sábado, 11 de outubro de 2014

“ESCÓRIA DINAMARQUESA!”

Na edição que possuo do guia elementar “1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer”, “O Reino” (1994), minissérie inicialmente televisiva dirigida por Lars Von Trier e Morten Arnfred, é elogiosamente citada à página 841. Na mesma, a articulista Kim Newman alega que este telefilme sintetiza muitos dos temas recorrentes na obra trieriana, o que voltaria com mais vigor em “O Reino II” (1997, co-dirigido pelos mesmos cineastas do primeiro), em minha opinião bem mais elaborado roteiristicamente. O problema: achei tanto o primeiro telefilme quanto o segundo capengas!

 Se o primeiro incomodou-me sobremaneira por causa de seu ritmo moroso (os atores e personagens são ótimos, mas as situações – arrastadas ao extremo, como é típico em seriados de TV – não!), o segundo tem na forçação de barra acerca das convenções do gênero horror o seu maior problema. Exemplo: o veterano ator Udo Kier interpreta o bebê gigantesco que provém do intercurso erótico entre uma médica e um demônio. É concebível que ele possua dimensões extremadas, mas não dá para suportar a sua loquacidade existencial!

 Acerca do ótimo protagonista Ernst-Hugo Järegård, que interpreta um médico sueco que odeia os dinamarqueses que o acolheram, lamenta-se que ele seja obrigado a ficar se escondendo em arquivos, para obliterar o suposto erro médico envolvendo a operação cerebral de uma garota que ficou mentalmente debilitada após o procedimento. Acho um desperdício obrigar um profissional que passa a segunda temporada da série analisando a própria merda, depois de ter viajado ao Haiti para sintetizar um soro zumbificante, se submeter a isso! (risos)

Por mais que eu tenha desgostado oficialmente de ambos os filmes (o segundo é um décimo melhor que o primeiro), não posso negar que as marcas registradas trierianas estejam lá: os arroubos protecionistas de sarcasmo societal (e/ou xenofóbico), as crenças legítimas no cristianismo (ainda que por um viés irônico) e as interações problemáticas entre personagens egoístas que se desejam estão todas lá. O problema é que a duração de quase quatro horas e meia para cada um dos telefilmes prejudica bastante o andamento do processo narrativo. Mas vale a pena ser visto, analisado e discutido. E – por que não? – também sentido, como um inequívoco filme de terror religioso merece!

Wesley PC>

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

“VOCÊ É TÃO DELICADINHA, MINHA FILHA! TEM QUE TER CAUTELA COM A TUA SAÚDE...”

Ainda não consigo reconhecer a Cristina Aché fisicamente, mas sei que ela é uma linda mulher e uma excelente atriz. Mais de uma vez, tive a oportunidade de me deslumbrar frente às suas atuações, mas esta dificuldade distintiva fez com que eu prejudicasse apreensivamente alguns dos aspectos dramáticos mais chamativos do belo e vagaroso “Noites do Sertão” (1984, de Carlos Alberto Prates Correia), que acabei de ver...

No filme, Cristina Aché interpreta Lalinha, uma moça recém-divorciada que resolve passar uma temporada na fazenda do seu sogro (Carlos Kroeber). Lá conhece as duas filhas dele, uma soturna e religiosa (a ótima Sura Berditchevsky) e a outra jovial e lúbrica (Débora Bloch). A primeira morre de desgosto, enquanto a segunda passa algumas noites de prazer ao lado da nora de seu pai. Lalinha, entretanto, resolve seduzir o sogro. Despe-se para ela, faz perguntas calculadas acerca da beleza de sua efígie e de seu corpo, enquanto Maria da Glória, a rapariga jovial, perde a virgindade com um serviçal, antes de ser cortejada matrimonialmente por um jovem médico da região (Tony Ramos), a quem é legado o desfecho, uma narração plácida sobre os acontecimentos que virão... Na derradeira imagem, o sol nasce, deixando o céu avermelhado. Autor do argumento original: João Guimarães Rosa, através da novela “Buriti”.

Assim, de cara, não fiquei de todo interessado na leitura do livro que inspirou o filme, mas sinto que, quando revê-lo, gostarei muito mais: já estarei apreciando a formosura de Cristina Aché, excelente atriz, que aparece nua, encantando-nos com o brilho de sua pele alva e mui graciosa. Linda!

Wesley PC>

terça-feira, 7 de outubro de 2014

IAN McEWAN RESSIGNIFICANDO A MINHA VIDA!

