É assim que o personagem de Satã se apresenta na cena
inicial de “O Império do Sexo Explícito” (1985, de Marcelo Motta), quando o
protagonista vivido por Oásis Minniti é atirado numa cela entulhada de homens
violentos. A tipicidade genérica em relação aos filmes do Francisco Cavalcanti
me levou imediatamente a pensar neste cineasta, o que não era por acaso, visto
que, além do ator comum, ele também foi co-diretor de um filme do José Mojica
Marins, tal qual o Marcelo Motta. O modo desordenado como a trama é conduzida,
entretanto, distancia-se sobremaneira dos filmes cavalcantinianos que, para
além de sua qualidade questionável, ao menos respeitavam a linearidade na seqüência
das ações.
Em “O Império do Sexo Explícito”, apesar de sua pompa
policialesca, a estória é o que menos parece importar, mas, paradoxalmente, as
cenas de sexo prometidas no título do filme também não são extensas. A
impressão que fica, nos menos de 80 minutos de duração do filme, é que estamos
a ver uma versão retalhada da produção, tamanha a dificuldade de compreender a
trama, em que o presidiário ao qual o violento se dirige logo no início recebe
o nome de Marcelo. Apaixonado por uma modelo chamada Linda (Zilda Mayo), que
conhece numa praia, durante um flerte, Marcelo envolve-se com o tráfico de
drogas e, por causa disso, é perseguido por gangues rivais. Não sendo
necessariamente um mocinho (ele assassina um jovem bonito, irmão de um perigoso
traficante, a sangue-frio numa duna!), Marcelo não permanecerá vivo ao final,
num julgamento moral que tem muito a ver com o universo justiceiro ao qual
Francisco Cavalcanti (e, pelo visto, também o Marcelo Motta) se filia.
Malgrado sua dificuldade de entendimento tramático e as
cenas mal-realizadas, o filme não é de todo desagradável: particularmente,
apreciei a exigüidade de seqüências pornográficas, mas, durante estas, fui
brindado espectatorialmente com situações impressionantes, como oito pessoas
fodendo numa cama de casal, uma mulher enfiando o bico de seu seio no ânus de
um parceiro e o pitoresco instante em que um homem pára de lamber a vagina da
mulher com quem trepava para enfiar o salto de sapato preto dela no grelo. Como
pode? (risos)
Apesar de não ser um filme que possa ser classificado como
engraçado (é protagonizado por um anti-herói assassino e criminoso e possui
cenas gráficas de decapitação), há pelo menos um momento genial de humor,
quando um capanga acossado num cano de esgoto durante um tiroteio exclama, em
tom musical: “ôxe, e quem disse que eu quero bala? Eu quero mesmo é comer maria-mole!”.
Papoquei-me de rir neste instante!
Quando comecei a ver este filme, cri que o detestaria, que
me enfadaria, que o acharia desprovido de qualquer interesse, para além de seus
elementos estatísticos para a minha pesquisa de mestrado sobre a decadência que
acompanhou a saturação sexual nos filmes produzidos pela Boca do Lixo
paulistana após a reabertura democrática do Brasil em 1985. Não foi o caso: por
mais mal-feito que este filme seja, faço questão de revê-lo em breve e
recomendá-lo a meus amigos mais pervertidos. Ele permite boas e inusitadas reflexões
morais em meio às transas e gozadas: por essas e outras que eu amo o cinema
brasileiro!
Wesley PC>