sábado, 6 de novembro de 2010

OS FILMES QUE VEJO POR CAUSA DE OUTREM – PARTE II: ATRAVÉS DE MICHAEL CACOYANNIS, A TRANSCENDÊNCIA SUBMISSA DA RELIGIOSIDADE

Tenho a honra de trabalhar com uma jovem alegre e prenhe de espírito administrativo que, recentemente, foi chamada à atenção pelos líderes da igreja evangélica que freqüentava por ter pintado o cabelo de loiro, algo que não é enxergado como bom exemplo por alguém que exercia as funções de organista como ela. Chateada com este julgamento superficial de sua religiosidade, ela trocou de igreja (hoje freqüenta um templo batista) e pôs-se à frente de um evento universitário que a tornou bastante conhecida entre os acadêmicos de Letras da UFS, a ponto de uma lésbica juvenil confessar que imaginar-se sendo pisoteada por esta minha amiga de trabalho é uma de suas mais preciosas fantasias sexuais.

Tendo achado graça, mas não ofensa, nesta confissão, minha amiga emprestou-me dois filmes dirigidos pelo grego Michael Cacoyannis, que somente hoje tive o prazer de ver. Conhecido por ter dirigido em 1965 o clássico em defesa da alegria “Zorba, o Grego”, Michael Cacoyannis já foi criticado por seus compatriotas em razão das parcerias internacionais a que consentiu no que tange à divulgação narrativa de dramas locais. Infelizmente, a maioria dos seus filmes não chegou ao Brasil, mas os dois filmes que vi hoje têm como mérito adicional duas coincidências: terem a mais preclara das estrelas cipriotas, a bela Irene Papas, em seu elenco; e abordarem, através de diferentes prismas, a Guerra de Tróia, ocorrida entre 1300 a.C e 1200 a.C.. Fiquei encantado com o modo como ambos os filmes adotam as bases mais longevas do que hoje entendemos como tragédia.

No primeiro dos dois filmes, “As Troianas” (1971), um estratagema teatral permite que quatro grandes atrizes brilhem na defesa dos papeis escritos há séculos por Eurípedes: em cinco ciclos dramatúrgicos, Katherine Hepburn (a rainha Hécuba, mãe de Páris e Heitor), Geneviève Bujould (Cassandra, filha de Hécuba), Vanessa Redgrave (a princesa Andrômaca, viúva de Heitor) e Irene Papas (Helena de Tróia, esposa de Menelau de Esparta, a quem trai quando conhece Páris) recitam emocionados monólogos, cada uma delas impregnada até os ossos de pujança dramático-actancial. No primeiro dos ciclos, Hécuba lamenta a sua própria desgraça e a das demais mulheres troianas, obrigadas a serem vendidas como escravas para os gregos; no segundo, a enlouquecida Cassandra é entregue como esposa a Agamenon; no terceiro, Andrômaca tem a desgraça de ter seu filho ainda infante arrastado de seus braços e atirado de um precipício; no quarto, Hécuba e as demais desgraçadas de Tróia tentam convencer o traído Menelau a assassinar a deslumbrante Helena; e, no quinto e último, Hécuba reaparece para enterrar seu neto Astíanax e ser ainda mais lancinada pelas lágrimas e pela desventura nacional quando percebe a cidade que ama ser destruída pelas chamas atiçadas por solados gregos. Conclusão da personagem: “o medo domina quando a razão vai embora”. E eu tinha diante de mim uma verdadeira tragédia!

O segundo dos filmes, “Ifigênia” (1977), não é menos trágico, mas a encenação divide-se entre as incitações belicosas e os destinos amargurados propriamente ditos. A trama é anterior aos eventos do filme prévio e mostra os preparativos da invasão à cidade de Tróia. O rei Agamenon é induzido por um sacerdote a sacrificar sua filha Ifigênia em prol da vitória de seu irmão traído Menelau contra os troianos. Incapaz de confessar à sua esposa o real motivo da convocação de Ifigênia à praia onde os guerreiros treinam para a guerra e eventualmente morrem de fome e estafa, Agamenon mente para Clitemnestra, dizendo que o guerreiro Aquiles deseja se casar com a moçoila. Lá chegando, Clitemnestra descobre tudo e, como sói acontecer neste tipo de drama, as conclusões trágicas serão regadas a muitos gritos e lamentos, não obstante a aceitação benevolente da jovem Ifigênia (interpretada por Tatiana Papasmoschou, vide foto) no que tange ao seu destino mortal. Não é tão imponente quanto o filme anterior, mas destaca-se não somente pela participação deslumbrante de Irene Papas, como também pelo charme musculoso do intérprete de Aquiles, Panos Mihalopoulos. Com certeza, este ator grego deve ter conquistado também a minha iridescente amiga evangélica. E, graças a ela, tive o orgulho de ver uma dupla subestimada de filmes gregos, muitíssimo relevante enquanto arte, enquanto narrativa e enquanto entretenimento dramatúrgico. Portanto, Σας ευχαριστώ πολύ, ένας φίλος του εργατικού δυναμικού (ou seja, muitíssimo obrigado, amiga de trabalho)!

Wesley PC>

OS FILMES QUE VEJO POR CAUSA DE OUTREM – PARTE I: AO INVESTIGAR BERNARDO BERTOLUCCI, EU DESCUBRO A MIM MESMO, APAIXONADO E FAMINTO!

Ontem eu fui intimado a resumir a obra de Bernardo Bertolucci numa fórmula sintética: política + sexo. Por mais que minha resposta fosse impregnada de imediatismo, tinha razão: cada um dos filmes deste gênio italiano exala sensualidade e uma concomitante e profunda reflexão sobre os fundamentos da própria sensualidade, sobre aquilo que nos faz desistir de algo em prol de um contato sexual com alguém ou vice-versa. É por esse motivo que o jovem atormentado por suas indefinições socialistas sofre quando se vê apaixonado pela tia católica em “Antes da Revolução” (1964); é por esse motivo que o protagonista de “O Conformista” (1970) hesita em render-se às suas pulsões homossexuais e deixa-se levar por atos assassinos de apoio fascista; é por esse motivo que o viúvo desiludido de “Último Tango em Paris” (1972) enfia-se numa relação permeada de sexo e tango com uma desconhecida, depois de tachar Deus de “fodido”; é por este motivo que a virgem que protagoniza “Beleza Roubada” (1996) descobre o ciúme e a traição, ao mesmo tempo em que percebe que assume uma função tão curativa quanto as injeções intravenosas de um velho doente; é por esse motivo que a entrega sexual em “Assédio” (1998) é tão carregada de culpa e interesse. Bernardo Bertolucci me excita, ao mesmo tempo em que me faz refletir pungentemente sobre o modo como eu enfrento o mundo ao meu redor. Logo, é um gênio!

