sábado, 18 de fevereiro de 2012

A CONTINUIDADE (ENQUANTO ESTÍMULO STURGESIANO):

Acabo de assistir a um ótimo filme estadunidense: “Mulher de Verdade” (1942), estranho título nacional para o subestimado clássico cômico “The Palm Beach Story”, do genial diretor e roteirista Preston Sturges. Na primeira seqüência do filme, uma conjunção de qüiproquós frenéticos desemboca na cerimônia de casamento do casal central, composto pelos simpaticíssimos e apaixonantes Joel McCrea e Claudette Colbert. Após eles consumarem o seu amor, entretanto, um intertítulo gigantesco continua a mensagem de que “eles foram felizes para sempre” com um questionamento: “foram mesmo?”. O restante do filme é a prova de que sim, até mesmo quando parece prevalecer o contrário...

Muito pertinente – e não necessariamente casual – que eu tenha visto dois filmes seguidos do diretor Preston Sturges [antes de “Mulher de Verdade”, assisti ao divertido, mas não tão interessante, “As Três Noites de Eva” (1941)] no dia em que eu resolvi capitular com estas desajeitadas mudanças na estrutura do Fotolog: depois de tentar obter, sem sucesso, o porquê de minha senha estar sendo insistentemente recusada, resolvi dar continuidade ao meu descarrego diário de impressões sobre a vida no novo formato, utilizando o banco de dados anterior como complemento enciclopédico-sentimental. Evidentemente, isso não esconde a minha frustração com esta rede social que tanto me aprazia nem tampouco as precauções e baixas expectativas que acompanharão as minhas publicações daqui por diante. Como bem satirizou a protagonista de “Mulher de Verdade” no que tange ao desejo recorrente de fazer sexo com seu marido: “existem maus hábitos que não nos deixam jamais”...

Insistindo na comparação com os personagens sturgesianos [além dos dois filmes citados, assisti anteriormente à obra-prima “Contrastes Humanos” (1942) e ao boníssimo “As Trapalhadas do Harold” (1947)], o rapaz de óculos posicionado contra o muro de tijolos do quintal de sua casa tem bastante em comum com eles: não obstante as inevitáveis diferenças de classe (Preston Sturges costuma escolher milionários filantrópicos, bonachões ou sumamente erotizados como seus protagonistas), o senso de continuidade que move cada um deles tem muito a ver comigo, inclusive no sentido mais estereotipado e fútil metonimizado neste retorno ao confessionário virtual que me serviu de terapia cibernética ao longo de anos. Tomara que ainda sirva para isso, para além das decepções formais recentes. Em outras palavras: estou de volta!

Sim, eu estou de volta!
WPC>

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O texto acima, bem como a foto a ele acostada, fazem parte de minha tentativa de retorno ao divã virtual que atende pelo nome de Fotolog, 'site' que utilizava com regularidade diuturna há quase dez anos e que, de repente, enfrentou uma modificação estrutural horrenda, que, de uma hora para outra, me impediu de ter acesso à minha conta, sem qualquer explicação. Pelo sim, pelo não, criei uma nova conta. Quem quiser conferir meus devaneios confessionais ainda mais íntimos, estes podem ser encontrados aqui. Por enquanto, pelo menos!

Wesley PC>

“NÃO É UM MUNDO MUITO JUSTO, MAS AINDA HÁ ALGUMA JUSTIÇA!” OU GEORGE CUKOR, POR QUE TU SEMPRE DESISTES DE FAZER AS PAZES COMIGO?!

É bastante conhecida a minha antipatia (justificada) contra o cineasta hollywoodiano George Cukor: por mais que eu admita que ele possui alguns filmes geniais em seu currículo, ele insiste em estragá-los ou tomar alguma decisão directiva que me irrita sobremaneira. Tanto que, por mais que eu seja fã compulsiva de alguns de seus filmes, não consigo admitir que eu seja seu admirador. Até porque talvez eu não seja mesmo: ele me irrita! Faz bons filmes, mas me irrita com seu esquematismo moral, com sua subsunção modista, com seu pedantismo de viado incubado, me irrita mesmo!

Seja como for, eu insisto em lhe dar algumas chances de (re)conquista, conforme pode ser lido aqui ou aqui. Eu insisto, eu tento, mas ele não se contenta em me agradar e me frustra! Foi o que acaba de ocorrer mais uma vez. Acabo de assistir a um filme absolutamente magistral em seu ponto de partida: “Fatalidade” (1947), sobre um excelente ator que enlouquece durante a temporada trianual da peça shakespeareana em que o mouro Othello assassina injustamente a inocente esposa Desdêmona. A primeira metade do filme é soberba: acompanhamos o rigor do protagonista Ronald Colman (em impressionante desempenho laureado com um Oscar) em entregar-se completamente ao papel, de corpo e alma, afastando e incomodando todos ao redor, exceto o público, que aplaude de pé o seu perfeito desempenho. Dividido entre uma longeva paixão por sua ex-esposa Brita (Signe Hasso, também impressionante) e um flerte fugidio com a garçonete Pat (Shelley Winters), afinal assassinada de forma oteliana, ele faz com que o novo namorado de sua amada (Edmond O’Brien) perceba que a sua confusão interpretativa fora dos palcos pode redundar num crime, o que, de fato, ocorre e responde pelo quartel menos interessante de um filme que tinha tudo para ser uma obra-prima. Mas o diretor George Cukor não quis, ele não quis! Ainda assim, um ótimo filme: recomendo-o de pé, com os olhos embebidos de lágrimas que teimam em não cair!

Wesley PC>

POR QUEM EU ESTOU TORCENDO...

“Um homem escreve porque é atormentado, porque duvida. Ele precisa constantemente provar a si mesmo e aos outros que é digno de algo”.

O trecho acima é atribuído aos escritores Arkadiy e Boris Strugatskiy, autores do romance que deu origem ao filme “Stalker” (1979, de Andrei Tarkovsky). Li o trecho por acaso, num ‘blog’ sobre “filmes nos quais ficamos pensando muito tempo após o final da sessão”, e me sentei para assistir a uma comédia irlandesa exibida na TV, enquanto comia o cuscuz com ovo e café que minha mãe havia me preparado. De repente, me percebo enfeitiçado pela inteligência sardônica do filme em pauta: “A Fortuna de Ned” (1998, de Kirk Jones), em que dois amigos idosos descobrem que um velhinho que mora isolado falecera ao descobrir que ganhara quase sete milhões de libras na loteria esportiva. Ansiosos para corrigir o que consideram uma injustiça do destino, eles resolvem convencer os 49 demais moradores da vila a colaborarem com eles no plano de fazer com que outra pessoa se passe pelo falecido e, assim, possam dividir igualmente a fortuna entre os 51 moradores ainda vivos do local. Uma velha sovina discorda da proposta, mas o que acontece com ela ou com os demais personagens não é tão importante agora: essencial é congratular o filme por seu surpreendente e intricado roteiro, que me deixou literalmente absorto em seus hilários estratagemas de coadunação defensiva a personagens fraudulentos. É o tipo de filme em que simpatia e imoralidade se confundem, lançando-nos numa teia reflexiva dúbia sobre as contradições éticas da contemporaneidade.

