terça-feira, 21 de junho de 2011

O MARIDO DA AGNÈS VARDA: UM HOMEM QUE SABE O QUE É O AMOR...

Através de uma agradabilíssima conjunção de acasos, vi “Lola, a Flor Proibida” (1961), primeiro filme do Jacques Demy, na manhã de hoje. Jacques Demy era o marido da Agnès Varda e, por mais que a amasse, ele não deixava de amar também outras mulheres. Ele sabia o que era o amor. Ela também. Por isso, depois de morte de seu marido – ou, quem sabe, bem antes, como se percebe no genial “As Duas Faces da Felicidade” (1965) – Agnès Varda dedicou-lhe belíssimos libelos românticos. Mas não é dela que falo agora. É dele. E ele sabia o que era o amor...

Apesar de haver um nome de mulher no título, o filme é sobre vários encontros e desencontros fortuitos. Num deles, um homem entediado reencontra na rua a amor que amou, desde a infância, 15 anos antes. Ela está com um filho loiro a tiracolo. Ele a pergunta: “tu és casada?”. Ela responde: “quase”. Ela é dançarina num cabaré, uma espécie de cortesã apaixonada, que se entrega caridosamente a um gentil marinheiro norte-americano porque este se parece com o primeiro (e único) homem que ela amou...

Numa das mais belas seqüências do filme, o belo marinheiro loiro vivido por Alan Scott pede para passar a noite na casa da protagonista. Ela consente. Ele adormece, de cansado e bebedeira. Ela sai e encontra alguém apaixonado por ela, que se vê enciumado por causa do marinheiro. Ele vai embora. Ela chora. E, quando volta para casa, ela encontra o marinheiro, que também se despede. Feliz que ele se sente por dentro, ele escorrega pelos corrimões das escadas públicas, até se deparar com uma menininha que completa 14 anos naquele dia. Eles se divertem juntos num parque de diversões, mas ele tem que partir, ela partirá também...

Como é praxe nos filmes de Jacques Demy, um final feliz não implica em previsibilidade, nem sequer em previsão. Jacques Demy sabe que, em assuntos de amor, temos também que nos consolar, que aceitar concessões. E, se alguém pode comemorar a felicidade perene ao lado que quem sempre amou, outros partem, outros vão embora sozinhos... Jacques Demy sabe o que é o amor!

Enquanto via o filme, pensei que quase todas as pessoas que eu aleguei amar (no plano proto-marital) hoje estão felizes ao lado de outrem. Há talvez uma púnica exceção, mas, ainda assim, é um caso contingente. As pessoas que amo são felizes ao lado de quem amam e cabe a mim ficar feliz por isso também: e Jacques Demy entendia o que eu sinto agora. Por isso, é como se ele tivesse feito este filme para mim. Para mim e para o Max Ophüls que ele cita no crédito de abertura, acompanhado de um provérbio chinês deveras pertinente: “chore, se tu achas que deves; ria, se puderes”!

Wesley PC>

Nenhum comentário: