quinta-feira, 3 de novembro de 2011

“ENTRA EM MIM... ME ARREBENTA, ME FAZ MULHER!”

Dentre todos os filmes dirigidos e/ou escritos por Ody Fraga que pude ver até então, “A Fêmea do Mar” (1981) é, de longe, o mais solene. Emulando um tema pasoliniano, o enredo deste filme é focado no cotidiano praiano de Jeruza (Neide Ribeiro), matriarca que pensa estar viúva, vivendo isolada à beira da praia com seus dois filhos, Cassandra (Aldine Müller) e Ulisses (Calu Caldine). A primeira gosta de se banhar completamente nua e sabe que isso desperta a curiosidade ‘voyeur’ de seu irmão, que, após observá-la, transa com cabritas, ao som não-diegético de Ludwig van Beethoven. Até que um dia – que não é sábado, mas bem que poderia, como lamenta o dono de uma quitanda – chega à praia um marinheiro loiro e estranhamente sedutor (interpretado pelo também diretor Jean Garrett), que seduz mãe, filha e planeja fazer o mesmo com o filho. Segundo ele, nada é mais belo que o desejo que faz romper muros, estando comprometido com a correta conjugação do verbo amar: eu te amo, tu me amas, ele nos ama, nós nos amamos, vós vos amais, eles se amam”. Não tinha como eu não gostar de um filme como estes!

Assisti a este filme por brincadeira: sabia que o erudito e chanchadesco diretor Ody Fraga costuma manipular diversos materiais em seus filmes eróticos e inconseqüentes, mas não esperava que ele fosse tão longe em seu estudo freudiano lato. Por mais moralista que possa parecer o desfecho da trama, eu fui completamente arrebatado pelos jogos de sedução envolvendo os dois belos irmãos e o impávido marinheiro, que, numa cena-chave, sabemos também ser o assassino do pai dos dois meninos. Ou seja, os clichês psicanalíticos hoje desgastados da destruição de pilares familiares que redundam em libertinagem redentora são adotados neste filme de uma forma que clama pela discussão pós-ejaculação imitativa. Por mais excitante e destinado a causar a excitação sexual acima de tudo que este filme seja, “A Fêmea do Mar” toca nos tabus renitentes do incesto, do homossexualismo potencial e do compartilhamento marital de uma forma muitíssimo bem-vinda no panorama comercial do qual o filme emerge, sendo patente o grau de personalismo do diretor e roteirista no que tange à escritura desta trama, afinal rodada em sua terra natal, com atores menos célebres (mas muitíssimo bem-conduzidos no plano actancial) e ótimo uso de uma trilha sonora clássica que beira o pastiche. Juro que eu quis estar à beira da praia com aqueles personagens... Tomara que mais alguém que eu conheça tenha visto este filme: preciso conversar sobre ele!

Wesley PC>

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