Na manhã de hoje, assisti finalmente ao primeiro filme que ele dirigiu, “A Morte” (1962), breve e não muito bem-sucedida tradução nacional para “La Commare Secca”, que quer dizer algo como “a triste ceifadora”. Tudo bem que o título referia-se realmente à morte, mas o contexto em que ela surge deixa antever bem mais que o caráter fatalista e supersticioso da palavra aqui nomeada. A morte não é uma mera contingência no filme, é um produto social, da mesma forma que o amor, o sexo, a indiferença, a pobreza ou qualquer outro substantivo abstrato e sentido por humanos que eu poderia me dispor a listar. E, ao saber que o roteirista do filme é Pier Paolo Pasolini, não me surpreende que o filme seja tão carregado de urgência reivindicativa, inclusive no plano das sexualidades.

Trama de “A Morte”, em sucintas palavras: uma prostitua aparece morta num parque, conforme se percebe na imagem que é amalgamada aos créditos iniciais. No restante do filme, policiais interrogam possíveis suspeitos de seu assassinato. Cada qual conta a sua própria versão do que vira: um garoto pobre e órfão de pai narra seus fracassos enquanto ladrão pé-de-chinelo; um gigolô enumera as brigas constantes com sua sogra mal-amada; um soldado abobalhado vitupera: “quando se tem sono, o que é que se faz? Se deita! E quando se deita, o que é que se faz? Se dorme!”; um rapazola confessa, constrangido, que aceitou passear com um homossexual promíscuo porque precisava de dinheiro para comprar os ingredientes necessários para que sua namorada cozesse nhoque; e o verdadeiro culpado do crime esconde seus motivos, afinal de contas, “era apenas uma puta”! Pungente drama social, impregnado de análises sobre o porquê de desejarmos foder (vide a cena em que uma rapariga se irrita quando um ladrão interrompe sua transa para roubar o rádio de seu parceiro ou quando mãe e filha se enfrentam com uma faca e um ferro elétrico, respectivamente, por causa de um macho) e sobre os recursos mais desesperados de que nos servimos para saciar a fome (vide a cena em que uma prostituta miserável tem seu cachorro roubado por um credor por não ter dinheiro para pagar à sua cafetina ou quando o soldado acocora-se num canto escuro para comer seu sanduíche envelhecido e proteger-se da chuva e depara-se com um verdadeiro bordel a céu aberto nos esgotos romanos). Tremia de satisfação diante do filme. Bernardo Bertolucci é gênio! Bernardo Bertolucci me entende! Bernardo Bertolucci não se vendeu – e os dez maravilhosos filmes dirigidos por ele que vi até então comprovam isto em cada um de seus fotogramas!

Wesley PC>

BEATRIZ RIMA COM GENETRIZ E IMPERATRIZ, SENDO AQUELA QUE FAZ O POETA FELIZ, OU DEPOIS DO INFERNO, VÊM O PURGATÓRIO E O PARAÍSO!

“Quando o deleite, ou bem a dor intensa
Uma de suas felicidades prende,
Nossa alma nela se recolhe tensa,
E a outra qualquer decerto não se estende;
Onde se mostra o erro, claramente,
De quem uma alma múltipla pretende”.
(início do Canto IV – “Purgatório”)

Comecei, hoje, a ler o que se segue
Das narrações dantescas pelo além-morte
Para meu gozo, estas permitem que eu negue
As inaceitas propagações da sorte
Dado que o que ali acontece
É fruto do que, da almas, entende-se como merecimento.

Lamento muito quando eu vejo
Diante de uma TV a anunciar
Parodistas de um jornalismo malfazejo
Num contexto sub-policial utilizar
Derivações impróprias do que se entretece
Como um largo e descabido desentendimento.

Pois, se o populacho este livro cita,
Preso está a um deturpado sensacionalismo
Fingem os maus que a realidade apenas imita
O que no livro é visto como falta de batismo
Afinal de contas, tem-se, neste mundo, o que se merece
Ou de nada mais vale este consolador pensamento?

De minha parte, tenho, tal qual Dante, uma musa
E juro que, por intento próprio não a maldo
E, se esta, formas e pronomes masculinos usa,
É, nesta terra, ele conhecido como __________.
E, se o não-preenchimento desta lacuna nos desapetece,
É porque somos vítimas da ausência de consentimento.

Peço perdão, aqui, por ser inglório da poesia
Mas, ainda assim, filho e devoto das tentativas.
Por dentro, choro, sempre ao fim do dia
Quando incômodas se denotam minhas invectivas
E, se o conjuntos destas, num limbo perece
É porque meu fanatismo associa-se ao tormento.

Voltarei, portanto, ao que tenho em mãos como egrégia leitura
E, por hoje, não mais macularei as palavras com estas rimas
Enquanto folheio o livro, por vezes, sinto a alma impura
Mas o autor, me incita: “não te reprimas”!
E, se clamo por perdão tanto quanto empreendo uma prece,
Assento que, do meu muso, a mim só provém contentamento”.


Não nasci para escrever poesia, nem tampouco tinha este intento ao forçar-me a redigir estas linhas, mas espero que um provável leitor enxergue com um olhar bem-humorado este pusilânime intento de confessar-me gratificado diante do correspondente másculo e terreno do que, para Dante Alighieri, era a Beatriz que o compungia a deambular por terrenos tormentosos para almas ainda não-expiadas. Sou um covarde e, neste terreno literário, desprovido de talento, mas sou sincero. E, como tal, emociono-me com o que leio ao final do canto V do “Purgatório”:

“’Depois que houveres retornado ao mundo,
Já descansado desta estrênua via’
- falou alguém, calando-se o segundo –
‘recorda-te de mim, que sou a Pia:
Sina me fez, e me desfez Marema;
Aquele o sabe que a aliança um dia
Me deu, ao desposar-me, co’ uma gema’”.


