sábado, 13 de novembro de 2010

DE COMO COMEÇAR UM VERGONHOSO RELATO AUTOBIOGRÁFICO: ACABO DE LER O LIVRO DA BRUNA SURFISTINHA - ISTO ME FAZ UMA PESSOA MELHOR OU PIOR?

Como começar o relato avaliativo sobre o que li? Penso que talvez a melhor pedida seja uma citação direta, atirar na cara dos leitores desta resenha o que eles encontrarão se se dispuserem a ler “O Doce Veneno do Escorpião – O Diário de uma Garota de Programa”:

“Um dia, pintaram dois clientes juntos. ‘Vocês querem ir um de cada vez?’ ‘Queremos ao mesmo tempo’. Uau! Será que eu agüento? Nunca tinha feito dupla penetração (a tal DP). Dizem que a curiosidade matou o gato. No meu caso, o gato (ou a gata) tem sete vidas e continua vivendo. ‘Vamos nessa!’ No início, nem sabia para quem eu dava mais atenção. Comecei chupando um, quando o outro veio e se ajoelhou ao lado do amigo e eu passei a fazer rodízio de picolé. Beijava um, depois o outro. Fiquei pensando se ia rolar alguma coisa entre eles, como costuma rolar entre as mulheres num ménage. Mas saquei que entre eles não haveria contato nenhum. Só as cabeças dos paus encostavam uma na outra, e mesmo assim quando eu juntava e tentava chupar os dois ao mesmo tempo. Missão difícil... embora não impossível.” (páginas 42-43)

Foi um trecho selecionado com cuidado. Nestas linhas, todo o estilo e “interesse” que possa estar vinculado ao relato da autora está sintetizado. É assim que ela é, é assim que o livro é: linguagem chula, direta, sem rodeios. Vida real, oportunista, capitalizada, repleta de vaidade. Cheia de preconceitos, de senso comum, de putaria sensacionalista. É como se eu estivesse conversando com uma vizinha, no sentido mais dialógico do termo, inclusive! Se isto é ruim? Como diria a autora em várias passagens, “quem está na chuva é para se molhar”. Ou seja, se eu me atrevi a ler esta barbaridade, sabia o que iria encontrar – e encontrei. E, como não seria de todo surpreendente, me identifiquei muito com a personagem real. Para além de nossas diferenças de classe, intelectualidade ou o quer mais que seja, temos algo em comum no que tange ao tom sensacionalista das exposições sexuais, no sentido menos traumático e mais psicanalizante do termo. E basta no que diz respeito aos aspectos “positivos” do livro.

Se eu não consegui odiar de todo “O Doce Veneno do Escorpião”, a sua autora é uma pessoa desagradabilíssima. Viciada em cocaína, mimada, mentirosa, cleptomaníaca, preguiçosa (exceto para foder), desbocada... Não a teria como amiga, mas, enquanto pessoa, defendo a sua existência, defendo os seus direitos legais e, como tal, entendo o que ela quis dizer quando termina seu relato com uma frase-clichê em negrito: “o importante na vida é nunca desistir de buscar a felicidade”. OK, se ela diz...




Ao final do livro, escrito em 2005, ela alega estar feliz num relacionamento amoroso, explicita seu desejo de parir um casal de gêmeos, confessa ter largado a prostituição e as drogas. Único arrependimento: ter realizado um filme pornô, que a incomodou por ser ainda mais mecânico do que algumas das transas ruins a que teve que se submeter. E ela submeteu-se a muitas. Fodas e mais fodas são descritas em detalhes no livro, não sei com que intento... Desabafo apenas? Não sou ingênuo em pensar isso, por mais que ela tente nos convencer (e a si mesma) deste objetivo para-freudiano. Ela quer mesmo é imaginar seus leitores batendo punheta, como deixa escapar numa passagem e, se ela conseguiu sucesso no que tange à minha excitação pessoal, confesso que uma passagem é significativa neste sentido: um trecho adleriano, em que ela explica com minúcias o extremo prazer psicológico que sente quando se via induzida a “descabaçar” vários meninos de 12, 13, 14 anos que apareciam uniformizados no bordel em que ela trabalhava, não por acaso localizado perto da escola em que eles estudavam. Senti-me um tantinho irmanado com ela durante o processo de comunhão entre inexperiência sexual e desvirginização alheia. É algo que alimento enquanto fantasia pessoal. É assim que eu imagino a minha segunda (e definitiva) “primeira vez”...

De resto, sou obrigado a admitir que o livro ‘per si’ não é tão ruim quanto pintam. O que é ruim é que obras como esta recebam a visibilidade midiática que recebem, a ponto de eu ser obrigado aqui a confidenciar o porquê de eu lê-lo com tamanha avidez: um rapaz deveras inconcluso em relação à sua própria sexualidade, por quem me sinto fortemente atraído ou apaixonado ou ambos, volta e meia puxa assunto comigo acerca do lançamento da versão cinematográfica do livro, a ser lançado no ano que vem, sob o título genérico “Bruna Surfistinha”. O diretor é o desconhecido Marcus Baldini, a protagonista é Deborah Secco, a trilha sonora é da banda pretensamente alternativa Cansei de Ser Sexy e houve rumores (não-confirmados) de que o cineasta Karim Aïnouz esteve envolvido no argumento. Pressinto, desde já, coberto de razão, que o filme será de um moralismo atroz, mas não posso deixar de nutrir um ciuminho renitente em relação às expectativas do garoto que me expôs os preparativos para esta produção. Quiçá ele fantasiará diante do filme – porque sim, ele vai ver este filme, visto que ele insiste em ver filmes antecipadamente ruins na tela do cinema! – situações neo-barrocas de pecado defensivo que eu não estou autorizado a alimentar e muito menos a divulgar aqui, o que me traz de volta à estrutura do livro, no parágrafo seguinte, supostamente conclusivo.

Oscilando entre os relatos propriamente ditos das fodas (numa delas, ela faz questão de dizer que sua opção por implantar silicone nos seios é mera exigência profissional, visto que ajuda na prática da “espanhola”, ato de enfiar o pênis no meio dos peitos da mulher) e as angústias típicas do que parece ser uma garotinha adotada por uma família rica que se sente rejeitada na escola por ser gordinha, “O Doce Veneno do Escorpião – O Diário de uma Garota de Programa” consegue entreter-nos em sua primeira metade, mas descamba para uma ridícula auto-terapia ultra-midiática depois que sua autora expõe o que mudou em sua vida depois que concedeu entrevistas no rádio, na TV e viu sua imagem exibida pelo mundo afora. Ela é puta, gosta do que faz, é puta porque gosta, repete isso o livro quase inteiro e, no final das contas, deseja para si o que todo mundo deseja. OK. Direito dela. Escreveu um livro ruim. OK, direito dela também. Agora, como ela mesma diz, lê a porra do livro quem quiser. E eu quis. Por isso, deixa quieto. Assumo aqui meu constrangimento e reafirmo: identifiquei-me muito com o que li ali. Mas, com certeza, ganho mais fazendo outra coisa!

