sábado, 14 de agosto de 2010

SÉTIMA PROPOSIÇÃO: “SOBRE AQUILO DE QUE NÃO SE PODE FALAR, DEVE-SE SILENCIAR”

Assim Ludwig Wittgenstein (1889-1951), um de meus filósofos preferidos e um dos mais complicados a que tive acesso, conclui o seu poderoso – e posteriormente refutado por ele mesmo – “Tractatus Logico-Philosophicus” (1922), conclusão esta de que me sirvo com fins dúbios, mas, de alguma forma, coadunados com a biografia pessoal do filósofo, em especial, no que tange à versão fílmica realizada por Derek Jarman em 1993. Afinal de contas, se eu já sabia que este filosófico é um dos homossexuais mais influentes do século XX, fico agora de boca aberta ao saber que ele estudou com Adolf Hitler (1889-1945) na infância. Talvez seja a metáfora definitiva de que eu precisava para "calar a boca". Citando novamente o filósofo: “A solução do problema da vida é uma maneira de viver que faça desaparecer o problema”. Temos dito!

Wesley PC>

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

TENTANDO FALAR SOBRE OUTROS ASSUNTOS – III: MAIS UM PROTESTO FÍLMICO DE ELOY DE LA IGLESIA!

Numa das cenas mais sutis e discursivas do clássico “Os Prazeres Ocultos” (1977), o estagiário de contabilidade heterossexual por quem seu chefe se apaixona obcecadamente pergunta ao mesmo se ele se submeteria a um tratamento que o curasse da homossexualidade. A resposta vem num átimo: jamais me submeteria a este tipo de tratamento, pois isto implicaria em deixar de ser quem eu sou”, resposta esta que eu já precisei defender em alguns momentos de minha vida tenra. No ano seguinte a este filme, o diretor e roteirista Eloy de la Iglesia voltaria a abordar este dilema através de um viés político socialista. O resultado está no impactante filme “El Diputado” (1978).

Acabo de ver esta preciosa obra de arte cinematográfica e quedo-me efusivo diante da genialidade protestante do roteiro, em que um deputado comunista luta com a inaceitação pessoal e coletiva de seus desejos homoeróticos, que, até então, “sempre foram vistos como sórdidos e marginais”. Numa prisão política, ele conhece um delinqüente erótico (Ángel Pardo, visto em foto), acostumado a receber dinheiro para fazer sexo com homens mais velhos. Este atua como cafetão e arranja inúmeros menores de idade para o consumo erotógeno do deputado Roberto (José Sacristán), que se apaixona violentamente por um deles. As conseqüências desta sarabanda de desejos irrestritos só não são mais trágicas porque são políticas, porque clamam por liberdade, uma liberdade democrática que não exime o espectador de uma crítica sagaz: como se pode falar em nome da igualdade irrevogável entre os indivíduos se o dinheiro é utilizado para corromper os lúmpens em prol de desejos íntimos? As lágrimas do protagonista respondem a esta questão com atos – acima de tudo, atos!

Wesley PC>

TENTANDO FALAR SOBRE OUTROS ASSUNTOS – II: KARNE KRUA É BEM MAIS ‘PUNK’ QUE ‘HEAVY METAL’!

O som da banda sergipana Karne Krua é bastante valorizado no bairro que moro, pois vários de meus compatriotas são amigos pessoais do vocalista desta banda, Sylvio Campos. Como a maioria destes compatriotas são metaleiros, tinha um ranço genérico em relação ao som da banda, da qual só tinha ouvido o disco “Em Carne Viva” (2002), bem mais “produzido” que os LPs anteriores. Foi ouvindo um destes LPs na manhã de hoje que constatei que o som da Karne Krua tem muito mais a ver com bandas como Bad Religion e Cólera, das quais eu gosto muito, do que Black Sabbath e Napalm Death, sobre as quais ainda não me sinto apto a comentar. Digo mais: se eu já era um admirador respeitoso e passivo da banda, agora tornei-me um fã deslumbrado, tamanha a satisfação reivindicativa que senti diante de petardos como “Mancha de Sangue” (sobre o cotidiano de prostitutas “velhas e enrugadas” que enfrentam uma Hiroshima a cada noite), “O Vinho da História” (verdadeiro clássico do ‘rock’ nordestino) e “Cenas de Ódio e Revolta” (que contém uma magnífica reinterpretação do Hino Nacional Brasileiro). Ouvi o disco ontem, ouvi hoje de manhã e planejo ouvi-lo (e praticá-lo) mais e mais vezes!