Enquanto via o filme, uma situação incômoda se desenrolava em minha casa: meu irmão caçula emprestara sua motocicleta recém-comprada (e ainda longe de ser paga) a um amigo bêbado e usuário de ‘crack’, que prometeu devolver o veículo poucas horas depois. O dia raiou, meu irmão não conseguiu dormir, ansiando pela devolução de sua motocicleta e a esposa do amigo dele liga irritada para minha casa, reclamando com minha mãe que meu irmão não deveria ter feito o que fez e que ela está prestes a ir prestar queixa sobre o sumiço de seu marido numa delegacia, visto que ele esquecera o telefone celular em seu local de trabalho, cujo proprietário está telefonando irritando porque ele ainda não compareceu para cumprir sua jornada empregatícia diária. Alheio a estes últimos detalhes, mas ansioso pela devolução de seu veículo, meu irmão perambula pelo conjunto em que moramos, em busca de seu amigo caloteiro, depois de ter chorado bastante de angústia na varanda de nossa casa, enquanto minha mãe se desespera com os problemas típicos que se anunciam neste início de feriado carnavalesco. E eu aqui, pensando nos efeitos legitimadores de minhas gargalhadas reativas ao ótimo filme irlandês que vi mais cedo. O pior é que nem sei por qual lado optar no afã que esta situação problemática se resolva logo: meu irmão continua chorando de desespero, minha mãe o acusa insistente e inutilmente de ter emprestado a motocicleta a um demente viciado, e a esposa do rapaz em pauta, com um filho pequeno ara criar, teme que ele tenha sofrido um acidente na estrada ou sido preso por tráfico de entorpecentes. Ao longe, escuto meu irmão falando ao celular: “não sei nem o que está acontecendo. Se ele morreu, se está vivo... O pior é que ele tem uma nêga, ali no final do conjunto, e nem ela sabe de nada!”. Já passou da hora de meu irmão ir trabalhar também e eu aqui, sem saber o que fazer para ajudar a minha família. Por isso, eu escrevo: porque duvido (de mim mesmo, inclusive)!

Wesley PC>

QUANDO A UNILATERALIDADE MILITANTE (NÃO) SE TORNA UM PROBLEMA...

Durante alguns meses do ano passado, eu tive o privilégio de trabalhar com uma muçulmana. Obviamente deslocada em relação à permissividade exacerbada de alguns costumes locais, ela sempre aventava com esperança a possibilidade de seu marido paquistanês viajar com ela para fora do Brasil. Numa tarde em que conversávamos sobre a filmografia do oriente Médio, ela olha para mim e pergunta: “tu já viste as montanhas do Afeganistão? Lindo aquilo ali, não é? Um dia, eu ainda viajo para lá”... Eu apenas sorri, em respeito à minha própria ignorância sobre as condições regionais de um lugar tão distante de minha realidade pretensamente laica, mas tão embebida de ideologia católica.

Os meses se passaram e, na noite, finalmente assisti ao filme mais publicamente acessível do genial diretor iraniano Mohsen Makhmalbaf: “A Caminho de Kandahar” (2001). Acostumado que já sou aos experimentos que confundem realidade, ficção e representação simultânea dos dois nos filmes do cineasta, esperava, ainda assim, me surpreender com as soluções narrativas do autor cinematográfico. Dito e feito: ainda no quartel inicial do filme, já estava impressionado com o estranho ponto de partida tramático adotado pelo filme. Quando descobre que sua irmã pretende se suicidar no dia de um eclipse solar vindouro, por se sentir irrevogavelmente oprimida pelos ditames fundamentalistas do regime Talebã, uma jornalista que agora vive no Canadá resolve interceder e tentar salvá-la. A impossibilidade de conseguir um visto para entrar em seu país natal, entretanto, a conduz por um périplo tão surpreendente quanto esquemático, em que ela adentra o Afeganistão num helicóptero e termina acossada num dos vários desertos nacionais. No caminho, ela se depara com um garotinho que não hesita em tentar lhe vender os anéis que retira dos ossos de um cadáver encontrado na areia, com um médico de fala anglofílica que pratica a filantropia propedêutica numa cidadela pobre e costuma diagnosticar a fome como principal causadora dos sintomas patológicos das mulheres da região, e com um ladrão maneta que perambula com muletas supostamente deixadas por sua falecida mãe inválida e esquartejada por uma mina terrestre. Tudo muito condizente com o imaginário espantoso que advém das notícias sobre os maus tratos sofridos pela população afegã (especialmente a feminina) durante o período em que o filme foi realizado, mas, ao mesmo tempo, tudo tão espetaculoso: como é que o diretor conseguiu extrair humor e ironia estrangeirazada de situações tão delicadamente dramáticas quanto as que foram descritas acima? O filme responde de uma forma tão esteticamente interessante quanto politicamente perigosa. Ao final, não sabia se achava o filme genial ou horrendo. Insisto que é um ótimo filme, mas estarei eticamente desesperado enquanto não discuti-lo com alguém.