Observação final: o parágrafo acima deveria ser conclusivo, mas esqueci um detalhe fundamental. Quando eu o garoto que me inspirou sentimentos nocivos de ciúme que engendraram a necessidade espúria de ler o livro discutíamos sobre nossos pontos de vista mui diferenciados sobre prostituição, eu disse-lhe que o que mais me incomodava nesta profissão era o entreguismo pecuniário, a transformação do corpo humano (e, algumas vezes, também da alma) em mercadoria, enquanto ele se incomodava com a própria noção convencional de promiscuidade, conforme ele fora educado em sua educação familiar cristã. “Eu não gostaria de sequer imaginar a possibilidade de minha irmã dar a bunda, Wesley. Como tal, não desejo isso para ninguém, acho isso ruim”, disse-me ele. "Acho isto ruim no plano moral, enquanto tu só achas ruim porque envolve dinheiro". Ele tinha razão neste aspecto. Por outro lado, eu intuo que ele já deve ter se excitado pensando na tal da Bruna Surfistinha, apelido profissional para Raquel Pacheco, garota comum de 26 anos que agora sonha em se formar em Psicologia e aplicar na teoria e nas consultas o que já experimentou na prática. E eu acho que já deu para entender o que eu quero dizer com esta mistureba confessional de situações, não é? Sinto ciúmes, sinto inveja, sinto culpa e, mesmo que em pequena medida (ao menos em um dos dois primeiros sentimentos), sei que isto é preocupante quando começo a mergulhar na fase desesperada e terminal de amor platônico em que agora me encontro... E esta estória definitivamente não vai ter fim!

Wesley PC>

QUANDO O LEITE MATERNO NÃO COMPORTA O AMOR À PÁTRIA (COMPLEMENTO CONTRA-EXEMPLAR ÀS BENESSES BUROCRÁTICAS DE OUTRORA)

Quando desliguei a TV na noite de ontem, após a minha frustração lancinante com a subsunção de reivindicações nacionalistas aos caprichos de uma diretora com talento superestimado, deitei-me no sofá e li algumas páginas do romance angolano “A Geração da Utopia”, de Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, que assina como Pepetela, cuja sensatez reivindicativa, ao contrário do que se manifestara na brasileira com ascendência magiar, está fadada à genialidade até mesmo por vias involuntárias. Dividido em quatro macro-segmentos (“A Casa”, “A Chana”, “O Polvo” e “O Templo”), escritos com intervalos de mais ou menos dez anos entre um e outro, “A Geração da Utopia” é, desde já, um de meus livros favoritos, ainda que esteja apenas na metade. É tudo tão urgente, é tudo tão político (no sentido mais minimalista do termo) que não posso esquivar-me de ser atingido no cérebro, no coração, no pênis e onde quer mais que eu demonstre sensibilidade em relação aos nervos de meu corpo!

A primeira frase do romance já me encantara por completo: portanto, só os ciclos eram eternos”, escreveu Pepetela em 1961, desafiando os detratores que lhe disseram que “portanto” é uma palavra que só pode ser utilizada em contextos que visem à conclusão de um raciocínio. “Daí a raiva do autor que jurou um dia havia de escrever um livro iniciando por esta palavra. Promessa cumprida”. E, ainda na primeira página de seu livro, já havia um raciocínio a ser concluído: um raciocínio que leva a novos raciocínios e aos inúmeros epílogos que se somam aos capítulos, à busca eterna pela liberdade. A trama do livro? A História de Angola, narrada pelos olhos e sentimentos de um grupo de estudantes que se reencontra em Portugal e, depois, nos combates sangrentos pela independência do país africano, reconhecida somente em 11 de novembro de 1975. O que me traz à mente outra anedota real de meu trabalho como recepcionista do DAA.

Recentemente, um graduado em Ciências Econômicas entregou-nos os documentos requisitados para a confecção de seu Diploma. Na certidão de nascimento, constava: “nascido em Luanda – Portugal, 1971”. Na carteira de identidade, “nascido em Luanda – Angola”, expedição da 2ª via do documento: 2003. A funcionária responsável pela análise dos documentos chamou-me para mostrar a discrepância geográfico-informativa e eu expliquei-lhe que os documentos estavam em ordem. “Até 1975, Luana, capital de Angola, era província de Portugal. Por isso, a documentação dele está em ordem sim”. Isso era eu dizendo. “E eu lá tenho a obrigação de saber que o País se tornou independente depois que ele nasceu ou não?! Ele vai ter que me trazer documentos atualizados com a mesma nacionalidade em ambos!”, contestou ela. E o graduado até hoje enfrenta pendengas burocráticas para receber um pedaço de papel que lhe permitirá exercer suas atividades legais enquanto economista. Este é um exemplo de que a burocracia nem sempre funciona?

Tomei como pessoal a angústia documental do formando, ainda que, à época, não tivesse sequer ouvido falar do romance que ora me apetece, e, como tal, comuniquei o problema histórico à minha chefa, que se comprometeu a consultar a procuradoria Jurídica da UFS em apoio ao graduado, cujos ancestrais já foram largamente vitimados pelos derramamentos de sangue nacionalistas, conforme metaforiza a bandeira do País, em que o vermelho diz respeito ao que corre em nossas veias. O processo de independência de Angola foi muito violento, como sói acontecer em qualquer questão que envolva a África, comumente desmerecida pelos interesses oportunistas e desumanos das grandes metrópoles mundiais. E, ainda hoje, 35 anos e dois dias desta data de suposta libertação colonial, o que não falta em Angola, infelizmente, é violência!

O que me traz de volta ao romance: os dois primeiros segmentos lidos forma escritos antes da tal data: “A Casa” data de 1961 e se passa nas circunvizinhanças de uma universidade lusitana, enquanto “A Chana” data de 1972 e se passa nas regiões desérticas que fazem fronteira com a Zâmbia. O tom de escrita entre um e outro segmento é muito diferente: no primeiro, há ainda a utopia de que o título fala, os personagens falam de sexo, de sonhos, de esperanças profissionais, de desejos familiares, de preconceitos e sub-preconceitos, de amor ao próximo, em geral, enquanto que, no segundo, o que há é fuga, é sangue, é a necessidade de comer que faz com que até mesmo corças em estado avançados de gravidez sejam decapitadas diante de uma fogueira rala. Diz um dos personagens: “a verdadeira luta de classes é a contradição que opõe os que passam o dia a pensar na barriga para a encher e os que, se nela pensam, é apenas para a esvaziar. E não me venham com teorias, esta é a única verdade”. E eu não venho com teorias. Calo-me, por ora, enquanto preparo-me para iniciar a leitura do terceiro segmento, “O Polvo”, escrito em abril de 1982. Meu sangue lateja!

Wesley PC>

“OPRESSÃO EMPREGATÍCIA” (POR DENTRO) OU A BUROCRACIA SÓ É RUIM PARA QUEM ASSIM A QUER!

Na manhã da última segunda-feira, irritei-me brevemente com um estudante de Engenharia Elétrica da UFS. Ele precisava de um documento específico para apresentar numa seleção de estágio e queria que, no documento, constasse uma informação adicional, que demandaria uma verificação adicional e um tempo extra para digitação. Disse-lhe que o documento levaria dois dias para ficar pronto, depois que ele apresentasse o comprovante de pagamento do mesmo, ao que ele arrebatou: “não é só digitar algumas informações num papel? Por que não tem como fazer isso agora?”. Bufei, mostrei-lhe a pilha de documentos em que eu estava trabalhando no momento em pauta e frisei, em tom iracundo mas solícito, o tempo estimado para entrega do documento: dois dias”. Ponto. Ele pagou a taxa e depois, na quarta-feira, veio buscar o documento, sem mais reclamações e em tempo hábil de entregá-lo à seleção de estágio que lhe interessava. Custava ter entendido desde o começo que nós, empregados do setor público, precisamos de um tempo mínimo para atender á enorme demanda por emissão de documentos?

