sábado, 25 de dezembro de 2010

NÃO MAIS UM ESTAFERMO!

Acabo de ver, meio sem querer, a versão fílmica do Robert Zemeckis para “A Christmas Carol”, obra literária do ensebado e bem-intencionado Charles Dickens que já me recomendaram N vezes para ler, em inglês mesmo. O nome do filme era “Os Fantasmas de Scrooge” (2009) e tratava-se, conforme já foi dito, da enésima versão para a conhecida estória do velho avarento que é visitado por fantasmas do Natal Passado, do Natal Presente e do Natal Futuro. Não importa quantas vezes eu já tenha visto esta trama, eu quase sempre gosto dela. Identifico-me um pouco com o tal do Ebenezer Scrooge: detesto Natal! Fui ensinado ou obrigado a tal, desde pequeno, visto que algumas das brigas e dissensões mais violentas de minha família aconteceram durante o que deveria ser a comemoração desta data. Fiquei traumatizado!

Para o meu deleite e surpresa, o que mais me encantou no filme do versátil Robert Zemeckis foram as “brechas” na estória, além do aspecto demasiado sombrio de algumas passagens. Sem contar os personagens que são abandonados, mesmo que sejamos obrigados a sentir tanta pena deles... Personagens que são, acima de tudo, personagens e que, como tal, por mais que nos enterneçamos de suas agruras e possamos evitá-las se tornássemos homens mais felizes, é como se algo ficasse sempre por resolver, como se algo escapasse às nossas forças morais. Como me pareceu egocêntrico aquele desejo infantil final, transformado em canção na voz do Andrea Bocelli: “God bless us everyone”!

Fiquei com uma vontade plangente de ler este livro agora, conforme tanto já me recomendaram. Em inglês mesmo, visto que Charles Dickens tem aquele charme anglofílico clássico e caturra. E, enternecido e amargurado que eu não tenho como deixar de estar, percebo que meu vocabulário adjetivo se renova graças à obra-prima de Eça de Queiroz que leio. Não sou avarento, mas tendo a ficar defensivamente amargo por causa de paixões naufragadas do passado, do presente e, ao que tudo indica, também do futuro. Ou talvez não. Que elas não estão naufragadas coisíssima nenhuma. Tal como diz a criada Juliana ao final do sexto capítulo, “ – ‘Não se pode estar melhor! A barca vai num mar de rosas’. E acrescentou, com uma risadinha: - ‘E eu ao leme!’”. Quem me dera... Que Deus me proteja e que nos abençoe, a cada um de nós!

Wesley PC>

OS DISCOS QUE EU NÃO COMPREI PELA CAPA (VERSÃO 25 DE DEZEMBRO):

A rua em que habito é conhecida como uma das mais festivas do Conjunto Residencial Brigadeiro Eduardo Gomes, aqui no município de São Cristóvão - SE. Conclusão: a barulheira tipicamente ferial, associada ao final do mês de dezmebro, está altissonante, o que não impediu que, por diferentes motivos e recursos, eu dedicasse parte do dia de hoje à audição crítica de três discos recentemente baixados:

Reggae Resistência” (1988), de Edson Gomes: conforme citado abaixo, um disco clássico, que, em apenas 10 faixas, sintetiza porque este baiano faz tanto sucesso na periferia até hoje. “Sistema do vampiro” logo na entrada, “Malandrinha” em seguida e “rastafary” na faixa 03. Só por estas 03 faixas, dava para ficar repetindo, repetindo, que já fazia a cabeça de muita gente, mas ainda tem “Cão de Raça”, “Na Sombra da Noite” e “Samarina”. Uma jóia para ser ouvida em som alto, sem um pingo de vergonha integracionista!

The Holy Bible” (1994), de Manic Street Preachers: citei-o recentemente, no sentido de que é um disco melhor no papel do que nos ouvidos, mas, ainda assim, a faixa 04, “She is Suffering”, já é minha preferida. As demais faixas falam sobre suicídio, dor, automutilação, anorexia, campos de concentração, tristeza, abortos, traições, maldade inata e tudo aquilo que me chamou a atenção só de olhar a capa. À primeira audição, não é bem o que buscava, mas potencial é o que não falta...

• “Music Has the Right to Children” (1998), de Boards of Canada: minha mãe não gostou, porque os grunhidos contidos na faixa 12, “Aquarius”, a fizeram lembrar-se de meu irmão: “é a voz de Rômulo aí, é? Não? Certeza?”. Eu ri com isso, mas, no geral, este é um disco de música eletrônica ambiente, cadente, mais lenta, com poucas frases e repleta de repetições que justificam e/ou explicam o título do álbum. Não vou citar nenhuma faixa preferida, além da 12ª, visto que só o ouvi uma vez (hoje pela manhã, quando acordei), mas é bem agradável e dançante, ao mesmo tempo.