Durante a sessão, fiquei imaginando o que a minha provisória colega muçulmana de trabalho acharia do filme. Ela nunca esteve no Afeganistão, que nem eu, mas, ao contrário de mim, suas concepções sobre o modo como as mulheres infiéis devem ser tratadas pelos homens seguidores do Islã diferem sobremaneira das minhas. Em outras palavras: ela já antecipou em diversas conversas que acha falsamente propagandístico o discurso de diretores como este, que “deturpam” a realidade local em prol de uma aceitação comercial/sentimental estrangeira. Em quase qualquer outra situação, eu seria imediatamente restritivo em relação ao seu devaneio reclamante, mas, no caso de “A Caminho de Kandahar”, eu fiquei preocupado: nossa, como ela tem razão!

Wesley PC>

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

AFETOS DE INFÂNCIA NAUFRAGAM?

Apesar de ser afeiçoado ao diretor Jean-Jacques Beineix desde a infância, o único contato que eu tive com sua obra foi o belo longa-metragem “Roselyne e os Leões” (1989). Faz tempo que eu tive acesso a este filme, mas, caso eu tenha a oportunidade de revê-lo hoje, pressuponho que constatarei que o filme é muito mais estiloso do que necessariamente bom, o que não é um problema no que tange à forte memória afetiva que eu tenho em relação ao filme. Pois bem, há algumas horas finalmente assisti ao longa-metragem de estréia do diretor, “Diva – Paixão Perigosa” (1981) e, apesar de me decepcionar com o ritmo lento anunciado por alguns detratores do artista, confesso-me renitentemente encantado com o seu frescor operístico. No sentido literal, inclusive.

Sendo mais específico: na trama do filme em pauta, um carteiro apaixonado por ópera dedica parte de seu tempo livre à gravação pirata dos concertos ministrados por uma cantora lírica que se recusa a gravar um disco oficial por acreditar que “a música deve ser livre e não aprisionada em um estúdio”. Por acidente, a fita cassete contendo o mais recente espetáculo da cantora é confundida com a fita cassete contendo o depoimento de uma prostituta que fora assassinada quando tentava provar que um dos comissários de polícia responsável por uma investigação de tráfico de drogas é, na verdade, adúltero e corrupto. Infelizmente, entretanto, os detalhes operísticos da trama sucumbem às inverossímeis tramóias policiais do enredo e a trilha sonora inebriante é secundarizada. Mas, ainda assim, o filme possui algo que encanta, que me faz ter certeza de que, se eu tivesse êxito em ver este filme quando era criança, lembraria dele com muito mais carinho hoje em dia...

Wesley PC>

AS SUPERSTIÇÕES, AS FÓRMULAS PRONTAS, OS DIAS BRANDOS...

Na manhã de ontem, um dia típico de quinta-feira, fui para o trabalho ouvindo um disco da paulista Bruna Caram. Não é um disco de todo ruim, mas é envergado até o talo por estas fórmulas de MPB contemporânea, em que regravações brandas de sucessos alheios conquistam os ‘pimbas’ que se acham equivocadamente órfãos do bom samba. E, nesse viés, confesso que a faixa de abertura (uma simpática releitura de “Quem Sabe Isso Quer Dizer Amor”, do Lô Borges) é bastante graciosa, mas antecipa o tom monocórdio do álbum “Feriado Pessoal” (2009), que não possui clímaxes ou arroubos de conquista, apesar de a cantora chegar perto na canção que intitula o disco ou na faixa 09, “Um Momento”, ambas compostas por ela e muito adequadas à sua voz doce. Mas, de resto, o álbum é tão mediano ou tendente ao pré-fabricado quanto a versão da artista para “Gatas Extraordinárias”, do Caetano Veloso, cuja interpretação lenta está aquém dos lampejos de paixão que a falecida Cássia Eller depositou em sua versão da mesma canção. Mas nada que a coerência reclamante e apaixonada da faixa 10, “Alquimia”, quase não resolva. Não é um disco ruim, como eu disse antes, mas enfastia antes de chegar ao fim...

