sábado, 31 de dezembro de 2011

O ÚLTIMO FILME DE 2011 E O CONSELHO EMBUTIDO PARA 2012:

Neste mês de dezembro, coincidentemente, assisti a vários filmes em que o ator juvenil Zac Efron era o protagonista e calhou de justamente ele assumir o papel principal do derradeiro filme visto este ano. Ou seja, querendo ou não, algo em seu desempenho no filme “Eu e Orson Welles” (2009, de Richard Linklater) tornar-se-á o meu primevo conselho comportamental para 2012. Não sei o que ainda, mas algo havia naquele filme que me dissesse respeito...

No filme em pauta, dirigido por um cineasta ‘pimba’ que eu considero como “leve arquiinimigo”, no que tange à minha teimosia em admitir que ele é arrojado e criativo, para além de suas pretensões ostensivas e aparentes, o citado Zac Efron interpreta um garoto apaixonado por William Shakespeare que, em 1937, casualmente se torna membro do Mercury Theater, companhia teatral nova-iorquina de vanguarda dirigida por aquele que, em 1941, protagonizaria e dirigiria “Cidadão Kane”. Ocorre de ele se apaixonar por uma das protegidas do diretor e, como tal, entra em conflito direto com a sua petulância genial. Simples assim: por mais profissionalmente vilanaz que seja a tal personificação de Orson Welles, é como se ele tivesse motivos, razões e justificativas para ser assim, defende o filme. Era como se Richard Linklater estivesse a representar os seus próprios devaneios pretensamente autorais dentro de uma corrente dita “alternativa” do cinema hollywoodiano. Ele tem direito a este voto de defesa? Sim, tem. Ele me convenceu? Talvez. O filme te disse algo além disso, Wesley? É o que eu estou me perguntando ainda agora...

Nesta última semana de 2011, três acusações referentes ao meu sobejo de “exibicionismo sarcástico” ditaram a imposição da melancólica característica da época sobre mim: no trabalho, fui acusado de tirania infundada por um reclamante pérfido; na vida pessoal, duas pessoas muitíssimo relevantes e queridas afastaram-se de mim por causa de uma espécie de hipertrofia da precaução, receosas de que a minha língua solta e meu senso de humor ácido corroessem os novos direcionamentos de suas vidas. A mim, resta acatar, mais ou menos como fizeram os demais integrantes do Mercury Theater no filme citado. Fazer o quê?

Um detalhe interessante sobre tudo o que foi escrito anteriormente é que, após a sessão do filme, eu saí de casa para visitar uma amiga recém-divorciada que mora aqui mesmo no conjunto. Enquanto caminhava sob o sol, fui atingido por uma impressão de impotência muito forte, convertida numa timidez quase paralisante e numa impressão dominante de feiúra. Eu me sentia feio enquanto caminhava, muito feio, mas achava injusto deixar de seguir o meu rumo, cumprir a promessa de visitar a amiga necessitada de uma boa conversa. Afinal, cheguei em sua casa e, lá sentado, fui carinhosamente penteado por sua filha pequena. Quando estava voltando para casa, fui novamente afligido pela tal timidez, mas não sentia mais tão feio. Aí eu percebi que segurar a armação de meus óculos me causava a impressão de certa invisibilidade. Quanto eu me sentia constrangido por causa do olhar de alguém, bastava segurar os óculos que eu conseguia enfrentá-lo, ao menos provisoriamente. E aqui estou eu: que venha 2012!

Wesley PC>

"AS COISAS QUE EU NÃO SEI"...

São quase 3 horas da madrugada de domingo, último dia do ano. Fazem mais de 24 horas que eu não tomo banho. Não foi programado, não foi acidental, talvez nem precisasse ser dito, mas é verdade: sou obrigado a lidar com isso e, por extensão, quem está ao meu redor e me quer bem, também!

Anteontem eu fui à praia. No dia anterior, também. Tomei banho em ambos os dias com xampus diferentes. Hoje eu pretendo cortar o meu cabelo. Queria ficar moderno, parecer moderno, um corte em estilo 'degradée' que realçasse o estilo "'nerd' erótico" de meus óculos. Queria...

Na foto, eu e o irmão de um amigo, que completará 15 anos de idade amanhã. Alguns minutos antes de esta foto ser tirada, eu e o gurizinho em pauta jogávamos uma espécie de futebol com mãos e, num passo em falso, eu o derrubei na areia. Ele ficou agachado por um tempo, reclamando de forte dor na mão (caíra por cima do braço), mas, depois de algum tempo, se levantou e voltou para o jogo. Primeiro, éramos do mesmo time. Em seguida, éramos de times opostos. Divertimo-nos do mesmo jeito nas duas situações. É a mensagem!

