sábado, 17 de março de 2012

SOBRE O QUE EU IA DIZER, NEM PRECISA MAIS?

Tinha me programado para explicar aqui alguns temores e tensões que me tomam de assalto neste fim de semana: na segunda-feira, terei a minha primeira reunião oficial de orientação no mestrado e terei que abandonar o lugar em que trabalhei por 10 anos. Estou amadurecendo, num plano mais geral, e este tipo de “dor de parto” é indispensável ao processo. Estou lidando bem como os fatos, penso, acostumando-me ainda. E, por precaução, urge que eu seja cauteloso na explanação de alguns dilemas hodiernos...

Seja como for, paralelamente a tais problemas e decisões, me dispus a ver um filme sobre o qual nada havia ouvido falar: “A Good Old Fashioned Orgy” (2011, de Alex Gregory & Peter Huyck). Não é um bom filme. É ruim, ruim mesmo! Deveria ser uma comédia, mas é desengonçado, sem graça, demorado demais. Os 95 minutos de projeção se estendem incômoda e insossamente, no intuito pouco inspirado de nos manter empolgados diante da festa orgiática que um grupo de amigos de 30 e poucos anos prepara para comemorar a resignação inevitável ao fracasso pós-‘yuppie’ em que eles viviam. Como eu vivo numa espécie de desvio cronológico, geográfico e situacional do mesmo fracasso geracional, me identifiquei desejosamente com o filme. Só um pouquinho, mas um pouquinho que me deixou pensativo ao final da sessão. Sentei-me em frente a minha própria casa, por volta da meia-noite e pensei... E amei... E senti saudades!

Dentre as várias seqüências equivocadas do filme, uma me deixou positivamente estupefato por sua potência analítica sobre a crise existencial macrológica dos personagens: depois de terem contemplado duas amigas fazendo sexo, um personagem gordinho e alvoroçado aproxima-se nu de seu melhor amigo, ambos heterossexuais, e percebem que seus narizes estão se tocando, como se fossem esquimós se beijando. O que acontece em seguida é banal, mas a promessa da cena me encantou. Bem mais que os carrapatos na areia da praia, anunciado mais de uma vez através de placas, mas que, afinal, não são mostrados. Felizmente?

Wesley PC>

sexta-feira, 16 de março de 2012

COMEÇOU!

“ – Professora, mas eu não costumo ser muito bom em primeiras impressões.
- Apesar de isto engendrar decepções no futuro, Wesley, não te preocupes: tu tiras de letra!”


O diálogo não foi necessariamente este, mas a tônica do diálogo, sim. Minhas aulas de Mestrado começaram. Tive medo, mas, ao mesmo tempo, alimento esperanças, o que também me assusta. Mais cedo, inclusive, recebi uma mensagem, dizendo que eu teria mais sucesso profissional se buscasse uma fonoaudióloga. Não sei se é isso o que quero. Não sei o que quero. Sei que quero alguma coisa. E que querer é bom. E que...

À noite, dou mais detalhes sobre minhas primeiras aventuras com o Mestrado.

Wesley PC>

“COBIÇAMOS O QUE VEMOS... TODOS OS DIAS!”

Outro aspecto da atitude dos povos primitivos para com seus governantes relembra um procedimento que é comum nas neuroses em geral, mas vem à luz naquilo que é conhecido como delírio persecutório. A importância de uma pessoa é determinada e imensamente exagerada e seu poder absoluto é aumentado até o grau mais improvável, a fim de poder ser mais fácil torná-la responsável por tudo de desagradável que o paciente possa experimentar”. [Sigmund Freud – TOTEM E TABU – Seção (b) – “O Tabu Relativo aos Governantes” – da parte (3) do capítulo 2, ‘Tabu e Ambivalência Emocional’]

Ponto de partida 01: é assim que o psiquiatra canibal Hannibal Lecter explica o surgimento de uma determinada psicopatia no clássico de suspense “O Silêncio dos Inocentes” (1991, de Jonathan Demme). No filme, um homossexual enrustido deseja tornar-se mulher e, para além de suas limitações defensivas ao preconceituoso social depositado sobre ele, decide assassinar garotas com o tipo físico semelhante ao seu e, assim, construir um vestido feminino de pele. Antes de provar o tal vestido, ele esconde o pênis entre suas pernas e, durante o instante eternizado na fotografia, ele fala para uma quarta parede imaginária: “eu foderia comigo mesmo!”. Apesar de não querer necessariamente ser mulher (não preciso disso!), já repeti esta mesma frase em diversos contextos, inclusive numa inconsciente imitação desta perfeita cena cinematográfica!

