quinta-feira, 22 de abril de 2010

BEM MAIOR QUE O MEDO DE VIRAR MULA-SEM-CABEÇA!

Só mesmo nunca tendo visto nada do Nicolas Roeg para crer que sua evocação do horror no maravilhoso filme “Inverno de Sangue em Veneza” (1973) seria desprovida de paixão, de questionamentos carnais mais amplos e não-lineares. Não foram poucas as vezes em que elogiei este cineasta aqui, portanto serei breve nesta evocação, visto que o que me interessa nele é uma particularidade, mas...

O inquieto britânico Nicolas Roeg estreou em longas-metragens cinematográficos com o genial “Performance” (1970, co-dirigido por Donald Cammell), um dos mais geniais filmes sobre a perda de uma geração contestatória que já vi. Nele, Mick Jagger é vítima e algoz das conseqüências capitalisticamente abarcadoras de nosso tempo, sentimento este que perpassa todas as obras seguintes do diretor, sempre magnificamente editadas e intercaladas com ações íntimas e intimidadoras. Não vi ainda sua versão televisiva para “Sansão e Dalila” (1996), o que me enche de curiosidade, mas, no filme aqui em pauta, a edição do excelente Graeme Clifford mexeu com meus sentidos e pulsões: não sabia se tremia ou se ficava excitado. Por precaução, tremi de medo e excitação ao mesmo tempo.

Para quem não conhece a trama (resumida integralmente na página 568 do guia “1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer”, sendo um dos quatro filmes do diretor resenhado no livro, fato raro), “Inverno de Sangue em Veneza” é o título nacional (surpreendente bom, aliás) para “Don’t Look Now”, um filme em que um restaurador de arte sofre a perda de sua filha, morta por afogamento, e, numa viagem a trabalho por Veneza, sua esposa aflita conhece uma médium cega que diz que a falecida garotinha está feliz e que eles devem sair urgente da cidade, sob pena de que algo pior aconteça. Não preciso dizer que acontecerá – e é impressionante! Porém, não é só o temor que se destaca no filme: a química impressionante entre os ótimos atores Julie Christie e Donald Sutherland e todas as seqüências de questionamento eclesiástico me deixaram com vontade de visitar uma igreja. Não que eu creia que isto vá redimir quaisquer de meus pecados, mas... Fiquei com vontade. Estou querendo! Talvez seja culpa da pletora da cor vermelha na direção de fotografia de Anthony B. Richmond (parceiro freqüente do diretor) ou os acordes românticos do Pino Donaggio...

Vale acrescentar que, aos 81 anos de idade, Nicolas Roeg está realizando este ano um filme de nome “Night Train”, protagonizado por Sigourney Weaver, basicamente sobre a investigação policial sobre o assassinato brutal da filha de um delgado. Nas mãos competentes e ainda muito ágeis de Nicolas Roeg, qualquer tema se torna um estudo potente sobre a inteligência/ignorância humana e suas implicações na própria carne. Sendo assim, aguardo com ansiedade o lançamento de mais este novo filme, enquanto lido internamente com o medo de virar mula-sem-cabeça...

Wesley PC>

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