De resto, eu preferia um pouco de silêncio. Preciso prosseguir a leitura de “O Primo Basílio”. Preciso voltar para minha criada Juliana!

Wesley PC>

“ELE TRAZIA SEMPRE O SUOR NO ROSTO, O CORPO CANSADO, E NADA NO BOLSO”...

Estes são versos compostos e vociferados pelo cantor baiano Edson Gomes, sobre seu pai e sua atual configuração trabalhista racial, na canção “Hereditário”, faixa 08 do ótimo e já clássico disco “Reggae Resistência” (1988), que ouço agora, para ver se acalmo a fúria etílica do meu irmão Rômulo. Tento, mas, independentemente de funcionar ou não, está me sendo pitoresco comparar o seu discurso de arrependimento deste ano com o do ano passado. As mesmas lágrimas e a mesma lamentação (“eu vou mudar, neste ano eu mudo!”), enquanto segura uma lata de cerveja numa das mãos e uma pedra de ‘crack’ na outra. E, na Internet, um amigo virtual apresenta-me ao trabalho pictórico da canadense Agnes Martin (1912-2004), sob o pretexto de que este quadro abstrato anexado à postagem, datado de 1960, lembra a textura do tecido da camisa que eu vestia numa dada fotografia... E não é que parece mesmo?!

Caramba, o disco do Edson Gomes supracitado é muito curto - apenas 10 canções em 35 minutos e 37 segundos - mas como se mescla bem aos protestos familiares de meu irmão, como se parece com ele. E como é bom, acima de tudo, muito bom! Mas é também curto e, assim sendo, quando acaba, meu irmão sai de casa, reclamando que não tem dinheiro “para tomar uma”, não obstante estar com dois copos cheios de cerveja na sala, ambos enchidos por ele, que os abandonou pela metade, como se fosse um personagem mimado de M. Night Shyamalan. Na rua, a qualidade das músicas sendo executada é inferior, e eu penso seriamente em repetir o CD, para ouvi-lo com mais cautela nostálgica, visto que eu próprio projetei lágrimas recentes ao som de “Malandrinha”:

“Há muito tempo que eu queria ter um grande amor como você.
Que demorou, mas chegou e minha vida se transformou.
Todo tormento já passou. Em minha vida, tudo é amor.
Não esperava que, um dia, viesse ser feliz assim”...


Só canto até essa parte. Depois eu só danço. Não ouso esperar mais de um outrem inalcançável. E, lendo a biografia da tal da Agnes Martin, interesso-me particularmente pela ostensividade com que ela se afasta do abstracionismo racionalista (isso existe?) e mergulha num compêndio de traços e malhas cromáticas que remetem ao taoísmo, para ficar apenas num exemplo isolado e enciclopédico. Creio que voltarei a falar sobre ela no futuro, bem como sobre Edson Gomes, bem como sobre a toxicomania de meu irmão, bem como sobre as coisas que aprendo com meus amigos virtuais... E, se eu tivesse um pai, estaria agora seguindo os seus passos, trazendo o suor no rosto, o corpo cansado, nada no bolso, mas um sorriso largo e de enfrentamento, acima de tudo. Por que, mesmo sem pai, minha mãe me ensinou a agradecer: por isso, eu digo OBRIGADO!

Wesley PC>

PROPAGANDA ESPÚRIA DAS LOJAS AMERICANAS:

Na madrugada de hoje, um interlocutor frasal desejou-me “boas compras” natalinas, acrescendo o desejo escrito com várias onomatopéias de gargalhadas (KKKK). Era uma piada, facilmente compreensível e de muito bom tom sarcástico, na situação que ele e eu encontrávamo-nos no momento: ele, confinado numa festa em que canções pornográficas eram executadas sob um pretexto natalino troncho; eu, sofrendo o que sofri nas descrições imediatamente anteriores. Para além de eu achar graça ou não na referida piada, foi-me um alento sentimental deveras particular: tu que vem daquele interlocutor me faz bem e, como tal, lembrei-me de um episódio comercial recente, acontecido no interior de uma das filias das lojas fundadas em 1929, pelos norte-americanos John Lee, Glen Matson, James Marshall e Batson Borger: um rapaz foi comprar chocolates, enquanto outro ficou lendo o exemplar do livro de Máximo Gorki que acabara de comprar. Entre um e outro, várias pessoas, R$ 5,00 e uma porrada de sentimentos assimétricos. Para infelicidade de um deles, talvez a fila tenha sido rápida demais. E, por receio de irritar o outro com suas obsessões fotográficas incompreendidas, a contemplação haverá de ser mais mental do que material: o temor borrou a imagem, mas não obliterou os intentos passionais que se forçavam respeitosos. “Ele nunca tentou te agarrar a pulso, não?”, contou-me ele, transmitindo um receio externado por um parente. “Não, não, ele é uma boa pessoa”, disse-me ele, como sendo esta a resposta típica e defensiva a meu respeito. E, além dos chocolates, eu comprei alguns DVDs virgens nas Lojas Americanas, em 21 de dezembro de 2010.