Ponto de partida 02: apesar de ter o filho de mãe solteira Jadson Teles como o meu melhor amigo desde 1996, até 2004 eu não perceber que tinha uma corruptela de nojo em relação a sua pessoa. Por mais tempo que passássemos juntos e por mais que eu o amasse como algo superior a um irmão, até ser fulminado por um filme magistral do Mike Nichols que eu vira no cinema, eu nunca havia lhe dito isso. De repente, percebi que, em oito anos, eu nunca havia lhe abraçado. Corrigi o defeito em breve e, hoje, não sinto nenhum nojo dele: pelo contrário, careço dele ao meu lado como um filho que não sente desconforto em, eventualmente, tocar nos mamilos de seu pai. Mas já conversamos muito sobre este assunto, o que nem de longe contribuiu para que a relevância psicanalítica do mesmo fosse esgotada, em especial, quando comparada com o tipo de relacionamento amistoso que eu tinha com outro amigo, Américo, outrora demasiado íntimo, do qual sentia também essa espécie de “nojo amistoso” (se é que o oximoro existe), não obstante termos nos beijado na boca numa das fases iniciais de nossas apresentações enquanto pessoas...

Ponto de partida 03: acordei tarde na manhã de hoje. Havia sonhado que um determinado amigo masculino, cada vez mais íntimo no parâmetro recente, mostrava-se nu para mim e, onde eu cria que veria um pênis esquálido porém atraente, deparei-me com uma vagina de mais ou menos 12 anos, depilada e, do modo como se apresentava no sonho, feia. Antes de escovar os dentes, apressei-me em redigir uma mensagem ao amigo em questão, perguntando se eu poderia vê-lo nu. Não obtive uma resposta precisa, o que é socialmente compreensível, mas não necessariamente entendível no contexto que eu queria abordar aqui: na última semana, fiquei subconscientemente chateado com ele, pois precisei muito conversar sobre uns problemas emocionais sérios que me afligiram, mas ele estava ocupado, incapaz de responder do modo como eu queria e precisava ao que eu queria e precisava. Uma desilusão pessoal muito profunda fez com que, quando eu o reencontrei – após um hiato inaceitável, e hodiernamente incomum – eu não tivesse motivação emocional para dizer o que tanto me perturbou nos últimos dias. Mas sorrimos deveras. E, na madrugada de hoje, tive um sonho, que bem poderia ser um pesadelo, no que tange aos significados ainda trabalhados no plano consciencioso e que, pelo visto, redundarão numa agradável conversa de mais de 2 horas. Viver é divertido, mas, em meu caso particular, diversão implica também uma dose necessária de desconforto!

Acabaram-se os pontos de partida textuais. Segue uma conclusão freudiana: “o ato obsessivo é ostensivamente uma proteção contra o ato proibido, mas, na realidade, a nosso ver, trata-se de uma repetição dele” (grifos do autor). Minha mãe deixou um prato de comida sobre o sofá. Faço por bem em saciar este meu desejo alimentício básico, não é?

Wesley PC>

quinta-feira, 15 de março de 2012

OU... O QUE VEM A SER O TAL DO ‘ADVENTURE POP’.

Este é o rótulo genérico através do qual a banda alagoana My Midi Valentine se define. Em verdade, na prática, não difere muito dum ‘pop/rock’ repleto de barulhinhos psicodélicos, que remete tanto à fase mais LSD do The Beatles quanto ao estilo lisérgico do The Olivia Tremor Control, assemelhando-se deveras ao grupo californiano Grandaddy. Apesar de meu entojinho anglofílico inicial, os chiadinhos entre as canções enterneciam a minha mente, num fundo de ônibus, enquanto pensamentos um tanto iracundos eram convertidos em mensagens de celular. Estou ansioso hoje: é o meu primeiro dia de aula no Mestrado, um seminário externo com alguém que vem da Unisinos – Universidade do Vale do Rio do Sinos (RS). Não sei exatamente sobre o que ele palestrará, mas estou ansioso mesmo assim: hoje eu preciso de um pouco mais de ‘adventure pop’!