O que me traz de volta ao título da postagem, retirada de um diálogo cabal do filme "O Segredo de Brokeback Mountain" (2005, de Ang Lee), quando o embrutecido personagem Ennis Del Mar diz ao seu namorado recôndito e inassumido que, se ele descobrir que o mesmo anda freqüentando bordéis homossexuais, poderia matá-lo num acesso de raiva. Esta sempre foi uma das cenas do filme em que eu mais chorei. Era um aviso... E eu sabia!

Wesley PC>

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

QUE BOM QUE EU NÃO ENVIEI AQUELA MENSAGEM?

Da primeira vez que eu tive acesso a qualquer imagem ou informação referente ao filme “Ressaca de Amor” (2008 – título nacional para “Forgetting Sarah Marshall”, de Nicholas Stoller), eu estava com um pênis na boca, literalmente. Não conhecia o filme nem sabia do que se tratava, mas logo me interessei pelo humor inteligente do filme, ressaltado pela presença em cena do sardônico Jason Segel, ator cuja beleza gorducha me lembra algo entre o saudoso Heath Ledger e o jovem Gerard Depardieu. Ou seja: sou tiete do Jason Segel e, por achar o humor do filme semelhante às obras originais e muito divertidas produzidas pelo Judd Apatow, fiquei com muitíssima vontade de vê-lo. Só não o fiz naquela oportunidade por causa do pênis em minha boca, que tinha outros programas televisivos para depois de sua gozada.

Alguns meses se passaram e hoje me vi novamente diante de “Ressaca de Amor”. Dessa vez, tinha uma colher de arroz com maionese na boca e minha mãe ao lado. Como eu suspeitava que o filme contivesse cenas apologéticas à masturbação, fiquei levemente constrangido com a presença dela. Tinha receio de que ela não entendesse o humor ácido do filme e muito menos a minha adesão em primeira pessoa gargalhante ao mesmo. Imaginei a mim mesmo em diversas situações do filme e, por causa disso, mas não só disso, gostei muito dele. Muito mesmo!

Durante os créditos finais, constatei o óbvio ululante e benquisto: o filme é, de fato, produzido por Judd Apatow! Uau! Roteirizado pelo próprio Jason Segel, o ponto de partida do filme é demasiado simples e pessoal: um músico sedentário se vê abandonado pela esposa após 5 anos e, incapaz de superar o seu trauma choroso, viaja para o Havaí e se hospeda no mesmo hotel em que ela está, ao lado do novo namorado. Providencialmente, ele conhece uma cordial e bela recepcionista (vivida por uma inspirada Mila Kunis) que, aos poucos, retribuirá ao seu amor sensível. Era certo que, além de rir bastante e me emocionar deveras, eu iria torcer para que eles ficassem juntos ao final. Muitíssimo bom o filme, recomendo-o de coração.

Infelizmente, assisti ao filme pelo vilanaz e conservador canal fechado TNT, o que implica em dizer que a duração adicional da produção seria interrompida por diversos e inconvenientes intervalos comerciais. Estava tão ansioso para ver o filme, que suportei este problema, além do fato adicional de o filme estar dublado. Mas ainda pior foi saber, ao final da sessão, que eu fui privado das convincentes, naturais e bem-situadas cenas de nudez frontal protagonizadas pelo Jason Segel. Puxa, além de bom ator, bom roteirista, bom músico e pessoa boa-pinta, ele ainda sabe fazer uso expressivo de sua genitália? Se eu era tiete antes, agora sou fã mesmo: vê-lo num filme agora é, para mim, garantia de qualidade!

Detalhe extra-sessão: enquanto via o filme, lembrava calorosamente de um rapaz com traços semelhantes ao ator em pauta, de modo que redigi uma mensagem burlesca e bêbada de celular, não enviada no derradeiro momento, por medo de um constrangimento responsivo que talvez me deixasse tão triste quanto ficou o protagonista do filme acima. A fim de não perder a oportunidade, segue aqui a transcrição da abobalhada mensagem:

Tava vendo um filme
E lembrei de tu também.

Agora uso óculos
Mero paliativo simplista
Omkt jadjm jrtngaemj...