Wesley PC>

E, SE HOUVER UM “ANO QUE VEM”, ESTE É O FILME QUE DEVE SER REVISTO!

Na primeira cena de “O Dia da Besta” (1995, de Alex de la Iglesia), um padre vira-se para outro e pede para se confessar. “Por quê? Tu pecaste?”, pergunta um. Não, mas vou pecar bastante. É a única forma de salvar a humanidade”, responde o outro. Uma cruz enorme despenca da igreja e mata um dos padres. O outro encontra um mendigo queimado vivo na rua, rouba a sua carteira e manda-o para o inferno. Era véspera de Natal, dentro e fora do filme. E minha mãe estava ao meu lado, sentada no sofá, gargalhando diante da genialidade anárquica deste filme primoroso, ideal para efetivar a catarse citada na postagem anterior. Não é um filme necessariamente triste nem muito menos perfeito (não obstante ser dramático em sua melancólica observação de um mundo em decadência que, ainda assim, merece ser salvo), mas resolveu o problema: curou a minha depressão natalina deste ano!

Nos 103 minutos de projeção deste filme espanhol mais do que inspirado, crimes são cometidos em prol da salvação da Humanidade, uma pletora de ‘heavy metal’ é ouvida e mencionada na trilha sonora, cogumelos amanitas são reivindicados enquanto complementos psicotrópicos para o transe que fundamenta qualquer experiência religiosa elevada, o Diabo se manifesta como um ser que sente inveja fetichista de Jesus Cristo, o charlatanismo de exorcismos televisivos é dilacerado e um grupo de assassinos que se autodefinem como "higienizadores citadinos" é metonimicamente citado enquanto denúncia contra os ataques xenofóbicos que vêm assolando a Europa desde bem antes da produção do filme. Em suma, "O Dia da Besta" é arrebatadoramente genial em toda a sua euforia, culminando numa bela declaração positiva de que o verdadeiro Bem deve ser praticado anonimamente. Se houver um “ano que vem”, eis o filme que eu indico prontamente para ser exibido num Natal em família. Maravilhoso!

Wesley PC>

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

EM BUSCA DA TRISTEZA PERFEITA NUM CONJUNTO DE CANÇÕES SUPRA-NATALINAS E, (IN)FELIZMENTE, NUNCA A ENCONTRANDO...

Eu queria estar trabalhando nesta noite de Natal. O trabalho liberta”: está lá, inscrito sobre as grades dos campos de concentração nazistas, hoje convertidos em zonas de turismo histórico. Num telejornal, visto há pouco, uma repórter perguntou a uma mendicante o que ela estaria fazendo durante o ‘réveillon’: “estarei nas ruas, pedindo escolas, mas os meus filhos ficarão em casa, viu?”, disse ela para a câmera. Na janela do meu quarto, um irritante pisca-pisca executava canções natalinas tradicionais. E eu imaginava se, em algum lugar do mundo, alguma mulher pobre estaria sendo infibulada com pedaços de vidro extraído de uma árvore artificial comemorativa. Tomara que não. De coração, tomara que não. “Haveria arte sem tristeza?”, perguntou-me um menino bonito, com um largo pedaço de pizza de mussarela nas mãos, na noite de terça-feira. E, como sói acontecer, ano após ano, meu irmão senta em frente a nossa casa e chora. Diz que vai parar de usar drogas degenerativas, mas... Entediado, taca fogo numa pedra de ‘crack’, depois noutra, depois noutra... Minha mãe chupa tangerinas no sofá, enquanto eu busco discos tristes na Internet. Queria ouvir algo completamente impregnado de sordidez, a fim de introduzir a catarse neste coração apertado sabe-se lá por que. O que está me incomodando, meu Deus?! Por dentro, me sinto tão bem. Estive ao lado de quem queria ontem, estou vivo, vejo, ouço e tenho o dom de falar e escrever, mas um desconforto atroz me persegue. Pus algumas faixas do disco “The Holy Bible” (1994), da banda galesa Manic Street Preachers, para serem executadas, enquanto me empanturrava de chocolate, em cima da cama de minha mãe. As letras das canções são impregnadas da tal “tristeza perfeita” citada no título perscrutador desta postagem. Uma delas menciona uma mulher que está sofrendo. Outra descreve o cotidiano de alguém que se define como um aborto ambulante. Uma terceira demonstra como um prego enferrujado é ideal para se rasgar a perna enquanto se morre no verão. O compositor das canções se suicidou. Supostamente, pulou de uma ponte. Seu corpo nunca foi encontrado. A inscrição na entrada do campo de concentração de Dauchau foi uma de suas principais inspirações compositivas. Eu acredito que é importante ter musos na arte. Minha cadela tem medo de fogos de artifício e minha mãe não pode assistir TV no quarto porque este recinto está impregnado de fumaça tóxica. Não é desta vez. Por dentro, eu me sinto bem. Aquele menino é tão bonito... Meu muso!