Não vou recair no equivocado estratagema de comparar livro e filme nem tampouco poderei demorar-me em citações proveitosas da magistral obra literária que é “Reparação” (2001), do escritor britânico Ian McEwan. Mas adianto: a versão cinematográfica que Joe Wright perpetrou em 2007 [“Desejo e Reparação”, no título brasileiro] é igualmente excelente. Diferente, porém soberba!

No filme, a personagem Briony é loira, enquanto que, no livro, ela faz questão de orgulhar-se de seus cabelos negros. Imaginativa e mui talentosa, esta garota, no auge de seus treze anos de idade, pensa ter presenciado um estupro e denuncia o namorado da irmã como culpado. Ele é preso, vai para a II Guerra Mundial e, sobre o restante, só lendo o livro, que é dividido em quatro partes: na primeira, dividida em capítulos, conhecemos os personagens e entendemos as suas motivações primárias; na segunda, unimo-nos aos dramas copiosos de guerra; na terceira, reencontramos Briony, adulta, como enfermeira; e, no quarto, glupt, a instância narrativa do romance culpa a si mesma de ser incapaz de atingir a redenção por seus pecados. O motivo: “não há reparação para Deus, ou para romancistas, mesmo se eles são ateus. Seria sempre uma tarefa impossível, e este é precisamente o ponto: a tentativa é tudo!” (página 351, a derradeira da edição anglofílica que me deram de presente).

Levei pouco mais de uma semana para ler o livro, com as devidas para respirar, visto que a minha identificação com a Briony era inevitável. Ao mesmo tempo, como não amar Cecilia Tallis e Robbie Turner, o casal que se apaixona e é impedido de levar à frente as suas pretensões românticas: ela é rica e espevitada; ele é filho da serviçal da casa, mas disposto a se formar em Medicina. Ambos são inteligentes e amorosamente correspondidos, mas... Há alguém, que faz algo, e os impede, e, assim, faz a trama jorrar. E, enquanto eu lia aquilo tudo, por mais que eu torcesse pelo amor deles [vide confirmação individual aqui], era como se eu estivesse sendo cúmplice da separação. Noutras palavras: por mais que eu tenha desgostado infinitesimalmente da Segunda Parte do livro (que era intencionalmente desagradável, forte em sua violência gráfica e sobrevivencial), estive diante de uma obra-prima, que, ao deslindar o seu desfecho transcendental, ressignificou por completo este magnífico fotograma do filme wrightiano, que tem tanto a ver com a minha vida, a minha própria vida...

Wesley PC>

domingo, 5 de outubro de 2014

“NUNCA SABEMOS QUEM NOS AMA DE VERDADE. POR ISSO, DEVEMOS CONTINUAR AMANDO. AS PESSOAS PASSAM POR NOSSAS VIDAS, E O QUE NOS SOBRAM SÃO ALGUMAS LEMBRANÇAS, ALGUNS SORRISOS E A INEVITÁVEL SENSAÇÃO DE FRACASSO”... (EM DEFESA DO PEDRO CARLOS ROVAI)

Este melancólico julgamento sobre a vida está contido no segundo episódio (“A Assinatura”) da alegada pornochanchada primeva “Adultério à Brasileira” (1969), dirigida e roteirizada por Pedro Carlos Rovai. Apesar de o último episódio (“A Receita”) realmente conter os chistes machistas atrelados a este subgênero cômico, o tom do filme é quase merencório, chegando mesmo a emular os filmes neo-realistas de Michelangelo Antonioni. Surpreendi-me positivamente, a ponto de me empolgar solenemente com o talento directivo subaproveitado do realizador brasileiro associado a comédias eróticas rasteiras...

Ao voltar para casa, depois de exercer o meu “direito democrático do voto” (sic), arrumei-me para ver “A Viúva Virgem” (1972), um dos filmes mais elogiados do diretor, mas a cópia era falsa. Consolei-me, então, com mais uma pornochanchada em episódios, “Os Mansos”, que, além da direção de Pedro Carlos Rovai, contava também com as colaborações de Braz Chediak e Aurélio Teixeira. Minha mãe e meu irmão sorriram bastante durante a sessão, mas o filme me desagradou por seu conteúdo preconceituoso. Exceção ao tom irônico do primeiro episódio, “A B... de Ouro”, sobre um homem (Mário Benvenutti) que oferece uma fortuna apenas para tocar nas nádegas de uma loira escultural (Sandra Bréa), que convence o seu marido (José Lewgoy) a consentir com a negociata. Lema do episódio: “Deus foi injusto com os homens: com tanta mulher no mundo, ele nos fez com dez dedos e apenas um pinto”. Urgh! Machista até o talo, mas quem diz isso é o protagonista, ridicularizado ao final, e não o diretor/roteirista. Menos mal...

Wesley PC>