sábado, 10 de abril de 2010

Gosto dos Nelsons




Eu ouvia falar que Nelson Rodrigues era um reacionário. Lendo umas coisas dele na internet, vejo que não. Sempre há tempo pra aprender. Gostei dele. Quero um livro desse cara pra ler.

"Não há ninguém mais bobo do que um esquerdista sincero. Ele não sabe nada. Apenas aceita o que meia dúzia de imbecis lhe dão para dizer" (Nelson Rodrigues).

por Leno de Andrade

QUEM SABE UM FILME DO JEAN-LUC GODARD NÃO AJUDA...?


Fiquei contente ao perceber que eu possuía em casa um DVD ainda não-visto do grande gênio paridor da ‘nouvelle vague’: “Alemanha Nove Zero” (1991), sobre o fim da Guerra fria comentado pelos olhos tristes de quem percebeu nisto apenas uma desculpa para que o Socialismo sucumba definitivamente sob a sanha capitalista, que tudo transforma em mercadoria. “Há música depois da morte!”, constata “o último espião” (Eddie Constantine) que protagoniza o filme, numa cena maravilhosa, regada a músicas de Franz Liszt, Wolfgang Amadeus Mozart e Johann Sebastian Bach, e quem mais tiver composto uma música clássica antes do século XIX. Incrível a quantidade de compositores de que o diretor se vale para pôr em prática sua melancolia sublime, politicamente pessimista em relação não somente à reunificação da Alemanha, mas a todo um contexto de congregação mundial na vileza (aquilo que os comunicólogos de outrora batizaram “aldeia global”). No início do filme, pensava eu que não estava a compreendê-lo adequadamente, tamanha a quantidade de referências cinematográfica, musicais e literárias despejadas, mas, aos poucos, foram justamente estas referências que me salvaram, quando passei a reconhecer fotogramas murnaunianos, fassbinderianos, languianos e de muitos outros gênios teutônicos – Joseph Goebbels incluído. Ao final do filme, estava impregnado do conhecimento para o qual o teórico Fredric Jameson (que lia antes de ver o filme) me preparara e saí repetindo o aforismo pós-hegeliano e pós-nietzscheano que pululava durante o roteiro: “a História está acima do bem e do mal”. Durante a sessão, imaginava um menino do interior segurando uma pistola e assassinando 70 sapos numa mesma tarde, confessando-me com orgulho, alguns anos depois, que sentiu muito prazer nisso e que eu deveria fazer o mesmo. “Não”, eu disse-lhe. “Sei o que é estar no lugar dos sapos”. 62 minutos depois, eu estava possuído, encantado com a auto-referência godardiana, em que o detetive Lemmy Caution revive algo que se passara no futuro não-remoto de “Alphaville” (1965), quando livros de caracteres ideologicamente duvidosos são deixados em quartos como se fossem bíblias obrigatórias... A história da opressão se repete?

Wesley PC>

sexta-feira, 9 de abril de 2010

MAIS FORTES SÃO OS RAIOS NO MEU CORAÇÃO!


Na noite de ontem, por volta das 18h15’, uma garota telefonou para o setor em que trabalho e perguntou: “ei, tu sabes se vai ter aula hoje?”. “Por que não?”, perguntei em retorno. “É que acabei de ver na televisão que, por conta da tempestade anunciada pelo serviço meteorológico, as instituições públicas iriam fechar. É verdade?”. Não”, eu disse, “aqui vai funcionar normalmente”. E era verdade. Trancado no setor em que eu estava, não percebia que chovia lá fora. Ouvia os trovões, mas não sabia que estava chovendo tanto. Chovia. Tanto. Cheguei em casa completamente molhado. Mais fortes eram os raios em meu coração!

Wesley PC>

DILEMA AMBIENTAL: “NÃO HÁ UMA SOLUÇÃO QUE NÃO GERE OUTRO PROBLEMA”!


Nunca escondi de ninguém que eu era um CDF, no sentido mais pejorativo do termo. Sou daqueles que, dada a discordância branda em relação ao que os professores estão falando, reclamo pouco, questiono-os de forma sempre complementar, visto que sei que pouco adianta lampejos de iconoclastia e revolta num sistema universitário derruído em sentido geral. Talvez isso seja culpa de minha sujeição burocrática gradual, conforme alguns me acusam, mas não só. Estou velho o suficiente para saber que existem momentos mais adequados para desperdiçar minhas energias, principalmente no plano institucional.