Wesley PC>

quarta-feira, 14 de março de 2012

SE A IMAGEM ACIMA TE CAUSA ENFADO POR SER APELATIVA, TU ÉS COMO EU: TE IRRITARÁS COM “SHAME” (2001, de Steve McQueen)!

Assim que entrei em contato com os fundamentos enredísticos e técnicos do filme “Shame” (2011, de Steve McQueen) – além de seu magnífico pôster húngaro, é claro! (vide comprovação aqui)– fui atingido por uma dupla impressão que parecia certeza: me identificaria deveras com a potência erotógeno-dramática do filme e me irritaria deveras com seu moralismo canhestro. Dito e feito!

O filme começa muito bem, a direção é ótima, o elenco é soberbo, o argumento me atinge em cheio, tinha tudo para dar certo! Mas, quando a trilha sonora de Harry Escott entra em cena, o filme desanda por completo. Não que a música seja ruim – muito pelo contrário, aliás! – mas ela julga os personagens, ela despeja lições de moral e comiseração sobre suas atitudes, fazendo com que sentimos pena por eles estarem vivos. Como pode?

Numa das cenas que mais poderiam ser interessantes, a irmã do protagonista (Carey Mulligan, linda) flagra-o se masturbando no banheiro, com a porta destrancada. Ele atira-se sobre ela, de toalha, xingando-a e expulsando-a de sua casa. Mais tarde, culpado, ele (Michael Fassbender, magnífico) joga fora todo o vasto material pornográfico que acumulava em sua residência e, enquanto assiste a um desenho animado na TV, ela se aproxima dele e lhe pede um abarco, pedindo desculpas em seguida. Ele brada: “tu só sabes pedir desculpas. Ao invés disso, aja. Ações valem mais do que palavras!”. Resta a ela pedir ainda mais desculpas... Me vi nesta cena, sim, eu me vi!

O péssimo roteiro de Abi Mogan [também responsável por “A Dama de Ferro” (2011, de Phyllida Law – sic), entretanto, não queria que eu me visse, apenas. Queria que eu me convertesse, me curasse, me sentisse culpado por ter ereções. O desfecho do filme é constrangedor de tão ridículo e impositivo. Muito pior do que eu temia e imaginava: o filme é quase ruim!

Obviamente, ainda é cedo para que eu julgue o filme. Preciso revê-lo, mais preparado para as decepções exageradas. Mais tarde, comento sobre ele com mais propriedade e menos raiva. Agora, estou muito irritado. Mas nada que lembrar da magnífica seqüência triste em que Carey Mulligan cantarola “New York, New York” numa versão dilaceradoramente lenta não resolva...

Wesley PC>

EU POSSO SER QUEM TU QUISERES QUE EU SEJA!


Apesar de o anúncio ter sido escrito por outra pessoa e conter algumas informações divergentes de minha biografia, tomo-o de assalto e incluo o meu e-mail abaixo do texto. Feitas as devidas reservas e modificações, faço valer a máxima de Bertrand Russell: “não ter algumas das coisas que desejamos é parte essencial da felicidade”. Fui claro ou querem que eu chore?

Wesley PC>

“TOTEM E TABU” (1913), NA MINHA TESTA!

“Uma pessoa que não tenha violado nenhum tabu pode todavia ser permanente ou temporariamente tabu por se encontrar num estado que possui a qualidade de provocar desejos proibidos em outros e de despertar neles um estado de ambivalência.” [capítulo II – “Tabu e Ambivalência Emocional” – Parte (2)]

O que mais eu posso acrescentar? O que mais eu preciso dizer? Ler uma obra original de Sigmund Freud é como passar em revista a minha própria biografia recente, num estado de perenidade intermitente que explica bem como esta tal noção de “tabu” oscila conceitualmente da significação sacra para uma aplicação proibitiva.

Segundo as bases bibliográficas freudianas, 'tabu' é um conceito polinésio, que se opõe estruturalmente à noção de ‘noa’, aquilo que é “geral” ou “comum”. Por esta oposição, o tabu é dotado de um ‘mana’ (influência mágica), que causa o conflito entre a tentação e a consciência da evitação que redundará, metaforicamente, na neurose. Tudo muito óbvio, ninguém ousa duvidar, mas, no meu caso refletido em particular, tudo grita: quanto mais proibido ou bizarramente inacessível me parece, mais desejoso se torna o troço. Sou uma cobaia freudiana nata!

Wesley PC>

“NA VIDA, EXISTEM TRÊS IDADES: A JUVENTUDE, A MATURIDADE E O ‘VOCÊ ESTÁ ÓTIMO!’”