Repare só no agouro:
Entrando num bloqueio
Inspirando com dureza
Nadando no ultraje
Ardendo e latejando,
Latejando e tremendo
Desculpa pelo nonsense
Omoplata brilha
!”


Assim mesmo, do jeito como está escrito. Imagina só o que me aconteceria se a mensagem fosse enviada (risos). E nada de pênis em minha boca, por ora...

Wesley PC>

IGNORANDO O COMENTÁRIO SOBRE “NO MORE WORDS”:

Apesar de eu ser bastante nostálgico e fetichista, neste final de ano de 2011, eu não me sinto tão motivado quanto outrem (ou como eu mesmo, noutros tempos) a elaborar postagens enumerativas acerca das melhores “algumas coisas” do ano que se passa. Hoje, especificamente, eu me sinto mais tendente a uma hipertrofia de coesão e, como tal, faço de conta (por algumas horas) que os momentos finais desta invenção do calendário gregoriano são meros momentos iguais a quaisquer outros, sendo injusta, portanto, esta sede de catalogação. É uma fase, uma defesa, desnecessário dizer de imediato.

No afã por refugiar-me das tais resoluções e/ou pendências anuais, rendi-me prioritariamente a uma superstição erudita: escolhi aleatoriamente um livro teórico na Biblioteca da UFS e hoje, sexta-feira, decidi que o leria até o momento de voltar ao trabalho, na segunda-feira, dia 02 de janeiro. O exemplar escolhido foi “Cultura” (1981), do marxista britânico Raymond Williams. Até agora, li apenas os dois capítulos iniciais (“1. Com vistas a uma sociologia da cultura” e “2.Instituições”), mas já me deparei com uma passagem conceitualmente epifânica e digna de menção apaixonada acerca do tipo de tema/dilema/apreciação que eu costumo publicar neste ‘blog’: “uma sociologia da cultura satisfatória deve atuar de modo mais rigoroso. Ela não pode evitar a presença estimulante de estudos empíricos e de posições teóricas e quase-teóricas existentes. Deve, porém, estar preparada para reelaborar e reconsiderar todo o material e conceitos tidos como verdadeiros, e para oferecer sua própria contribuição no âmbito da interação franca entre evidência e interpretação, o que constitui a verdadeira condição de sua adequação” (páginas 34-35 da segunda edição lançada no Brasil, em 2000, pela editora Paz e Terra).

Um pouco antes de ler o trecho destacado – que me encantou pessoalmente, insisto – li, com muita atenção e interesse, uma daquelas listas de melhores discos do ano 2011 e me deparei com uma resenha elogiosa do disco “Anna Calvi” (2011), obra homônima de estréia de uma cantora também britânica elogiadíssima por artistas que aprecio, como o trovador Nick Cave, os integrantes da banda Interpol e Brian Eno, que chegou a dizer que “o surgimento desta artista é o acontecimento musical mais importante desde Patti Smith”. Obviamente, é um exagero da parte dele, mas, diante de uma declaração dessas, como não me obrigar a ouvir este álbum o quanto antes? Dito e feito: estou na terceira audição consecutiva de “Anna Calvi” e, agora, já me sinto apto a comentar algo sobre ele, excetuando-se as considerações sobre a segunda faixa “No More Words”, que não constava da primeira cópia virtual do disco que adquiri.

Composto por apenas 10 faixas e durando 39 minutos em sua íntegra, “Anna Calvi” é um disco interessante sim, mas menos vanguardista do que eu pensei. É mais ou menos uma atualização da sonoridade patenteada e divulgada pelo grupo Siouxsie and the Banshees, cujo destaque supremo é a faixa 07, “I’ll Be Your Man”, repleta daqueles arroubos multirrítmicos que tanto me encantam. Sem contar que a letra da canção possui aquela melancolia ofertada que tanto me seduz (“In the day, I can be your lover/ In the night, these words are true/ And we wait, wait forever/ For night, I can find / I’ll be your man”). Um primor, simplesmente um primor!

Dentre as demais canções do álbum, os destaques são “Desire”, “Firs We Kiss”, “The Devil” e “Morning Light”, que tocam em temas que muito me incomodaram nestas últimas semanas, temas estes embalados por melodias que transitam entre o oitentismo ‘pós-punk’ e os timbres soturnos desta nova geração musicalmente influenciada por David Lynch, Gus Van Sant e Wong Kar-Wai, como a cantora declara em entrevistas. Não sei se o disco se tornará um dos meus favoritos, mas, no atual contexto, rompe muito bem as contraposições estudadas por Raymond Williams no que tange ao “meramente utilitário” X “artístico” ou “útil” X “meramente cultural”. E, ao final, “Love Won’t Be Leaving”...

