sábado, 7 de maio de 2011

QUANTA SAUDADE DO DIAS GOMES O GUEL ARRAES ME FEZ SENTIR!

Oficialmente, o escritor Dias Gomes faleceu em 1999. Tornou-se culturalmente imortal, entretanto, em virtude de suas criações personalísticas absolutamente singulares. Excetuando-se o magistral filme “O Pagador de Promessas” (1962, de Anselmo Duarte), a marcante minissérie “As Noivas de Copacabana” (1992) e a divertida micro-telenovela “O Fim do Mundo” (1996), eu tive poucas oportunidades de acompanhar o trabalho do autor quando ele ainda estava vivo. Na TV, seus trabalhos mais famosos são as telenovelas “O Bem Amado” (1973) e “Roque Santeiro” (1985). Assisti a diversos trechos das mesmas em programas de variedades, mas nada muito substancial no plano da quantidade. Por isso, fiquei contente quando soube que um canal pago exibiria, na noite de ontem, a versão fílmica recentemente dirigida por Guel Arraes. E, por pelo menos 10 minutos, eu sou obrigado a admitir: “O Bem Amado” (2010) é muito bom!

Um incremento mui pessoal em minha volição no que tange à audiência deste filme tem a ver com uma mensagem eletrônica que recebi de uma professora querida, depois de comandar a cansativa organização um evento interdisciplinar sobre comunicação ambiental, em que a mesma dizia que sua alma estava “tão lavada e enxugada quanto a de Odorico Paraguaçu”. Achei a citação genial e, como tal, tinha que conhecer a obra em que tal frase foi pronunciada. Dito e feito: gargalhei quando o protagonista interpretado por Marco Nanini pronunciou o referido estado de espírito (risos).

Infelizmente, Guel Arraes está mais preocupado em ganhar dinheiro com espectadores viciados em fórmulas televisivas do que tornar marcante um estilo cinematográfico próprio, e, aos poucos, o filme se torna irritante de tão veloz e omissa que sua montagem se torna. Cenas importantes são interrompidas ou abandonadas, enquanto piadas reles envolvendo os comportamentos sexuais bizarros dos personagens são destacados. E, se José Wilker não tinha como desperdiçar a sua imponente tipificação enquanto o matador Zeca Diabo, a grande maioria do elenco está insuportável: Matheus Nachtergaele exagera nos estereótipos ao compor o celibatário e covarde Dirceu Borboleta, enquanto Caio Blat, Maria Flôr e Tonico Pereira estão horrendos enquanto jornalista, filha e principal opositor do político protagonista. Em alguns momentos, inclusive, o discurso ideológico assumidamente anti-socialista (em oposição à genialidade sutil das críticas rotativas do magnânimo texto original) é tão obviamente irritante que até minha mãe percebeu que o filme destoava em relação aos temas principais da telenovela, a que ela teve o comemorado prazer de ter visto na época em que foi exibida.

Vale frisar, entretanto, que os 10 minutos iniciais do filme são muito bons. A narração comparando os fatos corruptos da fictícia cidade de Sucupira com eventos reais da década de 1960 não tinha como desperdiçar a genialidade impressa pelo autor Dias Gomes. Além disso, uma ou duas canções interpretadas por artistas como Jorge Mautner, Mallu Magalhães e Caetano Veloso são funcionais quando implantadas na trilha sonora. E, apesar de, no cômputo geral, eu ter detestado o filme, ainda assim eu gostei de suas tentativas de elã, prontamente naufragadas pela opacidade polimórfica do cinema televisivo que encontra na figura de Guel Arraes um de seus maiores difusores e especialistas. Pena!

Wesley PC>

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