Estranho pensar que eu já tenha achado que desgostava do cineasta Domingos de Oliveira. A cada filme dele que calho de ver, me percebo arrebatado por sua consciência masculina do envelhecimento intelectual, pelos lembretes inclementes da libido cadente, pelos amores circundantes. Recentemente, vi o filme “Amores” (1998) e fiquei emocionado. Dez anos após a realização deste filme, o cineasta realizou “Juventude” (2008), e foi este o filme que acaba de me emocionar. Equivocado, estropiado, mas lindo demais, sô!

Como calha de acontecer, nos filmes dirigidos por ele, a trama de “Juventude” é demasiado simples: três amigos de infância se reúnem na mansão de um deles, o mais rico, judeu. Um deles (Aderbal Freire Filho) possui uma filha viciada em heroína que precisada ser hospitalizada. Resolve pedir dinheiro emprestado ao judeu (Paulo José), que, numa dada situação, quase consente com isso depois que o terceiro deles (interpretado pelo próprio diretor e roteirista) sofre um enfarto. E o sol nascerá novamente. Assim, pura e simplesmente!

Antes, porém, que os deliciosos e inconstantes 72 minutos de projeção do filme se passem, diálogos espirituosos, nostálgicos e, eventualmente, geniais são despejados, atirados magnanimamente sobre nós, espectadores apaixonados. Confesso que me senti tentado a redigir a maioria deles nesta resenha, mas a minha memória seletiva me aconselha a deixar alguns guardados para outras ocasiões: pretendo rever o filme, se possível, bem acompanhado! Mas sinto-me autorizado a reproduzir um dos monólogos iniciais, quando o personagem de Paulo José diz que acreditou em Sigmund Freud e na Psicanálise, de modo que, se tivesse tido coragem e inteligência suficiente, se dedicaria ao autoconhecimento e, quem sabe, poderia até ser feliz... Como eu estava lendo “Totem e tabu” (1913) diante de um amigo querido minutos antes de o filme começar, não consegui conter o encanto: este filme tornou-se especial em minha vida. Se o meu amigo estivesse desaparecido, eu sairia na chuva para procurá-lo!

E, para quem não tenha entendido de imediato a associação entre estes elogios ao filme e a imagem que lhe serve de moldura, antecipo que a mesma faz menção à peça de um único ato “A Ceia dos Cardeais” (1902), de Júlio Dantas, representada pelos amigos do filme em mais de uma situação.: “Eram três os cardeais, já idosos. Da vida, só lhes sobraram apenas alguns parcos prazeres. O poder e a bajulação já não os encantavam.A cena se passa no Vaticano. Sentavam- se à mesa. Comiam faisão, tomavam champanhe e falavam sobre o amor. A louça era Sèvre, em azul e dourado, os cristais mais puros, toalha de rendas e, enquanto a nobre ave era trinchada, em generosos nacos, suas mentes divagavam...”. Assim começa a peça. O filme já terminou, mas continua reverberando em minha mente, minha alma, meu coração...

Wesley PC>

terça-feira, 13 de março de 2012

DE UM LADO, O ARREBATAMENTO (LEIA-SE: A BELEZA); DO OUTRO, O FEDOR (QUE BEM PODERIA SER A MORTE)

“Com surpresa, Aschenbach notou que o menino era perfeitamente belo. Seu rosto pálido e graciosamente fechado, circundado por cabelos cacheados, louros cor de mel, com o nariz reto, a boca suave, a expressão de seriedade divina, lembrava esculturas gregas dos mais nobres tempos e da pura atração da forma; era de tão rara atração pessoal que o observador julgou nunca ter encontrado na natureza ou no mundo artístico uma obra tão bem sucedida”. (página 113 – edição da Abril Cultural, 1979)

Tenho certeza de que já devo ter destacado o trecho acima neste ‘blog’. Trata-se de uma citação fundamental daquele que talvez seja o melhor livro que já li em vida, o meu livro favorito de todos os tempos, sem sombra de dúvida. Publicada em 1912, por Thomas Mann, “Morte em Veneza” é uma espécie de biografia antecipada e idealizada de minha vida anterior, de uma solidão sequiosa, cercada pela beleza e pela decadência do mundo circunvizinho. Transformado em belíssimo filme por Luchino Visconti em 1971, este trecho obviamente atrela-se a uma proximidade inevitável com a decepção reconstitutiva, num viés muito semelhante ao que experimentou Pier Paolo Pasolini quando buscou na “Terra Santa” de Jerusalém a locação ideal para seu filme sobre Jesus Cristo (leia declaração de embasbacamento mútuo aqui).