Wesley PC>

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

“SEI LÁ... BICHA É MAIS SENSÍVEL, NÉ?”

PREÂMBULO: Dois amigos meus, ambos homossexuais e externamente afetados, estavam bebendo algo num bar do Centro da cidade de Aracaju, quando três cafajestes se aproximam:

“- Oi?
- Oi.
- Tudo bem?
- Sim...
- Eu e meus amigos preferíamos comer uma boceta, mas, como só tem vocês mesmo, a gente aceita. Que tal irmos para aquele motelzinho ali no canto para... (ele faz um gesto com as mãos, que quer dizer ‘foder’)
- Errr... Não, obrigado.
- Ah, vamos. Meus dois amigos têm o picão!
- Err... Não.
- Vamos, vá...

- NÃO!”


O diálogo acima foi ditado por um dos dois amigos envolvidos no convite indecoroso, na tarde de ontem, numa praia. Ele acrescentou que, ao final, diante de tanta insistência dos três cafajestes, ficou com medo de ser espancado ou perseguido. Por sorte, nada aconteceu e eles foram firmes em sua recusa sexual de baixo calão. Ligando a TV na manhã de hoje, me deparo com um filme brasileiro chamado “Os Machões” (1972, de Reginaldo Faria), que partem de um pressuposto inversamente imitativo: no afã por comerem uma boceta, três amigos mulherengos vão até a casa de um travesti, sem saber que ele, de fato, não é mulher. Quando estão beijando-o à força, um dos amigos vê o sutiã com enchimento cair e espanca o travesti até que ele desfalece. Quando o mesmo acorda, a idéia: “que tal vocês três se vestirem como viados?”. Eles aceitam e resolvem procurar emprego no mesmo salão de beleza e que o homossexual agredido (Márcio Hathay) trabalha...

A partir da obtenção dos empregos, o filme passa a contar três estórias paralelas: a primeira, protagonizada por Erasmo Carlos, o agressor do travesti, é a de um bigodudo que se finge de massagista ‘gay’ para fazer sexo com suas clientes, que, solitárias, sempre recomendam os seus serviços às amigas; a segunda estória é a do loiro boa-pinta vivido por Reginaldo Faria, que se torna, mesmo sem querer, um cabeleireiro talentoso e ganha a confiança de uma viúva macambúzia, que o contrata como embelezador particular, até que ele se apaixona por sua filha loira e juvenilmente lasciva; e a terceira estória é a do franzino personagem de Flávio Migliaccio, que se apaixona platonicamente por uma milionária obcecada por ficar nua, mas que duvida de sua sexualidade até mesmo quando ele se revela heterossexual. Ele insiste tanto, que ela anui em fazer sexo com ele, mas ele broxa. Passa a questionar a sua própria sexualidade, chegando mesmo a se vestir de mulher por uma noite, mas o desfecho do filme lhe concederá um benfazejo congelamento de imagem, ao som da canção “Mundo Cão”, composta por Erasmo Carlos e seu companheiro de Jovem Guarda Roberto Carlos. É um bom filme, apesar de tudo.

Apesar de a primeira estória ser previamente autorizada pelas fórmulas cômicas similares de tantos outros filmes e a terceira ser pitoresca e até um tanto dramática na identificação de objetivos perseguidos que alcança com a platéia, a segunda me pareceu delicada e muito complicada: primeiro, porque Reginaldo Faria é hostilizado por parecer homossexual, mas o filme não lhe dá voz de defesa geral (posicionando ostensivamente contra a homofobia gratuita, por exemplo), mas apenas porque ele não é ‘gay’; segundo, porque eventualmente a câmera focaliza os olhares tristes de pessoas coadjuvantes à sua imitação de efeminado, como a viúva interessada nele e o travesti agredido que o ama confessadamente. Aí eu percebi o quão inteligente é a direção do Reginaldo Faria, irmão do mestre Roberto Farias, por detrás de um roteiro machista e tão enganoso em seu talento legítimo: o filme adota uma forma deslocada de “narrativa indireta livre”, em que é facilmente distinguível a quem pertence o ponto de vista a partir do qual as estórias (em especial, a segunda) são narradas. Ou seja, o filme obviamente torce pelos personagens mulherengos, mas não toma partido completo deles. Isso só torna a recepção do filme ambígua: se hoje eu estranhei as opções controversas e “indefinidas” do diretor e roteirista, imagina então na época em que o filme foi lançado, quando a afetação homoerótica não estava tão em moda como hoje em dia... Juro: fiquei surpreso com o que vi. Pensei que fosse nutrir ódio pelo filme, pelos personagens, pela covardia do diretor, mas até que simpatizei deveras pela sinceridade argumentativa fugidia do mesmo. Recomendo-o, devidamente acompanhado de debate.

