domingo, 8 de abril de 2012

UM IDEAL RURAL CADA VEZ MAIS DISTANTE, MAS... O QUE ME IMPEDE DE SONHAR?!

Na madrugada de hoje, acordei com a mensagem de celular de uma amiga recém-divorciada. “EU TE AMO”, dizia-me ela em letras maiúsculas. Apenas isso, puramente isso. Respondi que sentia o mesmo, mas não consegui mais dormir. Era pouco mais de 4h30’. Liguei a TV e havia acabado de começar um filme chamado “O Poderoso Garanhão” (1974, de Antônio B. Thomé), com o cantor brega Waldick Soriano no elenco. O título e a sinopse poderiam não me interessar noutra época, mas, no contexto atual, me pareceram absolutamente tentadores, de modo que não me arrependi nem um pouco de ter visto este filme rejeitadíssimo de nosso cinema. Ao final da sessão, fiquei idealizando um romance rural que jamais se efetivará... Mas, como bem disse o cineasta Pier Paolo Pasolini, noutra feita: “mas é tão bom sonhar!”. Deixa quieto: o filme não era de todo ruim...

Pelo que pude entender sobre a publicidade de “O Poderoso Garanhão”, ele pretendia ser uma paródia nacional de uma clássica série literária do Mario Puzo levada às telas por Francis Ford Coppola. A trama deste filme, porém, é muito específica: o vaqueiro Heitor, interpretado pelo cantor brega mostrado na foto, depois de muito tempo afastado de sua fazenda natal, regressa para assumir as terras do pai quando este é morto pelos capangas de uma fazenda rival. Lá, Heitor percebe que ainda está apaixonado por sua amiga de infância Maria, que o ama em retorno, apesar da opinião contrária de seu irmão Wilson, que acoberta Jonas, o desalmado assassino do pai de Heitor. O pai de Maria, por outro lado, enxerga com bons olhos cobiçosos a casamento vindouro de sua filha com Heitor, visto que, assim, a comunhão entre as fazendas de ambos engendraria uma espécie de Império Rural. Mas tem um detalhe: apesar da legitimidade de sua paixão por Maria, Heitor tem necessidades fisiológicas diferentes das que ela demonstra, de modo que, mal acabam de se reencontrar e declarar o amor sobrevivente da infância um pelo outro, ele é convidado por seus asseclas a visitar uma “casa de mulheres perdidas” onde se deita com a cafetina Laura, também apaixonada por ele. À medida que a trama avança, Laura será de vital importância para que Heitor descubra os assassinos de seu pai e se case com Maria, que fica levemente enciumada quando conhece a prostituta, mas ouve da boca dela algo que me emocionou por identificação: “eu sei perder!”. Na cerimônia matrimonial entre Heitor e Maria, Laura estará observando tudo à distância, no seu elegante e espevitado vestido roxo. E, antes mesmo que eu adormecesse emocionado ao final da sessão, eu declarava meu amor insistente a um habitante rural, repetindo para ele, com a explicação do adequado contexto, exatamente aquilo que a marafona quase aposentada disse: “eu sei perder!”. Sim, sim, eu sei perder...

Impressionou-me deveras no filme o modo sincero como o roteiro constrói os personagens, respeitando suas especificidades regionais e evitando julgar seus comportamentos, seja no que tange à compulsão reativa por vingança seja no que diz respeito ao financiamento naturalizado da prostituição. Além disso, a trilha sonora de Salatiel Coelho é muito precisa no enquadramento dramático das seqüências, em especial naquelas protagonizadas por Maria Viana, que interpreta a apaixonada pretendente romântica do protagonista. Além disso, a utilização de canções bregas é deveras benfazeja, o que justificaria o sucesso do filme ao menos entre os fãs do cantor Waldick Soriano, que, numa cena ousada e de gosto duvidoso (porém realista e bem-executada), aparece de cuecas na cama da meretriz com quem se deita. Não sei se eu estava atropelado por uma apreciação demasiado subjetiva, mas sinto que gostei muito do filme. Muito mesmo! Fiquei contente pelo aproveitamento positivo do caráter nacional, pela reconstituição firme de tipos humanos essencialmente brasileiros. Definitivamente, este é um filme que merecia ser estudado pelos amantes do cinema e da identidade cultural do Brasil. Dentro de minhas limitações, dispor-me-ei a fazer com que este filme seja mais conhecido!

Wesley PC>

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