domingo, 14 de abril de 2013

“NÃO TENHO O DIREITO DE MATÁ-LO APENAS PORQUE ELE ME ODEIA!”

Desde que minha mãe assistiu a “O Ódio é Cego” (1950), filme oficial de estréia de uma de seus atores favoritos, Sidney Poitier, fiquei impressionado não apenas com a sinopse do filme, sobre a faceta mais patológica dos ódios raciais convertidos em crimes sociais, como pela importância subestimada do mesmo na carreira primorosa do diretor e roteirista Joseph L. Mankiewicz. Além disso, a trama possibilitava que eu enrijecesse as minhas impressões discursivas sobre o racismo, bastante úteis numa paquera platônica que, naquela ocasião, estava sendo inutilmente implementada. Passada a oportunidade, assisti ao filme noutro contexto, bem mais apaziguado e com expectativas reduzidas, mas não menos digno de ser relatado:

Nesta manhã de domingo, chateado por ter dormido mais de dez horas seguidas, descobri o filme pro acaso no Telecine Cult e me impressionei de imediato com a ótima personificação caricatural de Richard Widmark, bandido racista que crê furiosamente que um médico negro assassinou por vingança o seu irmão também bandido, que ele não sabia que estava com um tumor no cérebro. Se, nos quesitos dramáticos (a complexidade dos relacionamentos entre o médico negro, seus colegas de profissão e sua família, o tormento existencial da namorada do falecido, que era traído por seu irmão, etc.), o enredo impressiona pela pujança, na subtrama policial ele decepciona pela ingenuidade, visto que o modo como um prisioneiro consegue se apropriar de um bisturi numa sala de operação escancara uma terrível falha de segurança, que se repetirá no modo como este mesmo prisioneiro, baleado numa perna, consegue fugir do hospital, no modo como ele seqüestra e ameaça a sua cunhada e no modo como ele invade a casa do melhor amigo profissional do protagonista médico. Tais pequenos defeitos não eliminam a reflexão poderosa que o filme traz à tona, com certeza geradora de polêmicas à época em que foi realizado: os preparativos para uma chacina de negros que são apresentados num bairro periférico do ‘white trash’ norte-americano são impressionantes, de maneira que garrafas quebradas para servirem como armas assustam ainda mais quando lembramos da cicatriz horrível na face do ascensorista do hospital, ferido numa chacina semelhante.

Terminado o filme – que, conforme previsto, gerou uma breve discussão entre eu e minha mãe sobre os absurdos do racismo – pensei no rapaz que me motivaram idealmente a descobrir este filme e que, por ser idiota, preconceituoso e virulento em meu medo pequeno-burguês de se relacionar com as pessoas, hoje me evita. Problema dele: quem perde é ele! De minha parte, estou contente de, por causa do que eu sentia por ele, ter descoberto este poderoso filme genericamente envelhecido, mas infelizmente ainda atual e não-resolvido em sua temática denuncista!

Wesley PC> 

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