Lindo, lindo, lindo!

Wesley PC>

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

A LÓGICA DA SINECURA INVERTIDA

Assim que eu cheguei ao trabalho hoje, fui interceptado por uma argüição hermenêutica de minha chefa: “Wesley, o que tu entendes a partir da famosa citação do publicitário David Ogilvy que prediz que ‘as normas existem para a obediência dos tolos e a orientação dos sábios’?”. Imediatista que sou, respondi com o primeiro argumento que me veio à cabeça: “em minha concepção, o autor desta citação joga com uma interessante inversão de sujeitos: induz-nos a tecer comentários responsivos sobre a existência das normas em si, quando o que está sendo questionado aqui é a sujeição dos indivíduos às mesmas”. Momentos depois, eu estava sentado detrás de um balcão, utilizando normas para dizer “não” a pessoas esperançosas, que desejavam se livrar de obrigações financeiras com suas instituições universitárias de origem, mas não dispunham de condições competitivas ou documentos comprobatórios para tal. Algumas aceitavam passivamente os “não”’s que eu dizia. Outras gritavam comigo como se eu fosse mais um legislador despótico do que um mero intermediário normativo. E, cada qual à sua maneira, cada uma daquelas atitudes perseguiam-me. Sendo motivadas por exigências profissionais ou não de minha parte, eram reações a algo que eu fazia ou dizia e, como tal, eu deveria assumir responsabilidades por elas. E eu assumo-as aqui: meu trabalho me faz ser uma pessoa melhor, inclusive e principalmente no que tange ao entendimento das regras a que escolho obedecer (ou a ser orientado por elas).

Assumido ou não que eu seja em relação às minhas responsabilidades extra-empregatícias e supra-normativas, eu sou uma pessoa com configurações biológica e psicologicamente falíveis. E, tal qual vários de meus colegas, senti cansaço, fome e impaciência nas 9 horas de atividade empregatícia que gastei hoje. E, enquanto ia para casa, escutava pela terceira noite seguida o mesmo disco triste do Bonnie ‘Prince’ Billy, um dos mais belos e infelizes que descobri nos últimos meses. E a voz desolada do compositor sussurrava em meu ouvido (em inglês): “eu tenho um amor/ um amor por todos que conheço/ e você sabe que eu tenho um plano traçado para viver / não vou esquecê-lo/ Mas poderia você ver esta contradição ressurgindo às vezes?/ Isso é terrível e opressor/ e vem enegrecendo minha mente/ E, então, vejo uma escuridão”. “I See a Darkness” era o nome da música e do disco. E eu só obedecia se eu quisesse.

Cheguei em casa, troquei de roupa, e, aconchegado no sofá, li de uma sentada só “Sobre a Brevidade da Vida”, do filósofo espanhol Sêneca, que despejava seu estoicismo epistolar em mim. E, por mais que eu tivesse certeza de que ainda vou citar algum precioso aforismo deste filósofo numa postagem recente, insistia em repetir várias e várias a mesma canção melancólica, posteriormente regravada por Johnny Cash: “And then I see a darkness/ Did you know how much I love you?/ Is there hope that, somehow, you can save me from this darkness?”. E, se me perguntassem agora do que eu mais recordo no dia de hoje, em especial, no trabalho, diria que saí de minha sala 31 minutos após o encerramento do expediente externo e que três lembranças cativas preenchem com júbilo o meu coração: o ressarcimento cibernético de meus ‘downloads’ fílmicos, os sorrisos coletivos que eu e meus colegas travamos entre aquelas paredes e a bênção de que fui revestido ao me despedir daquele menino que combina como nenhum outro um boné preto e envelhecido com seu encanto natural e sua camisa do Flamengo...

Wesley PC>

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

PARA BOM ENTENDEDOR (TEXTO FICCIONAL EM PROSA)

- Tu gostas de Nossa Senhora?
- Qual delas?
- Qualquer uma. Nossa Senhora das Dores, por exemplo.
- É para gostar?
- Depende, tem quem goste, os chamados marianos. Eu não gosto.
- Por que tu não gostas?
- Sei lá, não gosto. Ou melhor, não odeio. Tanto faz, como tanto feliz. É que nem gatos.
- Tu não gosta de gatos?
- Tanto faz como tanto fez?
- Já comeste hoje?
- Se eu já comi gato? Não, sou vegetariano.
- Faz tempo?
- Mais do que o tempo de vida de alguns gatos (risos).
- (...)
- Por isso que as muriçocas não me picam!
- (...)
- Por que foi que tu te calaste de repente?
- (...)
- [Outra voz]: tu estás bem melhor hoje, sabia?
- Ouviste?
- (...)
- Eu amo você.
- Grande bosta.
- Ah, isto tu ouves, né? A isto tu reages, né?
- (...)

Aí ele levanta e guarda a caneta vermelha num canto específico do computador.

- Que gesto bonito, vou escrever sobre ele, visse?
- (risos)
-Vou escrever sobre ele, visse? Reafirmo.
- (...)
- Vai chover hoje?
- Não sei.
- Trouxeste guarda-chuva?
- Não. Por que tu insistes em falar estas coisas que não me importam, hein?
- Porque são verdades que me afligem pela recorrência.
- Tudo exagero de tua parte.
- Exagero? O quê? Dizer que tu és a luz de minha vida, a razão de minha existência?!
- KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
- É sério. Queres que eu prove?
- (...)
- É sério! É só fazer testes físicos em mim. Quer topar?
- (risos)
- A raiz quadrada de 169 é 13, sabia?
- Sabia.
- Queres um pedaço de manga?
- Não, é demasiado íntimo para mim.
- [outra voz]: descasque!

Wesley PC>

O MOTIVO – PARTE II: POR FORA, EU DURMO, COMO E PENSO NELE.