Se Pier Paolo Pasolini precisou enfrentar uma forte sensação de tristeza e concomitante inspiração artística ao perceber que os locais em que Jesus andou em vida não mais serviam para retratar, hoje, a sua história, com o homossexual marxista Luchino Visconti não foi diferente. No afã por encontrar o intérprete ideal de Tadzio, em seu filme, o cineasta percorre várias cidades européias em busca de um menino loiro de 14 anos que transmita toda a beleza e leveza que emana do personagem. “Mas os poloneses proletários de hoje em dia não correspondem mais ao idealismo contido em Tadzio”, diz a narração. “Ele era aristocrata, compassado, enquanto os adolescentes hodiernos são práticos, imediatistas”... E, enquanto vários adolescentes rosados e desenxabidos desfilavam diante de Luchino Visconti e sua equipe, somos surpreendidos pela imponência um tanto cínica do sueco Björn Andresen, que parecia destinado a protagonizar o filme. Ele sorri para a câmera, fica sem camisa, a pedido do diretor, hipnotiza-nos do primeiro ao último segundo em cena... Tadzio estava ali!

Pesquisando sobre o intérprete, descobri que ele ainda está vivo, tem 57 anos de idade, é casado, ainda trabalha como ator e, sobre os antecedentes de sua experiência mais marcante do cinema, disse o seguinte: “Depois que eu estive em MORTE EM VENEZA, tantos jornais na América disseram que eu era homossexual... Tudo por causa de um filme! Eu precisava ficar dizendo que não, não, o que me fez até soar desesperado ou preconceituoso... Então, eu penso que seja melhor manter-me afastado de tudo aquilo. Eu tinha apenas 16 anos de idade quando Luchino Visconti e a sua equipe levaram-me até um clube ‘gay’. Quase toda a equipe era homossexual. Os garçons no clube me faziam sentir bastante desconfortável. Eles olhavam para mim tão descompromissadamente como se eu fosse um belo pedaço de carne. Eu sabia que não poderia reagir, teria sido um suicídio social. Mas este era apenas o primeiro de vários encontros: minha carreira foi daquele tipo que começou no topo absoluto e, depois, regrediu. Isto foi solitário”. Quem pode culpar o diretor, qualquer um dos garçons ou nós de reagirmos deslumbrados como reagimos? Björn Andrésen, aqui, é a Beleza em estado puro e bruto!

Wesley PC>

segunda-feira, 12 de março de 2012

E SE EU FOSSE CAPAZ DE DAR UM BOM CONSELHO?

No lugar em que trabalho, existe um rapaz que ama. Talvez seja uma informação demasiado genérica esta, mas o tal rapaz que ama também se apaixona. Por não vivermos no mais justo dos mundos, eu e ele, o rapaz talvez se dê ao luxo de se apaixonar por quem já é comprometido. E, como tal, há um bom tempo ele vem me indicando a audiência ao filme “Eu, Meu Irmão e Nossa Namorada” (2007, de Peter Hedges) como sendo um filme que me ajudaria a entender o tipo de “problema” que ele enfrenta cotidianamente. Na tarde de hoje, tive folga no trabalho. Ligo a TV por acaso, enquanto me preparo para almoçar, e... Qual filme estava começando?! Era a oportunidade que eu precisava: nada nesse mundo é por acaso!

Sem querer expor aqui dilemas particulares do rapaz, confesso que a trama do filme é facilmente propensa à identificação por quase qualquer pessoa: Steve Carell interpreta o pai viúvo de três filhas que, de repente, se vê apaixonado pela encantadora namorada de seu irmão (Juliette Binoche). Não é difícil imaginar que o filme forjará um final feliz espúrio em que ele e ela ficarão juntos, às expensas de uma súbita mudança de personalidade do irmão mais novo (o belo e carismático Dane Cook), que se mostra um incorrigível mulherengo e conformará as mágoas de seu abandono oportunista no colo ousado da tragicômica personagem de Emily Blunt. O suficiente para me deixar extremamente irritado com a malevolência moral do filme.