Pois bem, a situação acima descrita é apenas uma das centenas de reclamações semelhantes que enfrento por semana, sentado quase 10 horas por dia diante de um balcão de atendimento aos alunos cada vez mais mimados da Universidade Federal de Sergipe. Vendo, na noite desta sexta-feira, o elogiado filme “Um Passaporte Húngaro” (2001), em que a cineasta Sandra Kogut filma a si mesma num périplo internacional em busca da nacionalidade magiar, à qual estavam afiliados os seus ancestrais, com o intuito de adquirir o passaporte nacional do título. “Por que tu desejas adquirir este passaporte e a nacionalidade húngara?”, pergunta uma burocrata. A cineasta fica calada, incapaz de admitir que se tratava de um mero pantim pequeno-burguês. Deu vontade de xingar na mesma hora. Péssima demonstração de exibicionismo subjetivista pseudo-reclamante.

Durante os tortuosos 72 minutos de duração do filme, a cineasta entrevista sua avó húngara, visita embaixadas na França e na Hungria e penetra as catacumbas documentais de um arquivo brasileiro, onde estavam registradas as chegadas de vários imigrantes europeus no Brasil, sendo que a maioria deles mudou de nome ao chegar ao país por causa das perseguições que sofriam por serem judeus. Como o avô da diretora do filme fora um destes que mudaram de nome, ficou ainda mais difícil para ela descobrir suas origens magiares, o que só se torna ainda mais burocraticamente grave quando ela deixa de apresentar sua certidão de nascimento para uma autoridade budapestense. Ou seja, ela queria ser naturalizada húngara não porque nascera na Hungria, mas porque os pais de um de seus genitores nasceram lá. E daí? Por que ela se achou no direito de transformar este acerto de contas xaroposo com as raízes de sua família num libelo contra a atrofia burocrática, servindo-se, para tal, dos piores estratagemas documentais em primeira pessoa? Péssima argumentação, abominável deturpação de elementos e interessantes, detestável filme. Fiquei envergonhado por ter desejado ver este filme, com um título tão gracioso, por tanto tempo. Erca!

Voltando ao DAA: na noite desta mesma sexta-feira, apareceu-me uma estudante de Administração Pública alegando precisar de um documento ainda mais complicado que aquele solicitado pelo estudante de Engenharia Elétrica. Comuniquei-lhe o prazo-padrão. “Mas eu preciso enviar este documento para Brasília até quarta-feira!”. Disse-lhe que tentaria entregar o tal documento na terça-feira à noite. Ela reclamou, disse que morava numa distante cidade interiorana, que não teria como buscar noutro dia. Insisti que eu tentaria lhe entregar o tal documento na terça-feira à noite. Ela disse, então, que o seu namorado podia aparecer no DAA no dia em pauta. Antes de vir para casa, deixei o documento digitado e impresso sobre a mesa de minha chefa, somente aguardando a assinatura dela e um carimbo, para se tornar completamente oficial e aceito em qualquer repartição pública do País. Comigo, burocracia funciona!

Wesley PC>

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

“TOT TORNA A COMENÇAR”

Há alguns dias, um amigo virtual enviou-me o endereço cibernético do videoclipe da canção-título desta postagem, faixa que abre o ótimo disco “Ordre i Aventura” (2010), quinto álbum de estúdio do grupo de ‘rock’ independente catalão Mishima. Nos últimos três dias, é ao som deste disco que eu me banho. Aquelas canções tristes, aquela voz apaixonada e moribunda do vocalista David Carabén, a declamada erudição cultural de todos os integrantes da banda, que citam poesia suicida homoerótica japonesa e filmes luteranos dinamarqueses enquanto falam de amor, de carência, do tema universal do desencontro, tudo aquilo me faz bem...

Por outro lado, enquanto estou a me enxugar e retirar os excessos aquosos de minha epiderme, é a faixa 2, “Una Cara Bonica”, que me faz companhia, repetidas vezes, a ponto de me fazer crer agora que ainda tenho qualquer aspecto evocativo adicional para comentar no que tange ao elogio truísta que não raro dedicado à noção devota de Beleza. E, mesmo que eu não tenha, segue aqui a letra da canção:

“Hi ha una veritat en una cara bonica,
rebela algún secret la seva bellesa.
Perque em fa feliç, tornar-te a veure
que em descobreixo una mica més quan et miro
Quin dels teus rinxols amaga un per sempre més?”


E, digo mais: utilizar um dos mais austeros filmes de Carl Theodor Dreyer - e um dos mais belos da História! - como base para um videoclipe é o tipo de “aventura” (tenho que usar uma das palavras contidas no título do disco) que me faz perguntar: eles realmente gostam de emular a ressurreição kierkegaardiana da esposa de um fanático religioso, morta após um complicado e demorado trabalho de parto, ou é apenas um mero truque “pimba” para fisgar os órfãos contemporâneos do “cineasta da brancura” e seus descendentes (in)diretos? Pelo sim, pelo não, após a terceira audição, o disco funcionou muito bem comigo. Recomendo-o!

Wesley PC>

SEMIÓTICA APLICADA A JOHN BELUSHI (E A QUEM MAIS PARECE COM ELE):

O comediante John Belushi morreu em 5 de março de 1982, aos 33 anos de idade, em decorrência de uma injeção de ‘speedball’, combinação fatal entre heroína e cocaína. Sua morte foi recebida com pesar pelos críticos, visto que ele representava com elegância atitudes sistematicamente iconoclastas, no seriado de TV “Saturday Night Life” e nos filmes “Clube dos Cafajestes” (1978) e “Os Irmãos Cara-de-Pau” (1980), principalmente. Vi poucos filmes protagonizado por ele, mas, ao contrário do que elogiam os críticos, desgostei de suas atuações, acho-as desagradáveis, no plano moral. Meus amigos boêmios gostam muito, mas eu não. Mas respeito quem gosta (risos). Tentaram até empurrar o comediante Chris Farley como substituto, mas este é ainda mais vulgar, inclusive no que tange ao motivo de sua morte: overdose de cocaína, como não poderia deixar de ser...

Que seja, esta introdução biográfica foi apenas um pretexto para lançar três proposições interrogativas neo-peirceanas sobre o que/quem esta foto me faz lembrar:

- Proposição interrogativa nº 1 (o ícone): John Belushi obviamente se parece consigo mesmo e parece muito com James Belushi, seu irmão, mas também se parece com outrem. Ou seja, guarda relações de similaridade icônica com ao menos uma pessoa que nasceu 4 anos e 13 dias após a sua morte. Pode-se dizer que há uma relação semiótica neste caso? Se eu fosse filiado às doutrinas analíticas da Filosofia, poderia iniciar uma provocação negativa, visto que isto seria uma semelhança “não-justificada”, mas... Sou continental demais para tanto (risos);

- Proposição interrogativa nº 2 (o índice): a morte e a carreira cômica de John Belushi seguiram-se à morte e à carreira cômica do insuportável Chris Farley, cujas similaridades contíguas beiram a imitação renitente. Há uma nova relação semiótica aqui, supondo que seja confirmada a decisão assumia do falecido Chris Farley em seguir os passos de seu ídolo também falecido? E se o novo avatar carnal de uma provável reencarnação terrena do John Belushi não fumar nem beber nem usar drogas, em respeito às determinações morais de seu pai? Que fiquem as perguntas no ar;

- Por fim, a proposição interrogativa n٥ 3 (o símbolo): seja o que for que eu pergunte, a resposta é SIM!