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METAFÓRICOXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
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FUNDOXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
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XXXXXXXXXXXXXXX MENINO COM R XXXXXXXXXXXXXX

Ponto de interrogação + lágrima

Wesley PC>

O MOTIVO – PARTE I: POR DENTRO, MINHA CABEÇA DÓI!

“O que os ávidos espectadores esperam das confissões públicas das pessoas na ribalta é a confirmação de que sua própria solidão não é apenas tolerável, mas, com alguma habilidade e sorte, pode dar bons frutos. [...] Ao ouvir as histórias de infância infeliz, surtos de depressão e casamentos desfeitos ficam seguros de que viver em solidão significa estar em boa (e muito célebre) companhia e de que enfrentá-la por conta própria é o que os torna membros de uma comunidade”. (BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2003. página 64)

E, por mais que eu admita não gostar deste sociológico polonês, entrar em contato fortuito com esta passagem de suas reflexões sobre o consumo pós-moderno enquanto assistia a duas vizinhas que tentavam realizar uma homenagem fotográfico-nostálgica para uma amiga aniversariante cujo pai se enforcara fatalmente quando ela era criança é um convite à ação. Por um minuto (mais um!), era como se eu tivesse certeza de que sabia por que eu me exponho tanto. E ainda faço tão pouco. E ainda tenho tanto para contar. E é tão pouco. Tudo se resumiria àquelas manchas vermelhas implantadas na radiografia de meu crânio aos 10 anos de idade...

Wesley PC>

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

ANDANDO POR ONDE JESUS ANDOU...

Durante os 52 minutos de duração do epifânico documentário “Locações na Palestina” (1965), o diretor Pier Paolo Pasolini confessa estar diante de uma perplexa decepção: por mais grandiosos que, em sua mente impregnada de doutrina católica, fossem os cenários onde Jesus Cristo caminhou quando vivo, no século I d.C., na realidade, estes são infilmáveis, indignos de serem utilizados enquanto cenário para um filme sobre a vida do filho de Deus na Terra, de maneira que a modernização capitalista de cidades como Belém e Nazaré inviabilizam que as mesmas sejam utilizadas como locações para as cidades históricas de Belém e Nazaré. O mundo é comumente transformado pelo capitalismo, constata o cineasta, ao passo em que constata que tribos beduínas ainda vivem como pré-cristãs nos dias atuais (da época em que datam as filmagens, pelo menos), sendo, portanto, inviável até mesmo a utilização de membros destas tribos enquanto figurantes do filme, que, conforme vemos no documentário, anseiam por milagres bem mais táteis, geralmente envolvendo a multiplicação de moedas. Os tempos mudaram – e para pior!

Por mais que, nesta peça singular da cinematografia mundial, façamos coro com a decepção física do cineasta, irmanamo-nos com ele quando ele atrela esta mesma decepção a uma concepção elevada do sagrado, que faz com que ele se sinta até um pouco herético ao pisar em locais tão impregnados de História e religiosidade milenar. E, ao lado do cineasta, o pároco Don Andrea Carraro justifica com versículos bíblicos o porquê da pequenez proposital de cenários reais da grandiosidade de Jesus, que assim envergonha os prepotentes habitantes das mais desenvolvidas cidades da Terra, inglórias de serem palco de um nascimento tão egrégio. E eu me emocionava, ao entender o sentido político e estético que Píer Paolo Pasolini temia não estar sendo capaz de transmitir ao ser traído pela memória durante a dublagem do filme. Nobre modéstia!

Diante deste filme, lançado posteriormente ao motivo de ele ter sido realizado [a filmagem de “O Evangelho Seguindo São Mateus” (1964), laureado e reconhecido até mesmo pelo Vaticano], constatamos o quão complicado foi para este gênio italiano materializar os seus anseios religiosos e estéticos, visto que, “ao invés de submeter a geografia à sua imaginação”, ele teve que submeter sua imaginação à geografia modificada e deteriorada pelo capitalismo do lugar. E, se por vezes parecia que o cineasta e o pároco divergiam em suas noções de sagrado, eles muito concordavam quando explicitavam o que deve ser realmente considerado como relevante durante a feitura do filme: “se a geografia sagrada dos lugares em que Jesus Cristo realmente caminhou não lhe parece interesse, tu bem podes reconstituí-la noutro lugar”, assevera Don Andrea. Quem teve o orgulho de apreender os resultados do processo ora apresentado constatou o quanto Píer Paolo Pasolini improvisara. E, assim sendo, ele atingiu a perfeição em matéria de estase. Por isso, eu, ele, o pároco e alguns do que me lêem neste momento acreditamos em Deus: porque existe aquilo que existe e aquilo que não pode ser refutado!

Wesley PC>

CONFORME PROMETIDO, A EXPLOSÃO (MAIS ESPONTÂNEA DO QUE EU ESPERAVA) DE CORES!

Este garotinho sorridente pintado numa tela multicolorida chama-se Darsheel Safary e, aos 11 anos de idade, é o protagonista de “Como Estrelas na Terra – Toda Criança é Especial” (2007, de Aamir Khan & Amole Gupte), surpreendente filme bollywoodiano que acabo de ver e, ouso dizer, aborda o problema da dislexia por um viés que eu nunca, jamais imaginaria. Absolutamente surpreendente, uma aula de cinema e de vida, com todas as concessões xaroposas que a conjunção destes dois termos implica. Recomendo de coração e aplaudo de pé! E não falo mais sobre o filme porque ele deve ser descoberto, retirado do mesmo limbo em que se encontram muitas crianças disléxicas incompreendidas. Por favor, busquem-no! Qualquer coisa, eu e minha chefa temos uma cópia em DVD.

Wesley PC>

terça-feira, 2 de novembro de 2010

HORA DE REVELAR O SEGREDO...