Wesley PC>

“O IMPORTANTE É AMAR” (1975, de Andrzej Zulawski): NÃO COMENTÁRIOS, MAS REVERBERAÇÕES...

Na primeira cena do filme, a personagem de Romy Schneider não consegue dizer que ama um dado moribundo. Chora, mas não consegue. Pede que não a fotografem, e não consegue. Era um filme dentro do filme e eu já previa que eu me emocionaria deveras diante deste filme: sou fã do Andrzej Zulawski e, até mesmo no mundo real, ele é caótico, explosivo, genial!

Não sei como resumir o que me tomou de assalto diante deste filme: é pessoal, é íntimo, por mais compartilhado que eu pretenda, o que eu senti aqui explode lá dentro. No máximo, o que poderei mostrar são as conseqüências. Muito corajosa a Romy Schneider!

“O Importante é Amar” situa-se entre dois maravilhosos filmes zulawskianos vistos anteriormente: o historicamente perturbador “O Diabo” (1972), em que gozos e assassinatos são cometidos em meio ao caos bélico; e “Possessão” (1981), em que gozos e assassinatos são cometidos em meio ao caos marital. Dois filmes foram suficientes para entender o estilo violento de interpretações posto em cena pelo diretor, em cujas obras os atores choram, se digladiam, sofrem, são vitimados por uma espécie particular e contagiante de epilepsia. Por isso, fiquei intrigado ao conhecer a trama deste filme, cujo título é infinitamente mais singelo que os demais. Mal sabia eu que encontraria ali o que eu pensava que encontraria de fato: genialidade corrosiva, pela qual se paga um preço sangüíneo e nerval. Amar dói, Andrzej Zulawski sabe disso muito bem!

Tentei escrever outro desfile de apologias sobre este filme, noutro canto, mas, quem disse que eu consigo ser fiel ao que estou sentindo? Talvez se eu utilizasse uma citação direta do filme, quem sabe? Não custa tentar: em dado momento, o fotógrafo (Fabio Testi) que se apaixona pela atriz desqualificada/subestimada do filme encontra-se com um amigo padecendo de ‘delirium tremens’. Este vive numa imensa biblioteca, ao lado do cachorro. Sua ex-mulher lhe traíra com o amigo em pauta. Angustiado, ele resolve comer ração de gato (“no rótulo dizem que faz bem!”). Ele passa mal – não por isso, diga-se de passagem – e morre, mas antes compõe um adágio genial, daqueles que fazem os companheiros de sessão tremer: “a solidão é a higiene da alma”. Quem teria coragem de dizer que não? O importante é amar!

Wesley PC>

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

EU, FÃ DO JEAN GARRETT, OU: BUSCANDO SENTIDO (ESTÉTICO) PARA A PERVERSÃO QUE É, POR MIM E NÃO SÓ POR MIM, SENTIDA.

Ontem à tarde, eu saí para visitar alguns amigos. Tinha como planejamento secundário não chegar muito tarde em casa, a fim de visitar também aquele que eu chamo de “meu fornecedor habitual de sêmen”, que não é vegetariano e costuma se masturbar em todas as vezes em que toma banho. Em 96% das vezes, para ser numericamente aproximado. Quando eu chego em sua casa e encontro-o com os cabelos molhados, isto equivale a uma declaração tácita de princípios eróticos: “tu não tocarás em meu pênis hoje!”. O consolo é que, como o rapaz é alto e bonito, resta muito o que fazer com o restante de seu corpo, ainda que, como bem diagnosticou um amigo, o fulgor seminal insiste por manifestar-se, de maneira que, nestas situações de consolo, volta e meia eu termino chateando-o por causa da minha insistência em pelo menos observar o seu pênis ainda avermelhado, admirar aquela glande recém-exercitada, ansiar pela sucção dalgumas gota renitente de esperma que talvez não tenha sido despejada no ralo do banheiro. E, por mais que eu saiba que isto é recorrente, volta e meia me vejo prisioneiro e algoz deste fulgor.