Wesley PC>

A DEMOCRACIA ENQUANTO FORMA DEGENERATIVA DA POLITÉIA

Assisti a um breve debate com o professor da USP Alberto Ribeiro G. de Barros no início da noite de hoje e, em seu discurso sobre “os obstáculos republicanos à corrupção”, ele citou uma taxonomia aristotélica, em que, junto à tirania e à oligarquia, a democracia seria uma forma degenerativa do que os gregos antigos entendiam como Politéia. Para além de qualquer julgamento mui precipitado ou chistoso que eu possa vir a fazer sobre o assunto, lembrei de imediato que estávamos em dia de eleição para o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFS. Eram 19h e eu ainda não havia votado. Quando tencionei fazê-lo, por volta das 21h, fui abordado por vários amigos, que torciam de formas diferentes para chapas rivais. As opções eram duas: ou eu votava na “chapa dos ‘hippies’” ou eu votava na “Entregação”. Por motivos que talvez eu explique nalguma outra oportunidade, optei pelos primeiros.

Opções e escolhas democráticas à parte, em seguida ao debate acima descrito, tive o prazer de assistir a outra palestra, também proferida por alguém que leciona na USP – agora uma mulher, professora doutora Maria das Graças de Souza – em que a conferencista abordava as diferenças de concepções rousseaunianas e condorcetianas para debater os rumos da educação pública contemporânea. Segundo a palestrante, muitas das reivindicações cabais da escola pública, conforme entendemos e legitimamos hoje em dia, têm seus fundamentos conceptuais no século XVIII, época em que viveram os dois teóricos utilizados como substrato para a fala da palestrante. Se, por um lado, a professora sintetizou as posições de Jean-Jacques Rosseau (1712-1778) sobre o assunto através da “primazia da vontade”, em que o amor à pátria é algo que deve ser estimulado tão primevamente quanto o aleitamento materno, por outro, as proposições de Marie-Jean-Antoine-Nicolas de Caritat, vulgo marquês de Condorcet (1743-1794), mereceram destaque por causa de seu insistente apelo racional e contra qualquer tipo de disseminação catequética nas escolas, que deveriam ser laicas e não atreladas aos interesses do clero. Tanto umas quanto as outras são arriscadas se seguidas restritamente, advertiu a professora. E, quando foram abertas as inscrições para debate, um colega de curso, visivelmente atrelado à postura reclamante da “chapa dos ‘hippies’”, ergueu a voz, reclamando que a universidade pública em que estudava não oferecia condições dignas de ensino. O Reitor estava presente e, depois de algum tempo, tentou se defender das acuações. Foi aplaudido pela platéia. Minutos antes, ele dizia que “a falta de instrução de algumas camadas sociais é o que explica os elevados índices de violência nas mesmas”. E, como não me ocorria em muito tempo, eu estava realmente com vontade de votar nas tais eleições para o DCE!

Encantou-me no sensato discurso da professora que ela frisasse que os problemas educacionais propriamente ditos da era em que vivemos são marcados por defasagens que são muito mais marcantes nos planos econômico e social do que necessariamente nas divergências teóricas sobre adoção de uma cartilha moral e cívica adequada para ser ensinada nas escolas. Por esse motivo, a professora mostrou-se apologética à revolta reclamante demonstrada por meu colega de curso e não questionou negativamente o enviesamento do debate, que, afinal, não tocou diretamente em nenhum dos pontos teóricos e históricos que ela tão bem destacou. Palavras de ordem mais apressadas conduziram a discussão, eventualmente interrompidas por pessoas que insistiam em manter seus aparelhos de telefonia celular emitindo ruídos altissonantes ou por comentários irônicos de partidários da chapa atualmente gestora do DCE. “Eu já fui lá, dar meu voto de confiança à chapa Integração. E tu?”, perguntou alguém que estava sentado à minha frente. Fingindo indiferença, eu continuei registrando as notas mais interessantes do debate em minha agenda. Foi uma palestra deveras produtiva, em suma.

Na verdade, a palestra em pauta fazia parte da programação de um evento promovido por um grupo de estudos de Érica e Política da UFS, em parceria com a Controladoria Geral da União. O objetivo central do debate era prestar esclarecimentos teóricos sobre a distribuição do erário público e temas afins, mas, como fui impedido de prestar a devida atenção ao evento, em razão de minhas obrigações profissionais, servi-me do mesmo para reafirmar a minha ferrenha indignação espectatorial contra apresentações docentes que pouco mais são do que leituras enfadonhas de textos que seriam muito mais profícuos no que tange ao estímulo do debate se tivessem sido previamente distribuídos aos membros da platéia. Oponho-me a este tipo formalmente empedernido de apresentação temática, do qual, felizmente, a professora Maria da s Graças de Souza se esquivou. Tanto é que, quando um aluno perguntou secamente a ela o que mata a razão?”, ela não se filiou aos risos incontidos do público e respondeu seriamente: “a superstição mata a razão”. E, neste momento, eu bem que poderia ter batido palmas de pé!

Wesley PC>

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

NÃO, NÃO, A INTENÇÃO ERA MATAR UM PADRE!

“Mas, que sei eu, se não há nenhuma outra coisa diferente das que acabo de julgar incertas, da qual não se possa ter a menor dúvida? Não haverá algum deus, ou alguma outra potência, que me ponha no espírito tais pensamentos? Isto não é necessário; pois talvez seja eu capaz de produzi-los por mim mesmo. Eu então, pelo menos, não serei alguma coisa?” (parágrafo quarto da segunda meditação cartesiana – “Da natureza do espírito humano; e de como ele é mais fácil de conhecer do que o corpo”)

Como sói acontecer, depois de uma madrugada de muita alegria temente a Deus, acordei moído pelo que parece ser uma conseqüência previsível da desobediência soporífera. Faltei à aula que deveria ter às 7h, mas uma colega de turma se prontificou em avisar que a professora não veio. Escutei um pouco de música ‘pop’ catalã e resolvi ir fantasiado para o trabalho, vestindo uma roupa intitula “eu não sou aquilo que eu não sou”: sapato social com um buraco do lado esquerdo, por onde se pode ver a meia; camisa de botão completamente amassada; perfume masculino diferente do que estou acostumado a usar. Como já estava atrasado, resolvi ir de ônibus. Mas teimavam em matar um porco perto de onde eu estava. Muitas mulheres grávidas atravessavam a rua para comprar pães. E eu sentia Deus. E lembrava que, quando ainda era uma criança elitista, tinha Fred Zinneman como um dos meus cineastas favoritos. E, com isso, eu mato a charada: ao contrário do meu interlocutor trifásico das postagens anteriores, desacredito que o relativismo seja o maior problema do mundo. Aí, ele vira as costas para ler. Quem sou eu para dizer que as atitudes de quem quer que seja são erradas?!

Wesley PC>

“O MAIOR PROBLEMA DO MUNDO É O RELATIVISMO” – PARTE III: EU NÃO SEI MAIS O QUE ESCREVER, MAS ESCREVO MESMO ASSIM!

Será que eu esqueci alguma coisa? Por precaução responsiva, seguem as fofocas dos que me circundam: um alega gostar de ficar deprimido pois pode tomar comprimidos que o fazem rir à toa; outra diz que eu sou suscetível aos vícios porque gosto de cumprir rotinas; uma terceira ameaça gritar com um subordinado injustiçado pelas denúncias de seres humanos incapazes de interpretar a sugestão modelar de uma procuração: um modelo é apenas um modelo, gente!

Vi, há pouco, um filme em que uma mulher morre depois que descobre que o marido está apaixonado por outra mulher. Ele conta para ele pouco antes de fazerem sexo pela última vez. “É a última vez”, diz ela. E ele goza. Se ela permanecesse viva, talvez eles gerassem um oitavo rebento. Mas ela sente uma forte dor no peito. Ela quer vomitar. Ela pede para não ser seguida. E chove. Tão bonito, meu Deus!

