quinta-feira, 10 de março de 2011

DIRIGIDO PELO MESMO AUTOR DE “OH! REBUCETEIO” (1984)...

A atuação metalingüística do diretor Cláudio Cunha no ótimo filme citado no título desta postagem leva-nos a imaginá-lo como uma personalidade comumente debochada, que realmente se masturbava ao nosso lado naquela orgia teatral que faz a graça de seu canônico e derradeiro filme qualitativo. Qual não foi a minha surpresa, portanto, ao assistir ao pouco conhecido “Amada Amante” (1978) na noite de ontem e descobrir que Cláudio Cunha era muito inteligente, sim, antes de “Oh! Rebuceteio”. Ao contrário do desbunde marcante deste último filme, porém, “Amada Amante” é conduzido de forma dramática e mui verossímil, focando-se na estória de uma família interiorana e mui conservadora que, em razão de uma promoção profissional de que o pai se beneficia, vai morar num apartamento na praia de Ipanema, onde eles serão expostos aos novos valores da antiga capital praiana do País. Logo de início tentado sexualmente por uma secretária, o pai de família repete para si mesmo que é fiel, que ama a sua mulher e que não procrastinará, como nunca precisou fazer até então, mas a realidade é bem outra...

Roteirizado por Benedito Rui Barbosa, responsável por diversas telenovelas de sucesso da TV Globo, “Amada Amante” possui uma cena mui significativa em relação ao papel que este roteirista desempenharia na emissora supracitada, enquanto responsável pela “cara do Brasil”, que a TV Globo tanto se vangloria de espelhar: assim que conhecem duas garotinhas tipicamente cariocas, os filhos do pai interiorano comentam que elas “falam engraçado”, cheias de gírias. Eles comentam: “vocês falam que nem o povo da televisão”, ao que elas respondem: não, não, eles é que falam que nem a gente”... Ai, ai, se fosse assim...

Pelo sim, pelo não, fiquei encantado com a sinceridade dramática do filme, que segue numa linha de contestação do conservadorismo extremo num viés que muito se diferencia das tragédias anunciadas tipicamente escritas por Nelson Rodrigues (que era um conservador, sou destes que defendem esta tese – risos): à medida que o pai de família se deixa envolver pela secretária sensual, ele recrudesce o seu moralismo familiar, chegando ao ponto de espancar sua filha mais velha com um cinturão quando a flagra beijando-se com um malandro local. A filha mais nova aos poucos se apaixona por outra menina (vide foto), enquanto que o filho é tachado de “viado” pela namorada por que “a respeita demais”. A mãe de família, tentando ordenar todos estes pequenos conflitos, é criticada pelo marido por ser frígida e subserviente, a ponto de ser culpabilizada pela amante do marido, quando esta última é descoberta pela família: “a falta de tempero de seu macarrão foi o que fez com que seu marido quisesse comer na rua”, reclama a secretária. O desfecho do filme talvez não impacte tanto hoje em dia, mas ainda é surpreendente, dada a leveza e a majestade respeitosa com que o filme é conduzido no que tange à exposição do conservadorismo benfazejo dos personagens. E isso não somente porque o elenco é ótimo (Sandra Bréa, Neuza Amaral e Maurício Lessa mais do que me impressionaram!), mas porque Cláudio Cunha é sim, um ótimo diretor. Se antes, tendo visto apenas um de seus filmes, eu já era fã, agora, com dois, sou mais fã ainda!

Wesley PC>

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