Creio que seja suficientemente óbvio, mas, da mesma forma que “a morte é assaz promiscua para ser amada” (acabo de ler esta frase genial numa crítica do filme que ora me pretendo a analisar metonimicamente), “verdades óbvias precisam ser anunciadas a fim de que não se configurem em ideologias ditatoriais”. Ou algo parecido. Então, segue o óbvio: durante este feriado, as postagens que eu adicionei a este ‘blog’ eram comumente acompanhadas por imagens em preto-e-branco. Era como se fosse um aviso, um clamor, um anúncio, que, eu não sei bem se interessa dizer, mas tem um destinatário-padrão, por mais que este seja relutante ou ocupado demais para prestar atenção em sinais abobalhados de um insuportável apaixonado, no mesmo sentido promíscuo atribuído à morte que protagoniza este filme através de negação onipresente: “O Parque Macabro” (1962), do injustamente desconhecido Herk Harvey.

No Brasil, o título acostado aprisiona as ações perturbadoras do filme a um cenário específico, enquanto que a tradução original (“Carnaval de Almas”) aplica-se melhor ao estupor que nos acompanha durante a curta, porém impactante, duração do filme. Apesar de não ter sequer 90 minutos de duração cronológica, os minutos que passei diante deste filme repercutirão eternamente diante de meu subconsciente tendente ao atordoamento. Isso porque eu não sei se entendi pouco ou muito o filme ou se ele tem pouco ou muito para ser entendido: é um filme para ser sentido e temido, como a morte ou a vida!

Poucas vezes, aliás, estive diante de um roteiro tão simples que consegue ser efetivo na transmissão de seus efeitos psicóticos: na primeira cena, um automóvel dirigido por homens desafia um automóvel dirigido por mulheres para um racha. O automóvel delas derrapa e cai de uma ponte. Buscas são efetuadas no local, tentando encontrar os defuntos femininos ou o carro em que elas estavam. Uma mulher aparece cambaleando no píer. Ela é organista e resolve sair da cidade, atormentada e desviada do mundo que estava. É perseguida por estranhas imagens de um avantesma morbidamente masculino (interpretado pelo próprio diretor). Encontra emprego noutra cidadela, mas desperta o interesse romântico/sexual de um vizinho de quarto. Ela não bebe, ela não dança, ela é tachada de adúltera pelo padre da congregação eclesiástica para a qual é contratada para executar o órgão. Ela fica surda de vez em quando e, nesta surdez, é como se ninguém mais a visse, como se o mundo a expelisse psicologicamente (apesar de sua presença física ser irrevogável) e ela enlouquece, grita, geme, sofre... Isso tudo resumido em menos de uma hora de projeção. O que acontece nos minutos finais me escandalizou! Uma verdadeira obra-prima do terror obliterada pelos preconceitos genéricos hollywoodianos, num filme que precisa ser conhecido, divulgado, sanado, debatido, analisado, curado. E, por isso, eu revelo o segredo: se tudo der certo, na próxima postagem, as cores brotarão!

Wesley PC>

“UM CAMINHÃO DE GELO ME ATROPELOU. E A TI, O QUE FOI TE ATINGIU?”

Fazia tempo que eu não via um filme mudo insistir tanto na descrição minuciosa da tristeza de um personagem. Acho que desde “Lírio Partido” (1919, de D. W. Griffith), eu não percebia tantos adjetivos lúgubres como weary, grim, suffering, guilty ou mesmo bitter agrupados num mesmo conjunto de intertítulos. Tratava-se de “Flesh and Blood” (1922), belíssimo filme triste de Irving Cummings que vi na manhã de hoje.

Na trama, o multifacetado Lon Chaney interpreta um homem que foge da prisão após 15 anos de injusta reclusão. “Era perseguido como se fosse uma besta selvagem, mas nem de longe assistido pela natureza quanto o são estas feras”, diz a legenda inicial. À medida que o filem avança, sabemos que ele possui um amigo chinês que o auxiliará no plano de vingança contra o rico empresário que o denunciou. Mas antes ele quer saber do paradeiro de sua esposa e de sua filha: após muito cansaço, e fingindo-se de aleijado, ele descobre que a primeira morreu e que a segunda é uma esperançosa missionária religiosa, prestes a se casar justamente com o filho do seu arquiinimigo, que, obviamente, não aprova o matrimônio. O que acontece depois só deve ser revelado a quem se dispuser a ver este belíssimo filme, mas não posso me furtar aqui de transcrever em letras maiúsculas o belíssimo apotegma final: A FELICIDADE DISPONIBILIZA ESTRANHOS CAMINHOS PARA AQUELES QUE OPTAM POR ESCOLHER OS PASSOS ATRAVÉS DOS QUAIS IRÃO PERCORRÊ-LA. Não parece óbvio? Por mais que seja, a audiência ao filme revela uma dulcíssima e amara surpresa. Este tipo humano, demasiado humano de filme mudo simplesmente me encanta! O questionamento acima destacado, formulado por um garotinho deficiente quando se depara com o choroso protagonista, não me deixa mentir...

Wesley PC>

WESLEY SURTANDO NA MADRUGADA!

Acabo de ver “Controle”, o 14º episódio da primeira temporada do seriado “House”, majestosamente protagonizado pro Hugh Laurie e, para além do choque e desamparo ético ocasionado por este episódio, em que o personagem principal mente (repito: mente) para salvar uma vida, eu surto:

1 – Eu já deveria estar dormindo, visto que quero ver mais um filme austero de Jean-Marie Straub & Daniele Huillet logo pela manhã;

2 – Percebi agora que nunca ouvi um álbum do mato-grossense Almir Sater na íntegra;

3 – Não lembro quando foi a última vez que “precisei” mentir, o que, desde já, é (ou pode ser) uma mentira;

4 – Quando eu não escuto a voz de quem eu gosto, eu enlouqueço;

5 – Apesar de enlouquecer com freqüência, minha sanidade está literariamente garantida;

6 – Eu sou religioso;

7 – Eu sonho em morar numa cidadela do interior algum dia;

8 – Não tenho medo de ratos, acho que não tenho medo de ratos, não preciso ter medo de ratos, minha mãe tem medo de ratos, ratos têm medo de mim, ratos têm medo de outros ratos, eu tenho medo de outros eus, ratos não têm medos de outros eus-ratos, ratos têm medo de ter medo e eu tenho medo de ratos que têm medo de mim...