Pois bem, na noite de ontem, desci do ônibus por volta das 20h40’. Quando adentro a casa do “fornecedor” em pauta, percebo que o computador está ligado: um filme levemente erótico estava pausado após mais ou menos 35 minutos de projeção. Escutei o barulho do chuveiro ligado. Era ele! “Adeus, sexo oral por hoje”, pensei. Tendo certeza de que ele estava a derramar solitariamente o colóide precioso, fiquei hesitante se ia direto para casa ou não. Fiquei com receio que ele pensasse que eu estivesse vigiando-o. Após muito pensar, resolver esperar e me despedir dele do jeito certo. Conversamos um tantinho sobre o filme que ele estava vendo, alisei a sua cabeça perfumada de xampu, cheirei os seus cabelos crespos , dei-lhe um beijo no pescoço e saí, prometendo talvez voltar mais para tarde, para conversar um pouco, quem sabe? Quando eu tentei voltar, a porta de sua casa já estava fechada. Escutei que ele ainda estava a assistir o tal filme erótico romeno. Menos mal...

Voltando para casa, desejoso e levemente frustrado em minhas intenções erotógenas, lembrei que o Canal Brasil exibiria um filme erótico que eu ansiava por ver: “Amadas e Violentadas” (1975), dirigido pelo inteligentíssimo Jean Garrett e produzido e protagonizado pelo tesudo David Cardoso. Era o suficiente para eu me consolar um tanto mais. Conhecendo o diretor como eu já conheci (vide este artigo, sobre aquele que talvez seja seu melhor filme; e este, em que ele trabalha como ator e personagem sedutor), tinha certeza de que me veria diante de um filme não apenas genial em sua essência pervertida e analítica tupiniquim, mas também uma obra de arte genial, com ecos de F. W. Murnau, Alfred Hitchcock, Marco Ferreri e muitos outros cineastas. Dito e feito: apesar de ter dormido ao final-surpresa do filme, como sói acontecer nestas sessões tardias do Canal Brasil, consumi uma obra impressionantemente subestimada da cinematografia brasileira. “Amadas e Violentadas” é uma verdadeira jóia!

Na trama, David Cardoso, jovem e utilizando óculos, interpreta um escritor sexualmente recatado, traumatizado pelo assassinato da mãe adultera pelo pai, que se suicida em seguida. Autor de livros de suspense, em que mulheres costumam ser violentamente assassinadas por seus parceiros sexuais, este escritor é, na verdade, um assassino que utiliza suas mórbidas experiências pessoais como motriz de seus enredos. Logo na primeira cena, ele mata sua secretária e um amante dela com um extintor de incêndio. Numa cena posterior, ele estrangula uma fotógrafa depois de posar nu ao lado dela. Numa terceira, ele estrangula uma leitora, tudo com muito requinte e luz avermelhada. Mas o verdadeiro toque de mestre do diretor e roteirista Jean Garrett está numa cena que muitos consideram gratuita, mas que me surpreendeu deveras pela originalidade: enquanto dirigia pela cidade, o protagonista quase atropela uma adolescente que fugia de uma seita de adoradores satânicos. Ela pede abrigo ao escritor, que logo se vê apaixonado por ela. Numa dada madrugada, ele desperta ao som de tambores ritualísticos. A mocinha havia sido seqüestrada pelos satanistas, que planejavam sacrificá-la, até que o escritor mente e diz que a havia deflorado há dois dias. Eles a libertam, sem qualquer represália de qualquer uma das partes. E eu exultei: “caramba, tiveram coragem de fazer isso num filme brasileiro de tintura realista, uau!”. Atestei, assim, a minha admiração suprema pela inteligência do Jean Garrett.

Como eu disse, infelizmente adormeci na seqüência final do filme. Na última mesmo, justamente. Estou ansioso para que alguém consiga o filme e depois me empreste, visto que, pelo que li através de uma descrição sinóptica internética, o desfecho da trama confirma a progressão de inteligência analítico-pervertida que o diretor e roteirista vinha adotando nas cenas anteriores. E, mais do que ficar excitado diante deste ótimo filme, eu entendia a mim mesmo enquanto homem carente de sêmen. Boníssimo e terapêutico, além de genericamente genial!