Wesley PC>

TENTANDO FALAR SOBRE OUTROS ASSUNTOS – I: “O COELHO DE SEVILHA” (1950), de Chuck Jones.

Entre meus 15 e 17 anos de idade, era comum tomar banho depois de assistir ao curta-metragem supracitado, exibido pela TV Atalaia (antigamente, repassadora do sinal sergipano do SBT) sempre que algum desvio temporal fazia com que a programação nacional entrasse em descompasso com os tempos livres da publicidade local. Para minha sorte espectatorial, isso acontecia com freqüência, de maneira que perdi as contas de quantas e quantas vezes eu revi o clássico “O Coelho de Sevilha” (1950), quiçá a obra-prima do genial animador Chuck Jones. Maravilhoso!

Tive a bênção de ter acesso a este curta-metragem precioso em extensão .avi no mesmo dia em que um amigo de trabalho confessou-me satisfeito que fora convidado por uma companhia nacional para participar como tenor numa montagem local da ópera “O Barbeiro de Sevilha” (1816), de Gioachino Rossini, brilhantemente parodiada no filme em pauta, em que Pernalonga foge de Hortelino Troca-Letras e encena uma versão ainda mais bufa do libreto original, que não hesita sequer em utilizar acordes orientais para satirizar a proposta enredística da peça. Não somente gargalho muito sempre que revejo o filminho aqui comentado, como engrandeço-me enquanto pessoa ao consumir acordes tão belos e tão suscetíveis a interpretações variadas. No final do episódio, por exemplo, há um chiste de casamento homossexual. Por este motivo, o DVD foi lançado com restrições paternas nos EUA, quando o crime maior é impedir que as crianças tenham acesso a esta verdadeira obra-prima multi-artística. E, enquanto isso, eu tento mudar de assunto. Numa madrugada destas, eu consigo...

Wesley PC>

SEMIÓTICA BÁSICA: VERMELHO SIGNIFICA “PARE”!

Nesta noite de quinta-feira, eu revi “Lua de Fel” (1992, de Roman Polanski) pela enésima vez. Juro: não sei quantas vezes já vi este filme canônico, mas desde a minha adolescência que eu tinha certeza de que esta obra sobre amores extremos era o que melhor me definia no que tange às minhas propensões relacionais e sexuais. Digo mais: revi-o hoje com um propósito expansivamente terapêutico, no sentido de que duas vizinhas confessaram-me recentemente seus respectivos términos de relacionamentos amorosos em virtudes de traições conjugais. Achei que o filme seria ideal para conversar maduramente sobre o assunto com elas duas. Não estive de todo errado...

A primeira das garotas já foi muito comentada por aqui (não cito os ‘links’ por mera precaução expositiva) e, conforme dito em outras ocasiões, enfrentou muito preconceito por parte de nossos vizinhos, em razão de ser gorda e pobre. Tende, porém, a exagerar na simpatia e, como tal, afeiçoou-se ao companheiro de biritas de um amigo em comum. Agarraram-se algumas vezes, mas uma vizinha casada, parida e ninfomaníaca acabou com o pentenho dela: deu em cima do tal guri e hoje ela está triste.

A segunda das garotas eu conheço desde que ela tinha uns 6 anos de idade. Hoje, tem 18 anos e compartilhava demoradas carícias com um rapaz que não me suporta e que bebe e fuma além da conta. Numa destas bebedeiras, beijou outra garota em público e foi visto pela mãe de sua namorada, que jura que nunca mais dirigirá palavras a ele. A garota não admite. Mas está triste, muito triste.

Acompanhado por estas duas garotas com o coração recentemente partido, deliciei-me e amargurei-me novamente com as diversas reviravoltas do ótimo filme de Roman Polanski, em que dois casais interagem de forma drástica num transatlântico: um dos casais é elegante e refinado; o outro, vulgar e desbocado. Ao final, não haverá muitas diferenciações plausíveis entre eles. Paixões violentas extinguem limites, fronteiras, asseios...