9 – Rato começa com R, medo não começa com R, surto tem a letra R no meio, R;

10 – estou surtando, surtado, surtei, surtarei, surtamos, surtaremos, surtarás, surtam, surtaram, surtaste, surucucu é o nome de uma cobra e Deus gosta quando eu me comporto bem. Pai Nosso que está no Céu, santificada seja a sua vontade!

Wesley PC>

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A DOCE RESSACA DA LAVAGEM DE PRATOS PÓS-HÚNGARA:

Quem me conhece de perto, sabe que possuo duas fraquezas “pimbas”: músicas balcânicas e filmes eslavos. Nesse sentido, quando fui enciclopédica e pessoalmente apresentado ao filme húngaro “Os Meninos da Rua Paulo” (1969, de Zoltán Fábri) e ao disco mais recente da romena Miss Platnum [“The Sweetest Hangover” (2009)], fiquei surpreso comigo mesmo ao me decepcionar com ambos os produtos culturais, Se, no caso do filme que meu caro Rafael Maurício tanto aprecia, o que me dificultou o favoritismo foi um distanciamento nostálgico em relação à belicosidade infantil dos protagonistas, que brigaram em vão por um terreno baldio mais tarde tomado pela construção civil, no caso do disco recomendado por meu xará Wesley Soares, desgostei da felicidade ‘pop’ promulgada pela diva romena, que canta em inglês todas as canções. Porém, há um curioso ponto de contato entre ambos os produtos culturais, que me pareceu deveras relevante nesta noite de segunda-feira: se no disco de Miss Platnum há uma boa regravação da famosa canção “Babooshka”, de Kate Bush, no filme do Zoltán Fábri é assim que os garotinhos se tratam entre si: “Babushka”, palavra que, em russo, quer dizer “vovô”, mas que as legendas brasileiras habilmente traduzem como “velhinho”.

Quando terminou o filme, fiquei com uma estranha vontade de lavar pratos. Repito: queria tanto lavar pratos quanto eventualmente quero fazer sexo oral ou comer pipocas, atividades estas que, se tiver sorte, planejo pôr em prática ainda nesta noite. E, enquanto eu lavava os pratos, escutava novamente o tal do “The Sweetest Hangover” e, tal qual me aconteceu da primeira vez, achei o disco apenas mediano, por mais que a cantora entupa algumas faixas com trompetes ciganos que muito me seduzem. Antes de terminar esta lavagem de pratos, porém, visitei uma vizinha e esta me perguntou o que era democracia (juro!) enquanto uma amiga trançava seu cabelo e eu me esforçava para explicar a uma garotinha de 4 anos que a letra J é aquela que se parece com a perna de um guarda-chuva. E, nesse contexto explicativo, talvez “Os Meninos da Rua Paulo” seja discursivamente útil, se bem que, em minha opinião, ele seria bem mais efetivo se tivesse uns 20 minutos a menos de duração ou fosse mais dramático do que pretensamente aventureiro. Se eu tiver tempo ainda este ano, verei o que acontece se este filme for assistido em grupo. O CD, por sua vez, é bem mais grudento, mas nem de longe está cogitado para se tornar uma de minhas opções dançantes favoritas. Deve ser porque eu não bebo (risos), apesar da ressaca que a artista descreve ser bem mais ampla do que uma interpretação rasa do título nos levaria a supor...

Wesley PC>

RINDO DAS ATRACAÇÕES (ANTI)DEMOCRÁTICAS ALHEIAS, MAS SÓ ATÉ CERTO PONTO!

Na manhã de hoje, fui convidado por uma vizinha de 18 anos a participar da festa de aniversário de uma amiga em comum, mas tive que declinar, pois se tratava de um churrasco. Por mais que elas insistissem que eu poderia comer somente arroz com salada, o cheiro de osmazoma me incomoda, saber que animais mortos estão sendo tostados enquanto eu me divirto estraga a minha capacidade social de cooperação festiva. Ao final, elas pareceram entender minha argumentação rejeitante. Não irei a esta festa propriamente dita, mas topo ir com elas a um barulhento e desordeiro concerto de pagode (apenas por alguns minutos), se isto implicar em satisfazer o desejo de minhas vizinhas adolescentes em se divertir ao meu lado. Gosto delas – e é normal gostar de pessoas que gostam de coisas diferentes das que gostamos.

Pois bem. Depois de conversar com esta vizinha, escolhi um filme aleatoriamente para ver enquanto almoçava e deparei-me com “Um País de Anedota” (1949, de Henry Cornelius), tradução nacional para “Passport to Pimlico”, filme que eu via sendo comumente exibido na TV Bandeirantes quando era pequeno. Não tinha a menor idéia do que se tratava, mas sabia que o humor britânico era demasiado sarcástico e, como tal, me faria rir. Só não imaginava que gargalharia tanto quanto ri diante deste filme hilário, absolutamente hilário, e tachado de “conciliador” por alguns críticos opositores ao estilo supostamente hipócrita do diretor Henry Cornelius. Como não sei bem do que se tratam estas pendências, entreguei-me ao filme. E ri muito!

A trama parece simples, mas é demasiado intricada e crítica: no condado britânico que intitula o filme, Pimlico, há uma bomba ainda não desarmada no meio da cidade. Herança da II Guerra Mundial, tanto quanto os racionamentos materiais a que os moradores são submetidos. Por acidente, alguns garotos travessos deixam cair um pneu no buraco onde a bomba estava, e esta explode. Com a explosão, é descoberto um tesouro medieval, anexado a um documento que proclama a região como sendo não-britânica, mas sim vinculada à Borgonha francesa. Livres dos impostos e imposições ingleses, os moradores atiram-se desenfreadamente ao consumo de materiais outrora racionados e ao comércio não-tarifado. Até que uma guerra pela independência é sugerida e um boicote britânico é imposto sobre o local, que fica literalmente ilhado dentro de uma ilha, sem acesso a água ou comida. A opinião pública mundial se compadece, então, dos moradores de Pimlico e os simpatizantes da causa passam a lhe enviar mantimentos, inclusive o porco de pára-quedas que enfeita esta postagem. Neste instante, eu não ri. Achei absurdo e potencialmente divertido, mas não ri. Mas nada que prejudique o brilhantismo sarcástico do filme. Não somente é genial como se torna ainda mais pertinente diante das contradições democráticas que vivenciaremos entre o final do mandato de Lula e a posse da presidenta Dilma Rousseff, em janeiro de 2011. Fazia tempo que eu não ria tão alto diante de um filme... Hilário: democracia legalista na prática me faz rir!