Wesley PC>

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

“ESTE É UM DIÁRIO DE ÓDIO”!

Não sei o que se passava por minha mente quando me dispus a ver “Diário de um Banana” (2010, de Thor Freudenthal). Não cria que fosse um filme bom ou justo, mas até que ele não é de todo mau: o protagonista Zachary Gordon, com apenas 12 anos de idade, é uma gracinha e o intérprete de seu irmão adolescente e inconveniente, Devon Bostick, tem pelo menos uma seqüência intrigante, quando obriga o protagonista a cheirar o seu sovaco, depois de dois dias sem tomar banho. Estes colegiais norte-americanos são mesmo esquisitos, né? Mas há algo de pitoresco no filme, mesmo assim!

Ao contrário do que possa parecer, não me identifiquei com o personagem principal não. O tal do Greg Heffley é egoísta, traiçoeiro, mentiroso, metido a besta, presunçoso, esnobe, e muitos outros adjetivos que perderam a minha simpatia logo no começo. Mas tem uma cena em que ele canta “Total Eclipse of the Heart”, com uma voz aguda e quase feminina, que seduz qualquer um... Não é um bom filme de todo, mas também não é mau!

Quando eu comecei a escrever este arremedo de resenha, tinha até alguns argumentos organizados para defender a minha subsunção não-identificada ao filme, mas sinto dor de cabeça por causa dos óculos que utilizo desde ontem. Não sei se isso é normal, mas não sinto que estou enxergando melhor de óculos. Pelo contrário, aliás. Acho que vou largar esta porcaria fora, mesmo tendo me custado R$ 250,00. Isso é o que dá quando eu traio o meu pantim para-foucaultiano de rejeitar autoridade médica! Para piorar, a minha sinusite voltou a atacar e eu dormir mal, depois de uma noite de humilhações não-programadas, em razão de uma discussão com um vizinho, envolvendo delimitações de liberdade e publicidade no que tange ao ato disparatado de dançar músicas de baixo calão no meio da rua. Ele achava que estava em seu direito. Quando eu o fotografei, também achava. O resto é medo de nossas discordâncias sub-enraivecidas tornarem-se algo mais sério e, como sempre, deletério para mim. Sou um idiota, um banana que nem o tal do Greg. Acho que verei a continuação do filme, quando estrear na TV fechada (risos). Acho não: tenho certeza!

Wesley PC>

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

DEFEITUOSO OU NÃO, ESTE FILME ME FAZ/FEZ SONHAR DEVERAS!

Ontem à noite, “Ópera do Malandro” (1986, de Ruy Guerra) foi exibido num canal aberto. Apesar de ter sido fracasso de público e crítica à época de seu lançamento, nutro uma simpatia mui particular por este filme. Não é apenas porque o magnífico disco de Chico Buarque no qual ele é baseado é excelente e meu favorito não: gosto das soluções visuais adotadas pelo diretor Ruy Guerra. Numa delas, por exemplo, Cláudia Ohana e Elba Ramalho disputam numa arena ao som de “O Meu Amor”. A arena é vista por cima, enquanto a letra da canção fica reverberando em nossa mente: “o meu corpo é testemunha do bem que ele me faz”. Não consegui me conter: enquanto a cena se dava, enviei o referido trecho da canção para alguns amigos, os quais eu supunha que estavam vendo o filme na mesma sessão que eu. Alguns, de fato, estavam e se emocionaram da mesma forma. O filme é bom, insisto: o filme é muito bom!

Ao contrário dos meus amigos, eu desgostei das primeiras cenas protagonizadas pela Cláudia Ohana e não gostei muito dela como cantora, mas, de resto, fomos unânimes ao elogiar o desempenho anímico de Elba Ramalho e a ótima composição de Edson Celulari. O sobejo de ironia na cena final do filme e os lamentos platônicos de J. C. Violla como o subestimado travesti Geni são mais alguns dos pontos positivos deste musical prenhe de brasilidade e emoção, merecedor do meu afeto próximo, de minhas lágrimas de identificação enquanto cantarolo uma ou outra canção. “Viver de Amor” jamais me deixará mentir:

“Pra se viver do amor
Há que esquecer o amor
Há que se amar
Sem amar
Sem prazer
E com despertador
- como um funcionário

Há que penar no amor
Pra se ganhar no amor
Há que apanhar
E sangrar
E suar
Como um trabalhador

Ai, o amor
Jamais foi um sonho
O amor, eu bem sei
Já provei
E é um veneno medonho

É por isso que se há de entender
Que o amor não é um ócio
E compreender
Que o amor não é um vício
O amor é sacrifício
O amor é sacerdócio
Amar
É iluminar a dor
- como um missionário.”