Hoje eu estou com vontade de falar sobre Deus: conversei sobre o assunto no trabalho e uma amiga adventista disse-me que “todo ser humano tem a necessidade de adorar algo. Por isso, a idéia de Deus”. Eu gosto de ter alguém para agradecer os lampejos infinitos de encanto que a vida me oferece. Por mais que esta infinitude pareça intermitente nalguns contextos. Quando eu era pequeno, sonhava em participar de um grupo de jovens franciscanos, mas sempre vetavam a minha participação por causa de minha sexualidade incandescente. Aos 7 anos de idade, eu respirava sexo. Para dentro e para fora. E, ao invés de eu ser acolhido, eu era rejeitado pro causa disso. Era como se a culpa fosse minha. Culpa minha? Hoje eu reconstruo com dificuldade um hímen anímico, destinado ao rompimento conjunto no auge vislumbrado de minha vida. Se me perguntassem agora se eu estou feliz, eu diria que SIM. “Se” duas vezes...

Wesley PC>

“O MAIOR PROBLEMA DO MUNDO É O RELATIVISMO” – PARTE II: UMA DECLARAÇÃO SIMPLES

Amo muito a minha mãe – e preciso dizer isso com mais freqüência.

(foto captada na noite de 9 de novembro de 2010)

Wesley PC>

“O MAIOR PROBLEMA DO MUNDO É O RELATIVISMO” – PARTE I: O DISCO QUE EU ESTOU A BAIXAR AGORA (EFEITOS IMAGINADOS)

Por mais cauteloso que eu seja em relação ao aliciamento semiótico, as palavras pregam-me peças. “Nomear é possuir”, diriam os barthesianos, mas eu não consigo entender como é possível que alguém possa insistir que a palavra ESTESIA seja mais nobre que o nome próprio de alguém que trabalha comigo, quando uma está irremediavelmente atrelada ao outro. Segundo o mesmo pressuposto, não se define DEUS a partir do conjunto de sentidos possíveis através da leitura de todos os vocábulos que constituem o seu verbete dicionarístico, mas a partir da simples observação da natureza ao nosso redor. E o salmo 116 sempre foi o meu favorito: “amo ao Senhor porque ele ouviu a minha voz e a minha súplica”. Amo. Faixa 4: “The Lung”, o pulmão. Respira-se a dúvida. O Senhor é bom e justo. Cheio de misericórdia é o nosso Deus. O Senhor cuida dos corações simples; achava-me na miséria e ele me salvou. Volta minha alma à tua serenidade, porque o Senhor foi bom para contigo. Pois livrou-me a alma da morte, preservou-me os olhos do pranto, os pés da queda. Na presença do Senhor, continuarei o meu caminho na terra dos vivos”. Ajuda-me muito neste trajeto saber que sempre há um dia após o outro...

Wesley PC>

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

LEVÍTICO 18:22: “COM HOMEM NÃO TE DEITARÁS, COMO SE FOSSE MULHER. ISTO É UMA ABOMINAÇÃO”!

Sempre fico impressionado com a pletora de temas que é comercializado sob um rótulo generalista de “subgênero homossexual”. Paralelamente aos estúdios hollywoodianos e aos filmes de culto cinefílico que são lançados ano após ano, existe uma indústria ‘gay’ que despeja estórias e mais estórias prototipicamente dramáticas sobre menininh@s que se apaixonam por outr@s menininh@s e entram em crise consigo mesm@s (no que tange aos valores morais apreendidos até então) e com a sociedade preconceituosa que @s rodeia. E, neste sentido, “Rock Haven” (2007, de David Lewis) tinha tudo para ser um daqueles filmes absurdamente enfadonhos e afetados, ao qual eu teria que assistir por mera obrigação profissional e extra-sexualista. Para a minha surpresa (surpresa!), mesmo ruim, o filme é funcional em seu clamor romântico e reivindicativo. E, como tal, não desperdicei 78 minutos de meu tempo ao prestar atenção em seu enredo entupido de clichês e situações comuns.

Sinopse: Brady é um mocinho de 18 anos, extremamente católico, que vai morar com sua mãe controladora numa pequena cidade à beira-mar. Lá, apaixona-se por um vizinho desleixado no plano religioso, que sempre lhe aparece em pensamentos quando ele está tomando banho. Se masturbação já é considerada pecaminosa por si só para os católicos, imagina pensar no pênis ereto de outro rapaz...! Brady se desesperava, atormentado pelas tentações negadas da carne. Seu corpo tremia, sua genitália pulsava, imagens de seu vizinho arreganhando o zíper irrompem na tela. Mas é pecado fazer isso, não pode! E ele chora, mas, com o tempo, percebe que seu sentimento não é tão herético assim e ele enseja até um namorico com o seu objeto de desejo. Aí, a mãe dele descobre tudo e... O resto só vendo o filme, mas não é difícil imaginar o que acontece. O final tinha que ser feliz, a fim de consolar os anseios do público-alvo, ou, no mínimo, conformador. E, em dado momento, um personagem diz ao outro, como se fosse uma reprimenda: “tua fé é maior do que nós dois”. Isso é errado?

Resposta: não, não é. Pelo contrário, é uma declaração boníssima de fidelidade, que está atrelada a um documento recente do Vaticano manifestando parecer obviamente contrário ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas sendo discreto na condenação deste tipo de comportamento: o que é condenável, segundo a Igreja, são as práticas homossexuais e não as pessoas homossexuais, como se houvesse diferença (risos). Em outras palavras: é permitido ser homossexual, desde que não se pratique a homossexualidade. Fácil, né?

Observação: ainda voltarei a falar sobre este assunto.

Wesley PC>

E, ENQUANTO FIDEL CASTRO SE VESTE, ERNESTO GUEVARA DE LA SERNA SE DESNUDA...

...OU “UMA POLÍTICA SE DELINEIA NA QUAL SERÃO IGUALMENTE RESPEITADOS O DESEJO DE JUSTIÇA E O QUE SE RELACIONA AO DESCONHECIDO” (SIC)

Ou, acreditem se quiser, mas a frase acima é a conclusão definitiva de Jean-François Lyotard no décimo-quarto e último capítulo, “A Legitimação pela Paralogia”, de seu famosíssimo livro “A Condição Pós-Moderna” (1979). Não sei se o problema está comigo, mas desgostei sobremaneira dos argumentos epistemológicos do autor para o que eu pensava ser o assunto central do livro, mas que, paralogicamente, é apenas um pretexto de abordagem sobre a crise da ciência moderna, num contexto que – juro, não sei se foi problema da tradução disponível ou de minha adesão recusada ao livro – foi melhor abordado por autores como Paul Feyerabend, Umberto Eco ou Slavoj Zizek, sem contar o meu queridíssimo Fredric Jameson. Sério, não entendi nada do livro e algumas frases pareceram-me realmente mal-escritas, como esta que adotei como subtítulo para esta postagem. Mas, que seja, ao buscar uma foto que representasse bem meu desamparo face à leitura desta obra, deparei-me com esta pungente captação de um momento de intimidade política mais íntimo entre o atual presidente cubano e um dos líderes revolucionários mais carismáticos de todos os tempos... E, caramba, esta imagem fala mais que o livro inteiro que acabei de ler! Nos comentários sobre este foto que encontrei no ‘blog’ do qual a retirei, comentavam até mesmo sobre um possível contexto homoerótico. Tudo, hoje em dia, é interpretação. Preciso rever “Memórias do Subdesenvolvimento” (1968, de Tomás Gutiérrez Alea) urgentemente!

Wesley PC>

terça-feira, 9 de novembro de 2010

QUANDO UMA COISA (LEIA-SE CONJUNTO DE COISAS) FICA REPETINDO, REPETINDO E REPETINDO EM NOSSA CABEÇA...