O quartel final do filme difere em tonalidade cômica da argúcia ferina do início, mas ainda assim é muito divertido. Profético, aliás, em sua sujeição demeritória aos problemas oriundos da aplicação de desígnios utópicos (no sentido cunhado por Thomas Morus) numa configuração populacional acostumada aos desvios perdulários, ao consumo exacerbado, à forçação de barra concessiva. Não é isso que costumam nos empurrar, hoje em dia, sob o rótulo de democracia, vulgo “a ditadura da maioria”? Sempre que sou voluntariamente impedido de estar presente numa comemoração de amigos ou vizinhos porque estes são adeptos do consumo de churrasco, sou obrigado a pensar num falso dilema pós-moderno: tem algo errado com meus amigos ou com o mundo? Se puserem uma arma em minha cabeça e me obrigarem a escolher um dos lados da questão, garanto que sei o que responder!

Wesley PC>

“FILME QUE ELEVOU A POPULARIDADE DO ASTRO A SEU ZÊNITE E DESENCADEOU VERDADEIRO FUROR PELOS COSTUMES ÁRABES, PELO MENOS COMO IMAGINADOS EM HOLLYWOOD”

Este é o parecer histórico do pesquisador Jean Tulard sobre “O Sheik” (1921), filme dirigido por George Melford que se tornou célebre por ser aquele que difundiu com maior intensidade romântica a sexualidade emergente do italiano Rodolfo Valentino, que falecera seis anos depois, em 1926, no vigor de seus 31 anos de idade, em decorrência de uma úlcera gástrica. Segundo a lenda, várias mulheres suicidaram-se depois que ele morreu, encantadas que estavam com o seu charme latino (o preconceituoso roteiro do filme logo se apressar em negar a ascendência árabe do personagem – risos), ao passo que outros biógrafos insistem em aplicar um perfil homossexual ao astro, em razão de ele ter declarado em seu diário pessoal que já passara uma noite na cama com outro homem. Polêmicas sexualistas à parte, eu particularmente não entendi porque este ator chamava tanta atenção enquanto protagonista. Muitos outros astros do cinema mudo são mais bonitos e talentosos do que ele!

Como padrões de gosto androfílico não se impõem, não se explicam e não se discute em nível julgamental, posso apenas ater-me ao que achei do desempenho do astro no filme que vi esta manhã: se dependesse de mim, bem menos suicídios coroariam a sua despedida fúnebre deste mundo. Não somente o roteiro apenas mediano da produção impede que o ator exponha seus dotes interpretativos, como o fato de ele estar sempre recoberto por túnicas e capuzes dirimia o meu interesse de enxergá-lo como símbolo sexual. Na trama, um xeque árabe recém-chegado de Paris apaixona-se por uma impetuosa rapariga britânica, que ousa desafiá-lo quando este cerra um cassino para seu deleite pessoal. Atraído pela teimosia da moça, ele a rapta e, depois de algum tempo, consegue êxito em fazer com que ela também se apaixone por ele. Numa das cenas-chave do filme, ela declara seu amor por ele nas areias do deserto, que permanecem intactas mesmo após a travessia de vários cavalos e a ventania típica do local. Amores tardiamente correspondidos têm este poder de desafiar até mesmo as regras da natureza (risos). Ah, se fosse comigo...

Wesley PC>

domingo, 31 de outubro de 2010

PRETO-E-BRANCO AOS 29 ANOS DE IDADE:

Dentro de algumas horas, o canal aberto TV Brasil (transmitido em Sergipe através do sinal da TV Aperipê) exibirá um filme chamado “A Cara que Mereces” (2004). Não posso arriscar-me a dizer que será o filme ótimo que penso que seja, mas filiando-se à tradição portuguesa juvenil inventiva e sendo dirigido por Miguel Gomes, responsável por um dos melhores filmes a que eu e alguns amigos vimos recentemente, conforme pode ser lido aqui. Pois bem, recomendo-o de coração.

A fim de tornar a recomendação mais pessoal, dois estratagemas pessoais:

1- Reproduzir a sinopse do filme, conforme constante na página virtual do canal em que o mesmo será exibido: “O longa de estréia do português Miguel Gomes é a próxima atração do Cine Ibermedia que a TV Brasil exibe no domingo (31), às 23h [horário de Brasília]. O filme gira em torno de Francisco, um professor à beira de uma claustrofobia emocional com a crise dos 30 anos. O filme busca convencer o protagonista do dogma: 'Até os 30 anos, tem-se o rosto que Deus lhe deu: depois disso, tem o rosto que se merece'. Na data do aniversário, Francisco adquire sarampo e fica de quarentena e, assistido por sete amigos, se vê induzido a uma série de questionamentos cômicos de sua infância”;

2- Comparar o contexto colorido das reminiscências cômicas e melancólicas que o argumento enredístico do filme indica com o meu próprio cotidiano socialmente claustrofóbico, haja vista que também beiro os 30 anos de idade e, se hoje tenho a cara que Deus que me deu, torço para que a mesma mantenha-se depois que eu receber a efígie por mim merecida, dado que, finalmente, gozo de uma positiva satisfação quando vejo o meu corpo nu. Talvez eu não precise me estender muito na explicação de como me é sobrevivencial esta satisfação, no sentido de que já fui muito vitimado na adolescência por ser fisicamente desengonçado e hoje me surpreendo ao ter ereções quando olho-me despido diante do espelho. Se eu não fosse eu, eu me apaixonaria por mim mesmo, num contexto menos egocêntrico do que parece. Amo-me por completo, mesmo assumindo defeitos recorrentes e quiçá aberrantes, e, por isso mesmo, sinto-me apto a amar outrem. Amo-me, amo-te, amo-vos, amo-o. E, neste último caso, ficar bonito nu ou vestido talvez de pouco adiante.

