quinta-feira, 9 de maio de 2013

“- TU TENS UMA SOBRINHA QUE PARECE UM NAVIO DE BATALHA? – TENHO SIM. MANTENHA-A AFASTADA DE MIM!”

Enciclopedicamente difundido como “o primeiro longa-metragem norte-americano da História do Cinema”, o filme que agora destaco – e que acabo de ver – chama a atenção, para além de seu inquestionável valor histórico, por ser um filme em que Charles Chaplin não atua como o seu célebre personagem Carlitos. Apesar de seus títulos brasileiros, “Idílio Desfeito/ O Casamento de Carlitos” (1914, de Mack Sennett) apresenta-nos ao famoso cômico mudo como um escroque que faz com que uma camponesa gorda e simpática (Marie Dressler) fique completamente apaixonada por ele, a fim de surrupiar o seu farto dote. Levando-a para a cidade, o casal passa a ser incomodado pela ex-namorada do trapaceiro, vivida por Mabel Normand, que, segundo um soberbo intertítulo, “é escravizada por sua beleza, que a faz ficar à mercê deste tipo de homem”. Poucos minutos antes, esta mesma personagem ingressara na “alta sociedade pela porta dos fundos”, visto que se empregara como copeira na residência de Tillie, a gordinha apaixonada do título original, erigida à condição de única herdeira de um tio milionário, depois que este é dado como morto numa atividade de alpinismo nas montanhas. Ao final, todos os mal-entendidos serão desfeitos e as duas mulheres apaixonadas pelo mesmo homem oportunista se unirão na rejeição programada e policialesca contra ele. Dois verbos em inglês que aprendi vendo o filme: “to oust” (“expulsar”) e “to spurn” (“rejeitar com desdém”). Uma obra de arte didática e pioneira, portanto.

 Digo mais: assisti a este filme em homenagem a um rapaz chapliniano que conheci recentemente e a fim de facilitar a minha exposição vindoura sobre o desenvolvimento da linguagem cinematográfica pré-hollywoodiana durante a década de 1910, que levarei a cabo no próximo final de semana, no grupo de estudos de que participo todos os sábados. Atendendo a uma recomendação de um Guia de Vídeo que sempre consulto, cri que o filme seria menos divertido que historicamente importante, mas discordei veementemente desta declaração: o filme é ótimo, hilário em seus qüiproquós e cenas de queda, torta na cara, palmadas e, principalmente, no instante em que, atolada na água, antes de ser digna de compaixão por sua rival trapaceira, Tillie é mostrada lutando com caranguejo, peixes e outros animais marinhos. Sem contar que, num artifício típico das comédias da época, há uma cena metalingüística genial em que o noivo enganador e a sua namorada interesseira entram num cinema para assistir a um filme que, segundo o intercrédito titular, adianta “o destino de um ladrão”. Inteligentíssimo o filme. Amei! Afinal de contas, eu sou desses que amam (e, aqui, não me atenho apenas ao filme)...

 Wesley PC>

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