domingo, 18 de abril de 2010

DA ARTE DE PREFERIR A VIDA, SEJA COMO FOR – PARTE I:

Na tarde de hoje, vi um filme sobre jovens em que um blogueiro “com muita dor para um rapaz de 17 anos”, vale-se de um célebre aforismo do escritor Albert Camus (“o suicídio é a única questão filosófica essencial”) para acabar com a própria vida, ingerindo uma mixórdia letal de soporíferos depois que sua ex-namorada recusa seu pedido de perdão. Para além de meus panegíricos ou insatisfações em relação ao filme em pauta, que estarão evidentes na crítica que planejo escrever de hoje para amanhã. Porém, antes que a mesma fique pronta, convém repassar a limpo algumas coincidências artísticas que me fazem preferir a vida mais e mais, não importa quão dolorosa ou insatisfatória ela pareça. Como o assunto foi pauta de um diálogo mui relevante na última semana, elenco algumas destas relações não necessariamente coincidentes, com um propósito auto-consolador que vai além da contrafação explicitada e reiterada. É um texto confessional, mas creio que possua alguma relevância para que seja aqui publicado. Espero que as razões deste texto sejam compreendidas (e perdoadas), visto que não quero difamar ninguém, mas apenas agradecer adequadamente a todos os seres humanos que permitem que eu continue a existir neste mundo paradoxal e repleto de gozos e frustrações.

Antes de qualquer lamúria mais específica, peço licença para citar pela segunda vez num mesmo dia uma seqüência do execrável filme “A Saga Crepúsculo: Lua Nova” (2009, de Chris Weitz), mas acho que a mesma vem ao caso: numa das cenas iniciais do filme, daquelas cujo roteiro preparam o espectador para reconhecer referências que parecem fugazes, mas que são tão oportunistas que beiram o plágio, o casal protagonista é intimado por um professor de colégio a escrever um trabalho sobre o amor trágico de Romeu e Julieta. Quando os mesmos estão assistindo uma versão cinematográfica antiga da peça shakespeariana, versão esta que parece entediante para ambos, o vampiro interpretado pro Robert Pattinson admite que sente muita inveja do apaixonado veneziano que tem por sobrenome Montéquio, não porque ele é correspondido em seu amor proibido por uma bela rapariga, mas porque ele é capaz de tirar a própria vida, algo que ele é incapaz de fazer. Num ridículo eco fílmico, o personagem consegue levar a cabo um suicídio por procuração, mas é impedido de cometê-lo no derradeiro segundo, graças à moça que ama e que ele pensara que tivesse se suicidado antes dele.

Ciente da irrelevância discursiva desta elegia suicida, não pude deixar de pensar um pouco nisso antes de sair de casa em direção a uma sala de cinema, onde dois amigos queridos me acompanhariam na sessão do mais recente filme da Laís Bodanzky, o que me fez lembrar de novembro do ano retrasado, quando uma pessoa muito querida esteve ao meu lado durante a projeção de “Chega de Saudade” (2007), filme que me fez redescobrir a tristeza sincera da Bossa Nova e que me propiciou vésperas de choro vitalício mui proveitosas para a aceitação de quem sou hoje. Encantei-me inesperadamente por aquele singelo filme sobre casais que se reencontram num baile para idosos, provando que a diretora Laís Bodanzky, responsável anteriormente pelo ótimo “Bicho de Sete Cabeças” (2001) e posteriormente pelo simpático “As Melhores Coisas do Mundo” (2010), visto hoje.

Chegando da sessão, visitei uma pessoa que, noutros tempos, foi o grande conforto de minha vida em relação ao que a personagem de Denise Fraga no filme mais recente chamou de “necessidades atávicas”. A mudança radical no seu horário de trabalho, porém, impede que nos encontremos, que eu pinha em prática a minha distinção até então não problemática entre as pessoas por quem me apaixono e aquelas por quem eu não hesito em me servir proto-sexualmente. Mais uma vez, a obrigação social do homem em trabalhar (no sentido empregatício do termo, o qual não considero necessariamente dignificante, conforme insiste o senso comum) limita uma possibilidade salvaguardadora de interação, que só se torna pior quando sei que amanhã não encontrarei novamente nenhum de meus redentores, nem o carnal (que estará confinado em seu ambiente de trabalho durante toda a madrugada) nem o anímico (visto que segunda-feira é seu dia de folga, quando não pode pôr em prática o nobre conselho redigido em letra esverdeada num pedaço de papel que, desde já, é um de meus tesouros fetichistas mais nobres). Tenho certeza de que sobreviverei, mas, dói! E, ao escrever esta conjugação verbal do verbo doer, sou obrigado a concordar tardiamente com Rafael Maurício num comentário elogioso que o mesmo fez sobre a simpatia exalada pela quarta faixa do álbum “Uhuuu!” (2009), da banda cearense Cidadão Instigado. Estou vivo ainda – e planejo continuar assim. Não sem a devida ajuda, evidentemente. Por sorte, esta existe. Graças a Deus, no sentido mais literal e acolhedor do termo!

Wesley PC>

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