Wesley PC>

SEMPRE SE PODE DESCER O NÍVEL UM POUCO MAIS!

É nesse tipo de situação que eu me lembro de um famoso chiste recorrente dum professor de Filosofia amigo meu, que, ao comentar a subsunção voluntária à decadência por parte de algumas pessoas, acrescenta: “quando se pensa que estas pessoas já desceram de nível o suficiente, elas retiram uma pazinha dos tornozelos e cavam mais!”. Eis como eu me sinto agora, depois de ter sobrevivido à sessão de “Os Vampiros Que Se Mordam” (2010, de Jason Freidberg & Aaron Seltzer), pseudo-paródia apologética dos filmes “Crepúsculo” (2008, de Catherine Hardwicke) e “A Saga Crepúsculo: Lua Nova” (2009, de Chris Weitz), respeitando, inclusive, a linearidade narrativa de ambos os filmes, sendo muito pouco cômica em relação à já ridícula concepção da cinessérie. São apenas 82 minutos de duração, mas... Como demoraram a passar!

Apesar de a atriz principal (Jenn Proske, iniciante e recém-graduada em Teatro pela Universidade de Boston) ser realmente boa e estar visível e compreensivamente constrangida na maioria das seqüências e de eu ter gostado da canção interpretada pelo Marilyn Manson (“If I Was Your Vampire”) que é executada durante os créditos finais, o filme não presta porque: a) tem como base para suas piadas algo que já não presta; e b) ri de si mesmo, crente de que assim riríamos também, conforme se destaca na seqüência em que uma alcatéia descamisada de lobisomens assume que faz parte de um grupo dançante ‘gay’. Por que razão eu vi este filme? Por que eu me submeto a este tipo de coisa? Apesar de isto já ter sido motivo de várias brigas intelectuais com o autor da frase acima, sinto como se eu precisasse estar constantemente “vacinado” contra estas execráveis abominações da Indústria Cultural e, partindo de minhas crenças homeopáticas, a vacina e o veneno se confundem, visto que tendo a me interessar carnalmente por pessoas que se interessam por estes produtos e, como tal, preciso ter assunto com elas, nem que seja para falar mal... O ciclo de relações e justificativas é infindável e talvez inconvincente, mas é pessoal. Por isso, não reclamarei. Ao invés disso, comemorarei: eu sobrevivi não somente à então trilogia fílmica baseada em romances adolescentes da Stephenie Meyer(da qual, não li nenhum livro) como também ao abjeto “Os Vampiros Que Se Mordam”! Mas, só por precaução, é melhor ver algo que presta da próxima vez (risos)...

Wesley PC>

‘TE QUIERO, PUTA!’

Descobri o filme “Garotas de Programa” (2004, de Maria Lidón) graças a uma equivocada informação que o atrelava ao realizador catalão Bigas Luna – posto que é assim que a diretora assina seu filme, à època: Luna – mas me decepcionei deveras com seu conteúdo: a esbelta e loira Denise Richards interpreta uma antropóloga juvenil que decide escrever uma tese sobre homens e mulheres que se prostituem na Europa. E, aos poucos, a narrativa do filme vai se confundindo com o pseudodocumentário realizado pela personagem. Mas é tudo tão moralista, tão ruim, que lamentei ter gravado este filme de forma parcialmente indelével no disco em que selecionei produções culturais polêmicas com as quais tenciono espantar a famosa depressão natalina que me persegue. O filme é tão ruim que estimula a depressão, um lixo!

Entretanto, como não só de filmes ruins sobre prostituição vive o mundo, na noite de ontem reassisti ao clássico “Nazarín” (1958), da fase mexicana de Luís Buñuel. Tencionava presentear com este filme o irmão de um ex-colega de trabalho, que, coincidentemente, estava a visitar uma igreja localizada no conjunto residencial em que habito, mas uma contingência silenciosa impediu a efetivação de minha entrega material. Fica para domingo, portanto.