Terminada a sessão, eu tentei dormir. Minha garganta estava inflamada, doendo e eu mijava o tempo inteiro. Minha mãe roncava de forma estranha, me deixando preocupado com sua saúde. Tentei acordá-la discretamente, mas logo me vi tendo um sonho erótico com um colega de curso de cabelos cacheados e moção sexualista supostamente incontornável. Desejei beijá-lo no sonho e, ao despertar, me senti estranho por ainda retroalimentar as sensações oníricas genitalmente estimuladas. Seria ainda por causa do filme? Por precaução, se me perguntarem se sou um transeunte, eu responderei: “não, não, eu sou puta, moço!”

Wesley PC>

domingo, 25 de dezembro de 2011

POIS TAMBÉM CABE A VIDA NUM FILME AZERBAIJANÊS...

“A 40ª Porta” (2008, de Elchin Musaoglu) não é um grande filme: é curtinho (dura apenas 82 minutos) e simplista em muitos aspectos, mas ficará cravado em minha mente como o primeiro longa-metragem azerbaijanês que vi. Na trama, um adolescente órfão recusa-se a permitir que sua mãe trabalhe como faxineira, sob pena de, assim, ela sujar a honra de seu pai. Ele torna-se, contra a vontade dela, lavador de carros e se envolve com um gângster local, mas, como bem notou minha mãe, o modo como ele se relaciona com sua progenitora é despótico. Ela, por sua vez, é excessivamente tolerante e submissa, mas não cabia a nós julgar a personagem sem analisar os dados culturais que a cercavam. Numa cena bonita, ela assopra a sopa de seu filho e deposita-a em sua boca, em largas colheradas. Numa cena mais bonita ainda, uma luz que vive piscando na escuridão de repente se torna uma luz piscando em meio à claridade. Mas, com exceção destas duas cenas bonitas, o filme como um todo é marcado pela mediania dramática, pela ausência do exotismo que eu buscava, posto que Baku, capital do Azerbaijão, é, também, uma cidade globalizada hoje em dia. Fica o aviso, entretanto. A boa intenção realista.

Wesley PC>

“TU JÁ FIZESTE SEXO COM UMA GIRAFA DIANTE DE UMA CRIANÇA?”

Eu não, mas, em algum lugar do mundo, deve haver quem tenha feito. A pergunta foi feita pelo cachorro que dá nome ao estranho seriado televisivo “Wilfred”, protagonizado por Elijah Wood, que interpreta um personagem solitário e tendente ao suicídio, que resiste em admitir a paixão que sente pela vizinha loira, dona do cachorro do título. Este cachorro, por sua vez, é enxergado como um homem vestido numa roupa de pelúcia pelo perturbado protagonista da série, da qual assisti apenas ao primeiro, nono e décimo episódios, sendo os dois primeiros incompletos. Digo mais: assisti aos tais episódios meio a contragosto, visto que detesto a interpretação caricata e grosseira de Jason Gann como o cachorro, mas terminei gostando do saldo psicanalítico geral da série.

No primeiro episódio, Ryan, o protagonista, tenta suicídio, mas sobrevive depois de, entre outras coisas, ter se masturbado no chuveiro. No nono episódio, ele recebe a visita de sua mãe, internada num manicômio há duas décadas, e esta confidencia que já o flagrara comprimindo o pênis contra a TV num ato primevo de masturbação. No décimo episódio, um mendigo viciado em heroína vasculha o seu lixo e deduz que pessoas reclusas são facilmente associadas a lenços grudentos, de modo que, numa cena seguinte, ele oferece a sua força masturbacional por vinte dólares. Acho que foi o suficiente para que eu nutrisse uma mínima simpatia pelo seriado. Afinal de contas, como bem pergunta a mãe de Ryan: “quem não se masturba?

Não sei dizer facilmente se é um bom seriado ou não, mas a boa composição do personagem de Elijah Wood é facilmente tendente à identificação por aqueles que ficaram acostumados a se sentir fracassados. De um modo ou de outro, este é meu caso. E livrar-me desta pecha impositiva talvez seja uma das minhas resoluções disfarçadas de Ano Novo. Creio que não terei gana de ver a segunda temporada (risos)...

Wesley PC>