Por que eu estou falando desse disco? Porque, tal qual uma invocação, o meu “dia típico” de quinta-feira foi marcado pelo mesmo tom monocórdio que abunda no álbum: havia me programado para assistir a um filme erótico com alguns amigos, mas eles desmarcaram a sessão. Por conta disso, desperdicei a minha folga noturna sem perceber, tentando sincronizar as legendas de alguns filmes britânicos antigos que eu havia baixado. Conclusão: saí do trabalho muito tarde, não necessariamente satisfeito com meus êxitos tangentes às sincronias aventadas. Dormi sem receber ou fazer visitas. E, se me serve de consolo, acordei bastante cedo hoje!

Antes de chegar em casa, prestei atenção num bom momento do disco, a faixa 03, “Gargalhadas”, com a qual me identifiquei em seu apelo cotidiano em prol da beleza dos dias típicos . Canta o eu-lírico da Bruna Caram:

“Pra que buscar recaída,
Reviver o drama, mexer na ferida?
Por onde se engana o coração
Se encontra a saída pra vida

Tempo de ver que é maldade
Martelar as horas no chão da saudade
Embora agora contradição,
O tempo que pôs essa dor nessa conta
É quem desconta, passa e te aponta o ponto de
Sorrir mais, soltar gargalhadas
Deixar pra trás o que te entristece e tece teus ais...”


Para além de qualquer concordância com a letra da canção, acho de bom tom ouvi-la enquanto escrevia esse texto banal e tão desejoso de simplicidade ou tipicidade quanto a manhã de sexta-feira que agora se inicia...

Wesley PC>

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

“MY SHARONA”!

Desde que o filme “Caindo na Real” (1994, de Ben Stiller) foi lançado, há 18 anos, eu intuía que me identificaria deveras com este filme. Hoje à noite, finalmente o vi. Desisti de algumas recorrências sexuais e para-sexuais a fim de assisti-lo e, para além de não ter me arrependido disso, o filme correspondeu bem às minhas expectativas. Não é ótimo, mas corresponde bem às nossas expectativas. Justamente porque é um filme sobre expectativas e o que vem antes e/ou depois delas. E, por respeito a algumas pessoas próximas a mim, talvez seja a ocasião de interromper esse texto, que periga ficar muito mais pessoal do que já é: é um mundo injusto!”, pareço me ouvir dizendo a mim mesmo. E, do outro lado, eu concordo com a cabeça. “Sim, é!”...

Wesley PC>

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

“OUTONO... TRISTEZA... AMOR DEFUNTO: ESTES SÃO OS TEMAS DESTA VELHA CANÇÃO RUSSA”

Sim, são. E sim, é um filme lindo. Mas, ao mesmo tempo, não sei direito como situar “Romance Sentimental” (1930) como obra eisensteiniana. A co-direção de Grigori Alexsandrov não é um problema taxonômico, visto que ele já havia colaborado organicamente em “O Encouraçado Potemkin” (1925) e parece ter feito a mesma coisa aqui. Mas é um filme bonito. Lindo demais até. Lindo e não-reivindicativo, ao contrário do que foi toda a obra deste gênio soviético, pelo menos no que tange à sua predominância subjetiva, mui destoante do vigor comunitário e socialista que abunda nas obras anteriores e posteriores a este encantador curta-metragem. Devo desgostar dele, portanto? Dizer que não entendi o que os diretores quiseram dizer com ele? Muito me tranqüiliza saber que é um filme de encomenda, realizado para agradar um monarca enfeitiçado com os dotes operísticos de sua amante Mara Griy, de modo que o diretor letão sentia vergonha de ostentar seu nome nos créditos. Mas ele precisava de financiamento monetário para seus projetos pessoais (inclusive a nunca efetivada feitura fílmica do livro canônico de Karl Marx, “O Capital”), de modo que, por causa disso, ele se deixou capitular com a beleza. Mas a que preço! E, pouco antes de ver o filme, alguém me telefonou para dizer que há um novo estagiário no local em que trabalho e que o mesmo é um “piteuzinho”. Ansioso para conhecê-lo, portanto!