Revendo o filme, realizado pelo “ateu, graças a Deus” que recebeu o devido reconhecimento do Vaticano, deixei de gemer de satisfação diante da devoção eclesiástica e humilhante do protagonista por alguns instantes para perceber como o diretor inseriu dignidade na trama secundária do anão que se apaixona por uma prostituta que deseja se reabilitar. Tu és tão feia, mulher pública, mas eu te estimo muito”, diz o anão. “E tu pareces um girino sem patas”, responde a prostituta, “mas eu também te estimo”. A “justiça dos homens”, entretanto, impedirá que eles concretizem o amor que sentem um pelo outro. Mas já era tarde para impedir os efeitos benéficos em minha mente: eles se amavam, por mais párias que fossem considerados, um em relação ao outro. Como (quase) sempre, isso me basta. Por isso, canto ao som da banda alemã Rammstein:

“Entre tus piernas voy a llorar
Feliz y triste voy a estar
(...)
Te quiero, puta!”


Wesley PC>

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

...E DECLARAÇÕES DE AMOR!

“Tinha suspirado, tinha beijado o papel devotamente! Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades, e o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas, como um corpo ressequido que se estira num banho tépido: sentia um acréscimo de estima por si mesma, e parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante, onde cada hora tinha o seu encanto diferente, cada passo conduzia a um êxtase, e a alma se cobria dum luxo radioso de sensações!”

Literariamente, este é um dos trechos iniciais do sexto capítulo de “O Primo Basílio” (1878), de Eça de Queiroz, romance que me encanta sobremaneira em razão da fecundidade aplicativa de um apotegma proferido por seu autor: “o realismo é a anatomia do caráter”. Oh, como é! E o meu caráter, neste exato momento, está irradiado por reações muito semelhantes às que tomam a protagonista Luísa no trecho destacado, que também aparece na primeira faixa do disco “Memórias, Crônicas e Declarações de Amor” (2000), da encantatória Marisa Monte. Na faixa em pauta, seu amigo Arnaldo Antunes profere os prosaicos versos destacado, ainda mais efetivos no videoclipe da canção, tão mal-compreendida por alguns fãs da artista, quando caiu no gosto popular à época, em razão de ter sido tema de telenovela, etc., etc.. Acho que ouvirei este disco na volta para casa, mais tarde...

No mesmo disco, “O Que Me Importa” também fez muito sucesso popular, mas, como o título do disco deixa bem evidente, há muito mais amor declarado do que somente nestas duas faixas. É um disco muito bom, ainda que mais “fácil” do que os trabalhos anteriores da cantora. Fácil no sentido de que suas composições e referências, aqui, são acessíveis a um público midiático muito mais largo. Amor é quase um clichê, amor é um truísmo, amor é base! E, como tal, eu sou um clichê, um truísta, mas deste sentimento básico não me esquivo. Se me perguntassem agora, diria que estou feliz. Citando novamente a eterna Joana d’Arc: “se não estiver, que Deus me faça estar; se estiver, que Deus me conserve assim”. Amo: “isso me acalma, me acolhe a alma. Isso me ajuda a viver”!

Wesley PC>

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

“ÉRAMOS COLEGAS, AMIGOS... HOJE SOMOS CONCORRENTES. A VIDA É ASSIM: IRÔNICA... E BELA”!

Por mais que eu repita para mim mesmo que “Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos” (2010), de Woody Allen, é um filme menor, não paro de pensar nele desde ontem. Acordei tão satisfeito... No ônibus de ida, uma mulher conversava com uma amiga, dizendo que se casar é a razão da existência humana na terra: “temos que ter alguém ao nosso lado quando formos velhos, né?”, perguntou ela. Respondi mental e reticentemente:o que eu não daria por isso”... E o filme, de certa maneira, falava justamente sobre isso. E o resto é segredo. Ponto para Woody Allen, como sempre. Envelhecer é divertido!

Wesley PC>

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

E SE EU DISSER QUE VINCENT VAN GOGH (1853-1890) SE MATOU DEPOIS DE PINTAR ESTE QUADRO?

A pergunta não é minha, mas do crítico de arte John Berger que, num dos vários exercícios válidos de apreciação artística contidos no livro coletivo seminal “Modos de Ver”, nos pergunta o que achamos deste quadro antes de fazer o questionamento acima. Aliás, acrescenta: depois que sabemos que o artista se suicidou depois deste quadro, a pintura por si mesma é acrescida de elementos dramáticos e trágicos não facilmente perceptíveis. Ou talvez já percebidos, mas não com a mesma amplitude. Antes, é uma paisagem tomada por aves daninhas. Depois, é o doloroso testamento de um artista incompreendido em seu próprio tempo. Ou algo parecido.

