terça-feira, 13 de março de 2012

DE UM LADO, O ARREBATAMENTO (LEIA-SE: A BELEZA); DO OUTRO, O FEDOR (QUE BEM PODERIA SER A MORTE)

“Com surpresa, Aschenbach notou que o menino era perfeitamente belo. Seu rosto pálido e graciosamente fechado, circundado por cabelos cacheados, louros cor de mel, com o nariz reto, a boca suave, a expressão de seriedade divina, lembrava esculturas gregas dos mais nobres tempos e da pura atração da forma; era de tão rara atração pessoal que o observador julgou nunca ter encontrado na natureza ou no mundo artístico uma obra tão bem sucedida”. (página 113 – edição da Abril Cultural, 1979)

Tenho certeza de que já devo ter destacado o trecho acima neste ‘blog’. Trata-se de uma citação fundamental daquele que talvez seja o melhor livro que já li em vida, o meu livro favorito de todos os tempos, sem sombra de dúvida. Publicada em 1912, por Thomas Mann, “Morte em Veneza” é uma espécie de biografia antecipada e idealizada de minha vida anterior, de uma solidão sequiosa, cercada pela beleza e pela decadência do mundo circunvizinho. Transformado em belíssimo filme por Luchino Visconti em 1971, este trecho obviamente atrela-se a uma proximidade inevitável com a decepção reconstitutiva, num viés muito semelhante ao que experimentou Pier Paolo Pasolini quando buscou na “Terra Santa” de Jerusalém a locação ideal para seu filme sobre Jesus Cristo (leia declaração de embasbacamento mútuo aqui).

Se Pier Paolo Pasolini precisou enfrentar uma forte sensação de tristeza e concomitante inspiração artística ao perceber que os locais em que Jesus andou em vida não mais serviam para retratar, hoje, a sua história, com o homossexual marxista Luchino Visconti não foi diferente. No afã por encontrar o intérprete ideal de Tadzio, em seu filme, o cineasta percorre várias cidades européias em busca de um menino loiro de 14 anos que transmita toda a beleza e leveza que emana do personagem. “Mas os poloneses proletários de hoje em dia não correspondem mais ao idealismo contido em Tadzio”, diz a narração. “Ele era aristocrata, compassado, enquanto os adolescentes hodiernos são práticos, imediatistas”... E, enquanto vários adolescentes rosados e desenxabidos desfilavam diante de Luchino Visconti e sua equipe, somos surpreendidos pela imponência um tanto cínica do sueco Björn Andresen, que parecia destinado a protagonizar o filme. Ele sorri para a câmera, fica sem camisa, a pedido do diretor, hipnotiza-nos do primeiro ao último segundo em cena... Tadzio estava ali!

Pesquisando sobre o intérprete, descobri que ele ainda está vivo, tem 57 anos de idade, é casado, ainda trabalha como ator e, sobre os antecedentes de sua experiência mais marcante do cinema, disse o seguinte: “Depois que eu estive em MORTE EM VENEZA, tantos jornais na América disseram que eu era homossexual... Tudo por causa de um filme! Eu precisava ficar dizendo que não, não, o que me fez até soar desesperado ou preconceituoso... Então, eu penso que seja melhor manter-me afastado de tudo aquilo. Eu tinha apenas 16 anos de idade quando Luchino Visconti e a sua equipe levaram-me até um clube ‘gay’. Quase toda a equipe era homossexual. Os garçons no clube me faziam sentir bastante desconfortável. Eles olhavam para mim tão descompromissadamente como se eu fosse um belo pedaço de carne. Eu sabia que não poderia reagir, teria sido um suicídio social. Mas este era apenas o primeiro de vários encontros: minha carreira foi daquele tipo que começou no topo absoluto e, depois, regrediu. Isto foi solitário”. Quem pode culpar o diretor, qualquer um dos garçons ou nós de reagirmos deslumbrados como reagimos? Björn Andrésen, aqui, é a Beleza em estado puro e bruto!

Wesley PC>

2 comentários:

Jadson Teles disse...

Ele é realmente fascinante querido Wesley! fascinante....

Pseudokane3 disse...

Veja este filme, Jadson!
Por favor, veja-o!
É facinho de achar Á PROCURA DE TADZIO na Internet. E dilacera, aviso! (WPC>)