Mas, deixe quieto: não é tempo de lamentações. Estou ansiosíssimo pelo filme e, prometo: depois que vê-lo, deixarei uma síntese de minhas impressões na trilha de comentários desta postagem. Até daqui a pouco, portanto!

Wesley PC>

DEMOCRACIA ANTI-POPULISTA: TINHA QUE VIR UM CASAL DE CINEASTAS E ME DIZER QUE ISTO NÃO SÓ EXISTE COMO FUNCIONA!

A francesa Danièle Huillet faleceu em 2006, deixando viúvo o também francês Jean-Marie Straub, considerado um dos mais austeros cineastas de vanguarda já estabelecidos na Europa. Desde 1963, quando o casal realizou o curta-metragem “Machorka-Muff”, do qual extraí a epigrafe mostrada em foto, que quer dizer que o que veríamos adiante seria um sonho metafórico e abstrato, e não uma estória”. Dito e feito: o excesso de abstração onírica do roteiro sisudo, aliado ao fato de que assisti ao filme em alemão com fugidias legendas em italiano, fez com que eu me sentisse ignorante diante do que estava acontecendo. Motivo principal: não sabia nada, exatamente nada, sobre o que o chanceler Konrad Adenauer havia feito durante seu mandato entre 1949 e 1963, ano em que o curta-metragem fora realizado. Conclusão: se eu pude me escandalizar diante de algo neste filme, o foco de minha atenção esteve nas metáforas institucionais e religiosas dos quais os diretores se serviram, ao fazer com que o protagonista, um militar nazista reintegrado, se apaixone por uma mulher que já se casara sete vezes e, antes disso, deparasse-se com um compêndio de notícias de jornal em que autoridades religiosas declaram não ser incoerente a prática do assassinato bélico por católicos e protestantes que jurassem lealdade suprema à pátria alemã. Glupt!

Espantado que fiquei com este curta-metragem, resolvi me aventurar por outro filme da dupla e assisti hoje à tarde ao ainda mais árduo “Fortini/Cani” (1977), no qual o escritor Franco Fortini (sobre o qual eu também nunca havia ouvido falar) lê trechos imensos sobre um livro em que ele narra suas memórias infantis politicamente traumáticas, visto que não raro era tachado de “porco judeu antifascista” por seus colegas de classe. Em durante os 83 minutos de projeção da película, longos e demorados ‘travellings’ horizontais perscrutam uma árida paisagem italiana, que fazia com que o espectador emulasse os clichês geográficos associados à área fronteiriça entre Israel e o Egito. A narração do filme é em italiano e as legendas estavam em francês fugidio. Conclusão: entendi este filme ainda menos do que o anterior, mas aventuro-me a parafrasear a declaração com que o autor encerra o seu discurso: “se ‘revolução’ não fosse um termo quase ridicularizado por seu abuso, tornando-se, por vezes, uma palavra ainda mais reformista do que aquelas proferidas pelos reformistas, poderia fiar-me aqui aos ensinamentos de Lênin, que alega que as situações revolucionárias possibilitam a descoberta não apenas uma saída em momentos de crise, mas também o potencial inequívoco de transformação das mesmas”. E, para este tipo de alegação, não somente eu bato palmas, como preciso trazer à tona duas situações democraticamente revoltantes de que eu fui espectador depois que exerci o meu dever democrático eleitoral.

Enquanto esperava o ônibus, acompanhei alguns partidários contratados da candidata Dilma Rousseff atirarem blocos e blocos de papel de campanha contra as ruas da cidade, comemorando a “vitória certa” dela enquanto presidenta do Brasil, ao que recebiam a anuência comemorativa de vários motoristas de automóveis, que buzinavam empolgados quando passavam diante deles. Senti raiva, por alguns minutos, daqueles poluidores, mas logo transferi minha chateação reivindicativa para os dirigentes do comitê eleitoral, que deveriam estar vigiando aquela baderna. Mais tarde, quando eu já estava sentado no último banco de um ônibus, alguns passageiros bêbados pediram um pote de água mineral quando passaram diante do comitê e, por não receberem, gritaram: “Dilma vai perder, bando de viados!”. E eu quedava-me calado, que, numa democracia como esta, eu que não me atrevesse a abrir a boca ali. O pior é que os tais passageiros perceberam meu corte de cabelo exótico quando desceram do ônibus emitiram alguns grunhidos ofensivos, que, por proteção, eu não escutei, não dei trela. E, enquanto escrevo estas linhas, um bando de crianças vizinhas comemora com cantos de guerra a vitória presidencial de Dilma Rousseff, candidata que, ressalto só por curiosidade, também contou com meu voto. E, se tudo der certo, amanhã estarei vendo mais um longa-metragem austero do casal Danièle Huillet & Jean-Marie Straub: “Comportamento em Classe” (1984), baseado num romance de Franz Kafka, falado e alemão e dessincronizadamente legendado em inglês. E viva os deveres democráticos!

Wesley PC>

DE VEZ EM QUANDO, VEM UMA MÚSICA E GRUDA EM NOSSA CABEÇA!

E já era bem tarde quando esta musica veio, mas eu não conseguia dormir enquanto não me enfadasse de tanto ser penetrado pela letra pungente da canção, transmitida através da voz suave e conquistadora de Bonnie ‘Prince’ Billy:

“Death to everyone is gonna come
And it makes hosing much more fun
Death to everyone is gonna come
And it makes hosing much more fun”


E agora eu tenho que comer, tomar banho, pegar um ônibus para votar no Centro da cidade de Aracaju. Nesse entretempo, não parei de perguntar a mim mesmo o tal do Bonnie ‘Prince’ Billy a compor um disco tão amargo quanto o é este “I See a Darkness” (1999). Seria ele triste mesmo? Estaria ele apenas interessado em fisgar quem acha que sofre por amor? Apesar de possuir uma extensa discografia, só vim conhecer este artista (nascido Will Oldham) na madrugada de ontem para hoje, graças à recomendação breve na enciclopédia “1001 Discos para Ouvir Antes de Morrer”, página 854. E não é verdade? A morte não chegará mesmo para todo mundo, algum dia?

“Death to me and death to you
Tell me what else can we do die do
Death to all and death to each
Our own god-bottle's within reach”


Obra-prima!

Wesley PC>