segunda-feira, 13 de setembro de 2010

REVOLUÇÃO ARMADA SOB A ÉGIDE DO “NÃO MATARÁS” É UM OXIMORO INFINITAMENTE MAIS DEFENSÁVEL QUE UM FILME CONTRA A DITADURA PATROCINADO PELA GLOBO FILMES!

22h30’ de domingo. Minha mãe estava a preparar o seu banho diário antes do sono quando eu a convido para ver um filme comigo, sobre padres que lutam contra a ditadura no Brasil de 1968. “Filme sobre padres? Quero ver não! Não acredito mais em padres desde que eu vi...”, disse-me ela, de forma incompleta, citando um filme que não conheço sobre padres perversos contra crianças. Argüi que ela não deveria generalizar e que, sei lá, talvez o filme mostrasse um novo ponto de vista pacífico em prol dos segmentos militantes da Igreja Católica. Nunca li nada do Frei Betto, mas cri que seria assim. Ao final, minha mãe talvez estivesse certa em recusar o filme. Não no que tange à religiosidade problemática dos personagens, mas às suas próprias condições sabotadoras de produção: experimentei com “Batismo de Sangue” (2006, de Helvécio Ratton) uma das aplicações mais atrozes e públicas de nulidade discursiva que vi em tempos. Não é ruim, mas é nulo, uma aula invertida de aplicabilidade antitética!

Quando eu era mais novo e me comportava como um potencial fundamentalista crente, achava absolutamente incompatível ser religioso e ferir alguém fisicamente em defesa de uma causa política. Hoje eu sou obrigado a rever meus conceitos, mas ainda não tenho nenhuma posição estabelecida sobre o assunto. Ainda estou a processar argumentações possíveis e dissonantes em relação às justificativas plausíveis para a desobediência do que entrou para a História como “os 10 Mandamentos da Lei de Deus”, mas entendo que é necessário enfrentar limites discursivos se quisermos sobreviver acreditando em algo. Admito que devo conhecer bem mais sobre o próprio Frei Betto ou sobre a Teologia da Libertação, mas envergonhei-me sobremaneira de ver o que vi neste filme: uma aula invertida de aplicabilidade antitética, a nulidade política em seu extremo mais absurdo!

A primeira cena do filme mostra o Frei Tito (Caio Blat) se enforcando numa árvore francesa. A trama retrocede, conhecemos um pouco (quase nada) sobre a congregação dominicana ativista de que ele participou na juventude, assistimos a algumas demoradas (e convincentes) cenas de tortura, vemos fatos conhecidos da revoltante História recente brasileira serem deturpados pela Globo Filmes e acompanhamos a agonia de um exilado traumatizado pela tortura e que é fã ardoroso de Noel Rosa e congêneres. Tudo muito raso e alinear. Tudo muito confuso e picotado, graças a uma montagem que parece uma combinação indigesta entre comercial de TV e telenovela censurada, mas contando com uma boa trilha sonora do mineiro Marco Antônio Guimarães. Só não saí da sessão mais indignado porque o filme é nulo, mas envergonho-me bastante de ter sido cúmplice nacional de uma produção esvaziadora como esta, num contexto em que 280.000 ‘e-mails’ são enviados diariamente, recomendando que não votemos em uma dada candidata à presidência do Brasil porque esta tem um histórico de “terrorista” em suas costas. Nada a favor da tal candidata, mas rigorosamente contra o tipo de desvio hermenêutico promulgado por este tipo de produção, de construção discursiva anuladora, em que a amostragem de eventos através de um prisma brando é mais contraproducente do que a sua obliteração. Vergonha: eis o que sinto agora depois deste filme. Vergonha: tenho que ler o livro do Frei Betto que deu origem a esta nulidade. Vergonha... mas sou brasileiro!

Wesley PC>

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