terça-feira, 23 de abril de 2013

“ALTA TRAIÇÃO É APENAS O NOME JURÍDICO DO QUE CHAMAM DE REVOLUÇÃO!”

Na manhã de hoje, eu não me recordava de ter ouvido o nome do cineasta carioca Sérgio Bernardes Filho em algum momento de minha vida. Filho de um conceituado arquiteto, ele realizou apenas um longa-metragem até hoje: “Desesperato” (1968), protagonizado por Raul Cortez, o qual vi há algumas horas e, apesar de tê-lo apreciado bastante esteticamente, desagradei-me de seu viés discursivo um tanto forçado e pragmaticamente tardio.

Se, pela manhã, uma prova de graduação sobre os conchavos jornalísticos durante a época da ditadura militar me obsedava, à noite, as conseqüências e esquecimentos geracionais destes mesmos conchavos assumiram uma nova faceta, através de um desentendimento sufocado que ameaçou eclodir durante o debate sobre o filme supracitado. Um desentendimento sufocado mas não esquecido: ele voltará, ele assombrará (positivamente, inclusive) quem esteve presente ao evento!

Ao invés de deter-me sobre as controvérsias do debate – e as contradições político-ideológicas que o circundaram – preciso ampliar o meu desconforto em relação ao filme, que, em seu desfecho inspirado pelas guerrilhas de países latino-americanos, plagia o final de “Terra em Transe” (1967, de Glauber Rocha), substituindo a crise ética que não é resolvida pelo protagonista para o terreno do amor carnal, aburguesado, monogâmico. Um nome de mulher é proferido antes que a derradeira frase do narrador seja completada: ela era a causa de tudo!

Se, em essência e guardadas as devidas proporções, “Desesperato”, em seus fundamentos ativos para a construção dos personagens, me fez lembrar bastante do ótimo filme contemporâneo “Dia Noite Dia Noite” (2006, de Julia Loktev – comentando pessoalmente aqui), em substância, ele explica por si mesmo o porquê de não ser conhecido por mim: ele fora ultrapassado em sua própria época, datado mesmo em seu ano de realização, vencido por sua própria pusilanimidade, não obstante alguns “atos falhos” formais e conteudísticos bastante inspirados compensaram positivamente a audiência e afastá-lo da fórmula em que “a quantidade tem mais importância que a qualidade”, conforme o seu próprio protagonista denuncia.

Muito mais focado na ‘Nouvelle Vague’ que no ‘Cinema Novo’, este filme lateja em minha cabeça neste exato instante menos por seus méritos que pelas derivações hermenêuticas que engendrou: é um filme que fala pouco, mas exprime muito e, por isso, merece ser redimido. De hoje em diante, Sérgio Bernardes Filho talvez seja um nome recorrente em minhas análises históricas do cinema brasileiro, mas enquanto contra-exemplo, enquanto operário pouco inspirado de um momento de transição que clamava por atitudes mais enérgicas. Ele preferiu refugiar-se na catarse romântica de seu alter-ego equivocadamente suicida em nome feminino de uma causa supostamente nobre. Não me convenceu, mas o debate ainda está aberto...

Wesley PC> 

Um comentário:

A. Everton Rocha disse...

Antes eu achava impossível alguém viver sem ter que se relacionar com mais de uma pessoa, hoje sei que é completamente possível viver com uma.