E é aí que eu entro: exigiram-me respeito no que diz respeito à divulgação da imagem alheia. E este respeito duplo é prenhe de razão: que direito tenho eu de expor os outros? Que ganho eu com isto? A quem mais eu atinjo e firo, do que a mim mesmo? Consciente e racionalmente, eu poderia responder com razão e cautela a cada uma destas perguntas, mas sou doente: padeço de um caso extremo de paixonite, de uma violência no ato de amar que destrói muito do que está ao meu redor. Tal qual já foi dito nalguns textos bem-aventurados sobre projetos inclusivos de segurança pública, meus surtos confessionais envolvendo a paixão que sinto por outrem deveria ser tratado do mesmo modo que o vício em ‘crack’: não como um caso de polícia, mas de saúde pública. Talvez eu precise mais de internação médica do que detenção criminal, posto que surto, que me descontrolo, que erro mesmo quando juro não mais cometer uma infração desrespeitosa. Ouso jurar respeito agora mais uma vez: conseguirei? Terei novos assuntos que substituam minha verve apaixonada no limiar da obsessão? Que não sucumba eu por falta de tentativas...

Wesley PC>

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

MANHÃ DE FOLGA

Antes de entrar no setor em que trabalho, eu passo antes no banheiro, a fim de driblar a minha poliúria psicológica. Na manhã de ontem, a cabine em que eu costumo urinar estava repleta de sangue. Havia sangue no chão, nas bordas da privada e muito sangue respingado na parede. Não consegui imaginar direito o que tinha havido, mas cheguei escandalizado: houve um estupro no banheiro!”. Minutos depois, descobri que havia um funcionário do DAA que vomitara sangue. Ele está internado num hospital neste exato momento e, por ora, não sei o que houve, qual a causa de sua moléstia. Em casa, vi um episódio do seriado “House”, no qual uma mulher que padecia de câncer no fígado (entre outras doenças) vomitava sangue, justamente. E, daqui a pouco, estarei eu de volta ao trabalho, ouvindo o de sempre, fazendo o de sempre, lidando com o extraordinário e inesperado cotidiano de lidar com os caprichos humanos... Como se já não bastassem os meus próprios!

Wesley PC>

“SE A VIDA É UMA LONGA ESPERA, ENTÃO ENSINA-ME A TE ESPERAR”...

Sempre pensei que a cantora brasileira-peruana Adriana Mezzadri estivesse meramente à sombra do compositor Marcus Viana, visto que ambos trabalharam juntos em mais de uma obra dirigida por Jayme Monjardim. A fim, porém, de olvidar alguns problemas que me afligiam, mergulhei profundamente na sonoridade própria do disco “Marcas de Ayer”, lançado em 2003, e encantei-me com a latinidade de “Por Verte Reír”, identifiquei-me com a funcionalidade temática de “Estatua de Hielo”, delirei ao repetir o refrão ‘a cappella’ da canção-título – internacionalmente famosa por ter sido tema de uma telenovela ‘for export’ de Glória Perez – e adicionei ao balaio de belas canções “Sete Vidas”, que fez parte da trilha sonora da minissérie “A Casa das Sete Mulheres”, exibida na TV no mesmo ano em que foi lançado o CD da cantora, muito boa, por sinal. Quanto a eu ter conseguido êxito no esquecimento pretendido com a audição do disco, creio que o que tenha havido seja exatamente o contrário: uma exacerbação passional oportunamente introspectiva, que só foi controlada com a audiência a mais um estudo chauvinista do diretor Neil LaBute, visto por acidente, quando minha mãe me despertou para arrumar a cama em que eu adormeci solenemente, com o livro de Vladimir Nabokov nas mãos. Mas todas estas são estórias diferentes. Por ora, fica a recomendação: “Marcas de Ayer” é um disco hispano-'pop' balsâmico!

Wesley PC>

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

UM DESABAFO NECESSÁRIO (E INCOMPLETO):

Ontem à noite, eu fui ao cinema, depois de um mês evitando este prazer. Evitando por dois motivos diversos: 1 – Não tinha dinheiro para o ingresso; e, principalmente, 2- não tinha motivação suficiente para investir nos filmes atualmente em cartaz. Até que o mais recente filme do petulante Christopher Nolan estreou com alarido por aqui. Quase todo mundo que eu conheço tinha se derramado de amores pelo filme. Caberia a mim a tarefa de expor insatisfações? Coube!