Pois bem, acabo de voltar de uma aula sobre acompanhamento midiático de temas ambientais e, confesso, estou perturbado. Fui pungido, em mais de uma circunstância, pelo talento da professora ambientalista, que possui aquilo que eu mais prego num ser humano: paixão. Por mais que ela se escore eventualmente em regras e formatações discursivas com as quais eu discordo (“ninguém é perfeito”, estou sendo obrigado a constatar), fiquei encantado hoje ao analisar a coerência de sua exposição de fatos em sala de aula, agravado pelo fato de a mesma estar emocionalmente afetada pelo que discutia, visto que morou e estudou boa parte de sua vida na cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, que agora é um local de constantes notícias jornalísticas em razão da catástrofe ambiental humanamente provocada que se abateu sobre lá. Mal sabia eu, em minha recusa voluntária em não assistir a telejornais, que o que chamam de Morro do Bumba não é morro coisíssima nenhuma, mas sim um entulho de lixo sedimentado ao longo de vários anos. Mais cedo ou mais tarde, algo iria acontecer, mas... Não é sobre isso que quero falar. Deixemos que os outros falem, por enquanto!

Voltando ao que me pungiu na aula: enquanto a professora falava e os alunos interagiam veementemente, visto que são quase todos pré-concludentes, eu percebia que sabia muito, muito pouco sobre o assunto. Sobre quase todos os assuntos ali tratados, aliás. Não sei quais são as propostas de governo da ex-ministra Dilma Rousseff, não sei quais os bairros de Aracaju mais castigados por deficiências infra-estruturais de mapeamento geológico e tampouco saberia definir o impacto de siglas como PAC e IDH na minha vida imediata, mas estou disposto a reparar estes equívocos. As intervenções pertinentes, chistosas e protestantes de um colega de classe – que percebeu contradições comportamentais no ambientalismo da professora, quando esta se desviou violentamente de um inseto em ferrão que a perseguia – trouxeram à tona um questionamento orgulhoso: “será que eu devo mesmo me preocupar com tudo isso?”.Viver pretensamente à parte das estruturas organizacionais latas do capitalismo como eu desejo viver não é suficientemente válido? Não seria mais importante para mim saber quem dirigiu cada um dos segmentos do clássico animado “Fantasia” (1940) do que comparar partidos políticos em que não vou votar? Receio dizer para mim mesmo que a resposta a estas duas últimas questões é NÃO!

Pelo jeito, esta complementação de habilitação graduada fará bem mais por minha vida do que eu imaginava quando aceitei o reingresso na Universidade Federal de Sergipe como portador de diploma. Percebi que a nova geração de comunicólogos que se seguiu à minha é assaz antenada com causas sociais mais amplas e cuidadosa em relação aos mecanicismos formais da profissão de Jornalista. Será que eu conseguirei me enturmar? Será que isto afetará drasticamente minha vida pessoal? Será que terei êxito em mais esta formatura? Torço para que possa também responder SIM a estas questões, mas, confesso: cheguei ao trabalho trêmulo depois da qualidade reflexiva da aula. Com todos os exageros aos quais meus leitores já se acostumaram, estou trêmulo!

Wesley PC>

quinta-feira, 8 de abril de 2010

NÃO/APENAS/MAIS DO MESMO?


Em 1983, Kenneth Johnson criou um seriado de nome “V”. Nunca vi sequer um episódio, mas este seriado foi atualizado recentemente sob o mesmo nome e teve o episódio de estréia exibido no canal pago Warner na última terça-feira. Vi a metade final do mesmo e, para além da mesmice nas investigações paranóicas da trama, em que um grupo diplomático de alienígenas que insiste em pregar a paz na verdade esconde sua origem réptil e destruidora de humanos, senti que me interessarei pelos futuros episódios, pelo que eles realmente apresentam de instigante e não somente porque podem me servir de pretextos eróticos em encontros com a vizinhança.

Parágrafo 2: o texto acima parece demasiado nulo? O é de fato. Mas sequer a nulidade me priva da sinceridade emocional na descrição de uma seqüência: a agente do FBI Erica Evans (Elizabeth Mitchell) infiltra-se numa célula anti-alienígenas, que constata que um dos principais avatares humanos dos répteis malévolos é um famoso terrorista, procurado pela agência para a qual Erica trabalha. Aprioristicamente, ela se consolaria em capturar este terrorista procuradíssimo e perigoso, mas depois que um olho animalesco se destaca sob a pele morta de um suposto humano, ela constata que a conspiração que investigará a partir de então é bem mais complicada do que pensava...

O porquê de eu estar escrevendo sobre isso agora? Quem me conhece que me compre. Mas o seriado é bom e a atuação caricatural da brasileira Morena Baccarin como a insistentemente “boa” Anna é digna de atenção crítica.

