Como não pensar no direito inalienável de aquelas pessoas ordinárias serem felizes? Como? Vendo “Pacific” (2009, de Marcelo Pedroso), uma miríade de idéias e perspectivas discursivas explodem e implodem na mente do espectador: o filme clama por uma discussão pública, por um embate de impressões. Para mim, que me vi diante do mistério no que tange à adivinhação dos intentos discursivos do diretor, montador e “roteirista”, trocentas interrogações se enumeram: o que está sendo pretendido neste registro crítico sobre a classe média, composto a partir de imagens captadas acriticamente pela mesma classe média retratada? Esfacelar a noção de autoria é suficiente? Haverá um juízo de valor aqui? Ou vários juízos de valores, que se misturam, se negam, se somam e constituem o paradoxo atroz que é apelidado de contemporaneidade por quem desistiu de tentar entender o desentendimento basilar da mesma? É difícil posicionar-se unidimensionalmente diante de um filme como estes e diante deste filme em particular. Tenho que rever “Pacific” assim que possível – e, se for ainda mais possível, acompanhado!
Para quem não sabe do que se trata, “Pacific” é um filme pernambucano sobre um cruzeiro luxuoso realizado entre a cidade de Recife e as praias de Fernando de Noronha. Neste trajeto, os turistas registraram eventualmente o que lhes pungia (sendo eventualidades relacionadas ao consumo abusivo de cerveja e os pareceres sobre festas os assuntos preferidos dos videografistas amadores), de maneira que, findo o cruzeiro, a equipe do filme abordou os participantes e solicitou que estes cedessem as imagens captadas para o documentário em si, agora constituído como a montagem “direcionada” de um material extremamente aleatório e múltiplo. Parecendo uma versão anárquica de “Babilônia 2000” (2001, de Eduardo Coutinho), o ‘réveillon’ captado pelas lentes deste filme assume as vezes de uma radiografia extremada do que é a classe média brasileira hoje em dia e, para além dos desafetos que esta classe média nos causa, não há como não ficar admirado (e agradecido) pela coragem surpreendente de entrega e exposição a que os personagens/indivíduos se submeteram aqui. Estou impressionado não apenas com o filme (no sentido mais genericamente conteudístico-formal do termo), mas com os sentimentos concorrentes de apreciação moral que ele me fez depositar sobre aquelas pessoas e o direito de serem felizes de uma maneira que me envergonha pessoalmente. Nalguns momentos, os viajantes são mostrados aprendendo ridículas coreografias de ‘axé music’; noutros, participando de brincadeiras bizarras à beira da piscina. Perto do final do filme, crianças são captadas em toda a sua inocência e potencial crueldade, ora desfazendo os desenhos de areia dos irmãos na praia, ora segurando indebitamente pequenas tartarugas que tentavam correr para o mar. Faz sentido imaginar que aquilo era felicidade? Talvez eu seja “infeliz” e sub-classista demais para responder...
Wesley PC>
DOIS É DEMAIS EM ORLANDO (2024, de Rodrigo Van Der Put)
Há uma semana
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