Depois da insônia perplexa e conseqüencial do dia anterior, acordei na madrugada de hoje para ver um filme cultuado por meninas apaixonadas e por ‘gays’. Meu interesse de futuro culto tinha outro foco: o diretor William Wyler, um de meus favoritos no que tange aos louvores da obsessão em Hollywood (vide exegese pessoal aqui). Penúltimo filme dele, tinha que ver!

Já tinha visto a continuação deste filme [“Funny Lady” (1975), de Herbert Ross] e não gostara muito, mas “Funny Girl – A Garota Genial” (1968) me manteve num estranho estado de estupor, que só foi intensificado pelo fato de eu estar meio sonolento, meio sonâmbulo, completamente apaixonado. Tão fantásticos os enquadramentos do fotógrafo Harry Stradling Sr. (vide foto), já acostumado a enquadrar a histriônica e carismática Barbra Streisand, que eu ficava mentalmente a fazer contagens milimétricas entre a posição de um dado objeto humano e para onde se dirigia o seu olhar, tamanho o rigor proporcional de cada seqüência. E as músicas? Apesar de eu não conseguir apreendê-las de todo – visto que vi o filme numa versão dublada, que ignorou a legendagem das canções – elas me possuíram, me invadiram como se fosse um emaranhado de lombrigas ávidas pelo consumo de minhas substâncias mais essenciais, consumo este tão parasitário quanto devolvido à minha própria identidade. E, assim, eu prefiro ser triste ao teu lado, o que me torna, por extensão, mais feliz do que ao lado de qualquer outra pessoa! Eu sou louco por ti, pois tu me fazes forte, mesmo quando não passas de um pensamento recorrente em minha mente. Estou tentando pensar noutra coisa, enquanto reorganizo em minhas impressões espectatoriais o que realmente eu achei deste filme, mas as letras das canções ficam indo e vindo e voltando e voltando e voltando...

Na madrugada do dia 18 de novembro, este filme vai ser novamente exibido na HBO2. Tomara que eu consiga despertar a tempo e revê-lo. Lindo, lindo! Não me diga para não voar, eu simplesmente consigo. Se alguém sofreu um derrame aqui, este fui eu e não tu. Quem foi que te disse que era permitido chover no meu desfile?

Wesley PC>

PIADA INTERNA: QUANDO VEM DE DENTRO E/OU VOLTA PARA LÁ MESMO!

Sintonizando alguns canais abertos e fechados de rádio e TV, pude perceber uma estranha revitalização do gênero humorístico conhecido como ‘stand-up comedy’, aquele tipo de comédia rápida em que um dado comediante sobre num palco, pega um microfone e improvisa, geralmente se servindo de exemplos ridículos pessoais (ou da platéia) para atingir o riso. Todo domingo, por exemplo, o programa do irritante apresentador de TV Fausto Silva é sintonizado por meus vizinhos, que hesitam em sorrir diante das piadas deste gênero que são destiladas na TV, mas acabam sorrindo, promovendo a revitalização de que falei no começo.

Pois bem, um dos fatores que mais dificultaram a apreciação do clássico “O Show Deve Continuar” (1979), obra-prima super-autobiográfica de Bob Fosse, entre alguns de meus amigos foi justamente a significativa participação que o enredo dedica a um destes tipos de comediantes, que tem funções dramatúrgicas renitentes tanto no plano sintagmático quanto paradigmático. No plano sintagmático, este cômico é o protagonista de um esquete fílmico que o protagonista tem a incumbência de editar, e que lhe causa estafa por não saber como fazê-lo, em meio à pletora de atividades profissionais e desordens sexuais de sua vida pessoal. No plano paradigmático, porém, as intervenções do cômico são ainda mais complexas: sua enumeração repetitiva de quais seriam os cinco principais estágios de enfrentamento em relação à morte é efetivo não somente no que tange ao falecimento vindouro (e espetacular) do protagonista como também ao que nós, espectadores e refratores, temos de similar a ele, enquanto seres humanos.

A base literária para as piadas ordinais do referido cômico (de nome de palco Frankie Man) encontra-se num livro da psiquiatra Elizabeth Kübler-Ross, que, em 1969, graças à publicação de seu “On Death and Dying”, propõe um modelo que leva o seu nome, composto pelos seguintes estágios progressivos: 1- negação e isolamento; 2 – cólera e raiva; 3 – negociação ou barganha; 4 – depressão; e, por último ou finalmente, 5 – aceitação: “tudo vai acabar bem”. Não vai!

Nas palavras chistosas do cômico, as reações correspondentes a tais estágios são melhor representadas pelos cinco monólogos a seguir:

1. “Não, não, não é bem isto não, não é isto está acontecendo não!”;2. “Pô! Que droga! Logo agora! Isto não pode estar acontecendo! Não vai ficar assim não!”;3. “Bom, e se eu fizer isto, (ou aquilo), será que não resolve? Deixa eu tentar”;4. “Éééééé... Não tem jeito mesmo. Eu sou um azarado mesmo. (Ou uma vítima, ou um desajeitado, ou um incompetente, ou...)”;5. “É. Já que não tem jeito mesmo, o negócio é deixar isso aí para trás e seguir em frente como der”.

Obviamente, não é somente em relação à morte que o Modelo de Kübler-Ross se aplica. Quando sabemos que um relacionamento (amoroso, amistoso, profissional, que seja) está prestes a chegar a um fim anunciado, as reações tendem a ser bastante similares. E, por ora, estou na fase da negação: não, não, não pode ser! Por que existe 17 de dezmebro neste calendário?!

Wesley PC>

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

OS BAIANOS QUE ME ALEGRAM DEVAGARZINHO...

Convidei um baiano para ver o filme do Arnaldo Jabor comigo amanhã. Ele ainda não me deu resposta; convidei uma baiana para ir comigo em casa hoje. Às 19h30’ de hoje, ela sairá do trabalho para trocar de roupa e convidar sua mãe para ir conosco. Tenho uma tia sergipana que está estudando em Salvador e, como tal, já está incorporando o sotaque e ouvindo Gal Costa a rodo, no afã pela obtenção reflexiva do sexo e da luz. E, por uma agradável coincidência que faz jus a ela, ouvi o álbum de estréia do Caetano Veloso, “Domingo” (1967), várias vezes de ontem para hoje, disco este que me foi apresentado por um baiano que já visitou Portugal e que me faz lembrar pungentemente doutro baiano por extensão quando o refrão de “Um Dia” (faixa 4) explode: “Abre os olhos, mostra o riso/ Quero, careço, preciso/ De ver você se alegrar”. Disco bom, suave, como não poderia ser diferente, em razão da produção caprichada do Dorival Caymmi.

Além da faixa destacada, a abertura egrégia com “Coração Vagabundo” já adianta a qualidade superior e nostálgica do disco, que também possui belos hinos lamentosos como “Onde eu Nasci Passa um Rio”, “Nenhuma Dor”, “Quem me Dera” e “Zabelê”. Suspeito, aliás, que ouvirei novamente este disco gracioso no caminho para casa, na noite de hoje. De vez em quando, faz bem relaxar ao som das vozes calmas de uma dupla singela de baianos. E, definitivamente, singelo é um termo que combina muito bem com esta bela conjunção de vozes e letras carinhosas. Recomendo audição renovada, tanto para quem foi quanto para quem ainda não foi à Bahia, que nem eu. Afinal de contas,

“Meu coração não se cansa de ter esperança,
De um dia ser tudo o que quer
Meu coração de criança não é só a lembrança
De um vulto feliz de mulher
Que passou por meus sonhos sem dizer adeus
Sem dizer adeus
E fez dos olhos meus
Um chorar mais sem fim
Meu coração vagabundo
Quer guardar o mundo
Em mim


Wesley PC>

SOLIDÃO MAIOR QUE A MINHA?

São quase 4 horas da madrugada e eu terei que estar acordado em breve, mas um tormento interior me afligia, uma sensação similar a uma esposa de 45 anos, 21 deles compartilhado com o mesmo homem, que de repente o flagra beijando uma prostituta adolescente e sem escolaridade e, depois de muito chorar, encontra abrigo numa igreja vazia, em que o sacerdote chorava também, por não ter mais a quem pregar a palavra divina de que se acredita portador. Eis a melhor descrição metafórica possível para tentar exprimir que tipo de sensação me toma agora, depois de finalmente ter visto “Flesh” (1968, de Paul Morrissey) na íntegra: não é só gozo, é religião, é epifania!

Na primeira cena do filme, o teofânico exemplar de perfeição biológica Joe D’Alessandro jaz numa cama, com a televisão ligada. Sua esposa o espanca com uma toalha, conclamando a acordar, visto que precisa de US$ 200,00 para realizar o aborto de sua namorada. Ele sequer tem uma cueca limpa para vestir e, a fim de embalá-lo melhor para presente de sua clientela, sua esposa faz um laço com uma fita branca em seu pênis. “Estás pronto, vai trabalhar!”. E ele sai de casa, em busca de clientes. Primeiro, uma foda rápida. Depois, um trabalho como modelo, enquanto um artista idoso passa meia-hora explicando suas concepções artísticas envolvendo o culto ao corpo humano. Joe não presta atenção. Tem fome. “O que temos para jantar?”, pergunta ele. Comida”, é a resposta do velho. Em seguida, vemo-lo discursar com outros michês que não se pode escolher ser heterossexual ou não num trabalho como o que eles executam. “Faz-se o que se tem que fazer”. E ele faz: na cena seguinte, ele está cercado por travestis idólatras de Hollywood, que logo cedem espaço para um afetado homossexual que lhe realiza uma felação forçada. Ao chegar em casa, esgotado de tanto trabalhar, ele é tachado de preguiçoso por sua esposa, que está a dormir com a nova namorada grávida, na mesma cama em que ele desmaia de estafa e ciúmes. E eu, ao lado dele, ainda estava envolvido por aquela cena mágica em que ele, completamente nu, dá de comer a um bebezinho, misturando exíguos pedaços de bolo ao suor que escorre de suas axilas. Poesia ‘underground’ em estado bruto, uma das mais belas exaltações do ‘white trash’ norte-americano que já vi no cinema, superado pelo mesmo diretor e protagonista quatro anos depois, no ainda mais tétrico e brilhante “Trash” (1972), em que os motivos da prostituição são ainda menos nobres: o vício da heroína.

Sou um rapaz conservador. Não uso muitas das substâncias psicotrópicas que meus amigos tacham de “expansores do músculo cerebral” (termo de Arnaldo Baptista) e que a imprensa hipócrita tacha de “drogas”. Não bebo. Não minto. Não faço questão de ter dinheiro. Se obtivesse êxito no que sou obrigado a diagnosticar como paixonite, seria o homem mais fiel e devotado do mundo, mas... Por que me identifico tanto com este tipo de filme? Por que encontro conforto em obras que beiram/transcendem o pornográfico e descortinam um universo de miséria concomitante à sensualidade gritante? Por que esta eterna impressão de desamparo? Seria eu blasfemo? Seria eu indecente? Seria eu desesperado? Sou eu apaixonado! 3h56’ da madrugada.

Wesley PC>

PÁGINA 36: “A QUESTÃO É QUE VOCÊ NÃO SABE O QUE É QUE ESTÁ PARANDO QUANDO PÁRA ALGUÉM”

Ainda não é desta vez que vou elevar a minha voz para dizer que sou fã do Cormac McCarthy, mas, definitivamente, não tem como permanecer psicológica e/ou sociologicamente incólume depois que se lê qualquer um de seus livros. Estou ainda no segundo, mas já tive a oportunidade de assistir a algumas bem-sucedidas adaptações cinematográficas de obras suas, sendo o ótimo “Onde os Fracos Não Têm Vez” (2007, de Joel & Ethan Coen), sem dúvida, o ponto máximo. E, não por acaso, entre as 14h e 23h de hoje, estive entretido, possuído, vidrado na leitura de “Onde os Velhos Não Têm Vez”, livro que o norte-americano Cormac McCarthy lançou em 2005. Escritor macho é aquele ali. E, portanto, cada página virada e cada vírgula eventualmente ausente eram como um soco de punho fechado em minha cara!

Não sei se parecerá de bom tom comparar o que filme e livro têm de diferentes, um em relação ao outro, mas existem tons bastante específicos em cada uma das versões da mesma estória. Se o filme dos irmãos Joel & Ethan Coen tomam algumas liberdades supressoras em relação ao livro (o tráfico de drogas é muito mais secundarizado no roteiro, a composição do matador Chiguhr é ainda mais lacônica e invulgar do que a descrição pormenorizada de seus olhos azuis faz supor, alguns personagens secundários são abandonados na versão fílmica), este é muito mais claro em sua “lição de moral”, em sua profunda visão de mundo, entrecortadamente pertencida ao envelhecido Xerife Bell, que abre cada capítulo com brilhantes e amargas reflexões sobre a decadência dos valores contemporâneos, o que explica porque o aparentemente pacato Llewelyn Moss se mete na enrascada em que se meteu por causa da valise de dinheiro sujo que encontra no deserto ou porque dois garotos brigam por uma nota de cem dólares que não queriam aceitar quando prestam socorro ao acidentado Chiguhr. E é o Xerife Bell quem tem a oportunidade conscienciosa de alertar-nos de que existe algo bem pior do que vender drogas às crianças nas portas das escolas: as crianças compram! E, como ele mesmo diz, “alguém que não saiba a diferença entre estuprar e assassinar pessoas e mascar chiclete tem um problema muito maior do que o meu”. E eu estava ao lado dele nesta conclusão!

Tanto estava que, na página 91 da edição da Alfaguara (2006) que me chegou às mãos, li um diálogo que fez com que eu exultasse os diretores da versão filmada do livro pela perfeita escolha do cínico e cativante ator Tommy Lee Jones como intérprete do quase onisciente Xerife Bell:

“ – Você já esteve num matadouro?
- Sim senhor. Acho que sim.
- Você saberia se tivesse.
- Acho que fui uma vez quando era criança.
- Lugar curioso para se levar uma criança.
- Acho que fui sozinho. Entrei escondido.
- Como é que eles matavam o boi?
- Havia um sujeito sentado numa baia estreita e eles faziam os bois passarem um de cada vez e esse sujeito os acertava na cabeça com uma marreta. Ele fez isso o dia inteiro.
- Isso mesmo. Já não fazem mais desse jeito. Usam uma arma de ar comprimido que dispara um pino de aço. Dispara até uma certa distância. Colocam esta coisa entre os olhos do boi e apertam o gatilho e pronto. É rápido assim”.


Segundo a instância narrativa do livro, o interlocutor do Xerife Bell aguarda que ele fale mais alguma coisa depois disso, mas ele não continuou. E eu me senti como os adolescentes futuramente estraçalhados em “O Massacre da Serra Elétrica” (1974), clássico do cineasta Tobe Hooper, em que uma explicação sub-reptícia mui semelhante para a explosão de violência contemporânea é utilizada, sob o viés empregatício da mesma modificação no modo de se matar bois. E, por ser vegetariano, o golpe foi duas vezes mais doloroso em mim. Este tal de Cormac McCarthy sabe bem sobre o que fala!