Porém, não falarei sobre o filme no sentido lato (já o fiz aqui), mas sobre um efeito mnemônico preocupante desencadeado por uma cena em particular – genial, diga-se de passagem: em dado momento do roteiro, a equipe de inserção de idéias em sonhos alheios comandada pelo personagem de Leonardo DiCaprio requisita um químico com experiência em sedativos, sendo que, quando o mesmo é encontrado, ele revela que já participa de um esquema ilegal de imersão de pessoas em sonhos propositalmente compartilhados, estando as mesmas insatisfeitas com a vida real e morosa que levam. Em outras palavras: a atividade onírica é vendida como droga no filme, vendagem esta que retorna em mais de uma situação, inclusive naquela que explica o porquê de o protagonista ser tão atormentado com a morte de sua esposa.

Mesmo sem ter gostado tanto do filme em questão, a cena descrita mexeu comigo, fez-me sentir pungido a confessar uma situação familiar nova que muito me atormenta, antecipada num texto que redigi noutro ‘blog’: como todos sabem, tenho irmãos que abusam de substâncias químicas que causam dependência. O mais novo deles, porém, entrou recentemente num processo de consumo de ‘crack’. Exerce suadas atividades remuneradas durante a semana e, aos sábados, gasta todo o salário que recebe em pouquíssimas horas, consumindo várias pedras consecutivas da droga, que lhe causará seriíssimas dores físicas no dia seguinte. Como importamo-nos com o bem-estar dele, preocupamo-nos bastante com o grau de insuportabilidade que ele enfrenta a fim de suportar a abstinência de tal droga. Mas, como não deve ser difícil de prever, sentimo-nos impotentes em lidar com tal situação: como ajudá-lo sem julgá-lo? Como?

No sábado passado, a situação chegou a um estopim descontrolado: meu irmão tinha deixado o dinheiro que recebera guardado com minha mãe. Retirou uma parcela, comprou as tais pedrinhas satânicas e, às 2h da madrugada, contorcia-se no meio da sala querendo mais. Minha mãe recusava-se e os dois começaram a gritar na varanda: ele suplicava por mais dinheiro, ela implorava para que ele fosse dormir. Ambos estavam à beira de chorar, enquanto eu quedava-me diante do computador, sem saber como interceder. Por sorte, minha mãe obteve êxito em sua súplica e ele foi dormir, sem envenenar seu corpo com as substâncias tóxicas contidas no ‘crack’, mas, no outro dia, minha mãe me pediu: “Wesley, dê uns conselhos para teu irmão, ajude-o a sair desta”. Eu tento, eu juro que tento, mas... É difícil! Como fazer isso sem julgá-lo?

(texto em progresso – estou vivendo o drama ainda!)

Wesley PC>

terça-feira, 10 de agosto de 2010

ARROTAR ESPERMA É UM ATO POLÍTICO!

Às 16h da tarde de hoje, no trabalho, eu arrotei esperma. Repito: no meio de uma eructação, senti o gosto precioso de sêmen em minha garganta. Obviamente, tal reprodução gustativa não é gratuita: ontem á noite eu submeti-me à audiência de um mau filme de suspense adolescente que estava a ser exibido na TV aberta e, após a sessão, fui agraciado com mais algumas gotas do colóide sacro que auxilia sobremaneira na minha sobrevivência humorística. Este ato para-sexual e gustativo carece de uma explicação política adicional, entretanto.

Ei-la: como todos sabem, vivo em processo passional-obsessivo contínuo e, como tal, não seria de bom tom confessar atividades eróticas envolvendo outras pessoas. Entretanto, é igualmente sabido que, quando apaixono-me fervorosamente, um rigor idiossincrático bastante característico leva-me a encetar declarações de amor “da cintura para cima”, que são, portanto, complementares às demais. Digo mais: existem algumas pessoas que, até então, comportaram-se como retroalimentadores perenes do bem-estar supracitado, sendo que uma delas parecia enfezada durante o processo ejaculatório de ontem. Precisei pensar sobre o que eu havia feito...

1 - Não é difícil imaginar que sou deveras insistente quando estou diante de um processo de insistência possível de usufruto erotógeno, o que pode muito bem irritar alguns de meus interlocutores felacionais; 2 – “sexo pelo sexo” é algo que não me orgulho de empreender, de maneira que sempre tento dotar a relação erótica com algum questionamento de ordem cultural e/ou política. No caso de ontem, o filme “Paranóia” (2007, de D.J. Caruso) foi visto por mim, finalmente. Tinha vontade de vê-lo faz tempo, mesmo suspeitando que era ruim. Pior: mesmo tendo certeza de que era um filme ruim, gostei dele durante mais da metade da projeção, o que era veementemente contestado por me interlocutor, ao que eu explicava: “é culpa de minha identificação com a trama. Sou ‘voyeur’”. Adendo: sou ‘voyeur’!

