quinta-feira, 3 de maio de 2012

DEVE HAVER ALGUMA RAZÃO FENOMENOLÓGICA SUPREMA PARA EU NÃO TER CONSEGUIDO FOTOGRAFAR O PALESTRANTE DE HOJE, NÃO É POSSÍVEL!

Pouco antes das 5h30’ da madrugada de hoje, eu estava levantando de minha cama. Tinha pressa para chegar ao auditório de uma conceituada universidade particular do Estado em que habito, a fim de participar de uma Oficina de Crítica Cinematográfica para a qual eu fui convidado. O ministrante da tal oficina chamava-se Luiz Carlos Oliveira Junior, outrora redator de minha publicação brasileira de crítica cinematográfica favorita, a Contracampo. Nunca tinha visto nenhuma imagem sua nem tampouco lembrava de suas críticas, mas isso era o de menos: o que mais me impressionava na Contracampo era a sua coerência grupal, o caráter de escola, na linha Cahiers Du Cinèma, por mais que, eventualmente, alguns redatores dos mesmo veículo divergissem radicalmente na apreciação de alguns filmes. O que só demonstra o brilhantismo maciço da mesma, insisto!

Pois bem, por volta das 8h05’ adentrei o auditório onde transcorreria o evento. Um rapaz belíssimo se locomovia entre outros exemplares do sexo masculino no púlpito. De repente, ele pede licença para não usar o microfone e pergunta: “está dando para me ouvir assim?”. Eu tremi. “Cristo rei, este que é o palestrante? Deve ser deslumbrado (no mau sentido)”. Feroz engano. A cada palavra pronunciada, eu ficava mais e mais impressionado com a sua genialidade, capacidade poética e erudição. Era um homem apaixonado e extremamente inteligente. Para que peste ele precisava ser também bonito?! 

 Enquanto me apressava em transcrever o máximo possível de seus aforismos para os amigos que não puderam comparecer ao evento, ficava elucubrando comigo mesmo se aquilo não era uma faceta humana de Mefistófeles. “Não é possível: só pode ser uma entidade demoníaca, uma tentação malévola!. Mas, não: era humano e amava Roberto Rossellini. Restava me render a sua sapiência.

Por quatro horas literalmente ininterruptas, o palestrante não parou de falar. Começou citando, com muita devoção, o crítico francês Jean Douchet, que, num artigo datado de 1961, chamado “A Arte de Amar”, dizia que a principal tarefa (e dificuldade) do crítico é encontrar uma harmonia ou equilíbrio no binômio paixão-lucidez. Acrescentou Luiz Carlos, com suas palavras: “o crítico é um ruminante, que esfrega as partes do corpo para saber onde o filme ficou guardado”. Mais tarde, acrescentou: “uma obra de arte não fica pronta enquanto não encontra o seu primeiro espectador”. E, mais tarde, arrebatou, parafrasticamente: “o filme não deve ser dissecado como um cadáver, um corpo sem vida, sem pulsões, mas sim analisado como algo que faz pensar na sociedade em que tanto o espectador quanto o filme estão vivos”. E eu gozava na platéia, apaixonado pelo que o rapaz dizia e por sua efígie em si. Aquilo não podia ser uma pessoa real: bonito demais, inteligente demais, apaixonado demais. Como alguém pode conjugar num só corpo tantos adjetivos tendentes ao superlativo?

 De minha forma passional e sumamente encantada, prestei atenção minuciosa a tudo de inspirado que ele proferia e quase fiquei com os dedos doendo, de tanto que me obriguei a transcrever as suas frases para meus amigos. Não conseguia parar: ele soltava um lampejo de genialidade após o outro! Afinal, ele deu um intervalo ao meio-dia. Sem querer, me deparei com ele no banheiro, minutos depois. Graças a Deus, ele fechou a porta da cabine onde urinava!

Almocei duas maçãs e uma goiaba, passeei pelos arredores da universidade particular onde estava e, às 14h, voltei para o auditório. Ele se atrasou um pouco, pediu desculpas e disparatou a falar – cheio de paixão, evidentemente – sobre Alfred Hitchcock ‘apud’ elogios de Jean-Luc Godard. Exibiu cenas de alguns filmes, mas não parecia tão empolgado quanto pela manhã. Ele estava agora trabalhando com material cinematográfico bruto (trechos de filmes), o que exigia um mínimo de retorno compreensivo por parte do público. Estes não haviam visto os filmes hitchcockianos mencionados, nem os hughesianos, nem os brooksianos, nem os rossellinianos, nem os weerasethakulianos... Ou seja, na parte vespertina desse primeiro dia de oficina, Luiz Carlos Oliveira Junior pareceu cansado (leia-se incompreendido). Até que ele pediu para a platéia se manifestar, comentar algo. Alguns falaram algo sobre o olhar, sobre a lentidão contemplativa de alguns planos, etc., etc.. E eu me derreti de amores pelos filmes, pela apresentação, pelo palestrante (ops!), por tudo o que vi e ouvi naquele dia. Impressionante!

Para além de meu respeito contemplativo ao palestrante (ou melhor, para aquém), tentei fotografá-lo, de forma sorrateira, mas, sabe-se lá por que motivo, a fotografia não foi captada por minha câmera. Simplesmente sumiu! Seria ele mefistofélico de verdade? Prefiro não indagar muito sobre isso. Ao final de sua apresentação, às 18h, tentei falar algo com ele, tremendo compulsivamente, e descobri que ele faz doutorado na Escola de Comunicação e Artes de São Paulo, orientado por Ismail Xavier, com tese relacionada ao historiador de arte Aby Warburg. Gênio!

Impaciente para escrever algo sobre a verdadeira epifania em dois turnos que experimentei hoje, tentei encontrar alguma fotografia do Luiz Carlos na Internet, a fim de demonstrar aos meus amigos e/ou leitores o quanto ele é fisicamente bonito (como se precisasse, após tamanha demonstração apaixonada de causa), mas não encontrei nenhuma que lhe fizesse jus. Não encontrei. Ao invés disso, me deparei com o homônimo mostrado na imagem, um ladrão de 20 anos, em agosto de 2011, que fora preso após roubar o cordão de prata do pescoço de um moço, na cidade de Itaperuna, Rio de Janeiro. Que fique o não-mostrado pelo muito dito e elogiado, por ora! Amanhã e sábado tem mais!

Wesley PC>

Um comentário:

Jadson Teles disse...

E eu gostaria ter estado aí com vocÊ!