Além dos personagens diametralmente opostos Bell e Chiguhr, há no livro e filme, também, o deslumbrado e idiotizado Moss, que engendra semi-voluntariamente a onda de mortes que encharca de sangue a trama. E, por vezes, somos convidados literariamente a partilharmos dos delírios persecutórios do personagem, que é assassinado elipticamente em ambas as obras. De forma simplesmente genial, em ambas as obras, pois ele é apenas uma ferramenta, um instrumento discursivo, um avatar minúsculo de como o Mal se instala hoje em dia (se bem que os acontecimentos do livro se passam em 1980, mas completamente aplicáveis aos dias de hoje). E, nesse sentido, eu devolvo a voz da razão ao Xerife Bell: “acho que se você fosse Satã e estivesse sentado pensando em alguma coisa capaz de colocar a humanidade de joelhos você provavelmente se decidiria pelos narcóticos” (p. 180). Sem vírgulas. “Talvez ele tenha feito isso”, foi a resposta que veio em seguida. Eu que não queira dizer o contrário. Que venha o próximo livro de Cormac McCarthy. Em breve, eu assumo, aos gritos, que sou fã de seu estilo seco e picotado de contar uma estória cruel e ultra-realista (mesmo no terreno da ficção científica), mas, por ora, ainda acho seus personagens muito melhores do que ele. Se é que é possível desvincular criador, criaturas e contexto de criação, neste caso. E no sonho eu sabia que ele estava indo na frente e que ele ia fazer uma fogueira em algum lugar no meio de toda aquela escuridão e de todo aquele frio e eu sabia que quando chegasse lá ele estaria lá. E então eu acordei”. Eu também!

Wesley PC>

"E... Ui! Me vi gemendo de prazer que nem de dor."



"No ápice,em átimos
Que pareceram séculos...
Eu me banhei, e me lavei,
Em sexo e luz."


Devora Cruz

domingo, 7 de novembro de 2010

RÁPIDO, BOCETUDA! MATE! MATE!

Tudo bem que eu nunca duvidei que “Faster, Pussycat! Kill! Kill!” (1965), de Russ Meyer, seria uma obra-prima, mas fiquei surpreso, chocado, escandalizado quando, ao finalmente vê-lo, perceber o quanto ele é inteligente e ambíguo em seu discurso feminista. Ponho cá a interrogação: feminista? Não vejo porque não. Por que não? Exclamação!

Um fiapo de trama conduz a estória: logo na abertura, um narrador invade o espaço reservado à trilha de som para anunciar que “uma nova geração está surgindo: a geração faminta por violência, violência esta que assume diversas formas, inclusive... sexo!”. E ele estava sendo muito mais do que profético! No momento seguinte, somos apresentados às protagonistas do filme, que poderiam ser quaisquer umas, inclusive dançarinas de boate. E é o que elas são! Momento feminista – parte 1?

Numa cena posterior aos créditos, as ‘strippers’ vagam em seus automóveis esportivos pelo deserto, quando se deparam com um velocista. Ao vê-lo treinando, a líder do trio de ‘strippers’, Varla (vivida pela intensa Tura Satana), lança a primeira de suas grandes frases de efeito: “não sei que graça tem em lutar contra o relógio. Eu não faço isso. Prefiro derrotar pessoas. E não tento. Faço-o!” E por aí vai... Dois segundos foram mais do que bastantes para conheceremos por dentro esta personagem, da mesma forma que as asseclas vividas por Haji (a estrangeira Rosie) e Lori Williams (a lasciva Billie) são psicologicamente diagnosticadas em questão de segundos: uma ao acender um cigarro para sua chefa, outra ao rebolar freneticamente no calor do deserto, depois de ter se atirado feito louca num açude. Momento feminista – parte 2?

Depois que Varla quebra o pescoço do velocista, elas seqüestram a namorada adolescente dele e buscam guarita no rancho de um paralítico machista – indignado porque “as mulheres hoje votam, bebem e fazem sexo como qualquer homem” – que, por sua vez, tem dois filhos: um que lê até mesmo enquanto cose ou coze; e outro que é tachado de “Vegetal” tamanha a protuberância de seus músculos. Este é vivido por um tal de Dennis Busch, que, infelizmente, só participou deste único filme como ator. E foi para ele que meus olhos sequiosos convergiram na maioria das cenas. Momento feminista – parte 3?

A partir daqui, já posso anunciar o quanto o filme representou para mim em matéria de questionamento feminista: 1 – o diretor era fotógrafo da revista Playboy antes de se aventurar pelo cinema; 2 – não por acaso, ‘close-ups’ dos seios e dotes calipígios das atrizes são mais freqüentes que o próprio som de suas vozes; 3 – elas matam; 4 – elas batem; 5 – elas roubam; 6 – elas desejam e “não tentam, fazem-no!”; 7 – elas sentem fome, “e nem sempre é só de comida”; 8 – elas votam, elas bebem, elas fazem sexo livremente e elas brindam em homenagem a trens; 9 – parem de contar comigo e vejam o filme, genial até as tampas e, ouso dizer, genial, sim, este caralho!

Wesley PC>

“POR QUE AS CABEÇAS DELES ESTÃO TODAS RAPADAS?”, PERGUNTA A MINHA MÃE. “ESTILO”, RESPONDE O MEU IRMÃO.

Em outras palavras, hoje eu dormi mais de 10 horas pela manhã. E ainda continuo com sono. Cochilei nos intervalos capitulares do livro que estou lendo e, a cada vez que desperto, percebo que o sobejo de sono não faz com que nos sintamos descansados. Ao contrário: leva-nos a dormir mais e mais. O sono é um desejo básico e, como tal, deseja mais desejo, logo, mais sono. E esta foi a minha experiência do dia!

Na terça-feira retrasada, conforme já havia anunciado, decidi me submeter a um jejum voluntário, apenas para saber se, sentindo muita fome, eu ainda seria tomado pelas tristezas habituais que eventualmente narro aqui. Hoje, minha submissão voluntária é inversa. Abdiquei de ver a minha quantidade diuturna de filmes no dia de hoje apenas para saber o que acontece comigo se eu exagerar no sono, se eu dormir demais até mesmo para bem obedece a padrões soporíferos sobressalentes. O que é interessante (e bom) é que, até mesmo em cochilos, eu sonho. Ou tenho pesadelos, que seja, não raro revestidos de conotações erótico-pornográficas. Mas acho que é suficiente: vou voltar ao meu livro, que me obseda desde o meio-dia de hoje. Não consigo parar, mesmo admitindo que Cormac McCarthy e eu pertencemos a ambientes diferentes. Ele sabe bem o que é promontório e paisagem aluvial. Eu não sabia antes dele. Agora sei – e vou continuar sabendo, mesmo finda a leitura. Se tudo der certo, em uma postagem ou duas, eu resumirei o que o livro publicado em 2005 me causou. Garanto que tem a ver com quase tudo, menos com sono, por sua vez mui constante do “Purgatório”, publicado pelo italiano Dante Alighieri no século XIV, o qual terminei de ler entre uma soneca e outra, repetindo para mim mesmo o que fala uma alma atormentada: “ditosos o que a luz divina poupou ao guante rude e extraordinário da gula, que decerto os não domina, pois se contentam só do necessário!”.

Na TV, meu irmão assiste a um jogo de futebol entre os times do São Paulo e do Corinthians. Minha mãe passa pela sala e pergunta ao meu irmão: “por que as cabeças deles [os jogadores] estão todas rapadas?”. “Sei lá, estilo!”, responde o meu irmão.

Wesley PC>