Façamos de conta que o que eu quero dizer com esta postagem está sendo mentalmente decodificado: uma zonzeira atroz em minha cabeça, uma expectativa, uma vontade de rever o filme mais assumidamente onírico de Akira Kurosawa, o medo de que tudo saia errado num encontro aguardado desde que fevereiro de 2010 raiou no horizonte de minhas frustrações anuais... A cada dia, aproximo-me mais e mais de Vincent Van Gogh, sem o mesmo talento, é claro. Se ele dedicou boa parte de sua carreira a expressivos auto-retratos, eu dedico a quase integralidade de minha vida a auto-expressões. E, por sorte, minhas orelhas são pequenas. E tenho que comprar fones de ouvido hoje. Na foto: “Campo de Trigo com Corvos” (1890). No ouvido: “Hurt”, em versão inicial de Trent Reznor, comandando sua “banda de um homem só”, Nine Inch Nails:

“I hurt myself today
To see if I still feel
I focus on the pain
The only thing that's real
The needle tears a hole
The old familiar sting
Try to kill it all away
But I remember everything”


E, pelo visto, sentido, pintado e ouvido, esta canção voltará aqui mais e mais vezes!

Wesley PC>

SABE QUANDO NÃO SE ACREDITA APRIORISTICAMENTE, MAS SE INTERPRETA CORRETAMENTE ASSIM MESMO?

Hoje eu tive um pesadelo esquisito (pesadelos costumam ser esquisitos!): um rapaz lacônico e de cabelos compridos – com o qual até tento conversar de vez em quando, mas discordamos veementemente no que tange a alguns posicionamentos de prática política – assistiu ao filme feminino “Flores de Aço” (1989, de Herbert Ross – ainda não visto por mim) durante uma viagem de barco e ficou sem entender o que o filme quis dizer. No pesadelo, o filme tinha 180 minutos de duração e eu já o tinha assistido várias vezes, de maneira que tentei explicar o conteúdo do mesmo ao rapaz com base em explicações subliminares sob o uso discursivo do conceito filosófico de “tabula rasa”, que, em termos enciclopédicos, implica em dizer que o homem nasce como se fosse uma “folha em branco”, de maneira que seu aprendizado é prioritariamente baseado no recurso da tentativa e erro, na experimentação propriamente dita. O empirista John Locke (1632-1704) explicaria melhor este conceito em suas obras. A mim, restou apenas ser despertado apavorado de um uso obliquo no interior de um sonho!

Passado o susto inicial, pude perceber que os elementos deste pesadelo real advieram de eventos que marcaram a minha noite branda de segunda-feira. Assisti ao filme “Criatura do Mar Encantado” (1961, de Roger Corman – este da foto), ‘trash’ por excelência, cujo roteiro mescla política contra-armamentista com romances insulares com tramóias de contra-espionagem com um monstro marítimo fubenga que se alimentam de carne humana e ouro. Tem como não se despertar de pesadelos depois de se assistir a um filme destes?!

Num intervalo auto-atribuído a este filme, saí de casa e visitei um vizinho febril, que bateu a porta de seu quarto, irritado por causa da dor física que sentia, largando-me sozinho no meio da sala, enviando mensagens de celular a um moço que estava justamente sendo acusado por mim de ser lacônico. Ele respondeu-me da seguinte forma: quanto mais lacônico, menos espaço para o erro. Frases curtas, pra que mais?”. Eu discordo. No mesmo momento, escrevi-lhe um texto enorme, defendendo o erro enquanto experiência gnosiológica, assumindo a mim mesmo como demonstração efetiva da validade conceitual do que Edgar Morin chamava de “hipercomplexidade”, a capacidade cerebral de reagir beneficamente, através da criação de novas sinapses, a estímulos objetivamente determinados como sendo “erros”. É assim que eu (sobre)vivo, aliás. Errando e errando! Por isso, tenho pesadelos como este... E depois venho aqui, relatá-los!

Wesley PC>

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

“EU NÃO SEI O QUE EU FARIA SE FOSSE CEGO”... “ACOSTUMARIAS-TE”, DISSE UM PERSONAGEM CEGO, EM PRONTA RESPOSTA.

Quando eu era pequeno, imaginar se um deficiente visual sonhava com imagens era uma reflexão recorrente. Desde esta época, portanto, ficar cego era uma possibilidade que muito me atemorizada. Nos últimos dias, em razão de uma forte dor em meus globos oculares, pensei novamente neste dilema, nunca respondido a contento desde que eu era criança: com o que os cegos sonham?

