sábado, 29 de março de 2014

UMA GRANDE SURPRESA TEATRAL: “ELA ESTEVE AQUI”

Neste final de mês de março de 2014, teve início o IV Festival Sergipano de Teatro, em que diversas produções locais serão exibidas gratuitamente. Faltei à encenação de estréia, pois estava ocupado com planos pornográficos, mas, após convencer alguns amigos de trabalho a acompanharem-me na segunda encenação, fomos prestigiar “Ela Esteve Aqui”, escrita por um recém-graduado em Letras da UFS, Euler Lopes Teles.

Tive o privilégio de encontrá-lo pessoalmente mais de uma vez (além de ajudá-lo em situações burocráticas quando trabalhava no DAA) e, por mais simpático que ele seja pessoalmente, não mentirei: descri que a peça fosse tão boa! Tanto que, quando telefonava para os meus amigos para convidá-los para a encenação da mesma, eu destacava muito mais a gratuidade que as benesses teatrais do evento. Como eu estava enganado! 

Adentrei o teatro alguns minutos atrasado, mas fui logo fisgado pelo que acontecia no palco: dois casais se revezavam na excreção raivosa de suas frustrações maritais. Uma das mulheres gabava-se de ter uma amante urinariamente ativa. Um dos maridos teve um flerte rápido com uma turista italiana no passado. Talvez os dois casais fossem extensões do mesmo par. Talvez as reclamações é que fossem parecidas e os casais diferentes. Seja lá qual for a explicação, o texto da peça era muito bom e os atores fizeram jus na defesa de seus papéis: gritavam, rastejavam-se pelo cenário,  giravam em círculo, atiravam objetos violentamente ao chão, brandiam, amavam!

Por mais que eu tenha me desagradado em relação ao complemento musical do espetáculo – malgrado as canções selecionadas como trilha sonora não serem ruins (duas executadas pela banda Plástico Lunar e outra do ótimo compositor Alex Sant’Anna), as mesmas foram inseridas de forma inadequada, rompendo o clima intenso da confissão de fracasso matrimonial – fiquei embasbacado com a engenhosidade do móvel básico que servia de cenário: projetado por uma elogiada estudante de Arquitetura, o emaranhado de pedaços de madeira que prendia e libertava – através de movimentos ora sutis ora bruscos – os personagens foi um incremento genial à pujança do texto. O mesmo sendo dito sobre o momento em que os interlocutores de cada sexo sobrepunham as suas vozes, descompassadas, enquanto narravam uma mesma situação, quando as esposas encantavam-nos ao cantarolar uma canção do Bon Jovi. Mais tarde, cada um dos quatro personagens subia numa espécie de púlpito e, enquanto os demais giravam no palco, narravam a gênese psicanalítica de seus medos e cacoetes. E foi aí que eu tive certeza do quanto Euler Lopes estava ótimo em cena: sim, não apenas ele teve uma excelente atuação como o seu texto me deixou particularmente afetado. Identifiquei-me sobremaneira com o seu personagem defensor da repetição dos dias, irritado com as pessoas que dependem de irrupções imaginárias de algo que seja “novo”. Novo por ser “novo”, apenas...

Os demais personagens eram um rapaz traumatizado por ter sido abandonado num ‘shopping center’ quando criança (Cícero Junior), uma rapariga perdulária que sentia pavor de ser tachada de frágil e uma moça que eventualmente se percebia diante da tela em branco do computador, que não queria lhe dizer nada... O mote para a peça e para todas as discussões que se entrelaçam era a visita da amante de uma das esposas à sua casa, onde o marido estava ausente e o banheiro disponível para o seu jorro de mijo. Afinal, percebe-se que era tudo uma provocação. E, pouco antes, as duas mulheres (Inês Reis e Marina Franca) passaram batom uma na boca da outra. Fantástico!

Gostei muito do que vi, ouvi e senti em “Ela Esteve Aqui”, a ponto de fazer questão de cumprimentar o autor ao final do espetáculo. Ele estava suado, claro, extenuado, mas muito feliz por perceber que fora tão exitoso em comunicar à platéia o que pretendia. Parabenizei-o pessoalmente, mas, por medo de não ter sido suficientemente compreendido, refaço-o aqui: parabéns sinceros, Euler. Gostei muitíssimo do que vi!

Wesley PC>

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