sexta-feira, 26 de março de 2010

“POR QUE TU NÃO NAMORAS?” (TENTATIVA DE RESPOSTA EM VERSÃO INTIMISTA)

Um garoto de 18 anos dirigiu-me a pergunta acima durante uma calourada unificada em que eu me sentia previamente entediado em virtude de estar enfrentando uma sensação mui similar àqueles cirurgiões endocrinologistas que adentram num bordel de luxo e percebem que já operou mais da metade das belas prostitutas do lugar. Explico: observava aquelas pessoas caminharem (nunca a UFS esteve tão repleta de afetados como agora!) e lembrava que já tive a desonra de ouvi-los gritar em meu local de trabalho, resmungando porque não conseguiram uma ou duas disciplinas na matrícula ou porque não aceitam o prazo determinado pela instituição para entregar documentos comprobatórios de vínculo. Olhava para aquele bando de guris fingindo serem descolados, sexualmente liberados ou afiliados a políticas de esquerda e, que balela, o tédio venceu!

Por sorte, tinha um plano B debaixo da manga: havia baixado o clássico de vanguarda “Índia Song” (1975), dirigido pela consagrada escritora Marguerite Duras. Na primeira metade do filme, espelhos dominam: personagens entram em cena por um lado da tela para percebermos, instantes depois, que eles estavam exatamente no lado oposto. Na segunda metade do filme, a rica personagem entediada da fabulosa atriz Delphine Seyrig deita-se em vários ambientes, cercada por homens jovens e influentes. Ela amava, ela era adúltera, ela estava oprimida pelas convenções sociais, geográficas e patológicas do lugar. Obra-prima!

Na minha cena favorita, um amante pergunta à protagonista por que ela nunca mais tocou música. Ela disse que estava tomada pela dor e aquela música fazia com que a amargura afligisse seu coração. Nas demais cenas do filme, os personagens movem-se pelo espaço como se fossem memórias espectrais. Suas falas e pensamentos são amalgamados às imagens como se fossem distantes lembranças vocais de um passado romântico. Fiquei absolutamente pasmo diante da genialidade, inventividade, qualidade e empatia do filme. Obra-prima, insisto!

Quanto à pergunta acima: por que eu não namoro?
Preciso responder?
Teria coragem de fazê-lo?

Wesley PC>

MÚSICA ‘INDIE’ É TUDO IGUAL?

Há suspeitas de que sim, mas isto não impede que música ‘indie’ seja agradabilíssima mesmo assim. Ouvindo “Beautiful Freak” (1996), elogiado álbum da banda norte-americana Eels, hiper-elogiado pela crítica e recomendado na página 780 do Guia “1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer”, percebi que o som deles parece demais com Beck, The Jesus and Mary Chain, Grandaddy, Yo La Tengo e muitas outras bandas similares que gosto. Algumas das músicas do álbum, inclusive, já fizeram parte de trilhas sonoras com personagens ‘freak’, como “Shrek” (2001, de Andrew Stanton & Vicky Jenson), “Monstros S.A.” (2001, de Pete Docter, Lee Unkrich & David Silverman) e “Hellboy 2: O Exército Dourado” (2008, de Guillermo Del Toro, que eu ainda não vi). Não é um som tão triste quanto eu esperava ostensivamente, mas o charme contrafeito de canções como “Novocaine for the Soul”, “Susan’s House” e a música-título justificam a minha recomendação do álbum: é parecido com muita coisa (boa), mas é digno, mui digno de ser ouvido e repetido!

Wesley PC>

terça-feira, 23 de março de 2010

“QUEM QUISER SER JORNALISTA, NÃO PODES FAZÊ-LO SEM CONHECER VLADIMIR HERZOG”

Assim disse minha professora de Introdução ao Jornalismo na manhã de hoje. Como sempre, fiquei pensando, fiquei contente com a fecundidade da aula, no sentido de que a professora em pauta, Messiluce Hansen, que se autodefine como “rígida” e “exigente”, é uma de minhas musas institucionais. Gosto do estilo dela, da firmeza, da determinação, das esperanças alimentadas... Porém, não sou dominante em minha opinião: a professora é rachada de “Messilúcifer” pelos corredores do Departamento de Comunicação Social. Quanto ao Vladimir Herzog (1937-1975), ele é um dos grandes mártires do Jornalismo mundial, assassinado pela Ditadura Militar quando trabalhava na TV Cultura e mantinha ligações com o Partido Comunista Brasileiro. Outros tempos... E olha que, em sua certidão de morte, a ‘causa mortis’ é auto-enforcamento.