Por pura coincidência, no meu horário de almoço de hoje, assisti a dois curtas-metragens sobre o tema. No primeiro, “O Cego Estrangeiro” (2000, de Marcius Barbieri), mais interessante na proposta que em sua execução, um narrador cego conta à platéia a estória de alguns homens que se apaixonam por uma funcionária de livraria, viciada em leitura, sendo que, a fim de conquistá-la, eles passam a ler bem mais. Tudo o que vemos são uma tela negra e as legendas, visto que o cego fala num idioma inventado para o filme. No segundo, “Eu Não Quero Voltar Sozinho” (2010, de Daniel Ribeiro), quase uma obra-prima, um rapazinho cego apaixona-se por um colega de classe, causando ciúmes em sua melhor amiga, apaixonada por ele. O primeiro vale pela tentativa. O segundo é uma aula de tudo o que de melhor pode ser atrelado ao Cinema enquanto diversão, projeção onírica e requisição por diretos humanos. Vale a pena falar mais um pouco sobre o segundo, portanto.

Em “Eu Não Quero Voltar Sozinho”, o protagonista, cego desde que nasceu, pergunta a sua melhor amiga se ele é bonito. Ele é. Num dado momento, ele convida o rapaz por quem é apaixonado para visitar a sua casa e, crente de que este está escovando os dentes num banheiro, é flagrado cheirando uma peça de sua roupa. Ninguém reclama de nada, visto que, segundo ele, uma das vantagens de ser cego é que todos lhe prestam favores o tempo inteiro. Porém, o brilhante roteiro do filme é mais complexo do que isso: lida com as nuanças passionais de uma forma encantadora, nada óbvia, salvo por uma decisão mui precipitada no trecho final. Mas nada que tirasse o encanto do filme. Tornou-se um dos meus favoritos deste ano. E, não por acaso, fui incluído entre os personagens que ampliaram os hábitos de leitura por causa da paixão sentida por alguém, conforme anunciado no desfecho de “O Cego Estrangeiro”. Será que eu me acostumaria mesmo com a cegueira? Pelo sim, pelo não, estes dois interessantíssimos curtas-metragens demonstram que, na situação hipotética em pauta, este seria o menor dos meus problemas...

Wesley PC>

DO ATO DE FALHAR...

Apesar de estar me graduando em Jornalismo, não é comum eu me sentar diante de uma TV para assistir a programas noticiosos. Minha mãe, por outro lado, costuma deixar a TV ligada em volume altissonante, a fim de acordar eu e meu irmão, para que possamos ir para os nossos respectivos empregos. Na manhã de hoje, ainda sonolento, ouvi uma notícia peculiar, que muito me interessou: um rapaz, depois de ter se decepcionado num relacionamento romântico, tentou acabar com a própria vida, atirando duas vezes contra a própria cabeça. Não morreu. Está internado num hospital, em estado grave e, quando se recuperar, será preso, visto que atentar contra a própria vida, segundo a Constituição brasileira, é um ato criminoso. Conclusão: além de ser preso, ele vai ser extremamente vigiado, para que não tente se suicidar novamente. Pós-conclusão: a vida é um direito individual, mas também é um sério dever estatal!

Tentei encontrar uma ilustração artística que metonimizasse bem a angústia que me tomou diante desta notícia. Motivo: apesar de eu ser pessoal e radicalmente contra o suicídio, a tentação (leia-se fraqueza) é eventual. Diante do episódio de estréia do seriado televisivo “The Walking Dead”, visto no último sábado, eu (enquanto espectador) e um dado personagem (enquanto protagonista ativo) compartilhamos o pavor de estar cercado por zumbis, debaixo de um automóvel. Agoniado que eu e ele ficamos diante da dor possivelmente resultante das mordidas fatais dos mortos-vivos, atirar contra a própria têmpora pareceu uma solução atenuante diante do tormento dorido. Ele pede perdão imaginário a sua esposa, que não vê faz tempo, e atira. O que acontece? Só vendo o seriado ou acompanhando os telejornais para saber. A vida é assim mesmo!

Wesley PC>

domingo, 19 de dezembro de 2010

• UMA CITAÇÃO, À GUISA TITULAR: “IMPUREZAS DO MUNDO NÃO ME ROÇAM/ NEM A FÍMBRIA DA TÚNICA SEQUER”...

