Fiquei contente ao perceber que eu possuía em casa um DVD ainda não-visto do grande gênio paridor da ‘nouvelle vague’: “Alemanha Nove Zero” (1991), sobre o fim da Guerra fria comentado pelos olhos tristes de quem percebeu nisto apenas uma desculpa para que o Socialismo sucumba definitivamente sob a sanha capitalista, que tudo transforma em mercadoria.
“Há música depois da morte!”, constata “o último espião” (Eddie Constantine) que protagoniza o filme, numa cena maravilhosa, regada a músicas de Franz Liszt, Wolfgang Amadeus Mozart e Johann Sebastian Bach, e quem mais tiver composto uma música clássica antes do século XIX. Incrível a quantidade de compositores de que o diretor se vale para pôr em prática sua melancolia sublime, politicamente pessimista em relação não somente à reunificação da Alemanha, mas a todo um contexto de congregação mundial na vileza (aquilo que os comunicólogos de outrora batizaram “aldeia global”). No início do filme, pensava eu que não estava a compreendê-lo adequadamente, tamanha a quantidade de referências cinematográfica, musicais e literárias despejadas, mas, aos poucos, foram justamente estas referências que me salvaram, quando passei a reconhecer fotogramas murnaunianos, fassbinderianos, languianos e de muitos outros gênios teutônicos – Joseph Goebbels incluído. Ao final do filme, estava impregnado do conhecimento para o qual o teórico Fredric Jameson (que lia antes de ver o filme) me preparara e saí repetindo o aforismo pós-hegeliano e pós-nietzscheano que pululava durante o roteiro:
“a História está acima do bem e do mal”. Durante a sessão, imaginava um menino do interior segurando uma pistola e assassinando 70 sapos numa mesma tarde, confessando-me com orgulho, alguns anos depois, que sentiu muito prazer nisso e que eu deveria fazer o mesmo. “
Não”, eu disse-lhe.
“Sei o que é estar no lugar dos sapos”. 62 minutos depois, eu estava possuído, encantado com a auto-referência godardiana, em que o detetive Lemmy Caution revive algo que se passara no futuro não-remoto de “Alphaville” (1965), quando livros de caracteres ideologicamente duvidosos são deixados em quartos como se fossem bíblias obrigatórias... A história da opressão se repete?
Wesley PC>
Nenhum comentário:
Postar um comentário