Wesley PC>

NA VOZ DE OUTRA PESSOA, QUE NÃO A DUSTY SPRINGFIELD OU A JOSS STONE...


"The only one who could ever reach me
Was the son of the preacher man
The only boy who could ever teach me
Was the son of the preacher man
Yes, he was!"

Tudo bem, é piada interna, mas a música é linda e vale em qualquer contexto - principalmente para quem já viu a obra-prima de nome "Pulp Fiction - Tempo de Violência" (1994), do tempo em que o respeito à História do diretor e roteirista Quentin Tarantino (genial, acima de tudo) ia bem além das transmutações assassinas a bel-prazer...

Wesley PC>

quarta-feira, 7 de abril de 2010

POR MENORES QUE SEJAM, AS AZEITONAS SEMPRE TÊM CAROÇOS.

“Este é um diário de ódio”: escreve Graham Greene num de seus mais maravilhosos livros a se tornar filme. “Este é um diário de tristeza”, ousaria dizer eu em resposta. Tristeza militante.

Os germes conteudísticos e sentimentais para tal publicação já estavam preparados há quase uma semana, mas não encontrava o momento ideal para começar a redigir. Na noite de ontem, quando finalmente vi “Balada Para Satã” (1971, de Paul Wendkos), pensei que o momento havia chegado. Na trama, um jornalista cultural é convencido por um pianista idoso e especialista em Franz Liszt a passar menos tempo diante de sua máquina de escrever e mais diante de um piano. Tudo, porém, não passava de um plano diabólico para possuir seu corpo e rejuvenescer às custas de outrem, rejuvenescimento este que implica na subsunção da esposa do jornalista a um pacto demoníaco, em que se deixa tornar vassala de Satanás a fim de permanecer ao lado do corpo do homem que amara. Não é escusado dizer que fiquei com medo de me imaginar em situação similar.

Dormi. Acordei. Comi. Fui para o trabalho. Conversei. Mijei. Bebi água. Ouvi músicas. Li. Arrotei. No prato de comida que comi há pouco haviam pequenos frutos de uma oliveira, todos prenhes em caroços, que, mesmo sendo mastigáveis, me deixaram receoso em adquirir apendicite, doença esta que tornou-se célebre em minha vida pessoal, em virtude de um episódio de adolescência, quando me compadeci de uma colega de classe que supostamente teria desmaiado em virtude de uma crise dolorosa desta doença, mas que, dez anos depois, descobri que se tratava de um aborto mal-feito. Choque: sequer imaginava que aquela moça, de nome Valdete, tinha vida sexual ativa, que dirá que a mesma havia interrompido uma gestação em vigor. Pessoas enganam a gente!

O que me traz de volta ao germe fotográfico desta confissão textual: na semana passada, eu e uma amiga de trabalho fomos buscar nossas carteirinhas de universitários, referentes ao período letivo 2010/1. A fotografia era tirada no próprio momento de confecção do artefato e, enquanto esperava a minha vez na fila, percebia que o arremedo de fotógrafa tratava as pessoas com brutalidade, dizendo que nunca havia tanta gente feia junta e ordenando que as pessoas tirassem fotos sorridentes e sem óculos. Ao chegar a minha vez, não quis tirar foto triste. “Não sou assim, preciso de uma foto taciturna e sincera”. Peguei emprestados os óculos de uma garota que estava na fila e sorria de minha defesa personalista e insisti em ser fotografado com a expressão grave que já me caracteriza. A mulher insistia para que eu sorrisse. Eu negava veementemente. Até que ela arrematou: “menino, ria logo que tu estás a atrasar a fila”. Eu pouco me lixei para a ordem ríspida: “tire a foto do jeito que eu quero que a fila volta a andar”. Ela se revoltou e a foto ficou como ficou. Não está iluminada nem aproximada como eu gostaria que estivesse, mas pelo menos não estou sorrindo. Menos mal. Tenho mais com o que me preocupar.

Wesley PC>

terça-feira, 6 de abril de 2010

RENDIÇÃO CAPITALISTA: COMPREI UM MP4 EM 3 PRESTAÇÕES!

