segunda-feira, 1 de novembro de 2010

RINDO DAS ATRACAÇÕES (ANTI)DEMOCRÁTICAS ALHEIAS, MAS SÓ ATÉ CERTO PONTO!

Na manhã de hoje, fui convidado por uma vizinha de 18 anos a participar da festa de aniversário de uma amiga em comum, mas tive que declinar, pois se tratava de um churrasco. Por mais que elas insistissem que eu poderia comer somente arroz com salada, o cheiro de osmazoma me incomoda, saber que animais mortos estão sendo tostados enquanto eu me divirto estraga a minha capacidade social de cooperação festiva. Ao final, elas pareceram entender minha argumentação rejeitante. Não irei a esta festa propriamente dita, mas topo ir com elas a um barulhento e desordeiro concerto de pagode (apenas por alguns minutos), se isto implicar em satisfazer o desejo de minhas vizinhas adolescentes em se divertir ao meu lado. Gosto delas – e é normal gostar de pessoas que gostam de coisas diferentes das que gostamos.

Pois bem. Depois de conversar com esta vizinha, escolhi um filme aleatoriamente para ver enquanto almoçava e deparei-me com “Um País de Anedota” (1949, de Henry Cornelius), tradução nacional para “Passport to Pimlico”, filme que eu via sendo comumente exibido na TV Bandeirantes quando era pequeno. Não tinha a menor idéia do que se tratava, mas sabia que o humor britânico era demasiado sarcástico e, como tal, me faria rir. Só não imaginava que gargalharia tanto quanto ri diante deste filme hilário, absolutamente hilário, e tachado de “conciliador” por alguns críticos opositores ao estilo supostamente hipócrita do diretor Henry Cornelius. Como não sei bem do que se tratam estas pendências, entreguei-me ao filme. E ri muito!

A trama parece simples, mas é demasiado intricada e crítica: no condado britânico que intitula o filme, Pimlico, há uma bomba ainda não desarmada no meio da cidade. Herança da II Guerra Mundial, tanto quanto os racionamentos materiais a que os moradores são submetidos. Por acidente, alguns garotos travessos deixam cair um pneu no buraco onde a bomba estava, e esta explode. Com a explosão, é descoberto um tesouro medieval, anexado a um documento que proclama a região como sendo não-britânica, mas sim vinculada à Borgonha francesa. Livres dos impostos e imposições ingleses, os moradores atiram-se desenfreadamente ao consumo de materiais outrora racionados e ao comércio não-tarifado. Até que uma guerra pela independência é sugerida e um boicote britânico é imposto sobre o local, que fica literalmente ilhado dentro de uma ilha, sem acesso a água ou comida. A opinião pública mundial se compadece, então, dos moradores de Pimlico e os simpatizantes da causa passam a lhe enviar mantimentos, inclusive o porco de pára-quedas que enfeita esta postagem. Neste instante, eu não ri. Achei absurdo e potencialmente divertido, mas não ri. Mas nada que prejudique o brilhantismo sarcástico do filme. Não somente é genial como se torna ainda mais pertinente diante das contradições democráticas que vivenciaremos entre o final do mandato de Lula e a posse da presidenta Dilma Rousseff, em janeiro de 2011. Fazia tempo que eu não ria tão alto diante de um filme... Hilário: democracia legalista na prática me faz rir!

O quartel final do filme difere em tonalidade cômica da argúcia ferina do início, mas ainda assim é muito divertido. Profético, aliás, em sua sujeição demeritória aos problemas oriundos da aplicação de desígnios utópicos (no sentido cunhado por Thomas Morus) numa configuração populacional acostumada aos desvios perdulários, ao consumo exacerbado, à forçação de barra concessiva. Não é isso que costumam nos empurrar, hoje em dia, sob o rótulo de democracia, vulgo “a ditadura da maioria”? Sempre que sou voluntariamente impedido de estar presente numa comemoração de amigos ou vizinhos porque estes são adeptos do consumo de churrasco, sou obrigado a pensar num falso dilema pós-moderno: tem algo errado com meus amigos ou com o mundo? Se puserem uma arma em minha cabeça e me obrigarem a escolher um dos lados da questão, garanto que sei o que responder!

Wesley PC>

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