Acabo de assistir ao filme “Noites Sem Dormir” (1994), tão múltiplo em suas perspectivas narrativas como qualquer outro filme da diretora, mas, ao mesmo tempo, muito coerente em sua tese denuncista contra as hipertrofias desejosas retroalimentas pelo capitalismo. Na primeira cena, a tripulação de uma aeronave gargalha. Em breve, somos apresentados aos três protagonistas diaspóricos do filme: uma lituana e dois martiniquenses. A primeira imigra para a França, mas não consegue emprego, salvo como camareira de hotel. Os dois últimos são irmãos, mas consideram-se estranhos, um em relação ao outro: um é músico e lida com a depressão de sua esposa branca. O outro é travesti e, aos poucos, se revela como o assassino de velhinhas de que os noticiários sempre falam. Este é o ponto de partida verídico do filme, aliás. Mas este realismo truísta não é o que interessa à diretora, que precisa nos confundir para se fazer entender. E, enquanto eu lamentava a forte enxaqueca que me tomava de assalto, mergulhava no filme e ficava perplexo com a sua genialidade.
Tanto quanto as memórias superpostas de “Chocolate”, os desejos recônditos de “Bom Trabalho” (1999), as hipertrofias antropofágicas da sexualidade em “Desejo e Obsessão” (2001) e os problemas advindos da adesão quase impercebida ao crime em “O Intruso” (2004), este filme traz em seu bojo todos os elementos mixórdicos que caracterizam o cinema denisiano: mesmo não sendo “fácil” de se assimilar (é preciso disposição para mergulhar, conforme já dito), está tudo lá, é tudo claro, direto, exposto. Mas ou menos como eu faço, em relação às minhas taras (auto)destrutivas. No filme e fora dele, há quem se banhe. E minha cabeça dói tanto: eu mereço?
“Sou uma pessoa fácil. Ninguém quer sofrer. O mundo enlouqueceu”!
Wesley PC>
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