• Uma dedicatória:para meu querido Werlinho, a quem tanto devo. Eis que tento ressarci-lo com todo o meu amor. Amo-te! A ti presenteio, fazendo uso do romance que mais amo. Um pouco de mim, para ti!”. Era uma amiga de infância, que sobrevivera bravamente às minhas amizades de infância;

Um título e um subtítulo: “O Primo Basílio – Episódio Doméstico”. Era o português Eça de Queiroz, em 1878, legando ao mundo um de seus romances mais famosos, em que a expressão singular “episódio doméstico” revela-se, desde já, como um coletivo de pequenos episódios domésticos, que se somam, mesclam-se, encantam e preocupam;

• Uma advertência: “no livro do Eça de Queiroz, há também um personagem chamado Reinaldo, Wesley! E este personagem é importante. Não é como o Reinaldo que aparece em ‘Hamlet’, de William Shakespeare”. Assim me disse um terceiro Reinaldo, ciente do poder que o seu próprio e simples nome tem sobre mim e sobre as projeções de identificação inversa que depositarei sobre este livro, há muito desejado e agora plenamente saciado por minha amiga de infância, Mara Jane, a quem amo em retorno.

• Uma época de recepção: assim sendo, às 16h do décimo nono dia do mês de dezembro deste ano da graça de Nosso Senhor, eu inicio a leitura deste precioso romance realista. Consumi os dois primeiros capítulos, equivalentes a cerca de cinqüenta páginas e 1/8 do romance completo. No trecho até então lido, conheci os percalços íntimos dos personagens, seus recatos e seus preconceitos. E, num sábio joguete metalingüístico, um dos convidados da protagonista Luísa, que em breve será infiel, narra uma peça teatral de sua autoria, em que uma adúltera é lançada ao escárnio público: merece ela o perdão ou a morte? O marido de Luísa proclama impiedosamente: “sou inteiramente pela morte!”. Meu coração lateja mais forte neste instante. Quantas emoções ainda me esperam!

• Um parágrafo longe de ser conclusivo: não sei se por sorte ou por mera contingência, o personagem de nome Reinaldo ainda não surgiu no romance. Mas, de alguma forma estranha, este nome é o que grita mais alto a cada página. Tenho muito a ler ainda. Desligarei o computador. Que venha a noite!

Uma assinatura pessoal: Wesley PC>

“O VERDADEIRO VAMPIRO É O TEMPO – (...) É ELE QUE SUGA A VIDA. MESMO A NOSSA” (página 67)

A frase é do livro “O Vampiro que Descobriu o Brasil” (1999), de Ivan Jaf. A imagem é do filme “Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosa” (2003, de Tim Burton), quando o protagonista explica aquele momento em que o tempo parece parar quando nos deparamos com a pessoa que amamos. A reflexão concatenadora é minha, mas poderia ser de qualquer pessoa. Qualquer pessoa! Bem que poderia ser qualquer outra pessoa...

O livro em pauta é recomendado como leitura obrigatória em muitos colégios públicos sergipanos. Um vizinho presenteou-me com uma fotocópia do livro certa vez, mas nunca tive um interesse efetivo de lê-lo. Pensei que se tratasse de um livro infantil convencional, que forçasse comicidade a partir de fatos históricos legítimos. Depois que vi um formando em História atribuir a cotação máxima a este livro numa rede social cibernética de leitores, resolvi arriscar uma leitura. E como me surpreendi: o livro possui âmago dramático, para além de suas interessantes reflexões tragicômicas sobre a História de nosso país, como o destaque para a ausência de pescoço no presidente militar Camilo Castelo Branco (risos). Dizendo de outra forma: o livro, muito curto, narra o périplo de mais de 500 anos de um taverneiro português que, tendo sido mordido por um vampiro, chamado de O Velho, fica incapacitado de vivenciar alguns de seus prazeres favoritos, como fazer sexo, bebericar vinho ou comer bacalhau. O resto do livro, portanto, mostra-o caçando seu algoz eterno, a fim de recuperar a capacidade de pôr novamente um pão na boca, sem vomitar.

O filme em pauta, por outro lado, denota uma triste inversão valorativa dos interesses tramáticos de Tim Burton, que agora parece mais preocupado com a realidade convencional, abandonando o seu apreço característico pela fantasia mitômana. Dizendo de outra forma, o roteiro deste filme, realizado quando o próprio diretor enfrentava o luto por seu próprio pai, narra o conflito entre um filho ‘yuppie’ e seu pai contador de histórias. Ao final, o filho vence enquanto ponto de vista dominante, ainda que o diretor deixe espaço para nossas fantasias. Depois deste filme, Tim Burton será cada vez menos merecedor de seu próprio nome...

E, paralelamente a isso tudo, de fato o tempo pára quando vemos quem amamos. Mas, de fato, o tempo talvez seja o verdadeiro vampiro. Estar ao lado de quem amamos, portanto, é a única forma de paralisar o vampiro. Mas se quem amamos não pode estar perto, o vampiro vence. E o vampiro suga... e suga... e suga!

Wesley PC>