terça-feira, 16 de outubro de 2012

DESAFIO DOS NOVE FILMES DESCONHECIDOS - #02: “NÓS, TRAVESTIS, PRECISAMOS RESPEITAR UMAS ÀS OUTRAS!”

É muitíssimo cedo para já mencionar a possibilidade de um paroxismo qualitativo desta nova maratona, mas acho difícil que algum dos filmes desconhecidos que se seguem consiga ultrapassar a genialidade ‘underground’ de “O Funeral das Rosas” (1969, de Toshio Matsumoto), obra absolutamente inaudita, sob qualquer prisma que eu me atreva a analisar...

Na trama básica do filme (e cometendo a licença poética de linearizá-la ao máximo), um rapazinho assassina a sua mãe depois que a flagra fazendo sexo com outro homem, depois que seu pai vai embora. Antes, esta mãe estapeia o rapazola, ao vê-lo beijando apaixonadamente a si mesmo diante de um espelho. Anos depois, este rapaz torna-se um travesti, que depõe diretamente para a câmera acerca das ambigüidades de sua vida sexual e tem um caso duradouro com um traficante de drogas, que, afinal, revelar-se-á seu pai sumido. O que fazer após deparar-se com o pai/amante esfaqueado no banheiro? Furar os olhos, é claro! Aparece, então, um comentador televisivo que diz que “esta é mais uma faceta da tragédia humana. Passemos ao próximo programa. Adeus!”. Édipo agradece pela inversão!

 Interessante é que, antes do desfecho do filme – quando tudo faz sentido, em termos tramáticos – eu estava me incomodando justamente com o excesso de vanguardismos no filme: Jean Genet é citado através do nome de um bar onde as travestis se reúnem; Yukio Mishima é emulado mais de uma vez (em dado momento, alguém proclama que “quando se retira a máscara de um homem, descobre-se a sua solidão, além de terceiras máscaras que se escondem sob aquela que estava debaixo da primeira”); trechos de um manifesto do cineasta norte-americano Jonas Mekas são proferidos por um espectador intradiegético, antes de este suplicar por maconha; excertos filosóficos assemelhados àqueles escritos pelos gregos antigos são despejados em mais de um momento (exemplo: “o espírito de um indivíduo atinge o máximo absoluto através da infinita negação”); tudo neste filme é antropofágico em relação ao que de mais inventivo acontecia no mundo no final da década em que ele foi realizado, mas, ao final, o percurso identitário é justificado. Como bem disse um dos homossexuais entrevistados durante o filme, há muitos traços em comum entre os intérpretes e os papéis que interpretam. Fiquei completamente extasiado durante a sessão: genial!

Wesley PC>

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