Despertei agoniado na manhã de hoje, sentindo que fora responsável pelo enfezamento do rapaz supramencionado. Visitei-o em dado momento da manhã de hoje e flagrei-o bebendo cerveja sozinho na sala, oportunidade ideal para conversarmos sobre alguns problemas alheios com drogas que me afligiam. Estendemos nossas observações sociais e críticas para a irritação causada por homossexuais encubados que fingem ser o que não são. Percebi homofobia defensiva no tom responsivo dele. Fiquei preocupado: precisamos conversar bem mais depois disso!

E que venham novos arrotos!

Wesley PC>

Feelings... Nothing more!



Eu não me arrependo de você
Cê não me devia maldizer assim
Vi você crescer
Fiz você crescer
Vi cê me fazer crescer também
Pra além de mim

Não, nada irá neste mundo
Apagar o desenho que temos aqui
Nem o maior dos seus erros
Meus erros, remorsos
O farão sumir

Vejo essas novas pessoas
Que nós engendramos em nós
E de nós
Nada, nem que a gente morra
Desmente o que agora
Chega à minha voz


Devora Cruz

ANTES A INDIFERENÇA? – PARTE 3

“Não tenho a menor intenção de glorificar ‘H. H.’. Trata-se, sem dúvida, de uma pessoa horrível e abjeta, notável exemplo de lepra moral, que assume um tom entre feroz e jocoso talvez para esconder o mais profundo sofrimento, mas que não inspira qualquer simpatia. É cansativo em suas idiossincrasias. Muitos de seus comentários incidentais sobre o povo e a paisagem deste país são ridículos. A sinceridade desesperada que permeia sua confissão não o absolve dos pecados de uma astúcia diabólica. É um ser anormal, nada tem de ‘gentleman’. Mas com que acordes mágicos seu violino evoca uma ternura”...

Do prefácio metalingüístico de “Lolita” (1956), romance de Vladimir Nabokov que periga ser um dos melhores que lerei, em que, obviamente, discordo do que dizem sobre o protagonista e identifico-me irremediavelmente com ele. Lerei a mim mesmo nesta obra? Medo e desejo se fundem num turbilhão que distorce tudo o que vejo ao redor... Menos e principalmente, ele!

Wesley PC>

ANTES A INDIFERENÇA? – PARTE 2

Sou religioso e, como tal, não minto. Estas duas características, porém, sempre me lançam diante de um verdadeiro turbilhão de conflitos sempre que me deparo com um mendicante: é correto dar esmolas? É errado não dar? Como se manifestar diante de alguém que pede dinheiro na rua? E quando alguém me pergunta ‘tem um dinheirinho aí, moço?’, se eu disser ‘não’, estaria mentindo? Nunca sei o que fazer e, pior, na maioria das vezes tenho vergonha ou receio de depositar algumas moedas na mão suplicante de quem me pede algo...

Por que pensei nisso agora? Porque, de um modo distinto, sou também um mendicante. Justifica-se, portanto, o porquê de eu insistir tanto em paixões e/ou amores platônicos que eu sei que não redundarão em muita coisa além de brigas desnecessárias que redundarão na indiferença salvaguardadora: antes escolher alguma(s) pessoa(s) e concentrar-me nesta(s) do que sucumbir aos devaneios da prostituição oportunista e ser assassinado por não ter dinheiro suficiente para sanar os anseios materiais de um gigolô. Por isso, eu me sujeito, entendeu?

Wesley PC>

ANTES A INDIFERENÇA? – PARTE 1

Manhã de terça-feira, dia de folga. Tomei um comprimido polivitamínico – daqueles que eu suspeito que seja indutor de sono, mas cuja hipótese eu insisto em testar – e sentei-me no sofá com um prato de sopa na mão direita. Na mão esquerda, o segundo prato de biscoitos ‘cream cracker’ com margarina, queijo e banana (o conteúdo do primeiro prato, minha cadela Zhang-Ke puxou a da mesa e comeu) e um copo de café. Na tela da TV, “Os Vencidos” (1953), filme antigo de Michelangelo Antonioni sobre o qual eu nunca havia ouvido falar...

