sábado, 21 de agosto de 2010

“FALEM MAL, MAS FALEM DE MIM...” É UMA COISA BOA?

Para muita gente, talvez não. Para mim e para o Jean-Claude Van Damme que protagoniza “JCVD” (2008, de Mabrouk El Mechri), a resposta talvez seja sim”.

Começando de outra forma: não são poucas as pessoas que me criticam pela hiper-exposição de minha vida pessoal nos ‘blogs’ de que participo e são ainda mais numerosas as pessoas que reclamam – com razão, às vezes – que eu as prejudico com minhas impensadas declarações de cunho pessoal, que as envolvem. Pois bem, vi há pouco o filme supracitado e confesso-me escandalizado com a entrega impressionante do ator belga Jean-Claude Van Damme ao que seria seu próprio papel, um ator de filmes de ação, envelhecido e decadente, que envolve-se por acidente num assalto a uma agência de correios e enfrenta vários reveses públicos por causa de sua fama. Ou mais ou menos isso.

Em verdade, “JCVD” requer uma análise bem mais complexa do que o meu estupor aqui demonstrado poderia proporcionar. Vejamos se eu consigo antecipar algo: o filme se inicia com um plano-seqüência de ação que estafa o ator-personagem, que se queixa de sua forma física debilitada, em razão de ter 47 anos de idade. Na seqüência seguinte, vemo-lo perder a custódia de sua filha em razão de sua legitimação da violência através dos filmes de pancadaria que realizara, para que, no momento seguinte, ele fosse aprisionado pelos assaltantes de uma agência de correios, aprisionamento este que é confundido pelos transeuntes e pelos policiais, que atribuem ao desesperado Jean-Claude Van Damme intra-diegético a autoria do assalto. Em dado momento do filme, aliás (este mostrado em foto), o personagem funde “realidade fílmica” e “fantasia fílmica” num devaneio choroso em que culpa o espectador por estar aprisionando-o nesta cadeia de mal-entendidos prejudiciais, oportunidade em que ele aproveita para confessar o quanto o vício em drogas destruiu não somente sua carreira, mas principalmente sua vida pessoal. Juro que não soube como me manifestar perante o ator-personagem depois disso!

Incapaz que eu estava de julgar ou “perdoar” o personagem por seus erros – que, sim, confundem ficção e realidade – pude manifestar minha insatisfação sobre a bazófia do diretor argelino Mabrouk El Mechri, que manipula o ator-personagem a bel-prazer, servindo-se dele como um mero fetiche para satisfazer às suas pretensões “autorais” e satíricas, que, se foram, afinal, bem-sucedidas, é porque não tem como não se sair perturbado deste filme (vou ter que usar esta palavra) original. Impossível não sentir compaixão pelo ator-personagem e/ou pelo personagem-ator, impossível não se pôr no lugar dele, impossível não se sentir culpado osmótico pelos qüiproquós violentos que são mostrados no filme. Eu, pessoalmente, que dediquei significativa produção de esperma adolescente a este astro marcial sempre que revia “Duplo Impacto” (1991, de Sheldon Lettich) e gozava na famosa cena da cueca de seda preta que identifica os dois irmãos gêmeos, não tinha como não me sentir envolvido no drama do ator/personagem/ator, que merece créditos positivos por suas participações “dramáticas” em filmes como “Cyborg, o Dragão do Futuro” (1989, de Albert Pyun – que eu sei que é horrível, mas marcou parte de minha infância), “Soldado Universal” (1992, de Roland Emmerich – quiçá o seu melhor filme), “Vencer ou Morrer” (1993, de Robert Harmon – em que a nudez do artista é sabiamente aproveitada como elemento enredístico) e “Desafio Mortal” (1996 – dirigido por ele mesmo e preterido injustamente pro seus próprios fãs). Confesso: foi triste vê-lo acabado daquele jeito, ainda que foi satisfatório percebê-lo tão bem-intencionado a enfrentar a situação...

Seja qual for a interpretação dominante sobre este filme singular (ouso insistir neste adjetivo), minha única revolta contra ele parte em direção ao diretor e roteirista Maboruk El Mechri, um pilantra sacana que se aproveita ironicamente da decadência de seu protagonista e entope o filme com piadinhas metalingüísticas, reviravoltas crono-dimensionais e ‘leitmotivs’ vilanescos incredíveis. Mas, por sobre todos os defeitos evidentes do filme, a sinceridade metonímico/metafórica do protagonista se destaca e, assim sendo, é impossível não se emocionar com a superposição de imagens vítreas que impera na seqüência prisional final. Belíssimo filme, belíssimo alerta para mim mesmo!

Wesley PC>

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