Encerrada a sessão, apressei-me em dizer ao rapaz que mo indicou que desgostei do mesmo, que não compactuo com o egoísmo irrefletido daquele tipo de paixão, ao final, hipócrita e imediatista em sua consumação autojustificada. O título original do filme (“Dan in Real Life”) talvez seja mais sincero em relação ao que estava sendo vendido pelo filme (a correção moral de um pai destinado à reabilitação valorativa do lema “a família em primeiro lugar”), mas, se serve de consolo – tanto a mim quanto ao rapaz em pauta e para qualquer pessoa que leia este desabafo – gostei deveras do derradeiro conselho do protagonista: “planeje ser pego de surpresa”. É exatamente o que estou fazendo agora!

Wesley PC>

QUANDO A MASTURBAÇÃO (ALHEIA) SE TORNA UMA RIVAL...

Dediquei um bom trecho de minha tarde de domingo à discussão sobre os efeitos nefastos da heterofobia entre ‘gays’ que se tratam como mulheres quando se sentem protegidos num gueto homossexual. Para meu contentamento orgânico, a discussão fluiu em direção ao entendimento mútuo, às impossibilidade taxonômicas e relativizantes sobre a heterogeneidade identitária de indivíduos eventualmente agrupados num mesmo rol de preocupações ou comportamentos. Na quinzena que vem, portanto, estaremos utilizando as palavras de Guy Hocquenghem como substrato teórico para entender o porquê de existirem heterossexuais adúlteros e procriadores que insistem em enfiar seus pênis melequentos nos ânus virginais de jovens quase deflorados na infância ou heterossexuais bem cotados no mercado carnal hodierno que se deixam ser chupados por um espermófago apaixonado ao menos duas vezes por semana. Pelo menos, quando este homossexual apaixonado chega antes da hora do banho...

Para além de uma frustração inicial em ser vetada a indispensável manipulação genital alheia, o heterossexual destacado na segunda classificação permitiu que o homossexual apaixonado levantasse a sua camiseta e cheirasse com afeto sincero o seu tórax encantatório e seu abdome cada vez mais proeminente – mas não menos encantatório. Houve amor durante aquela proibição ejaculatória desencadeada pelo excesso de masturbação solitária, de modo que, após o sono do referido heterossexual, coube ao dito homossexual apaixonado assistir ao filme do diretor canadense Denis Villeneuve que estava sendo exibido na TV: “Politécnica” (2009), sobre um massacre estudantil ocorrido em 1989, quando um rapaz armado invadiu uma classe de Engenharia Mecânica e assassinou a quase totalidade das mulheres da turma, pro confessar odiar feministas.

Filmado num belíssimo preto-e-branco, o filme só não se tornou melhor e mais impactante porque o diretor [nosso conhecido graças ao perturbador mas irregular filme “Incêndios” (2010)] exagera na autoconfiança trágica de seu roteiro e se perde em malabarismos formais desgastados após o definitivo enfoque dado a um tema semelhante no já clássico “Elefante” (2003, de Gus Van Sant). Mas foi um bom, belo e dramático filme mesmo assim. Coroou com chave reflexiva as discussões éticas de um bom dia, quando, numa cena-chave, uma carismática sobrevivente do massacre anti-feminista descobre que está grávida e escreve: "se for menino, eu o ensinarei a amar; se for menina, direi que o mundo lhe pertence". Quem negará a esta corajosa mãe tal direito?

Wesley PC>

domingo, 11 de março de 2012

E, ENQUANTO ESCREVO ESTA RESENHA, SINTO O MEU CABELO CRESCER...


“Você é linda, sua velha rabugenta, e se eu pudesse
te dar só um presente
para o resto de sua vida seria este.
Confiança.
Seria o presente da Confiança.
Ou isso ou uma vela perfumada”.


Os versos acima, do jeito como estão escritos, constam de uma espécie de posfácio ao final de “Um Dia”, maravilhoso livro do britânico David Nicholls que acabo de ler. São versos que não fazem mais parte da trama – e que talvez sejam um agradecimento interno e muito pessoal do autor a uma mulher que muito ama – mas que, ao mesmo tempo, tem muito a ver com a história que eu tinha acabado de consumir como se fosse uma projeção de minha própria vida. Extraordinário o livro, estou impressionado!

