quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

É IRRACIONAL QUANDO O SENTIMENTO VEM DE DENTRO?

Quando saí do trabalho, ontem à noite, eu e uma amiga conversávamos sobre nossos problemas relacionais, no plano para-namoratório. Se, do lado dela, ela não entendia o que eu vislumbrava quando me apaixonava por alguém, dado que não pratico formas convencionais de sexo penetrativo e padeço de traumas longevos envolvendo beijos na boca, do meu lado, eu a interrogava acerca das brigas que ela costuma ter com o namorado, geralmente relacionadas a crises de ciúme, da parte dele. Qual não foi a confirmação surpreendente, quando, ainda antes das 20h30’, o tal rapaz liga, irritado porque ela não estava em casa ainda. Mais: demonstrou insegurança em relação à minha presença ao lado dela: “por que tu estás com ele, a esta hora?”, deu para ouvir ele perguntando. Ela, obviamente, ficou sentida. Despediu-se de mim de forma silenciosa, a fim de não chatear mais o interlocutor a quem ela chamava de “amor”.

Tive dificuldade para escolher que música ouvir, depois disso, no caminho para casa. Ao chegar ao meu destino, guardei o meu material de trabalho e escolhei, e liguei a TV, visando assistir ao filme que seria exibido no programa “Mostra Internacional de Cinema na TV”, da TV Cultura. O filme já havia começado há mais de 15 minutos, era francês, e, pelas primeiras imagens, remeteu-me à afetação burguesa de um Claude Chabrol ou à erudição corriqueira de um Manoel de Oliveira, em sua versão francófona. Depois pensei que se tratasse dum filme do Dominik Moll, dado que o suspense psicótico do relacionamento amoroso obsessivo que cerceia o enredo tem muito a ver com o tipo de roteiro que ele leva a cabo. Vi o filme até o final, sem saber quem o dirigia, o que é bom, já que pude avaliar o filme pelo filme, sem as hipercodificações advindas de quando se reconhece o autor responsável pelo projeto.

No filme, um rapaz solteiro e tomado de bazófia familiar, conhece uma mulher num casamento. Faz sexo casual com ela e, para sua surpresa, ela diz que eles foram destinados um para o outro, que se merecem, eu devem se amar como nunca amaram a ninguém antes. Então, ela convida-o para morar com ela e entorpece-o com suas impressionantes estórias de vida, que culminam na enumeração de quatro atividades desafiadoras que “fazem a vida realmente valer a pena”: plantar uma árvore, escrever um poema, transar com alguém do mesmo sexo e matar uma pessoa. “Enquanto prova de amor, nós devemos matar alguém”. E ela o faz. Ela o ama patologicamente. O resto, só para quem ver o filme.

Sem conhecer nada sobre o filme, sem ter sido submetido a críticas positivas, negativas ou qualquer tipo de informação sobre ele, tive que depositar a minha relação apreciativa sobre a mais básica relação produto cultural – receptor midiático: a identificação qualitativa. Logo, gostei do filme porque me vi nele, em potência. Se um dia eu tiver o diferencial de ser correspondido em meus delírios platônicos, tenderei a comportar-me igualzinho a esta psicótica transtornada, apaixonada, entregue, louca... Assim pensei, assim tenho razão. Quem será o diretor deste filme?!

Wesley PC>

PS: no afã por encontrar uma fotografia que enfeitasse esta postagem confessional, descubro, com espanto (quase caio da cadeira, aliás), que o diretor do filme visto era realmente o Claude Chabrol! Reconheci o seu estilo em menos de 5 segundos de projeção. Nossa! Nome do petardo romântico em pauta: “A Dama de Honra” (2004), baseado em livro de Ruth Rendell e protagonizado pelo canastrão bonito Benoit Magimel. Nunca tinha ouvido sequer falar dele, antes de ontem à noite, mas agora ele me é altamente recomendado!

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