domingo, 10 de outubro de 2010

OU... OU

Não vou fazer menção ao título de inspiração kierkegaardiana e nem vou mentir dizendo que tive tempo para ouvir o álbum na íntegra. Porém, até onde eu cheguei, “Either/Or” (1997) é um disco forte, um disco que toca fundo quem se sentiu pelo seguinte trecho, constante do capítulo final de um livro de Machado de Assis: “o mais doloroso de tudo é que nem a cerca, nem os demais acessórios, nada lhe lembrou o outro homem que morria por ela. A felicidade é isto mesmo; raro lhe sobra memória para as dores alheias”. Glupt! Era para ser um final feliz, a comunhão aguardada de um romance ideal, em que um e outro pretendente amavam-se deveras. Mas a realidade segue outros caminhos: por isso, o autor veio a ser mais famoso por seu Realismo que por seu Romantismo, ainda que, em termos práticos, ambos se mesclem de forma singular. Glupt. Meu coração veio à boca nas diversas oportunidades em que fui interpelado pelo mais que onisciente narrador.

Voltando ao Elliott Smith, autor e compositor do disco ora resenhado, acho que foi a doce e erudita jornalista Tatiana Hora quem me falou dele. Conhecia o compositor por causa da composição de “Miss Misery”, tema do filme “Gênio Indomável” (1997, de Gus Van Sant), lembrei depois, mas nada se compara ao bem-estar advindo das 12 canções deste álbum, todas gravadas como se o cantor tivesse duas vozes simultâneas, uma delas comentando seus lamentos ao mesmo tempo em que estes eram proferidos na cadência bela dos acordes que os acompanham. Tal qual acontece no romance. E, não por coincidência, comecei a ouvir o disco pela mais pungente das canções e não pela inicial: “Cupid’s Trick”, a faixa 10, é aquela que elogio aqui, enquanto me recupero da dramática reação ao belo romance machadiano:

“Cupid's trick comes
Down to shake and deal
The stupid kick that makes me real
Should've lied”


Recuperar-me? Não ouso, sou tão tíbio quanto o pretendente arrasado pela felicidade de sua amada ao lado de outrem: “em vez de mergulhar na água e no nada, como delineara, regressou tristemente para casa, trôpego como um ébrio, deixando ali a sua mocidade toda, porque a que levara era uma coisa descolorida e seca, estéril e morta”. Ai!

Wesley PC>

Nenhum comentário: