sábado, 22 de maio de 2010

PROLEGÔMENOS DA HISTÓRIA ATRAVÉS DOS FILMES DA ATLÂNTIDA

“Cinema? Isto é um verdadeiro ligeiretivo. Sou professor de História grega... Helena de Tróia no cinema nacional? Estou escrevendo um livro: ‘A História do Movimento Abstrato na Filosofia Grega’, em cinco volumes. Estou no prefácio e já tenho a data em que ficará pronto: 25 de março de 1987”

O depoimento acima pertence ao historiador Xenofontes, interpretado pelo divertidíssimo Oscarito, em “Carnaval Atlântida” (1952, de José Carlos Burle e Carlos Manga), filme que vi há alguns anos, mas que, dentro do meu contexto atual de estudos nacionalistas positivos, é algo que preciso rever urgentemente. Na trama do filme, um realizador espalhafatoso de nome Cecílio B. de Milho (Renato Restier) resolve dirigir um filme de grandíssimo orçamento contando a saga de Helena de Tróia, servindo-se para tal da consultoria histórica do personagem acima citado, mas uma série de incidentes e atabalhoamentos faz com que o próprio professor Xenofontes travista-se como Helena de Tróia e o resultado final é uma baderna legitimamente brasileira, conforme propõe o titulo da obra.

Por motivos diversos, vi dois filmes produzidos pela Atlântida na tarde de hoje e fiquei repleto de alegria ao perceber minha mãe gargalhando diante deles. Após a sessão do segundo destes filmes [“Treze Cadeiras” (1957, de Francisco Eichhon)], humoristicamente tardo – tanto que recorre a um forçado desfecho dramático/enternecedor para marcar a diferença de públicos consumidores entre as duas metades da década de 1950 – fui convidado por uma amiga de infância a participar de uma cerimônia de colação de grau dos estudantes de História de uma universidade privada sergipana. Na segunda metade da execução do Hino Nacional Brasileiro, componente essencial da cerimônia, senti uma vontade de rir e, ao mesmo tempo, um orgulho hermenêutico patriótico intenso, que não se associava aos clamores bélico-defensivos da letra, mas encantava-se pela riqueza poética da mesma. A revisão dos filmes da Atlântida e a paixão crescente pelos estudantes de História que me cercam estão realmente operando mudanças em mim! Voltarei a falar sobre isso...

Wesley PC>

HEY, NOW, DO IT!

Os olhos restantes na montagem acima (plágio da homenagem do Google ao trigésimo aniversário do PacMan) foram tema da segunda conversa que tive com o estagiário novo do local em que trabalho. Percebendo que os mesmos quedavam constantemente semicerrados, intuí que isto redundaria num decréscimo fotogênico por parte do seu portador, intuição esta que foi completamente negada algumas semanas depois, quando descobri algumas fotografias pessoais do mesmo, todas envoltas por um classicismo religioso no patamar estético/fisionômico. Assumi o meu erro de julgamento prévio e segui adiante nas dificuldades de convivência empregatícia com o referido possuidor ocular, bastante imperioso em seus traços personalísticos, gradualmente apresentados desde a segunda quinzena de janeiro deste ano.

Pois bem, no intervalo entre tarde e noite desta sexta-feira, momento em que os funcionários de Departamento de Administração Acadêmica da UFS suspendem o atendimento externo a fim de resolverem pendências organizacionais ou simplesmente descansarem, o rapaz que carrega diuturnamente os olhos cinicamente expressivos desta montagem fotográfica perguntou se eu não tinha nada mais a fazer para além de olhá-lo insistentemente. Eu sorri, em resposta (óbvio que sou), ao que ele retrucou: “nem responda!”. Ri mais ainda e, hoje, passadas cerca de 20 horas desde que a pergunta foi formulada, insisto em perguntar responsivamente: o que poderia ser melhor? O quê?

Em verdade, tenciono redigir um texto imenso em resposta a esta pergunta desde o início da noite de ontem, mas uma enxurrada de imprevistos e situações positivamente inesperadas de escolha hedonista fizeram com que eu adiasse este intento, conservando, ao invés, os clamores protestantes da canadense Joni Mitchell em minha mente, conforme visto no bom documentário “Message to Love: Festival da Ilha Wight – 1970” (1997, de Murray Lerner). Viver é isto, também: suspender ações e desejos, de vem em quando.

“Hey farmer farmer, put away that DDT now
Give me spots on my apples
but leaves me the birds and the bees, please!
Don’t it always seem to go
That you don't know what you’ve got ‘til its gone
They paved paradise and put up a parking lot”

(“Big Yellow Taxi”)

Wesley PC>

sexta-feira, 21 de maio de 2010

DEPRESSÃO REAMBIENTALZADA

Já falei muito sobre os 15 violentos minutos de tristeza (melhor seria dizer: de vazio) que me assolaram ontem à noite, mas, reflexões posteriores e pseudo-causas anteriores à parte, a fim de que eu me sentisse novamente tranqüilo, precisei ouvir com atenção ao álbum “American Life” (2003), da diva Madonna, precisão esta que trouxe à tona novos questionamentos pessoais.

Por mais que eu reconheça o talento insofismável desta artista, descarto veementemente a associação pretendida entre a sua apreciação musical e os ícones ‘gays’ que ela supostamente representa. Digo mais: isto só não me é completamente irrelevante porque esta forçação de barra homoerotizada sobre os comportamentos performáticos da artista instiga-me a insistir comigo mesmo acerca do merecimento laudatório com que ela é celebrada ao longo de seus mais de 30 anos de carreira. Prestando atenção ao álbum, entendemos o porquê: Madonna pensa no que canta e leva-nos também a refletir sobre isto.

Fazendo parte da verve contemporânea ainda mais dançante (no mau sentido comercial do termo) da cantora, “American Life” faz pertinentes observações sobre o estilo de vida dominante no país onde a cantora reside, de maneira que canções como a faixa-título, “Hollywood”, “I’m so Stupid” e “X-Static Process” são bastante funcionais neste sentido, mas é “Love Profusion” a canção que mais se destaca, a que mais me tocou pessoalmente. Por mais que eu fique chocado ao imaginar pessoas rebolando enquanto a artista conta, em versos remixados, o quanto chorou ao saber da morte de sua mãe, aos 5 anos de idade (em “Mother and Father”), os jogos rítmicos da canção destacada, aliados à ternura da voz da cantora e a uma letra obviamente passional e prenhe de rimas, me deixam animadíssimo.

Cheguei cantarolando esta canção no trabalho, na manhã de hoje, e um colega de trabalho tachou-me de “guevariano”, por causa das tonalidades verdes da roupa que vestia. Na semana passada, fui tachado de “hippie largado” por alguém que telefonou para o meu chefe, tentando me identificar a fim de receber uma informação continuada. Achei engraçados os comentários identificatórios (em especial, quando descobri quais foram as principais influencias da cantora na confecção da capa e da coesão conteudística do CD), mas chateio-me quando isto descamba para uma suposta associação com os caracteres evasivos do termo ‘gay’. Não gosto deste termo e, numa conversa de pé-de-ouvido em sala de aula, há pouco, deixei entrever o porquê. Este será o tema de outra futura postagem confessional, mas, por ora, sigo a ouvir Madonna com cuidadosa reverência crítica. Ela merece!

Wesley PC>

quinta-feira, 20 de maio de 2010

A PARTE DE CIMA DA MONTANHA-RUSSA DAS OBVIEDADES SENTIMENTAIS

“Every time that I look in the mirror
All these lines in my face gettin' clearer
The past is gone
It went by like dusk to dawn
Isn't that the way?
Everybody's got their dues in life to pay”


Esta é a estrofe inicial da canção “Dream On”, famosa na voz de Steven Tyler, vocalista do Aerosmith, e são estes versos que ilustram o décimo-nono episódio do seriado televisivo “Glee”, do qual eu não consigo me livrar, não obstante a percepção crescente de sua monetifagia oportunista. Conforme costuma acontecer nas madrugadas de quarta para quinta-feira, dormi após a audiência do referido episódio e, por mais que eu desgoste da exacerbação de seus caracteres de auto-ajuda, não consigo desgostar do seriado: ele me afeta, ele mexe comigo, ao fazer com que eu traga à tona projeções emotivas nem sempre condizentes com meu passado efetivo, mas constantes de uma idealização hoje obnubilada do mesmo. Eu já devo ter sonhado algum dia...

O episódio homônimo à canção do Aerosmith me fez assumir disso, seja através da torcida para que a líder de torcida grávida e moralmente reabilitada seja percebida como tal pelos demais, que ainda a desdenham, seja através do menino paraplégico que imagina a si mesmo como dançarino, participando de uma coreografia populosa (o que chamam de ‘flash mob’) num ‘shopping center’, filmado através de câmeras de telefones celulares, tal qual um famoso videoclipe realizado por Spike Jonze para o Fatboy Slim.

Insisto: o clima dramático-assistencialista da série soa-me cada vez mais problemático, a ponto de um amigo querido dizer que minhas reações à mesma assemelham-se a uma montanha-russa sentimental e premeditada, mas, com todas as fórmulas fáceis decorrentes do confronto de adultos imaturos com suas próprias desistências adolescentes – algo que será a tônica intra-diegética daqueles personagens – fórmulas estas que são metonimizadas no embate/dueto entre Matthew Morrison e Neil Patrick Harris na canção-título, utilizada como decisão para saber quem conseguiria o papel de protagonista numa montagem teatral, assumo-me como fã de “Glee”. Culpa de minha sociopatia agendada!

“Sing with me
Sing for the year
Sing for the laughter n' sing for the tear
Sing with me
If it's just for today
Maybe tomorrow the good lord will take you away”


Wersley PC>

terça-feira, 18 de maio de 2010

NUNCA É TARDE PARA SER ETERNO!

Existem alguns filmes definitivos sobre morte que ficam cravados em nossa memória como sinônimos de eternidade artística. “Um Filme Para Nick” (1980, de Nicholas Ray & Wim Wenders) talvez seja o que mais anseio por ver, no sentido de que documenta frente à câmera a deterioração de um gênio hollywoodiano em razão de um câncer. “Sirius Remembered” (1959, de Stan Brakhage) era outro que eu desejava muito ver e, há pouco, tive a honra, depois de me benzer, temente de que as lembranças pessoais do falecimento de meu cãozinho Almodóvar viessem à tona. Se, no primeiro filme, o que está em voga é “o espetáculo da morte em ação” (conforme definição do editor alemão Peter Przygodda), no segundo, o que se destaca é a decomposição protestante, num libelo cine-pedagógico em prol da reeducação visual pós-primitva. Em ambos, porém, o efeito é o mesmo: a comoção da eternidade. E afirmo este mesmo sem ter tido a graça de ter visto o primeiro filme.

Pois bem, “Plano 9 do Espaço Sideral” (1959), obra-prima do injustiçado cineasta B norte-americano entra com louvor no rol deste tipo egrégio de filme. Seu diretor fora maltratado por anos como “o pior de todos os tempos” pela dita crítica especializada, mas sua argúcia para dignificar os retalhos de seus desejos fílmicos era genial, conforme se demonstra nesta brilhante peça cinematográfica, em que o falecido Bela Lugosi brilha como um velho viúvo lancinado pela depressão depois que sua esposa falece e, levado também ao perecimento carnal, é ressuscitado por alienígenas que pretendem, assim, destruir os seres humanos antes que estes dizimassem por completo o belo planeta em que vivem. O detalhe: quase tudo o que o ator é mostrado fazendo na diegese fílmica foi capturado num contexto personalíssimo, visto que o astro húngaro, relegado ao ostracismo depois de brilhar como o mais famoso vampiro do cinema, era amigo íntimo do diretor, que ficou ao seu lado até o momento derradeiro em que o vício soturno no consumo de morfina limou a sua sobrevivência. Quem viu a excelente biografia destes personagens realizada por Tim Burton, num passado recente e louvável, sente-se tentado a lacrimejar num filme comumente recebido por risos e escárnio. Fui um destes e me orgulho pessoalmente do fato!

Em verdade, este não era ainda o texto definitivo que queria destinar a este riquíssimo exemplar renegado da Sétima Arte, mas as boas intenções justificam a publicação precipitada. Sem querer estabelecer aqui um juízo de valor, há exemplos em que a Arte eterniza a Vida – e os três filmes aqui citados são demonstrações preciosas de como isto é eticamente gratificante para todos os envolvidos!

Wesley PC>

BRASILIDADE CONSCIENCIOSA

Nas últimas semanas, em virtude de um contato próximo com filmes popularescos que eu detestava aprioristicamente, passei a sentir um renovado patriotismo – num viés que não beira o ufanismo, mas que está atrelado a um orgulho regional que, por vezes, escorrega em concessões exageradas de ordem cultural.

Pois bem, o mesmo pivô humano responsável pelo resgate dos filmes produzidos pela Atlântida em minha vida fez com que eu finalmente visse “Cartola – Música Para os Olhos” (2006, de Hilton Lacerda & Lírio Ferreira), documentário sobre este egrégio sambista carioca que estava guardado em minha casa faz tempo, mas que nunca senti suficiente motivação para começar a ver. Motivos preliminares: 1- Não me interesso necessariamente por biografias de artistas, pelo menos, não em detrimento da autenticidade do eu-lírico em suas obras (vide reclamações pessoais íntimas que posto comumente aqui no ‘blog’); e 2 – Tenho um problema drástico de antipatia difusa em relação ao contexto que gerou grandes sambistas como Pixinguinha, Zé Kéti e o próprio Cartola. Não gosto da “malandragem” que eles defendem (ou do modo como eles viveram, pelo menos), não obstante esta mesma malandragem ser dialeticamente defendida por nobres teóricos de nossa cultura efetivamente nacional – Antonio Cândido, à frente, com louvor!

Explicando melhor o segundo ponto: não sei como classificar a minha suposta adesão à boemia, mas, apesar de viver num conglomerado periférico de habitantes suburbanos, não me divirto carnavalescamente (em datas e lugares específicos, ao menos) como os personagens entrevistados no documentário, bastante pusilânime para construir um ponto de vista reflexivo sobre o artista que usa como matéria-prima, não obstante o convidativo subtítulo do mesmo, efetivado através de uma montagem deveras pretensiosa que mistura depoimentos dos conhecidos de Cartola, imagens históricas da ditadura militar e da formação da Bossa Nova, por exemplo, e cenas de inúmeros filmes famosos, somente identificados como tais nos créditos finais. Tais características são fundamentalmente ruins? Nem de longe, mas, do modo como foram estruturados pelos diretores e roteiristas do filme, soam mais exibicionistas do que pedagógicos (ou algo do gênero), de maneira que eu me senti muito mais ignorante sobre Angenor de Oliveira (1908-1980) ao final do filme do que antes. Se não houvesse um estagiário culto no local em que trabalho que insistisse tanto em ouvir as canções do célebre Cartola em meio a Legião Urbana, Lily Allen, Seu Jorge e James Blunt, talvez eu ficasse mais irritado com o mau filme. Por sorte, o garoto se dispôs a ver o filme e me dizer o que achou do mesmo, após a audiência. Fico aqui na espera, portanto!

Sobre o que o filme tem de interessante: fiquei encantado com o contexto em que ele veio a se casar com a notória Dona Zica da Mangueira, fiquei intrigado com a insistência do artista em usar óculos escuros o tempo inteiro, e, claro, uma obra audiovisual construída sobre as músicas tristes e magnificamente cadenciadas deste gênio carioca não tem como ser de todo ruim! Mesmo que a extraordinária “Preciso Me Encontrar” não seja executada durante o filme, preciosidades como “Divina Dama”, “O Mundo é um Moinho” e “As Rosas Não Falam” estão lá, mas é “Quem Me Vê Sorrindo”, a canção dele que mais me apetece:

“Quem me vê sorrindo, pensa que estou alegre
O meu sorriso é por consolação
Porque sei conter para ninguém ver
O pranto do meu coração

O que eu sofri por esse amor, talvez
Não compreendeste e se eu disser não crês
Depois de derramado, ainda soluçando
Tornei-me alegre, estou cantando”


Quem me vê sorrindo, sabe!

Wesley PC>

segunda-feira, 17 de maio de 2010

PENETRANDO PELA URETRA, ENCONTRANDO CONFORTO SUICIDA, MORRENDO E MATANDO, AO MESMO TEMPO: ANEDOTAS SUBLIMINARES DE UM CANDIRU HUMANO

O peixe amazonense candiru, que atende pelo nome científico Vandellia cirrhosa é um actinopterígio (animal com nadadeiras calcificadas) que parasita outros peixes, enganchando-se nas guelras dos mesmos e sugando seu sangue, o que lhe rendeu o apelido de peixe-vampiro. Porém,o candiru é realmente famoso pela suposta capacidade de penetrar na uretra humana durante o ato urinário e alojar-se lá até a morte do hospedeiro. A possibilidade de remoção cirúrgica é deveras complicada, mas já há pelo menos um caso bem-sucedido relatado.

Na noite de ontem, uma situação típica de carícia preliminar felacional me fez pensar nesse peixe, na insuficiente exploração de seu assombro potencial num filme de terror genuinamente nacional irrealizado, e nas crises que se instalam na mente de um correspondente parasitário humano. Em várias situações similares, argúi comigo mesmo se o prazer para-sexual decorrente deste ato é de cunho predominantemente físico ou psicológico. Para quem está sendo chupado, é clara a satisfação pré-orgástica conseqüente, mas que tipo de satisfação preenche um ser humano que sente prazer em desafiar a uretra alheia com a penetração da ponta de sua língua neste pequeno orifício destinado à prática urinária e à ejaculação? Deixo a pergunta em suspenso.

Wesley PC>

VEGETARIANO: POR QUE NÃO SÊ-LO?

Um amigo querido pediu-me que escrevesse um texto explicando as razões que me levam a ser vegetariano depois de uma discussão acalorada que tivemos num quiosque do calçadão do bairro 13 de Julho. Segundo ele – ambientalista por vocação, formação e profissão – seus anseios pessoais pela abolição da carne animal em sua dieta alimentar básica só é contrabalançada pelo que ele não conseguiu explicar bem como sendo um “modismo” vegetariano. Insisti que não entendi o que ele quis dizer com isso, não obstante ter consciência de que muitos alegados vegetarianos o são por moda, e que isto pouco interfere em minhas razões pessoais para me opor ao consumo de animais mortos. Não quis usar os ensinamentos éticos do filósofo Peter Singer para justificar minhas motivações pessoais, visto que ainda li muito pouco deste teórico consagrado, mas creio que posso explanar aqui algumas características básicas e mui subjetivas de minha recusa em comer carne:

- Primeiro: sou religioso e, como tal, levo a sério o mandamento religioso “não matarás”. Logo, não vejo razão imediata para precisar tirar a vida de um animal – ou, de outra forma, ser cúmplice de um tipo similar de assassinato, se posso me alimentar perfeitamente de vegetais, incluindo aqueles que apenas caem das arvores, supondo que um dia chegue a um nível extremo de militância.

- Segundo: não somente os derivados de carne animal são mais caros que outros tipos de alimentos como é cientificamente comprovado que muitos dele são carcinogênicos ou responsáveis por diversas doenças, desde o aumento dos índices de colesterol até obesidade e congêneres.

- Terceiro: não gosto do sabor de muitos destes derivados de carne animal, desde pequeno, aliás, o que me é uma facilidade deveras particular, da qual fico muito contente por possuir, tornando um tanto fácil a minha determinação para tal, não obstante admitir que gostava de camarão (sendo que o caruru e o bobó veganos são igualmente deliciosos) e que tinha muita curiosidade de experimentar o sabor de tanajuras e outros insetos antes de morrer.

e – Quarto, mas não o último, para além do caráter definitivo deste argumento: não vejo sentido em atrelar a criação e reprodução forçada de animais como vacas e galinhas ao ciclo mecânico do comércio, que muitas e muitas vezes levam os consumidores a ignorar que seres vivos são condicionados desde antes do nascimento a serem transformados em mercadorias vendáveis. O pior: em alguns casos, as empresas que comercializam estes animais mortos e embrutecidos mercadologicamente utilizam imagens sorridentes do mesmo em suas embalagens, sendo o exemplo do peru sorridente da Sadia o mais crônico. Acima de todos os defeitos prosopopéico-discursivos que detecto no documentário “A Carne é Fraca” (2005, de Denise Gonçalves), admito que o enfoque neste ponto de vista é surpreendente e digno de elogios. Digo mais: é tão inquestionável em sua obviedade militante, que não entendo como possam haver ambientalistas e/ou alegados socialistas universitários que não achem incoerente lutar por uma causa e comprarem toucinho no supermercado. Não entendo!