Recentemente, apareceu um estudante de faculdade particular em meu local de trabalho, solicitando Transferência Externa para um curso da UFS. Seu sobrenome era justamente Herzog e eu pensei que ele tivesse algo a ver com o cineasta alemão Werner Herzog, um dos mais geniais defensores do élan super-humano de cunho nietzschiano. Não contive a interrogação e perguntei se ele conhecia o diretor, ao que ele respondeu: “não, não. Eu sou descendente do jornalista falecido Vlado Herzog. Sabes quem é?”. Sabia...

Wesley PC>

domingo, 21 de março de 2010

MAIS “UM FILME IRRESPONSÁVEL DE GREGG ARAKI”: AQUELE QUE FALTAVA...

Ontem eu fui convidado para um luau adolescente. A pessoa que me convidou disse que minha presença garantiria um consolo geracional, no sentido de que pessoas de sua faixa etária não costumavam se divertir como ele. Por motivos diversos, não pude aceitar ao tal convite e, no raiar da madrugada, no calor da reorganização de minhas atividades pessoais, vi “The Living End” (1992), um dos mais elogiados e propalados filmes do histriônico Gregg Araki e, mesmo faltando me atualizar acerca dos dois primeiros filmes (inacessíveis) deste diretor, creio que já posso esboçar aqui alguns julgamentos completos sobre sua obra, levando-se em consideração 7 filmes e as ilusões frustradas de que ele fizesse jus à militância ‘queer’ a que adere e fundamenta no início, mas que se perde ao longo dos anos. Eis seus filmes:

* THE LIVING END (1992): “filme de estrada” sobre dois aidéticos estilosos (vide foto) que se conhecem em situações de preconceito reiterado. Um deles, é crítico de cinema e não consegue esconder a infelicidade reinante depois que adquire a doença, não obstante recusar em culpar alguém em específico por seu mal. O outro culpa ostensivamente a sociedade e atira fatalmente contra lésbicas assaltantes, policiais homofóbicos e ‘skinheads’ que se metem em seu caminho hedonista, tentando impedir a consumação ideal de seu clímax mortífero, quando uma bala de revólver supostamente racharia seu crânio durante um orgasmo. É um filme problemático, mas também muito bom e problematizador, que culpa o governo e elogia a vida (e morte) a qualquer custo. Maravilhoso!;

* TOTALLY FUCKED UP (1993): literalmente traduzido como “totalmente fodidos”, esta aqui é a obra-prima do diretor, um ‘tour de force’ semi (ou pseudo?) documental em que ouvimos os depoimentos de vários jovens sobre suas experiências sexuais e esperanças e desapontamentos em relação à cultura de massa, à AIDS e ao moralismo repressor de seus pais e órgãos institucionais. Uma verdadeira preciosidade juvenil, que deveria ser vista por cada um que atingisse 15 anos e já tivesse tido uma ereção questionada em vida, mas a censura lima este filme, luta para que ele seja banido, infelizmente. Não consigo achar legendas para este filme nem mesmo em inglês, mas, se alguém se aventurar a vê-lo no idioma original, procurem-me que eu empresto um DVD. É maravilhoso e urgente!;

* GERAÇÃO MALDITA (1995): foi através deste filme que conheci o diretor. Comentei-o recentemente neste ‘blog’ em virtude de uma revisão nostálgica, mas, puxa, como o filme é interessante até mesmo em seus atropelos (literais ou não), sobre um trio bissexual que luta para se divertir num meio ambiente em que seus interesses são proibidos ou proibitivos. Um petardo ‘pop’ cheio de defeitos, mas violentamente propenso ás identificações tardias, do tipo “por que eu não fiz isso antes?”;