Quando vinha para o trabalho, às 12h30’ de hoje, debaixo de um sol escaldante, percebi que haviam derrubado os muros de uma fazenda no bairro Rosa Elze. À frente desta fazenda sem muros, estava parado um agricultor numa pose que me remeteu à maravilhosa cena final do filme “Morte em Veneza” (1971, de Luchino Visconti). O ângulo que seu braço na cintura formava permitia que eu visse que, além do facão em sua mão direita, havia o cabo de uma arma ou ferramenta de trabalho em sua roupa de baixo. A paralisia de seus gestos soava como um desafio, mas atravessei a rua como se não estivesse a perceber nada, não obstante um estranho temor me deixar apreensivo, em virtude de ter sido quase atropelado por dois táxis no mesmo trajeto. Mais à frente, deparei com uma mulher que saía de uma ‘lan-house’ com um telefone celular nas mãos e uma faca grande de cozinha na outra. Fiquei a imaginar o que ela estava a fazer com aqueles instrumentos diante de um computador. Dei de ombros novamente. Queria estar ouvindo música enquanto caminhava. Ao chegar ao local em que desempenho funções empregatícias, percebo que havia uma ligação perdida. Um vizinho havia comprado um executor de mp4 para mim, em seu cartão de crédito. À vista, o aparelho custava R$ 99,00. No cartão que ele dispunha, foi obrigado a parcelar em três vezes, de maneira que o preço final ficou estipulado em R$ 111,00. Precisava do aparelho. Fazer o quê?

Wesley PC>

“SENHORA” (1875), OBRA-PRIMA LITERÁRIA DE JOSÉ DE ALENCAR:



“Vertendo então n’alma do moço os eflúvios de seu inefável sorriso, Aurélia retirou-se da janela”.

Com esta passagem típica, decorrida após 52 páginas, no final do oitavo capítulo da primeira das quatro partes de que se compõe o romance, eu me entreguei soberanamente a este magnífico exemplar de Literatura, a esta suprema descrição dos ideais românticos que moviam seu egrégio autor. Quando li as três primeiras páginas deste livro no interior de ônibus, às vésperas do feriado de Páscoa, percebi que tinha locado na biblioteca a obra errada de José de Alencar. Tencionava ler uma trama explícita acerca da subsunção da mulher à honra e à prostituição, mas resolvi dar ao destino a oportunidade de seduzir-me com este livro cujo título já fora alvo de meus preconceitos de adolescente. Mal sabia eu o que me esperava: tantas projeções e identificações lancinantes este livro me cravou na alma, tantas!

Por detrás e em frente à pletora de adjetivos utilizadas pelo autor (que, por vezes, fazia-se de narrador cínico tipicamente realista), via a mim mesmo esparramado na trama, pulsando fortemente diante da dolorosa saga de Aurélia, moça rica na primeira parte do romance, mas que aos poucos revela suas intenções e dramas, seu convívio extremo com a pobreza, a rejeição e a orfandade e os motivos que a levaram a comprar um marido, marido este que era apaixonado por ela no auge de sua miséria, mas que foi levado a optar pelo casamento de conveniência em pelo menos duas vezes. Contar mais será estragar as surpresas de quem se dispor a penetrar a magnificência desta obra-prima de nossa literatura, inclusive tão consciente de seu papel fundamental que, numa passagem genial e inesperada, o narrador lança o seguinte petardo:

“Aconteceu uma noite cair a conversa em assunto de literatura nacional. Fato raro. Entre nós há moda para tudo nos salões; menos para as letras pátrias, que ficam á porta, ou quando muito vão para o fumatório servir de tema a dois ou três incorrigíveis”.

Sou um destes incorrigíveis, a tal ponto que não acreditei quando li esta passagem, às 5h da madrugada em que a tensão reinante entre a ânsia e o medo de um reencontro me afligia. E, para tornar ainda mais pungente esta tensão, cabe ressaltar que a pessoa que eu reencontraria tachou-me justamente disso: incorrigível. E eu assim o sou!

Como dormir ou fazer qualquer coisa antes que chegasse ao fim desta preciosidade literária que tão a nu punha a minha alma? Como? Sentei-me e devorei as 50 páginas que restavam para que eu chegasse ao fim do relato, para o qual, juro, torci para que houvesse um final feliz como nunca eu desejei durante uma leitura. Teria eu conseguido este final desejado? Sugiro que a obra original seja visitada no afã pela obtenção da resposta, à qual se segue um apêndice literário epistolar, publicado à época, em que uma leitora do romance assevera: “não pergunto à rosa que me enfeita e à seda que me veste, qual o canteiro ou o tear que produziu estas maravilhas. Da mesma forma não inquiro do livro, que cérebro o pensou, que mão o escreveu”. Eu exulto: sou agora um devoto alencariano. Ajoelho-me perante a sua genialidade.