Admito que o problema do consumo e do boicote a dados aspectos negativos do comércio é muito mais complicado do que fiz pensar no parágrafo acima e que possibilidades de resolução dependem de um cabedal imenso de pequenas atividades naturalistas, mas tem-se que começar por algum lugar, não é não? Deixo claro, inclusive, que este texto não pretende julgar ninguém nem tampouco soar doutrinário, diz respeito claramente a valores pessoais que defendo e que são, neste caso, diretamente responsivos à situação apresentada no começo de sua escritura, mas ficaria contente se o debate fosse levado à frente. Gostaria de ouvir contra-argumentos, de conversar mais sobre o assunto, de comungar ideologicamente com amigos e leitores que também concordam que “modismos” são, sim, bastante problemáticos e tendenciosos, mas, no caso do vegetarianismo, existem muito mais interesses por detrás do que a simples adesão inconsciente. A devastação de vastas áreas de vegetação em virtude da criação de pastos para monocultura de soja (alimento principal de alguns veganos) é apenas um ponto possível de partida...

Wesley PC>

domingo, 16 de maio de 2010

“AQUELE QUERIDO MÊS DE AGOSTO” (2008, DE MIGUEL GOMES) E A REDEFINIÇÃO DO ÊXTASE BREGA

Não vou negar a futilidade inerente a minha pessoa: foi a publicação desta foto no Fotolog de um amigo, acompanhada por um fiapo enredístico [“a relação proibida entre e uma garota e seu primo, sob os olhos de um pai incestuoso”], que me fez ficar obcecado pela recepção do filme português ora comentado. Acordei na última quinta-feira absolutamente obcecado por vê-lo a qualquer custo, prevendo que este seria um dos melhores e mais significativos filmes de minha vida. Tentei baixá-lo na Universidade, mas o bloqueio de endereços eletrônicos atrasou o meu deleite, de maneira que somente ontem, sábado pela manhã, pude gravá-lo num CD e convidar diversos amigos para me acompanharem na sessão.

Telefonei para várias pessoas, advertindo que o filme tem quase 2 horas e meia de duração, que pouquíssimas pessoas apreciaram-no, que a concepção do mesmo funde ficção e documentário de forma mui complexa e que a trilha sonora do mesmo era repleta de canções bregas lusitanas, surpreendentemente similares àquelas que são feitas no Brasil. Apenas dois amigos aceitaram a empreitada, de maneira que, após algum momento de espera, Jadson Teles e Américo Nascimento estávamos simplesmente gozando diante da televisão: não somente “Aquele Querido Mês de Agosto” é genial formal e conteudisticamente, como sua trilha sonora é soberbamente utilizada e ator juvenil Fábio Oliveira fisgou-me com a inocência interiorana do amor que sente pela personagem de Sónia Bandeira.

Ficamos tentando gravar na memória todas as canções lamentosas que desfilam diante da tela, captar os sotaques e situações pitorescas que se desnudam diante de nós, apreender adequadamente todas as (re)invenções lingüísticas que o filme implanta e conter o êxtase supremo em que os 147 minutos de projeção nos deixaram! Queria ter a capacidade de descrever em palavras o que é estar diante deste filme, mas não se consegue: o brilhantismo daquelas imagens e sons só é apreciado por quem se dispõe a vê-lo e a amar dentro e fora da tela. Por isto, eu suplico: o filme é facilmente disponibilizado na Internet e eu tenho o prazer e a obrigação de emprestar ou gravar uma cópia da versão que se encontra em meu poder para quem assim o desejar. Vejam este filme. Sintam a sua magia. Vivam-no e vivam, acima de tudo! Não consigo me conter de empolgação...


Wesley PC>