* ESTRADA PARA LUGAR NENHUM (1997): Com este filme, fecha-se a trilogia estritamente juvenil do cineasta, junto aos dois filmes imediatamente anteriores. Aqui, a pletora de personagens, sons e imagens confunde sobremaneira o espectador, que parece estar vendo cinco videoclipes ao mesmo tempo, misturado a citações de Jean Genet e Frank Capra. Toda uma geração de novos astros hollywoodianos (Ryan Philippe, Chiara Mastroianni, Christina Applegate, Traci Lords, Shannen Doherty e os recorrentes James Duval e Rose McGowan) aparece aqui, num filme que mistura romances, drogas, masturbação, festas, brigas, idiossincrasias e questionamento de preconceitos a um grande discurso em defesa do livre-arbítrio hebefílico. Ótimo retrato geracional;

* SPLENDOR – UM AMOR EM DUAS VIDAS (1999): o estapafúrdio subtítulo nacional evidencia que há algo muito errado com este filme. Exibido quotidianamente na TV aberta brasileira, este filme centra-se nos dilemas profissionais de uma atriz que não consegue encontrar um emprego atraente e que não consegue se decidir sobre qual de seus namorados ela gosta mais (e precisa?). Um dos namorados é Johnathon Schaech, que já havia trabalhado com o diretor e que protagoniza a cena mais interessante no plano da liberação sexual neste filme, visto que o mesmo descamba para um moralismo gritante à medida que se encaminha para o final e um terceiro namorado vem perturbar a mente da protagonista, que se sente obrigada a optar entre os dois moços gostosos e irresponsáveis ou um marido bonito, rico e quadrado. Aí eu sempre me pergunto: era preciso fazer esta escolha? Peido moralista na farofa, Gregg Araki, não obstante o filme ser muito divertido e engraçado, ora pois;

* MISTÉRIOS DA CARNE (2004): depois dos erros do filme anterior, ele realiza um “filme para gente grande”, um filme sério, dramático, genial, em que os jovens são novamente protagonistas, mas a reflexão que advém do filme ultrapassa qualquer reducionismo categórico sobre que geração ele atrai. Na trama, duas estórias de meninos sexualmente abusados por homens na infância se mesclam: um deles acha que seu molestador é um extraterrestre e cresce viciado em OVNI’s e congêneres; o outro sabe que foi um homem, gosta disso desde pequeno e embrenha-se pela prostituição voluntária a passos largos, até que um espancamento e um reencontro porão ambos os meninos deitados no sofá da casa onde morou o molestador de suas infâncias. Nem preciso dizer que este é um dos filmes que melhor sintetizam o que foi a minha própria infância no plano sexual. Absolutamente maravilhoso, quase um divã para mim!;

E, por fim, * SMILEY FACE: LOUCA DE DAR NÓ (2007): filme recente e desbaratado, sobre uma atriz (a desmiolada Anna Faris) que é obcecada por maconha e ingere uma quantidade desta erva ainda maior do que está acostumada, e precisa recuperar a mesma, sendo que o filme é conduzido por seu posto de vista completamente chapado. Não entendi algumas das opções criticadas pelo narrador do filme, mas receio concordar com elas e, por isso, já recomendei largamente este filme para os meus companheiros gomorrenses (risos). Talvez seja o filme menos interessante do diretor, mas é muito interessante, isto ninguém nega!

Estes foram os filmes do Gregg Araki que consegui ver até então. Para este ano de 2010, é planejado um reencontro entre ele e o mudo James Duval (lindo!) num filme batizado como “Kaboom”, cuja sinopse fala sobre “o despertar sexual de um grupo de colegiais, em clima de ficção científica”. Parece que ele tentará recuperar a verve lisérgica de “Estrada Para Lugar Nenhum”. Eu que não acho ruim. Que venha o novo filme... Gregg Araki é foda, mesmo quando erra!

Wesley PC>