Wesley PC>

SOBRE AQUILO QUE PRETENDIA SER UM RELATÓRIO DE CONCLUSÕES TARDIAS (OU PONTUAIS) SOBRE OS EFEITOS COLATERAIS DE MEUS CINCO DIAS DE JEJUM FÍLMICO...

Apesar de ser classificado como senso comum, o conjunto de saberes associado a “aquilo que toda mãe sabe” costuma ser muito mais efetivo que qualquer outra prescrição. Dentre estes saberes, está uma recomendação que diz que não se deve entupir de comida alguém que tenha passado muito tempo sem se alimentar. Minha mãe costumeiramente desobedece a esta recomendação (risos), mas foi bastante respeitosa comigo no que tange à minha decisão de passar cinco dias inteiros sem ver qualquer filme após a divulgação de minha aprovação num Mestrado. E, após eu ter voltado ao meu consumo “normal” de filmes, concluí que eu não dependo dos mesmos em nível patológico ou vicioso, mas como condição suplementar de meu bem-estar intelectual e relacional. Não é que eu não consiga viver sem assistir a filmes, mas que eu vivo bem melhor agindo dessa forma. O primeiro mandamento da lei de Deus não foi descumprido aqui: amo a Deus acima de todas as coisas!

Restabelecido o caráter religioso de uma decisão que eu relutei bastante em assumir como sendo correlata àquele tipo de promessa ao qual os fiéis católicos costumam se fiar quando desejam obter uma determinada graça material, aproveito esta oportunidade para mencionar aqui o primeiro filme inédito que vi após estes meus cinco dias de supressão espectatorial cinematográfica: “Contra’s City” (1969) curta-metragem dirigido pelo senegalês Djibril Diop Mambéty, em que uma dupla de narradores (um homem e uma mulher) comparam as diferenças aberrantes de alguns aspectos contrastantes da capital Dacar: ela devaneia de satisfação diante das manifestações impositivas do poderio colonial e arquitetônico francês, enquanto ele insiste em, sardonicamente,demonstrar o quanto isso implica na exploração inclemente das condições populacionais e sociais locais. Não achei o filme tão interessante quanto o amigo virtual que mo recomendou, mas admito que o viés político adotado pelo cineasta, aqui estreante, é mui divertido em sua verve satírica. Terei várias oportunidades para rever o filme – inclusive, com mais atenção, visto que o caráter espetaculoso da sessão pós-jejum inibiu uma adesão mais conscienciosa ao relevante discurso político-denuncista do filme, mas, por ora, publicizo a minha satisfação em estar liberto de uma restrição fundamental. Por mais submetido às disjunções psicológicas do Transtorno Obsessivo-Compulsivo que eu seja, não me submeterei voluntariamente a uma punição intelectiva como esta outra vez!

Wesley PC>

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

ÓCULOS MELADOS DE GALA (COM DUPLO SENTIDO E TUDO!)

A fotografia acima foi um presente. Sob qualquer âmbito lingüístico que se possa analisar qualquer um dos componentes da frase anterior, a fotografia acima foi um presente. Foi captada numa tarde de sábado, quando eu, um amigo heterossexual e sua filha pequena brincávamos na praça de uma igreja de bairro. No momento em pauta, meu amigo perguntava: “o céu é bonito, né?”. Eu lhe respondia, crente e sem pestanejar: “sim, é!”.

Pois bem, quando vi a fotografia publicada num dado local, trouxe à tona o diálogo sobre beleza que antecedeu a sua captura, ao que meu amigo, de forma muito lisonjeira, acrescentou: “o céu ficou ainda mais bonito porque tu estavas nele”. E, no mesmo dia em que li uma preciosidade elogiosa como esta, eu dormi durante a sessão de um filme do Alfredo Sternheim em que uma freira branca se apaixona por um pescador negro. Como eu pude?

Enquanto o filme era exibido – e eu cochilava – esforçava-me para limpar as lentes de meus óculos, que teimavam em permanecer sujas. Estava encantado com a beleza natural da fotografia do filme que estava sendo exibido, queria prestar atenção em todos os seus detalhes, mas eu teimava em jazer, tanto quanto eu entupo esse texto de pronomes utilizados de forma equivocada. Faz parte do processo: eu sinto falta de quem me circunda! Por isso é tão fácil compreender o que o título dessa postagem quer dizer...

Wesley PC>

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

UM APELO MELODRAMÁTICO:



Não é a que vida pareça não ter sentido – ou, mesmo que tenha, pouco importa saber isso agora – mas me sinto insípido hoje. Preciso de um filme do Douglas Sirk!

Wesley PC>

A ENTREGA DO 54º PRÊMIO GRAMMY E O TERMÔMETRO DA MÚSICA ‘POP’ ANGLOFÍLICA EM MINHA VIDA HODIERNA:

Enquanto escrevo esse texto, a cerimônia do Grammy deste ano está se desenrolando. Não sou muito bom para avaliar apresentações de artistas ao vivo, mas pude perceber que a cerimônia é marcada pela inseminação de surpresas durante as execuções musicais. A troca de microfones entre a cansativa Rihanna e o desgastado Chris Martin foi um bom exemplo, bem como a substituição presencial das canções interpretadas pela simpaticíssima Katy Perry. Até então, entretanto, o melhor momento do espetáculo, para mim, foi o encantador desempenho da apaixonante Taylor Swift para “Mean”, faixa 06 de seu ótimo disco “Speak Now” (2010). Gosto cada vez mais desse disco e dessa artista, tanto que torcia por ela sempre que seu nome era anunciado como concorrente a algum prêmio. A glória da noite, porém, estava reservada para a britânica Adele, merecedoramente premiada em diversas categorias. Gosto dela (tem como não gostar?), mas não tanto quanto muitos de meus amigos por aí, que se derretem a cada grito seu...

Por conta do recente falecimento da diva Whitney Houston, muitos artistas homenagearam-na durante os seus depoimentos. Compreensível e esperado, da mesma forma que também era previsível o sobejo de canções de ‘hip-hop’ ou ‘rhythm & blues’ industrial, gêneros que me incomodam pela subsunção às fórmulas vendáveis. Da mesma forma, incomodam-me ou desagradam-me Maroon 5 e a já citada Rihanna, artistas comumente presentes neste tipo de evento. Acho que estou cada vez menos antenado com as facções da música ‘pop’ anglofílica contemporânea. Mas tenho que confessar que esta Taylor Swift tem algo que me encanta deveras. Ah, ela tem!

De resto, desgostei da interpretação um tanto fanha da banda Foster the People para o clássico “Wouldn’t It Be Nice?”, do The Beach Boys, achei bonitinha a apresentação do Paul McCartney, fiquei contente com o prêmio de Melhor Desempenho de Rock recebido pela banda Foo Fighters, considero o multipremiado Chris Brown superestimado e acho o arroz-de-festa Nicki Minaj insuportável. Pois é, estou definitivamente por fora deste cenário musical ‘pop’ anglofílico hodierno...

