quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

COMO EU SEMPRE DIGO: TUDO O QUE FALAM SOBRE MIM É VERDADE!

Em 1926, o diretor sueco Victor Sjöström adaptou um dos maiores clássicos literários em língua inglesa e realizou “A Letra Escarlate” (1926), um filme maravilhoso, mas, infelizmente, pouco conhecido e pouco visto. Faz muitíssimo tempo, aliás, que eu próprio assisti a este filme, mas tendo acesso, há pouco, a um surpreendente filme cômico contemporâneo de nome “A Mentira” (2010, de Will Gluck), percebi-me estupefato quando a protagonista recomenda aos espectadores e colegas de escola que se dispusessem não apenas a ler o livro original como também a assistirem à sua primeira e inebriante versão muda cinematográfica. Esse era o tipo de detalhe que me advertia de algo: eu estava diante de uma pequena jóia hollywoodiana dos tempos atuais!

Dito e feito: nos 92 minutos de duração de “A Mentira”, deparo-me com uma trama peculiar e inventiva, a estória de uma jovem inteligente que, sem querer, finge não ser mais virgem e, por ter a sua reputação estragada no colégio, resolve servir de objeto de fofoca para os favores noticioso-honoríficos de rejeitados sociais (gordos, homossexuais, cristãos, etc.) que, de outra forma, não teriam como espalhar que não eram mais virgens. Trata-se de um dilema tipicamente contemporâneo, daqueles que são difundidos à granel pelos perfis pessoais de Facebook e, não apenas por causa disso, me vi completamente identificado. Detalhe inicial de comunhão tramático-personalística elementar: tal como eu, a protagonista é apaixonada e virgem!

A fim de não estragar as diversas surpresas do roteiro, talvez seja melhor não falar tanto do filme, que também se presta a uma homenagem atualizada mui bem-vinda dos filmes dirigidos por John Hughes na década de 1980, em que eu nasci e cresci. Sem medo de parecer excessivamente deslumbrado com os estratagemas ‘pop’ do filme, elogio-o com fervor (sim: fervor!), dizendo que não apenas me senti pessoal e analiticamente contemplado por ele como também o mesmo serve como demonstrativo midiático da tríade argumentativa estabelecida pelo teórico Manuel Castells para designar os processos desencadeadores do “novo mundo” que passou a tomar forma no final do milênio passado: a revolução nas tecnologias da informação; a crise econômica do capitalismo [e do estatismo] e sua posterior reestruturação; e o apogeu de movimentos culturais e sociais fortemente reivindicativos. Os três processos são constitutivamente importantes na minha pressuposição de que este filme sintetiza muito bem o drama de crescer na década de 2010: o que o futuro legará aos adolescentes do futuro? Pelo que o filme espertamente demonstra, pouco mais que as velhas fórmulas genéricas e tramáticas de outrora. Mas, como se pôde perceber aqui, o modo como se segue (ou finge deixar de seguir) estas fórmulas é determinante para uma sobrevivência mais digna no atolamento do pântano da Indústria Cultural hodierna: que bom que o capitalismo ainda finge suscetibilidade e, mais ainda, que bom que alguns destes fingidores aproveitem-se tão bem do capitalismo tardio!

Wesley PC>

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