Três episódios: um francês, um italiano e um inglês. O mesmo contexto: adolescentes burgueses e entediados, que cometem assassinatos gratuitos. A mesma geração: aquela que os jornais tacharam de “geração queimada”, crianças que nasceram em meio a um contexto de guerra e encontraram violência urbana no início da juventude. Diferentes níveis de satisfação: não compactei com o clima pernóstico da terceira estória, enfadei-me um pouco com os esboços de incomunicabilidade da segunda e amei o frescor da primeira, de onde eu tirei esta imagem, no momento culminante que precede o assassinato. O assassinato...

Antes um assassinato que a indiferença?

Wesley PC>

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

DA INSISTÊNCIA SUPERFICIAL...

Hoje foi o dia em que o meu salário saiu. Um dia de agonia, visto que fico tenso até pagar todas as minhas contas domésticas, que correspondem a mais de ¾ do valor que recebo mensalmente. Quando eu estava na fila do caixa eletrônico, encontrei um amigo albino de excelente gosto romântico musical, que praticamente me obrigou a ouvir “Go” (2010), o álbum solo recém-lançado do islandês Jónsi, vocalista do grupo ‘cult’ Sigur Rós, um de meus favoritos, diga-se de passagem. Conclusão: tendo baixado recentemente discos de Rita Lee, Dagmar Krause, Baby Consuelo, Moby e Oxe, que tempo terei para ouvir este disco com o cuidado requerido? Pelo sim, pelo não, cá estou eu, ansioso pela completude do ‘download’ (risos).

Para quem ainda precisa de mais referências para ouvir o Jónsi, saiba que este artista possui uma voz idílica, que seus acordes estão ainda mais selvagens neste trabalho independente da banda que o consagrou, que ele é cego de um olho desde que nasceu e que ele é um dos homossexuais mais influentes de seu país, tendo um relacionamento duradouro com o também artista Alex Somers. É o suficiente para arriscar a audição deste disco?

Detalhe: preambulando algumas das nove canções que compõem este disco precioso, senti que meu entojinho anglofílico me deu folga. Talvez não fosse entojo lingüístico coisíssima nenhuma, mas sim um protecionismo dos sentidos contra a saturação de fórmulas pegajosas da indústria fonográfica. Menos mal!

Wesley PC>

SOBRE AS DIFICULDADES EM (NÃO) SER BOM...

Apesar das evidências em contrário, ser bom e ser mau são conceitos relativizáveis. Explico: o que pode ser bom para uma pessoa (mijar na boca durante um ato sexual, por exemplo) pode muito bem ser péssimo para outra (e, neste caso específico, geralmente o é). Neste fim de semana mais recente, fui acusado de ser mau, muito mau, quando só queria ser bom. Fui tachado de invasivo e assediador quando só queria desculpar-me por ter sido efetivamente mau num julgamento empregatício enviesado. Recebidas as acusações, liguei a TV e vi “Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita” (1970, de Elio Petri), um dos filmes mais geniais que já vi neste sentido, em que um poderosíssimo agente policial e político assassina a sua amante e, por mais que tente incriminar a si mesmo como autor do crime, evidências contrárias sempre são implantadas em virtude de sua alta posição social. Ele luta para ser preso em dado momento, mas o sistema não permite seu encarceramento. Frank Kafka foi requisitado, portanto, como ferramenta literária acessória à crítica pungente do filme. E eu ficava a me questionar, por fora: serei eu bom? Terei eu boas intenções?

Wesley PC>

domingo, 8 de agosto de 2010

TUDO COMEÇOU COM UM CHISTE ENVOLVENDO “500 GRAUS”...

“Uma chuva diferente agora está se formando no céu
Temporal de benção e poder
Um calor tão glorioso invade toda igreja
500º de puro fogo santo e poder
Pra fazer enfermidade desaparecer
Pra fazer o inimigo fugir de você
Uma nuvem de vitória está sobre a igreja
A previsão de Deus diz que vai chover

Vai chover línguas estranhas por todos os lados
E desse temporal quero sair molhado
Molhado e revestido por esse poder
Agora o impossível vai acontecer

É a promessa de Deus, o fogo vai descer, por esse poder !”


Vi esta letra postada no Fotolog de um amigo virtual e encontrei aqui a oportunidade ideal para finalmente me dar ao luxo de ouvir, por vontade própria, um disco evangélico. O escolhido/recomendado foi “Recompensa [Play-Back]” (2001), da Cassiane, e, enquanto o ouvia, lembrava de todos os meus amigos homossexuais que gritavam letras como esta acima, a plenos pulmões, quando caminhávamos pelas ruas aracajuanas...

É impossível cantar este tipo de canção com os olhos arregalados: o vigor que as intérpretes depositam é tão vigoroso, tão potencialmente expressivo, que, por mais que eu discorde de alguns aspectos das letras ou ache outras inicialmente cômicas, sinto-me religiosamente tocado ao final. Digo mais: estava ouvindo o disco enquanto lavava os pratos e, ao chegar na faixa 7 (justamente esta de sugestivo nome “500 Graus”), repeti-a mais de cinco vezes seguidas. Algo contagia!

A voz da tal da Cassiane quase não é identificada em meio a um perene efeito de coro que permeia as canções e os acordes da mesma primam pela simplicidade acompanhante (não obstante chamar bastante atenção o tom latino da canção em pauta), mas acho que vou guardar este disco para ouvi-lo novamente num momento de sinceridade ecumênica. Motivo: na próxima vez que eu participar de uma maratona bicha, vou poder também erguer a minha voz ao Céu em louvor (risos):

“Pense na unção, veja a unção
pregue na unção, louve na unção
sinta a unção, ande na unção
viva na unção, cheio da unção”


Wesley PC>

“VAIS ENCONTRAR O MUNDO, DISSE-ME MEU PAI, À PORTA DO ATENEU. CORAGEM PARA A LUTA”.

Se um dia eu dispuser de qualquer possibilidade de intervenção direta entre os produtores de cinema, eis um livro que eu gostaria de ver transformado em filme: “O Ateneu” (1888), lido tardiamente esta semana, em homenagem ao vindouro aniversário de meu amigo Américo, nome de um personagem que desempenha uma função essencial no romance, para além de sua exigüidade de aparições.

Li o livro após contrárias: de um lado, alguns me impulsionavam em razão dos conflitos morais e sexuais que enriquecem as páginas do romance; de outro, alguns me assustavam, em razão de suas insatisfações com o estilo mui floreado de seu autor Raul Pompéia. Para além das várias expectativas anunciadas que me acompanhavam durante a leitura (já conhecia de antemão o final, por exemplo), encantei-me minuciosamente com o que encontrava a cada página: perfeito o tom do romance, maravilhosas lembranças o autor compartilha conosco, através de seu alter-ego Sérgio, defendendo o que seria a sua “crônica das saudades” com a seguinte réplica:

Saudades verdadeiramente? Puras recordações, saudades talvez se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas sobretudo – o funeral para sempre das horas”.

Perfeito! Nem boas nem más, lembranças apenas! Não obstante eu lamentar a curta extensão do livro – fiquei tão viciado nele que queria mais e mais e mais! – volta e meia me via tocado por uma encantatória descrição de afeto entre amigos (Capítulo VI: “estimei-o femininamente, porque era grande forte, bravo; porque me podia valer; porque me respeitava, quase tímido, como se não tivesse ânimo de ser amigo”), por definições pungentes e metalingüísticas (também no capítulo VI: “Qual a missão da arte? Originária da propensão erótica fora do amor, a arte é inútil, - inútil como o esplendor corado das pétalas sobre a fecundidade do ovário. Qual a missão das pétalas coradas? De que nos serve a primavera ser verde? As aves cantam. Que se aproveita do cantar das aves? A arte é uma conseqüência e não um preparativo”), por um poderoso aforismo (capítulo XI: “a educação não faz almas: exercita-as. E o exercício moral não vem das belas palavras de virtude, mas do atrito com as circunstâncias”), por vocábulos portugueses que eu não conhecia e, como tal, dependi de diversas consultas ao dicionário (anagógico, didascálico, alcatroado, esplim, facúndia, nédio, faiança)...

Não é um romance perfeito – é bastante defeituoso em seus intentos pretendidos, aliás, supondo que estes mereçam outro nome que não nossas próprias projeções – mas tornou-se um dos melhores que li em vida, o que só é realçado por eu ter sido um daqueles que, tal qual o protagonista, estudou num lugar intitulado Atheneu...

Wesley PC>