[INTERRUPÇÃO]

Quando eu terminei de escrever a parte anterior desse texto, faltava apenas uma hora para o encerramento da cerimônia. Decido prestar mais atenção ao que acontecia no palco antes de voltar aqui e emitir minhas opiniões precipitadas e deslocadas: achei desenxabido o pronunciamento do presidente da academia responsável pelos prêmios, entendi (mas não apreciei de todo) mais uma homenagem a Whitney Houston, correspondente à interpretação maçante da talentosíssima Jennifer Hudson para a icônica “I Will Always Love You”, e percebi que nutro um desgosto comedido pelos incensados Bruno Mars e Lady GaGa, desgosto este que não deixa de ser acompanhado por um efeito de sedução erótica pertinente. Mais: acho o David Ghetta chato (apesar de minimamente agradável) e considero a lista de indicados aos prêmios principais muito menos comprometida com a qualidade musical do que com os índices mercadológicos fonográficos. Assim sendo, acho melhor eu deixar de lado estas inconvenientes observações sobre o mundo vendável da música ‘pop’ e voltar para os meus comentários fílmicos, enquanto adianto que, neste exato momento, estou baixando o extraordinário disco “Pre-Millennium Tension” (1996), do DJ Tricky. Isso sim é música ‘pop’ (ou quase ‘pop’) que estimula corpo, coração e mente!

Wesley PC>

domingo, 12 de fevereiro de 2012

A SUTILEZA DA “CESTA DE BEIJOS”...

“Mad Men” é um seriado de época exibido pelo canal fechado HBO. Sua trama é focada no cotidiano de uma agência de publicidade nova-iorquina, em que as ambições e agruras sexuais de seus funcionários engendram os clímaxes sutis de cada episódio. Assisti a um cinco ou seis episódios da primeira temporada, lançada em 2007, e me percebi encantado por uma estranha personagem, a secretária Peggy Olson (Elizabeth Moss, ótima atriz), uma jovem com expressão oscilante entre o afobamento e a tristeza, que parece apaixonada por seu patrão, mas tem um caso com um jovem executivo recém-casado e, como minha mãe bem notou, parece guardar diversos segredos, o que explica o porquê de seu sorriso parecer tão fingido quando está falando com os homens mulherengos da empresa em que trabalha. Num dado episódio, o sexto (“Babylon”), se não me engano, ela chama a atenção de seus contratadores ao se destacar na avaliação prática de satisfação de algumas clientes de cosméticos, pois é a única mulher a ser firme em sua decisão de utilizar apenas a cor de batom com a qual se identifica. Quando um de seus chefes pede que ela recolha os lenços com as manchas de batom utilizadas pelas mulheres da pesquisa, a fim de contabilizar quais foram as tonalidades labiais mais utilizadas, ela se refere ao balde de lixo onde estão os lenços como sendo “uma cesta de beijos”. Recebe elogios por isso. Muito boa a série: sutil como há muito não se vê em produtos enlatados televisivos!

Wesley PC>

“ – POR QUE VOCÊ BEBE TANTO?”

De ontem para hoje, estou lendo Charles Bukowski. Muito! Estou sem poder ver filmes até as 17h38’ deste domingo. Os contos deste velho bêbado e safado me servem de estranho consolo. Um consolo feroz, quase opositivo ao que se espera desta palavra. Nas redes sociais virtuais, o assunto mais comentado é a overdose fatal de drogas que acometeu uma famosa cantora norte-americana. Um amigo distante disse que isso decorre do desconhecimento dos próprios limites, relacionado à má administração da própria solidão. E, pouco tempo antes, eu havia lido um conto de nome “Não Exatamente Bernadete”, em que um hipocondríaco fere seu pênis enquanto se masturba com uma garrafa de Coca-Cola, pensando na paixão adolescente emulada no trecho abaixo:

“Conheci uma garota numa cidadezinha. Estava no início da adolescência, e se masturbava com uma garrafa de coca. Enfiou-a lá dentro e não conseguiu tirá-la. Teve de ir ao médico. O senhor sabe como são as cidadezinhas. A coisa se espalhou. A vida da garota ficou arruinada. Ela era repelida. Ninguém queria nada com ela. A garota mais bonita da cidade. Acabou casando com um anão numa cadeira de rodas, com uma espécie de paralisia”.

Tenho medo que o meu destino seja parecido com um desses... Não sei se eu sei controlar os meus limites. Não sei se é possível saber isso. E, para piorar, não bebo álcool. Ou para melhor, não sei. Um grande amigo está com cirrose. Ou quase. E eu sou um velho safado!

Wesley PC>