Por mais que a trama eventualmente diminuísse o seu tom de surpresa (toda história de amor acaba sendo mais uma história de amor, mais cedo ou mais tarde) e por mais que alguns acontecimentos fossem essencialmente previsíveis (infeliz da trama – ou vida real – que não contenha mortes anunciadas, gravidezes, choros e abandonos, traições e, como é cada vez mais comum hoje em dia, divórcios), o autor conseguia se reinventar a cada parágrafo e nos surpreender, fazendo que até mesmo a minha arrogância subliminar de crítico dito “alternativo” se rendesse ao verdadeiro golpe de genialidade que acontece após a página 363 da edição que estava em minhas mãos, capítulo dezoito, “O meio”, datado como 15 de julho de 2004. Jamais imaginaria o que estava por vir, uma verdadeira ação mestra de literatura adulta!

E, NESTE MOMENTO, PEÇO QUE QUEM AINDA NÃO LEU OU DESEJA LER ESTE LIVRO EM BREVE EVITE AVANÇAR NA REVELAÇÃO DAS SURPRESAS CONTIDAS NAS PÁGINAS SEGUINTES!

Afinal de contas, o modo como o autor e, principalmente, a inteligente publicidade relacionada ao livro, cria expectativas tramáticas que serão francamente interrompidas ou remodeladas. Tal como ocorre na vida em si. Não que a morte súbita da protagonista feminina tenha sido uma surpresa plena. Foi, mas não a grande surpresa do livro. Para mim, o que realmente foi espantoso é o modo como o autor aproveita-se deste pressuposto para erigir muito mais emoção passional a partir do deslindamento de eventos suprimidos no dia que deu origem à trama, 15 de julho de 1988, quando os protagonistas Emma Morley e Dexter Mayhew dormem juntos após se conhecerem na festa de formatura universitária: na parte cinco de seu livro, “Três aniversários”, David Nicholls corrige em apenas cinco capítulos toda a minha exasperação atual com esta tendência insuportável dos meios de comunicação de massa hodiernos em estimularam o que tachei de “estética do Alzheimer”. Ali, a nostalgia é sincera, as memórias são carregadas de historicidade, o drama é legítimo e real. Definitivamente, este romance digna-se de fulgurar em os meus favoritos. Afinal de contas, estou ainda perplexo por não ter lido o capítulo referente à data que cumpriria a promessa do jargão publicitário envolvendo a sinopse: “vinte anos, duas pessoas. Não há um 15 de julho de 2008 no livro! Mas como é fácil e proveitoso imaginá-lo...


PODEM VOLTAR À LEITURA GENÉRICA, PESSOAL!

Obviamente, não tardaria para que essa história de amor fosse cooptada por Hollywood. Apesar de a trama não ser necessariamente adolescente – o protagonista masculino Dexter, por exemplo, é concomitantemente atraente e repugnante da primeira até a última página, sem possibilidade de maior redenção – não duvido que a condução adotada na versão cinematográfica do filme, já lançada em 2011, com a dinamarquesa Lone Scherfig na direção, roteiro escrito pelo próprio David Nicholls, e Anna Hathaway e o pouco conhecido Jim Sturgess como protagonistas, seja um tanto traiçoeira em relação à amargura inevitável de muitas páginas do livro, que, como já adverti, é muito consciente de seus antecedentes enredísticos, a ponto de um personagem secundário chamar o casal central, sardonicamente, de Harry e Sally, em referência a um já clássico filme romântico de Rob Reiner em que dois (quase) amigos se apaixonam após anos de convivência (forçada). Mas, para mim, o momento mais intimamente marcante do livro inteiro encontra-se no capítulo referente ao dia 15 de julho de 1993, em que as personalidades de quatro diferentes personagens são metonimizadas a partir dos filmes que eles escolhem ver naquele dia: enquanto uma moçoila culta e politizada que trabalha como professora colegial anseia por ver um filme do Krzysztof Kieslowski, seu namorado comediante deseja ver o novo filme de uma famosa franquia de ‘terrir’ do inspirado Sam Raimi. Mais tarde, a professora recebe um telefonema de seu suposto e inconstante melhor amigo, que a convida para a pré-estréia de um ‘arrasa-quarteirões’ de Steven Spielberg, mas ela recusa. Ele, então, é obrigado a se consolar com a presença de uma modelo fútil e espalhafatosa, que só aceitaria ao convite, sem se interessar pelo filme, se tivesse certeza de que a princesa Diana estaria presente na sessão. Por esse detalhe magistral de composição, não é difícil concordar comigo, mesmo sem ter lido o livro: ele é genial!

Wesley PC>