Wesley PC>

domingo, 4 de abril de 2010

BREVE EXTENSÃO QUÍNTUPLA MUSICAL, NACIONAL E CHISTOSA DO COMENTÁRIO ANTERIOR

Vou assumir:

1 – As capas de suco mostradas nesta imagem são uma brincadeira de uma empresa brasileira em homenagem a algo semelhante que teria sido realizado com uma famosa banda de Liverpool;

2 – Brincadeira ou não, os rótulos nos fazem pensar na paranóia justificada do Guy Debord sobre a comercialização extrema da arte;

3 – “Os Doces Bárbaros” (1976, de Jom Tob Azulay) é um filme que necessito ver urgentemente, já que não somente documenta os inesquecíveis concertos comemorativos das carreiras individuais de Gilberto Gil, Gal Costa, Caetano Veloso e Maria Bethânia como também escancara fatos polêmicos e revoltantes envolvendo a prisão, o julgamento e a internação de um deles por posse de drogas;

4 – Demorei muito tempo para entrar em contato pormenorizado com esta obra-prima de nosso cancioneiro reverenciado;

5 – Se hoje me pedissem para enumerar as 10 melhores músicas de minha vida, com certeza “O Seu Amor”, faixa 4 do primeiro disco, estaria entre elas:

“O seu amor
Ame-o e deixe-o
Livre para amar

O seu amor
Ame-o e deixe-o
Ir aonde quiser

O seu amor
Ame-o e deixe-o brincar
Ame-o e deixe-o correr
Ame-o e deixe-o cansar
Ame-o e deixe-o dormir em paz

O seu amor
Ame-o e deixe-o
Ser o que ele é
Ser o que ele é
Ser o que ele é”

Wesley PC>

“IN GIRUM IMUS NOCTE ET CONSUMIMUR IGNI”

De trás para frente de frente para trás, esta expressão latina permanece idêntica. Trata-se de um palíndromo moral que significa algo como “perambulando pela noite, somos consumidos pelo fogo” e é também o título do filme que vi na madrugada de ontem para hoje, depois que recebi um telefonema perguntando por que eu não havia comparecido a uma dada festa: “esta tua recusa em sair de casa tem alguma razão política. Wesley?”, perguntou a minha interlocutora, ao passo que eu não tive tempo de dizer que só não saí com ela porque ela não me disse a que horas seria o nosso encontro. Confesso, porém, que reluto em sair de casa muitas vezes para atender ao convite de amigos. É algum vício, alguma crise, algum problema que me persegue há um bom tempo e que me impede de apreciar e/ou descobrir algumas situações e experiências essenciais para entender melhor, nos sentidos cultural e político do termo, o mundo ao meu redor. E, para minha completa surpresa e estupor, era justamente sobre isso que o filme visto versava!

“in girum imus nocte et consumimur igni” (1978), escrito assim mesmo em letras minúsculas, é o nome do último filme dirigido pelo teórico situacionista Guy Debord, que suicidou-se em 1994. Quem já leu qualquer frase do teórico-cineasta contra o que ele definiu como “A Sociedade do Espetáculo” (tema de seu livro mais famoso e de filme homônimo dirigido em 1973), sabe que ele é absolutamente iconoclasta, odeia tudo o que tenha sido tocado pelo Capitalismo e professa o surgimento militante do anti-Cinema, levado a cabo desde 1952, aos 19 anos de idade, quando ele realizou “Uivos Para Sade”, filme que, insisto, até hoje leva o título de “o mais radical que já vi”. Em “in girum imus nocte et consumimur igni”, a abordagem é diferente, propositalmente modorrenta e arrogante, em que pessoas são mostradas como indignas de quaisquer tipos de concessões e imerecedoras até mesmo de imagens, visto que resignaram-se a desistir de tudo, conforme assim ordena as exigências mercadológicas atuais. Em verdade, é complicado acompanhar o filme não somente por causa de sua dificuldade narrativa e arrogância estrutural, mas porque o diretor faz uso de dados mui pessoais de sua própria vida e da cidade de Paris para explicar que não se pode ser militante sem viver, sem misturar-se aos problemas criticados, sem sentir na pele as conseqüências do que se condena. Por isso, ao fim da sessão de 100 minutos, há um recado pedindo que voltemos ao princípio, o que eu fiz através da leitura integral do roteiro, que, por sorte, eu havia imprimido antes de baixar o filme. Fiquei aterrado com tudo o que interpretei a partir daí. Dormi com muita dificuldade militante depois disso e continuo um tanto relutante em sair de casa, mesmo tendo certeza e sapiência de que isto é obrigatório e necessário. Erro meu. Talvez eu seja mais só um viciado contumaz na sociedade atroz e mercadológica que o diretor/autor condena... Hoje de manhã, faltou energia elétrica onde moro. Que agonia!

Wesley PC>